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Assassinas Voadoras Promovem Carnificina no Festival do Peixe Frito

Posted in Cinema with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on agosto 31, 2012 by canibuk

“Piranha 2 – The Spawning” (“Piranhas 2 – Assassinas Voadoras”, 1981, 84 min.) de James Cameron. Produção de Ovidio G. Assonitis. Com: Tricia O’Neil, Lance Henriksen e Steve Marachuk.

No calor da noite jamaicana  um casal de turistas mergulha no local onde há os destroços de um navio afundado para ter um pouquinho de sexo nas profundezas do mar azul. Peitinhos a mostra, sunga rasgada e os corpos do casal de amantes assanhados são devorados por piranhas famintas!… Hum, espere aí, piranhas em água salgada?… Sim, este é o brilhante ponto de partida do genial (e muito tosco) roteiro do produtor Ovidio Assonitis (com alguns pitacos do diretor James Cameron em seu único trabalho que admiro). Aqui somos apresentados ao Clube Elysium, uma espécie de hotel cheio dos mais variados tipos humanos que somente o cinema italiano tem a capacidade de criar. Entre uma e outra cena idiota, somos apresentados à Anne Kimbrough (Tricia O’Neil), instrutora de mergulho que trabalha ali com seu filho tapado, caçadoras de homens ricos, velhas ninfomaníacas, pescadores que usam dinamite, ricaços egocentricos, o xerife boa pinta, dentistas otários e, lógico, como não poderia faltar, o dono de hotel ganancioso que, a todo custo, quer fazer um festival do peixe frito na praia.

Em uma de suas aulas de mergulho Anne leva seus alunos até os destroços do navio onde as piranhas vivem. Um dos alunos entra no navio e é comido pelas piranhas. Assim o xerife, que se revela marido de Anne, começa as investigações. Anne, auxiliado por um aluno que quer comer ela, invade o necrotério para analizar o corpo podre do aluno morto. Enquanto estão fotografando o cadáver uma enfermeira descobre a farra e os expulsa. Ao arrumar o corpo do morto a enfermeira tem a surpresa que todos estão esperando, ou seja, uma piranha voadora sai de dentro do corpo e voa até sua jugular estraçalhando-a (as piranhas são de borracha, quando atacam os próprios atores precisam segurá-las e simular que estão vivas e violentas, rendendo momentos impagáveis de humor involuntário). Já em sua casa, Anne e seu aluno estão vendo as fotos do cadáver quando, como seria normal num caso assim, pinta um clima de tesão e eles se beijam e vão prá cama para uma foda revigorante. Deste ponto em diante o filme fica cada vez mais divertido, com as piranhas voadoras saindo da água como um cardume/bando sedento por carne humana. Logo Anne está implorando para o dono do Clube Elysium cancelar todas as atividades na água, mas ele não aceita isso (Assonitis e Cameron perdem aqui uma ótima oportunidade de esculhambar este clichê, já que como as piranhas voam e respiram fora da água, se todas todas as atividades da água fossem canceladas, ainda teríamos os deliciosos ataques).

Quando o aluno de Anne se revela um bioquímico, ficamos sabendo que ele sabia que no navio afundado havia ovos de piranhas modificadas geneticamente para serem utilizadas como armas pelos militares americanos. Como o festival do peixe frito não foi cancelado, todos os hóspedes que esperavam comer um peixinho frito de graça viram a refeição principal das piranhas que promovem uma carnificina gore repleta de feridas pustulentas, sangue grosso e membros amputados. A última esperança de todos é Anne mergulhar até o navio, ninho das piranhas, e explodir tudo com bananas de dinamite, promovendo assim um dos finais mais toscos que o cinema trash já filmou.

Com uma equipe-técnica completamente italiana (onde ninguém falava inglês), James Cameron deve ter se sentido um peixe fora d’água nesta produção do picareta Assonitis. “Piranha 2” era para ter sido dirigido por Miller Drake (assistente de direção no clássico “Alligator” de Lewis Teague, filmado um ano antes) que havia trabalhado com Roger Corman e Joe Dante no primeiro “Piranha” (1978) que traria de volta as personagens de Kevin McCarthy (que reapareceria todo cheio de cicatrizes porque foi vítima das piranhas no primeiro filme) e de Barbara Steele. James Cameron havia sido contratado para fazer os efeitos especiais do filme e, quando Drake foi despedido da produção, Cameron pode realizar seu sonho de dirigir um filme, mas, para azar do americano, Assonitis resolveu acompanhar as filmagens de perto e discutia quase sobre tudo com Cameron (nada pior para um produtor do que ter um diretor que não faz o que lhe é ordenado) e assim proibiu Cameron de ver as filmagens do dia e, depois, não o deixou acompanhar a edição do filme. Aliás, James Cameron se refere ao “The Terminator/O Exterminador do Futuro” (1984) como seu primeiro filme (há um curta-metragem de Cameron de 1978, intitulado “Xenogenesis” que merece ser redescoberto).

Ovidio G. Assonitis (1943) nasceu no Egito e é produtor de cinema independente. Nos anos de 1960 se tornou distribuidor de filmes no sudoeste da Ásia (em apenas 10 anos como distribuidor colocou no mercado mais de 900 filmes). Entre 1970 e 2000 produziu cerca de 50 filmes, muitos deles coproduções com produtoras como American International Pictures, Nippon Herald Films Inc. e Toho-Towa, geralmente com lucros absurdos como “Chi Sei?/Beyond the Door/Espírito Maligno” (1974), filme de baixo orçamento dirigido por ele mesmo, que teve arrecadação mundial de mais de 40 milhões de dólares. Com o pseudônimo de Oliver Hellman, além de “Chi Sei?”, dirigiu ainda “Tentacoli” (1977), trasheira estrelada por John Huston, sobre polvos assassinos; “There Was a Little Girl/Madhouse” (1981), sobre uma professora de surdos atormentada por sua irmã gêmea e a comédia “Desperate Moves” (1981). Como produtor trabalhou com os mais variados tipos de diretores italianos possíveis, realizando belíssimos filmes de baixo orçamento como “Nel Labirinto del Sesso” (1969) de Alfonso Brescia; “Il Paese del Sesso Selvaggio/The Man from the Deep River” (1972) de Umberto lenzi, um dos primeiros filmes do ciclo de filmes de canibais italianos; “Dedicato a una Stella” (1976) de Luigi Cozzi, um drama romantico; “Stridulum/Herdeiros da Morte” (1979) de Giulio Paradisi, sci-fi de horror sobre o bem e o mal em luta secular; “Iron Warrior/O Guerreiro de Aço” (1987) também de Alfonso Brescia; “Curse 2 – The Bite” (1989) de Frederico Prosperi, sobre um mané que é mordido por uma cobra radioativa e o resto pode ser imaginado; “Lambada” (1991) de Fábio Barreto, trasheira musical que tentava lucrar com a moda da lambada; “American Ninja 5” (1993) de Bobby Gene Leonard, com Pat Morita no elenco; entre vários outros exemplos de como ser um exploitation man do cinema.

Giannetto De Rossi (1942), responsável pelos ótimos momentos gores de “Piranha 2”, começou como maquiador em filmes como “Le Ore Dell”Amore” (1963) de Luciano Salce, comédia romântica estrelada por Ugo Tognazzi e Barbara Steele, “C’era una Volta il West/Era uma vez no Oeste” (1969) de Sergio Leone e “Quando le Donne Avevano la Coda/Quando as Mulheres Tinham Rabo” (1971) de Pasquale Festa Companile, comédia incorreta com Senta Berger. Em 1972 trabalhou na comédia “All’Onorevole Piacciono le Donne…/O Deputado Erótico”, dirigido por Lucio Fulci, trampo que colocou os dois em contato. Logo em seguida De Rossi trabalhou com Jorge Grau no clássico “Non si Deve Profanare il Sono dei Morti/Let Sleeping Corpse Lie/Zumbi 3”, onde criou efeitos de maquiagens gores convincentes. Mas foi com Lucio Fulci que extrapolou todos os limites do bom gosto ao elaborar os efeitos ultra gores de filmes como “Zumbi 2” (1979); “… E Tu Vivrai nel Terrore! L’Aldilà/Terror nas Trevas” (1981) e “Quella Villa Accanto al Cimitero/The House by the Cemetery/A Casa dos Mortos-Vivos” (1981). Sempre metido nas produções mais divertidas, De Rossi trabalhou em inúmeros filmes que marcaram época, como “L’Umanoide/O Humanóide” (1979), sci-fi cara de pau de Aldo lado; “Conan The Destroyer/Conan, O Destruidor” (1984) de Richard Fleischer, fantasia com Schwarzenegger; “Rambo III” (1988) de Peter McDonald, ação com Stallone; “Killer Crocodille” (1989), horror sobre um crocodilo gigante de Fabrizio de Angelis; entre vários outros. Giannetto De Rossi também foi responsável pela criação dos efeitos realistas do “snuff movie” que é projetado em “Emanuelle in America” (1977) de Joe D’Amato, estrelado por Laura Gemser. Giannetto ainda dirigiu três longas: “Cyborg, il Guerriero D’Acciaio” (1989), sci-fi de ação; “Killer Crocodille II” (1990), continuação sangrenta das aventuras do crocodilo gigante; e o filme em vídeo “Tummy” (1995), sobre um garoto que foge do orfanato com duas criaturas mágicas.

“Piranha 2 – Assassinas Voadoras” foi lançado em DVD no Brasil pela Columbia Tri Star Home Video e é ótimo para ver que todos os gigantes da indústria cinematográfica mundial começam pequenos.

por Petter Baiestorf.

Cani Arrabbiati

Posted in Cinema with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on julho 30, 2012 by canibuk

“Cani Arrabbiati” (1974, 96 min.) de Mario Bava. Com: George Eastman, Riccardo Cucciolla, Lea Lander e Don Backy. Também conhecido como “Semaforo Rosso” ou “Kidnapped”.

Se tem um filme em que você deve confiar na indicação sem maiores perguntas e sem se informar muito, é este clássico “Cani Arrabbiati”, mais conhecido como “Rabid Dogs”, do fantástico diretor italiano Mario Bava. Na minha opinião o melhor trabalho de Bava em uma carreira repleta de grandes momentos. O mais incrível é que este filmaço, na época em que foi finalizado, não teve distribuição nos cinemas porque a produtora responsável por ele entrou em falência e foi impedida, legalmente, de lança-lo. Somente no ano de 1995 (alguns dizem 1998, não lembro direito e pesquisando achei informações desencontradas, mas vi ele em 1999 em cópia pirata conseguida pelo colecionador Thómaz Albornoz) que o filme ganhou distribuição por insistência de Lea Lander, atriz do filme (que em algumas produções assinava com o nome de Lea Kruger para lucrar com a fama de seu primo Hardy Krüger, ator em clássicos como “Barry Lyndon” (1975, Warner) de Stanley Kubrick, “A Bridge too Far/Uma Ponte Longe Demais” (1977) de Richard Attenborough ou “The Wild Geese/Selvagens Cães de Guerra” (1978) de Andrew V. McLaglen).

O que você deve saber da trama é o seguinte: Quatro ladrões tentam assaltar um carro blindado. Um deles é morto durante o assalto e os três restantes precisam fugir pegando duas mulheres de reféns (uma logo é morta) e roubando um carro que estava parado num semáforo (o motorista, Richard, diz desesperado que está levando seu filho doente ao hospital, mas não consegue sensibilizar os bandidos). Logo o trio de maníacos começa a torturar psicologicamente seus reféns (a ação do filme se desenvolve, com maestria, dentro de um carro), com um dos ladrões querendo estuprar a mulher, Maria (Lea Lander), a todo custo. Saber mais do que isso estraga as ótimas surpresas que o roteiro nos proporciona. Posso assegurar que você vai se deparar com um dos melhores finais da história do cinema (dependendo de qual versão do filme você estiver vendo, pois existem pelo menos seis cortes de “Cani Arrabbiati” circulando no mercado mundial).

Com base numa história de Ellery Queen (pseudônimo usado pelos primos de origem judaica, Frederic Dannay e Manfred Bennigton Lee) publicada pela Arnoldo Mondadori Editore através da série policial “Il Giallo Mondadori”, os roteiristas Alessandro Parenzo e Cesare Frugoni, com algumas intervenções de Mario Bava, criaram uma tensa peça sobre o sadismo humano e sua capacidade de maldades em nome de lucro fácil, com um final extremamente niilista. Mario Bava nunca esteve tão a vontade e sarcástico em um filme, dá prá sentir ele se divertindo enquanto fazia o filme. “Cani Arrabbiati” era seu filme preferido dos que fez.

Mario Bava (1914-1980) foi técnico de efeitos, diretor de fotografia, roteirista e diretor, filho do escultor Eugenio Bava, um dos pioneiros do cinema italiano, responsável por trucagens e direção de fotografia de inúmeros filmes mudos. Mario, em 1956, foi contratado pelo diretor Riccardo Freda para fazer a fotografia de “I Vampiri”, filme que Freda abandonou no meio da produção deixando a oportunidade para Bava finalizá-lo. Seu primeiro filme solo é o clássico “La Maschera del Demonio/Black Sunday/A Maldição do Demônio” (1960, London Films) com Barbara Steele no elenco. Em seguida dirigiu uma série de filmes bastante influentes como “Sei Donne per L’Assassino/Blood and Black Lace” (1964) sobre modelos assassinadas; “Terrore Nello Spazio/Planet of the Vampires” (1965) que mostra astronautas lutando contra criaturas em planeta hostil, que serviu de inspiração para “Alien” (1979) de Ridley Scott e foi plagiado por “Pitch Black/Eclipse Mortal” (2000) de David Twohy; “Operazione Paura/Kill, Baby, Kill” (1966), horror gótico bastante imitado; “Diabolik” (1968), uma adaptação adulta inspirada em histórias em quadrinhos, dando uma nova perspectiva ao gênero e “Reazione a Catena/A Bay of Blood/A Mansão da Morte” (1971, também conhecido como “Twitch of the Death Nerve” ou “Ecologia del Delitto”), slasher exemplar que, alguns anos depois, foi descaradamente copiado em “Sexta-Feira 13 – Parte 2”. Decepcionado com a distribuição de seus últimos filmes como “Lisa e il Diavolo” (1974) e “Cani Arrabbiati”, Bava realizou ainda “Schock” (1977) e se aposentou. Lamberto Bava é seu filho e seguiu a tradição familiar, sem grande destaque, na produção de filmes.

Um dos atores do filme é Luigi Montefiori (George Eastman) que se tornou conhecido por sua longa parceria com Joe D’Amato. Trabalhou com vários grandes diretores italianos como Enzo G. Castellari, Enzo Barboni, Umberto Lenzi e até Federico fellini (ele está no elenco de “Satyricon” (1969), clássico felliniano imperdível). Foi ator e produtor do clássico “Antropophagus” (1980) dirigido por seu amigo D’Amato. Outro ator de destaque no elenco é Riccardo Cucciolla, um dublador (também diretor de dublagens) que eventualmente trabalhava como ator. Cucciolla também está no elenco de “Sacco e Vanzetti” (1970) de Giuliano Montaldo, um dos mais belos filmes políticos dos anos 70.

“Cani Arrabbiati” nunca teve um lançamento no Brasil. Espero que saia uma versão nacional com material extra como um clássico destes pede (e que não seja lançado pela Continental, lógico!). A título de curiosidade: escrevi o roteiro de “Raiva” (2000) inspirado em “Cani Arrabbiati”.

por Petter Baiestorf.

Veja “Cani Arrabbiati/Rabid Dogs” aqui:

Calafrios

Posted in Cinema with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on maio 25, 2012 by canibuk

“Shivers” (ou “Orgy of the Blood Parasites” ou “They Came From Within” ou “The Parasite Murders”, “Calafrios” no Brasil, 1975, 87 min.) de David Cronenberg. Com: Paul Hampton, Joe Silver, Barbara Steele, Lynn Lowry e Susan Petrie.

Um cientista conduz experiências onde almeja criar um parasita que possa ser usado em transplantes de orgãos que não funcionam mais, onde o paciente com um rim doente, por exemplo, receberia o parasita que faria o trabalho do rim em troca de um pouco de sangue como alimento. Mas algo sai errado e o que o cientista acaba criando é um parasita que assume o controle do paciente e faz sua libido sexual, sem culpas ou moralismos, crescer assustadoramente; uma combinação entre afrodisíaco e doença venérea que foge do controle quando a namorada adolescente do cientista espalha o parasita para outras pessoas do moderno condomínio onde vivem vários tipos humanos que logo se tornam tarados sexuais em busca de formas de saciar seu apetite sexual.

“Shivers”, o primeiro longa-metragem profissional de David Cronenberg (que antes havia dirigido apenas os curtas “Transfer” (1966), “From the Drain” (1967), os experimentais “Stereo” (1969) e “Crimes of the Future” (1970) e inúmeros curtas para a TV canadense), é a cara do cinema dos anos 70, um cinema que não fazia concessões para agradar o espectador, investia em roteiros originais/adultos (onde sexo e assuntos sérios eram discutidos), apostava em atores desconhecidos/amadores e os finais destes filmes geralmente eram bem pessimistas acerca dos rumos que a humanidade estaria tomando. Claro que tamanha ousadia não passaria desapercebida, depois de lançado “Shivers” foi a maior bilheteria do cinema canadense e foi discutido em seu parlamento que havia colocado em dúvida seu valor social e artístico para a sociedade, já que boa parte do dinheiro da produção havia vindo do Canadian Film Corporation, que era mantido pelo contribuinte através dos impostos.

Filmado em apenas 15 dias, “Shivers” foi um desafio para o jovem Cronenberg que lutou para ser o diretor do filme durante 3 anos (seu roteiro chegou até a ser oferecido ao lendário Roger Corman, mas uma cláusula no contrato que dava ao roteirista o direito de dirigi-lo, manteve Corman fora do projeto). O aval para a realização do filme veio depois que Barbara Steele (que Cronenberg havia conhecido no lançamento de “Caged Heat” (1974) de Jonathan Demme) concordou em tomar parte da empreitada. Os testes de elenco de “Shivers” foram abertos, ou seja, qualquer pessoa que não fosse ator poderia conseguir um papel. Susan Petrie, uma atriz de comédias de baixo orçamento, lutou pelo papel da personagem Janine Tudor, onde teria que chorar em várias cenas, como não conseguia chorar, Cronenberg conta, que antes de cada take a atriz pedia para que ele a esbofeteasse violentamente, criando um verdadeiro clima de sadomasoquismo entre ele e a atriz, para o espanto da equipe-técnica chocada pelo método nada ortodoxo de direção.

David Cronenberg nasceu em Toronto, Canadá, em 1943. Ainda criança começou a escrever histórias e seu interesse por ciências o levou a entrar no programa “Honours Science” da Universidade de Toronto. Inspirado pelo cinema underground de New York, conseguiu realizar seus primeiros curtas. Durante toda década de 1970 seus filmes foram produzidos com ajuda do dinheiro do contribuinte canadense (pelo menos não foi parar no bolso dos políticos de lá). Entre outros, realizou o maravilhoso “Rabid/Enraivecida – Na Fúria do Sexo” (1977), estrelado pela atriz pornô Marilyn Chambers (do clássico imperdível “Behind the Green Door/Atrás da Porta Verde”, de 1972) e que contava a história de uma garota que, após uma cirurgia, sofre uma mutação e começa a se alimentar de sangue; “Fast Company” (1979), um drama sobre o universo automobilistico lançado no Brasil pela distribuidora Zircon Films com o título “A Escuderia do Poder” e “The Brood/Os Filhos do Medo” (1979, em VHS no Brasil pela Top Tape), onde um psiquiatra aplica um método experimental de exteriorização de traumas e uma de suas pacientes gera uma “ninhada” de crianças que agirão comandadas por sua sede de vingança, um drama sangrento que Cronenberg escreveu após sua separação.

Os anos de 1980 começam com o sucesso internacional de “Scanners/Sua Mente pode Destruir” (1981, Van Blad Vídeo), um filme revolucionário onde somos apresentados aos Scanners, pessoas com poderes mentais, que são usados pela indústria farmaceútica (e que tem a famosa cena de uma cabeça explodindo sem cortes antes da computação gráfica estragar o cinema), filmaço que abriu as portas dos grandes estúdios americanos para o peculiar estilo de filmar horror adulto/inteligente de Cronenberg; Para a Universal Studios faz “Videodrome” (1983, Universal Home Vídeo), que mostrava como controlar os espectadores através da TV, com ótimos efeitos de maquiagens de Rick Baker; “The Dead Zone/A Hora da Zona Morta” (1983, Europa Multimedia) é a adaptação de um livro de Stephen King (que estava em moda nos anos de 1980) onde um paciente acorda do coma com a capacidade de ver o futuro das pessoas que toca; “The Fly/A Mosca” (1986, Fox Home Vídeo) é uma releitura moderna extremamente gore do clássico “The Fly/A Mosca da Cabeça Branca” (1958, Fox Home Vídeo) que havia sido estrelado pelo cult e genial Vincent Price. “The Fly” teve um grande orçamento (foi produzido pelo comediante Mel Brooks) mas não foi sucesso de público nos cinemas, diz a lenda que os espectadores ficavam ruins do estômago ao tentar assistí-lo. Cronenberg fechou a década de 1980 com “Dead Ringers/Gêmeos – Mórbida Semelhança” (1988, em VHS pela F.J. Lucas Vídeo), um drama sexual sobre ginecologistas gêmeos e sua relação com uma paciente feiosa. Acho muito discreto este filme, o assunto poderia ter rendido bem mais.

A década de 1990 parecia promissora quando Cronenberg lançou “Naked Lunch/Mistérios e Paixões” (1991, Spectra Nova), drama lisérgico inspirado no livro homônimo de William S. Burroughs sobre um escritor viciado em drogas que não sabe mais distinguir realidade e delírio. Em seguida o cineasta realiza o pomposo (perdão) “M. Butterfly” (1993), que na época de seu lançamento achei divertido, mas preciso revê-lo para ter uma nova opinião sobre o filme, e o genial “Crash/Estranhos Prazeres” (1996, em VHS pela Columbia Pictures), onde Cronenberg ajeita o chatíssimo livro de J.G. Ballard e nos apresenta seu último grande filme, uma história sexy sobre pessoas que após sofrerem acidentes de carro começam a procurar por sexo bizarro envolvendo carros. Nos últimos anos não realizou nenhum novo clássico, “ExistenZ” (1999) é fraquinho; “Spider” (2002, Movie Star) mornô e os filmes policiais que realizou (“A History of Violence/Marcas da Violência, 2005; “Eastern Promises/Senhores do Crime”, 2007 e “A Dangerous Method/Um Método Perigoso”, 2011) são burocráticos. Dá pena ver um cineasta tão bom desperdiçando seu talento por conta da mediocridade da indústria cinematográfica e seu público idiotizado atual.

Na produção de “Shivers” Cronenberg recebeu uma grande ajuda de Ivan Reitman que em 1972 já havia dirigido o ótimo “Cannibal Girls”. Se alternando nas funções de direção e produção, Reitman fez “Meatballs” (1979) e conseguiu chamar atenção dos grandes estúdios e na seqüência conseguiu emplacar o blockbuster “Ghost Busters/Os Caça-Fantasmas” (1984, Columbia Pictures), campeão das bilheterias dos anos 80. Depois dirigiu megas-porcarias estreladas por Arnold Schwarzenegger como “Twins/Irmãos Gêmeos” (1988), “Kindergarten Cop/Um Tira no Jardim de Infância” (1990) e “Junior” (1994). Verdadeira decadência para o cara responsável pela produção de filmaços como “Death Weekend/Fim de Semana Mortal” (1976) de William Fruet, “Rabid” (1977) de Cronenberg, “Ilsa – The Tigress of Siberia” (1977) de Jean LaFleur, “Animal House/O Clube dos Cafajestes” (1978) de John Landis e “Heavy Metal/Universo em Fantasia” (1981) de Gerard Potterton.

Um dos grandes destaques de “Shivers” são as maquiagens gore, simples mas de grande eficácia. Joe Blasco trabalhava com maquiagens para a TV quando realizou as trucagens gores para “Garden of the Dead” (1974) de John Hayes, distribuido nos USA pela Troma e do clássico “Ilsa: She Wolf of the SS” (1975) de Don Edmonds. Isso lhe valeu o convite para trabalhar em “Shivers” e “Rabid”. Quem aprecia bons trash-movies sem orçamento não devem perder o trabalho de maquiagem de Blasco nos filmes “Track of the Moon” (1976) de Richard Ashe, onde Blasco também “interpreta” a criatura, “Ilsa – The Harem Keeper of the Oil Sheiks” (1976) de Don Edmonds, “The Clonus Horror” (1979) de Robert S. Fiveson e “Whispers” (1990) de Douglas Jackson.

“Shivers” é um filme corajoso, fala sobre o corpo humano e nossos desejos sexuais que são sempre reprimidos pela moralidade social e religiosa de nossa sociedade. Aqui os infectados pelo parasita viram uma espécie de zumbis tarados e dão vazão aos seus instintos. Cronenberg aproveita para discutir assuntos tabus como pedofilia, incesto, homosexualismo, bestilismo, machismo e até o desejo sexual dos velhos. E tudo isso discutido embalado com uma roupagem de cinema gore sexploitation de alta qualidade e diversão. Cronenberg faz falta!

Aqui no Brasil o filme se chama “Calafrios” e já foi lançado em VHS pela F.J. Lucas Vídeo e em DVD pelos picaretas sem classe da Continental. Este filme ainda aguarda, como tantos outros clássicos do cinema gore, um lançamento decente (de preferência em Blu-Ray) em nosso país, cheio de material extra e o filme com qualidade de imagem impecável. Distribuidoras, façam seu trabalho bem feito, por favor!


Barbara Steele – Tão grande que não cabe em rótulos!

Barbara Steele enfeitiça. Lembro-me bem da primeira vez em que a vi num filme, justamente o “Shivers” e, apesar do papel pequeno e sem tanto destaque como em seus mais conhecidos filmes, ela simplesmente me enfeitiçou pela forte presença, pela beleza estranha, a estrutura óssea facial grande e forte (como desenho mulheres acabo sempre observando isso em todas, e o rosto da Steele parece ter sido esculpido com proporções todas erradas, mas que mesmo assim acabou dando todo certo no final), o sorriso largo e os olhos profundos e malignos. Pensei: “Como ela é gigante! Que rosto monstruoso e perfeito! Essa mulher é uma obra de arte!”. A partir daí eu precisa saber mais e ver mais sobre ela. Virei Fã.
Hoje, com setenta e cinco anos, a mais poderosa atriz dos filmes de horror que de tão grande não cabe em rótulos,  se assusta com o assédio dos fãs que até hoje a abordam empolgados por causa dos seus filmes antigos com uma emoção tamanha como se os filmes tivessem sido feitos ontem.
Conhecida como musa do cinema de horror gótico, Steele ganhou destaque na década de sessenta e alcançou seu status por conta da sequência de filmes de horror,  italianos principalmente,  onde atuou.
Steele nasceu na Inglaterra em 19 de dezembro e  não tinha intenção de ser atriz, queria mesmo era ser pintora, “queria ser Picasso” dizia, e estudou para isso, foi para Paris, mas precisava de grana e foi por esse motivo que em 1957  ela entrou numa companhia de teatro onde ganhava cinco libras por semana.
Sua estréia como atriz foi na comédia britânica “Bachelor of Hearts“, em 1958, e não tinha muito mais que um pequeno diálogo. Foi em 1960 que, após ver sua foto numa revista, Mario Bava a recrutou para o  que seria seu papel de maior destaque em “La maschera del demonio/Black Sunday/A Máscara de Satã” (que saiu aqui no Brasil em DVD pela London Films) onde faz um papel duplo, passeando brilhantemente entre a bruxa malvada e a princesa inocente. Este filme também marca a estréia oficial de Mario Bava como diretor. A partir daí, Barbara ganha grande notoriedade e em 1961 é levada para a américa onde estrela “The Pit and the Pendulum/A Mansão do Terror” (lançado aqui no brasil em DVD pela CultClassic) de Roger Corman, contracenando com o sempre genial Vincent Price. Ali, mais uma vez, ela nos encanta ao desempenhar muito bem seu papel de mocinha inocente e mulher cruel e assustadora ao mesmo tempo.
Durante a época em que ficou na américa, Steele relata que tentaram transformá-la em mais uma boneca de plástico fabricada por Hollywood “Eles tinham uma idéia preconcebida de que as mulheres eram todas lábios brilhantes. Eles diziam: ‘É melhor fixar suas orelhas para trás. É melhor deixá-la loira. Você não tem qualquer decote’. Depois vieram as recomendações: ‘não seja vista com fulano, porque… Não ande por aí de salto alto’ – eles achavam que eu era muito alta e todos se sentiam terrivelmente baixos lá. Era uma piada. Todos esses clichês fantásticos que você lê em “Day of the Locust” (livro de 1939, do autor americano Nathanael West sobre a decadência e alienação de Holywood nos anos 30). Só que era muito mais clichê do que você poderia imaginar.“, desabafou certa vez numa entrevista. Barbara se manda para a Itália e em 1962 ganha o papel para o filme “Fellini Otto & Mezzo” (de mesmo título aqui no Brasil e que foi lançado em DVD pela Versátil Home Video). Em seguida, ainda em 1962, faz o “L’orribile segreto del Dr. Hichcock“, o horror italiano dirigido por Riccardo Freda. Depois disso, outros papéis para filmes de terror surgem em seu caminho e consolidam cada vez mais seu título de rainha do horror. Entre estes títulos encontramos “Lo Spettro“, de 1963, dirigido por Riccardo Freda; “Danza Macabra” de 1964, dirigido por Sergio Corbucci e Antonio Margheriti; “I lunghi capelli della morte”, 1964, também dirigido por Antonio Margheriti, entre outros. Em 1966 faz um pequeno papel na comédia clássica “L’armata Brancaleone/O Incrível Exército Brancaleone” de Mario Monicelli (lançado no Brasil em DVD pela Spectra Nova) e em 1968 faz o clássico do horror britânico “Curse Of The Crimson Altar” de Vernon Sewell, filme que reúne também os outros dois grandes nomes do horror Boris Karloff e Christopher Lee. Apesar de todos os títulos e de seguidores fiéis do gênero do horror que mantém até hoje, Barbara Steele parecia não gostar tanto do culto ao título que recebeu, talvez pela limitação que isso causava a sua carreira. Declarou certa vez estar aposentada do gênero e que jamais voltaria a sair de um caixão de novo. A promessa não é seguida. Visando novos rumos para a carreira, volta à américa onde conhece o roteirista James Poe com quem se casa e tem um filho. Os dois ficam casados por muito tempo. Em 1969, Poe escreve um papel para Barbara na adaptação para a tela do romance “The Shoot Horses, Don’t They?”, mas quando Sydney Pollack, o diretor do filme, escolheu outra atriz para o papel, Barbara decidiu fazer uma pausa e ficou sem atuar por uns cinco anos. Volta ao cinema só em 1974 com o exploitation “Caged Heat” de Jonathan Demme.  Em 1975  aparece lindísisma no clássico cult “Shivers“, papel com pouco destaque, porém notável, e em 1977 no “I Never Promised You a Rosen Garden” de Anthony Page. Já com a carreira capengando ela aparece em mais alguns títulos, uns tornaram-se memóraveis, outros nem tanto.  Em 1978 ela e Poe divorciam-se e ela não volta a se casar novamente. Em 1980  tenta ainda o horror “The Silent Scream” de Danny Harris, se aposenta das telonas em seguida e se dedica, com sucesso, ao trabalho de produtora de mini-séries para TV. Chegou, inclusive,  a ganhar um Emmy pela produção na série “War and Remembrance“. Barbara Steele retornou às telonas agora em 2012 estrelando o horror “The Butterfly Room” de Jonathan Zarantonello. Não sei se esse filme será lançado aqui no Brasil, não achei informações que indicasse algo sobre isso, então ficarei devendo essa informação.

Mesmo setentona Steele continua linda e com aquele olhar impressionante que nos convida sem que a gente saiba se é pro bem ou pro mal, ela nem sempre foi bem aproveitada, mas é tão gigante em talento e força que impressiona mesmo quando seu papel é minúsculo.  Vida longa à  grande e fascinante musa!

Steele – “The Butterfly Room”

The Buterfly Room

Algumas imagens de uma exposição com suas pinturas que aconteceu em Roma no dia 9 de novembro de 1962

Trailers de alguns filmes com a musa:

Resenha de petter baiestorf
Box sobre barbara Steele de Leyla Buk