Entrei em Pânico no Youtube
Felipe M. Guerra escreveu me avisando que, diante da impossibilidade de realizar um lançamento em DVD/Blu-Ray (porque estes lançamentos não se pagam mais, eu mesmo parei de fazer lançamentos físicos porque vende pouquíssimo), resolveu colocar seu filme no youtube.
Na palavras do próprios Felipe:
“Em 2001, quando as duas únicas opções para fazer cinema no Brasil era ser filho de banqueiro ou aventurar-se no mundo encantando das câmeras VHS, eu fiz uma sátira aos filmes slasher chamada “Entrei em Pânico ao Saber o que Vocês Fizeram na Sexta-feira 13 do Verão Passado”, gravada em VHS e com “orçamento” de 250 reais. Na época a série “Pânico” fazia muito sucesso e tinha gerado um ‘revival’ desse tipo de produção, mas eram filmes muito ruins, sem sangue, sem mulher pelada, enfim, sem aqueles elementos que faziam os velhos “Sexta-feira 13” tão divertidos. E eu resolvi brincar com os clichês do subgênero, usando amigos como atores, sangue de suco de groselha e efeitos caseiros. Seja por causa do título gigante, seja por causa da curiosidade de uma produção de horror ter sido feita no interior do Rio Grande do Sul, o filme teve uma repercussão tremenda, bem mais do que merecia. Até hoje, acho que é um dos filmes independentes brasileiros mais conhecidos, mas menos vistos.
“Entrei em Pânico… Parte 2” surgiu de uma piada que não funcionou no final da Parte 1, quando os protagonistas fugiam de carro deixando o assassino vivo pra trás e diziam: “A gente volta na Parte 2 pra dar porrada nele”. Obviamente era só mais uma gozação, mas o final em aberto fez com que muita gente realmente me cobrasse pela Parte 2.
Em 2006 eu lancei um filme que gosto muito, uma comédia com toques de horror chamada “Canibais & Solidão”, que não teve repercussão nenhuma porque era mais comédia que terror. Inclusive não passou em festival nenhum na época. Aí eu resolvi fazer o “Entrei em Pânico… Parte 2” e dar ao público o que queria – sangue e tripas -, porque o primeiro filme teve reportagem na SET, no Fantástico e até numa revista espanhola de cinema fantástico, e eu queria tentar repetir esse “sucesso”.
O roteiro foi escrito em 2008, mas o filme só saiu em 2011. É por isso que os personagens vivem falando que o massacre do filme original aconteceu sete anos antes, e não dez. Acontece que no começo de 2009 eu me mudei para São Paulo, para fazer meu Mestrado, e voltava à minha cidade-natal (Carlos Barbosa, RS) somente de vez em quando, e era aí que filmávamos. Por isso que levei quase três anos para terminar o filme! Os atores e atrizes mudaram de peso e corte de cabelo umas 20 vezes durante as gravações, e a história do filme se passa apenas em alguns dias, mas ninguém nunca notou nada – e, se notou, não me disse.
Para a continuação, eu trouxe de volta vários personagens do original, inclusive um que morreu no primeiro filme (meu irmão Rodrigo, ressuscitado milagrosamente e com direito a uma piada ironizando esse tipo de absurdo em filmes). Minha ideia original era colocar todos os atores do primeiro filme neste, inclusive os que morreram, pois eles iriam aparecer como fantasmas que o personagem Goti enxergava devido ao trauma de ter sobrevivido ao massacre. Mas, durante o processo de filmagem, eu percebi que isso deixaria o filme muito longo e enrolado, e o original já era assim (demorava muito para a matança começar), então cortei toda essa ideia dos fantasmas.
Uma coisa que eu fiz questão de ter na Parte 2 eram efeitos especiais elaborados. No primeiro filme eu mesmo improvisei os efeitos sem nem saber como fazer direito, então neste eu paguei uma graninha para o Ricardo Ghiorzi, um técnico de efeitos especiais de Porto Alegre, me ajudar nesse departamento. Ele foi o responsável pela grande cena do filme, em que cinco jovens são mortos de uma vez só. Sempre achei engraçado esse negócio de, nos slashers, o assassino matar uma pessoa por vez, então fiz essa cena pensando num massacre coletivo mostrado no ótimo “Chamas da Morte” (The Burning, 1981). Levamos mais de seis horas para filmar uma cena que, editada, não chega a cinco minutos!
“Entrei em Pânico… Parte 2” custou quase 3 mil reais e deu bastante trabalho por causa do cronograma bizarro de filmagens. Eu só podia filmar quando voltava para minha cidadezinha, mas nem sempre os atores estavam disponíveis. Então tive que cortar ou alterar cenas inteiras para me adequar ao tempo e aos atores que tínhamos disponíveis em determinados momentos. Mas é um filme que a gente se divertiu muito fazendo. Inclusive, durante a gravação da última cena, eu fiz questão de tomar um banho de sangue falso atirado sobre mim pelos próprios atores.
Este foi meu filme de maior repercussão até agora. Não tanto quanto o primeiro, que chegou a revistas e ao horário nobre da Globo, mas somente porque os tempos são outros e hoje todo mundo está fazendo seu próprio filme, então isso deixou de ser notícia. Porém o filme circulou por praticamente todos os festivais de cinema fantástico e/ou independente do Brasil, e foi exibido em mostras na Argentina, em Porto Rico e no México, o mais perto que um filme meu chegou de Hollywood! Enfim, provavelmente foi meu filme mais VISTO, enquanto o primeiro as pessoas só conhecem de nome.
De 2011 para cá, fiquei remoendo a ideia de fazer um DVD duplo caprichado para o filme, pois tenho meia hora de cenas excluídas (incluindo umas mortes alternativas) e umas divertidas entrevistas com o elenco que fiz na época, além de making-of dos efeitos especiais. Mas o panorama do cinema independente mudou bastante de 2001, quando lancei a Parte 1, para agora. Lembro que vendi mais de 500 fitas do original, mas hoje ninguém quer mais saber de comprar filme independente, todo mundo só quer baixar ou ver de graça. Então resolvi jogar o filme no YouTube eu mesmo. O lado bom é que mais gente tem acesso ao meu trabalho. O lado ruim… Bem, eu nunca mais vou recuperar meus 3 mil, e assim fica cada vez mais difícil conseguir investir mais grana em futuras produções.
Uma coisa que “Entrei em Pânico… Parte 2” me ensinou é que certos preciosismos de diretor xarope e de estudante de cinema não fazem diferença alguma no produto final – em outras palavras, o espectador médio nem liga para isso. Por exemplo, eu me envolvi em algumas produções mais “profissionais” em que os diretores de fotografia ficavam duas horas só acertando a luz. Aqui, eu filmei tudo com luz natural ou pontos de luz simples (tipo abajures), e nunca ninguém criticou a “continuidade da luz” entre as cenas. Outra: o filme tem dois erros grosseiros de continuidade (na verdade tem um montão mas esses dois são grosseiros MESMO), e ninguém nunca percebeu. Um é a cadeira de rodas do personagem Goti: tivemos que usar dois modelos diferentes como se fosse a mesma, e elas são COMPLETAMENTE diferentes, mas ninguém notou. O segundo é a mão falsa que usamos nas cenas em que o Eliseu Demari é ferido na mão: o Ghiorzi fez a mão falsa TROCADA, e não havia mais tempo de refazer a correta, então usamos a trocada mesmo e passou batido! Assim, fica a dica para os técnicos chatos de cinema independente: dediquem-se mais à história e menos ao perfeccionismo, porque se umas barbeiragens como essas passaram batidas, não vai ser a sua iluminação 1,5% mais fraca ou o fio de cabelo fora de lugar no cenário que vão deixar seu filme uma merda!
Mas eu confesso que gostaria muito de fazer um “Entrei em Pânico… Parte 3″. Seria como fechar o ciclo, sabe? Porque cada filme da série foi feito num momento diferente da produção independente nacional: o primeiro em VHS no começo do século 21, o segundo em digital mini-DV dez anos depois, então agora eu queria fazer um terceiro e último em Full HD, porque hoje isso já é possível e dá uma cara mais profissional mesmo ao filme mais vagabundo feito em casa. Também seria uma homenagem ao próprio cinema independente, e eu gostaria de convidar artistas fodões tipo o Ghiorzi, o Kapel Furman e o Rodrigo Aragão para fazer uma cena de morte cada, sempre bem absurda e exagerada. Mas obviamente isso demanda tempo e dinheiro que eu não tenho. Mesmo assim, é algo que eu gostaria de fazer. Quem sabe daqui mais dez anos?”
Veja o filme aqui:
maio 6, 2016 às 10:16 am
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