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O Shot-on-Video e o Cinema Independente Brasileiro

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Sempre existiu na história do cinema mundial a figura do cineasta miserável que dava um jeito de inventar seus recursos, independente da quantia de dinheiro disponível. A própria história da mais cara arte do planeta está cheia de exemplos. Ainda nos anos de 1920 pequenos produtores exploravam temas tabus para competir com o cinema feito pelos grandes estúdios. Nesta época era corriqueiro que milionários encomendassem pequenos filmes domésticos à cineastas despudorados que sabiam como ninguém a arte de filmar rápido/barato os assuntos mais polêmicos que não encontravam espaço nos cinemas normais. Na década de 1920 já existia cinema pornô, por exemplo. Un Chien Andalou (Um Cão Andaluz, 1929, Luis Buñuel), outro exemplo, só existe porque independentes o realizaram.

No pós-guerra, na década de 1950, houve uma explosão de produtores independentes, que encontraram uma forma de ganhar dinheiro com filmes de monstros e/ou alienígenas feitos sem grandes recursos e que encontravam público. Tanto público que os grandes estúdios se apropriaram do gênero e faturaram muito dinheiro. Considero-os a principal influência do cinema Shot On Video, o SOV, que surgiu no início dos anos de 1980, principalmente nos USA. E essa influência transou com as influências do cinema underground e deixou tudo mais divertido ainda, porque a grande sacada do SOV foi a de misturar todo tipo de influências e recriar tudo à sua maneira.

Talvez Ray Dennis Steckler seja um dos grandes precursores do cinema caseiro mundial, com filmes como Lemon Groove Kids Meet the Monsters (1965) e Rat Pfink A Boo Boo (1966) que, embora produzidos em 35 mm, tinham todos os elementos de fundo de quintal que os SOVs dos anos de 1980 popularizaram. Mesmo um cineasta autoral, e agora respeitado por sua obra, como John Waters, começou fazendo produções caseiras com ajuda de amigos e familiares, caso de Mondo Trasho (1969) ou Multiple Maniacs (1970), inspirados nos filmes caseiros que artistas como George Kuchar e Jack Smith vinham fazendo no underground americano.

Rat Pfink a Boo Boo

Com distribuidores como Harry H. Novak garantindo espaço para escoar a produção independente, o mercado viu uma verdadeira epidemia de produções baratas surgirem, onde muitas vezes o dinheiro gasto era somente na película virgem e revelação do filme. Doris Wishman, H.G. Lewis, Ted V. Mikels, Al Adamson, entre outros, são exemplos.

Com o declínio dos Drive-In Theaters e grindhouses na década de 1970, e o surgimento de formatos domésticos como Super-8, Beta Tapes, Laser Disc e, talvez, o mais importante deles, a Fita VHS – que permitia uma arte chamativa em suas enormes caixas protetoras – o cinema SOV da década de 1980 começava, timidamente, a perceber suas possibilidades concretas.

Shot-on-Video!!!

Não demorou muito para que a jovem geração, ociosa e bêbada, descobrisse que era possível realizar filmes com câmeras VHS. Inicialmente o formato não havia sido recebido com muito entusiasmo. Sua qualidade de som e imagem deixava muito a desejar e era, geralmente, usada para o registro de aniversários, casamentos, viagens e outras festividades familiares. Mas estes artistas amadores improvisados começaram a provar o valor do VHS, agora pessoas comuns estavam conseguindo produzir seus filmes com a paixão e devoção que somente os fãs possuem. Hollywood não realiza o filme dos seus sonhos? Não tem problema, faça-o você mesmo em VHS, com ajuda de seus amigos tão sem noção quanto você! Teus amigos não te ajudam? Possivelmente você está andando com as pessoas erradas!!!

Nos anos de 1980, nos USA, houve uma explosão de produções Shot on Video, mas um dos únicos destes filmes a conseguir lançamento em um Drive-In de Long Island, NY, foi o longa-metragem Boardinghouse (1983, John Wintergate), seguido de Sledgehammer (1983, David A. Prior) e Black Devil Doll from Hell (1984, Chester Novell Turner). Os três filmes eram produções bem limitadas, mas nada pior do que um freqüentador habitual de Drive-In já não tivesse visto antes, só que produzido em 35 mm.

Com as videolocadoras popularizadas nos anos de 1980, quando qualquer cidadezinha minúscula perdida no meio do nada era bem servida dos clássicos e vagabundagens do cinema, os produtores atentaram para o fato de que não era mais necessário um circuito exibidor formado de cinemas. O filme que provou ser possível chegar à um público gigante através das locadoras foi o SOV Blood Cult (1985, Christopher Lewis), que foi um estrondoso sucesso na locação de vídeo e abriu espaço para outras produções no estilo, como Blood Lake (1987, Tim Boggs) e Cannibal Campout (1988, Jon McBride e Tom Fisher). O sucesso de vendas e locações de Blood Cult se deve ao fato de que criaram uma distribuidora exclusivamente para oferecê-lo às locadoras, com material de divulgação e muita lábia – conseguiram vender como se fosse uma produção profissional. Só que o público não só assistiu, como gostou, se influenciou e também quis se divertir fazendo seus próprios filmes.

Em seguida, o agora clássico, Video Violence (1987, Gary Cohen) foi comprado pela distribuidora Camp Video. Com base em Los Angeles, a Camp Video fez uma ampla divulgação da produção de fundo de quintal – que permanece sendo o filme SOB da década de 1980 com maior venda – e conseguiu colocá-lo em locadoras dos USA inteiro. Video Violence chegou a ser indicado para o prêmio de melhor filme independente no American Film Institute daquele ano. Em tempo: Video Violence é um filme que reflete sobre o assunto “violência é boa, mas o sexo não é”, algo que constatei pessoalmente com 30 anos de produções independentes pela Canibal Filmes, onde nunca fui censurado pelas cenas de violência, mas sim, apenas e unicamente, por cenas de sexo.

A distribuidora Camp Video também foi a responsável por colocar o filme Cannibal Hookers (1987, Donald Farmer) no mapa. E seu faturamento com estes filmes foi o responsável direto pelo interesse da Troma Entertainment  por SOVs, que comprou o filme Redneck Zombies (1989, Pericles Lewnes) e constatou que era muito lucrativo lançar aqueles filminhos amadores, não abandonando-os nunca mais. Aliás, muita gente confunde os filmes distribuídos pela Troma com sua produção própria. Os filmes da Troma não são SOVs, mas inúmeros filmes distribuídos por eles são. Alguns exemplos: O inacreditavelmente ruim Space Zombie Bingo! (1993, George Ormrod); Bugged (1997, Ronald K. Armstrong); Decampitated (1998, Matt Cunningham); Parts of the Family (2003, Léon Paul de Bruyn); Pot Zombies (2005, Justin Powers); Crazy Animal (2007, John Birmingham) e Blood Oath (2007, David Buchert). Outra distribuidora que costuma lançar SOVs é a Severin Films. Fundada em 2006 por David Gregory, já disponibilizou em DVD ou Blu-Ray vagabundagens como Blackenstein (1973, William A. Levey), filmado em 35 mm, mas tão amador quanto qualquer SOV feito em VHS, e clássicos como a trinca Sledgehammer (1983), Things (1989, Andrew Jordan) e The Burning Moon (1992, Olaf Ittenbach).

Sim, as produções SOV são essencialmente de fundo de quintal, feitas por entusiastas se autointitulando cineastas, que conseguem meter seus amigos e familiares no sonho de fazer cinema. Geralmente são produções amadoras desleixadas, desfocadas, com efeitos especiais improvisados, atores canastrões, figurinos inexistentes e roteiros absurdos. Mas é essa combinação que faz com que os filmes funcionem e tenham legiões de fãs ao redor do mundo. Outra particularidade do cinema SOV: São produções locais que ultrapassam fronteiras, ou seja, um filme vagabundo produzido entre amigos num sítio em Palmitos, SC, Brasil, é perfeitamente capaz de dialogar com um entusiasta do SOV que morou a vida inteira num pequeno apartamento em Tokyo, por exemplo.

O blog Camera Viscera, na matéria “Video Violence – 13 Days of Shot on Video!”, faz outra importante observação à respeito dos SOVs: “Eles conseguiram congelar o tempo. O que quero dizer é que os sets que você vê nestes filmes não são cenários construídos, são videolocadoras e mercearias reais. As roupas que você vê não são fantasias, são roupas reais que os atores tinham em seus roupeiros. As ruas, os carros, os locais, são todos reais e intocados, e você consegue vê-los como estavam em seu estado natural em 1987. Essas jóias do “no-budget” dos anos de 1980 capturaram a essência do tempo e isso é um bem inestimável. Eles são como se suas famílias tivessem filmes caseiros dos anos 1980, exceto com mais assassinatos (ou menos, dependendo do tipo de família que você veio).”

Não existe uma produção SOV inaugural. A produção mundial é enorme. A produção em um país como a Nigéria, conhecida como Nollywood e que é considerada a terceira maior indústria cinematográfica em volume de produção – atrás apenas de Hollywood e Bollywood -, é formada quase que exclusivamente de produções SOVs. Então é praticamente impossível catalogar a totalidade dessa produção, ainda mais se levarmos em consideração que muitos títulos lançados nem saem do círculo de amizades dos produtores – países da Europa, Ásia e América Latina também tem uma produção enorme. Tentar catalogar apenas os SOVs produzidos no Japão já seria tarefa impossível, por exemplo.

Nos USA alguns diretores que se destacaram são Todd Sheets – com quem geralmente sou comparado nas reviews da imprensa especializada, e, acreditem, isso não é um elogio! -, Donald Farmer, Tim Ritter, Kevin J. Lindenmuth, Hugh Gallagher e J. R. Bookwalter. Este último, inclusive, teve seu filme em super-8 The Dead Next Door (1989) apadrinhado pelo trio de amigos Sam Raimi, Bruce Campbell e Scott Spiegel.

Na Europa alguns produtores de SOVs que tiveram destaque foram o francês Norbert Georges Mount, com Mad Mutilator (Ogrof, 1983), que tem Howard Vernon no elenco; Trepanator (1992) e o impagável Dinosaur from the Deep (1993), com Jean Rollin no elenco. E os alemães Olaf Ittenbach, que causou sensação com seu The Burning Moon (1992), mas nunca chegou a fazer sucesso como um Peter Jackson, por exemplo; Andreas Schnaas, responsável por uma série de filmes gore exagerados que são fantásticos e inventivos: Violent Shit (1989), Zombie’90: Extreme Pestilence (1991), Goblet of Gore (1996) e Anthropophagous 2000 (1999); e Andreas Bethmannn, criador de Der Todesengel (1998), Dämonenbrut (2000) e Rossa Venezia (2003), este com Jesus Franco e Lina Romay no elenco.

Uma das grandes armadilhas na produção SOV é que dificilmente os diretores/produtores conseguem romper as fronteiras do cinema independente, mas não é impossível. Evil Dead (1981), de Sam Raimi, era essencialmente uma produção SOV, mas foi realizada com tanta garra e empenho que conseguiu colocá-los na mira dos grandes estúdios. Peter Jackson quando realizou seu Bad Taste (1987) estava fazendo um autêntico SOV com amigos – embora filmado em película – e acabou que a produção lhe deu o suporte necessário para se destacar na comissão de cinema da Nova Zelândia e o resto é história. Santiago Segura, hoje um dos mais respeitados cineastas da Espanha por conta de sua série de sucesso Torrente, iniciou-se na produção com curtas feitos em vídeo. Relatos de la Medianoche (1989) e Evilio (1992) são feitos em vídeo. Perturbado (1993), curta bem acabado que realizou de maneira mais profissional, fez com que conseguisse o dinheiro para a produção do primeiro Torrente (1998), que na época de seu lançamento, na Espanha, bateu a bilheteria do Titanic (1997, James Cameron) naquele país.

Bruce Campbell & Sam Raimi em Evil Dead

Pessoas que participaram de produções cinematográficas que se tornaram filmes de culto conseguiram manter suas carreiras atrávez de produções SOV. Talvez o exemplo mais famoso seja o de John A. Russo, conhecido roteirista de The Night of the Living Dead (A Noite dos Mortos Vivos, 1968, George A. Romero), que foi diretor de produções em vídeo como Scream Queens Swimsuit Sensations (1992) ou Saloonatics (2002). Aliás, o clássico de George A. Romero legou ainda outro diretor de SOVs: Bill Hinzman (ator que interpretou o primeiro zumbi que aparece no clássico) que realizou The Majorettes (1987) e FleshEaters (1988), este último uma tranqueira imitação de The Night of the Living Dead, onde Bill repete seu papel de zumbi magrelo sedento por carne humana.

Não só isso. Antigos diretores de cinema dos anos de 1960/1970 só conseguiram manter/retormar suas carreiras após os anos 2000, quando ficaram possibilitados de voltar a produzir seus filmes em vídeo, muitos deles autênticos SOVs. Jesus Franco realizou um punhado de SOVs divertidíssimos, como Vampire Blues (1999), Snakewoman (2005) e o hilário Revenge of the Alligator Ladies (2013), finalizado por seu fiel assistente Antonio Mayans. H.G. Lewis voltou a filmar 30 anos depois de seu último filme de cinema, que havia sido The Gore Gore Girls (1972), com o quase amador Blood Feast 2: All U Can Eat (2002). Ted V. Mikels, diretor dos clássicos The Astro-Zombies (1968) e The Corpse Grinders (1971), passou por algo parecido. Impossibilitado de bancar seus filmes em película, produziu em vídeo mesmo, com ajuda de conhecidos e fãs, The Corpse Grinders 2 (2000) e Mark of the Astro-Zombies (2004), re-encontrando seu espaço na produção SOV do novo milênio, que está cada vez mais parindo filmes extremamente bem produzidos com quase nada de dinheiro.

O verdadeiro cinema independente é o SOV. Nos USA o orçamento médio de um filme chamado de independente é de 30 milhões de dólares, valor absurdamente grande quando comparado aos SOVs produzidos com uma média de 10 mil dólares.

No Brasil o orçamento médio de produções bancadas por editais é entre um e dois milhões de reais, enquanto muitos SOVs de longa-metragem foram feitos com orçamento médio de cinco mil reais, geralmente dinheiro bancado pelo bolso do próprio diretor/produtor. Sempre fiquei na dúvida se ficava orgulhoso ou ofendido, quando meus filmes de cinco mil reais eram comparados com produções de mais de 500 mil reais no orçamento. Acho bastante injusto uma produção minha ser colocada no mesmo patamar de cobranças que um filme de 500 mil reais, mas se fazem a comparação é porque meu filme está dizendo algo, não?

Equipe da Canibal Filmes filmando Criaturas Hediondas (1993)

Aqui ainda houve o agravante de que as produções SOVs surgiram exatamente junto com a moda Trash, que assolou a década de 1990. O SOV brasileiro ganhou força com a cara de pau de minha produtora, Canibal Filmes, que, por ser realizada com orçamentos tão irrisórios, também encaixavam na descrição do Trash. Aí a imprensa oficial, que geralmente é preguiçosa e não vai atrás de informações para apurar os fatos, tratou de difundir essa confusão e o SOV ficou desconhecido aqui, sendo tratado como filmes Trash. Quando estava acabando a moda Trash estes filmes passaram a ser objetos de estudo de um grupo de acadêmicos que passaram a chamá-los de Cinema de Bordas, e perdeu-se a oportunidade de categorizar o SOV Brasileiro na história do cinema amador mundial.

O Monstro Legume do Espaço, filme que produzi em 1995, foi o primeiro título SOV brasileiro a ter uma distribuição em nível nacional, provando que era possível fazer cinema amador e ter público com sua produção feita na vontade e amizade. E, após isso, o cinema Shot on Video nacional finalmente deslanchou.

Guia de SOVs Essenciais

SOVs Essenciais (para entender este peculiar estilo de se fazer cinema):

Elaborei uma lista de Shot on Videos bem básica, que servirá para introduzi-lo na arte do cinema amador (optei por destacar nessa lista básica a produção americana e brasileira). São filmes fáceis de achar na internet, então possíveis de serem assistidos.

Within the Wood (1978) de Sam Raimi. Curta SOV, produzido em super 8, que deu origem ao clássico Evil Dead (1981).

The Long Island Cannibal Massacre (1980) de Nathan Schiff. A história é uma bagunça, mas as cenas de mutilação com serras elétricas são lindas. Super 8.

Boardinghouse (1983) de John Wintergate. Pensão é reaberta após uma carnificina ter acontecido lá. Vídeo.

Sledgehammer (1983) de David A. Prior. Um jovem assassina sua mãe e amante com um martelo. Vários anos depois os assassinatos do martelo reiniciam na mesma área. David também foi diretor do terrível filme profissional amador The Lost Platoon (Pelotão Vampiro, 1990). Vídeo.

Black Devil Doll from Hell (1984) de Chester Novell Turner. Uma mulher compra uma boneca possuída e passa a ter inúmeros problemas hilários. Vídeo.

Blood Cult (1985) de Christopher Lewis. Universitárias são assassinadas e partes de seus corpos são usados em estranhos rituais. Vídeo.

The New York Centerfold Massacre (1985) de Louis Ferriol. Aspirantes à modelo são molestadas e assassinadas misteriosamente. Vídeo.

Black River Monster (1986) de John Duncan. Filme de monstro feito para a família, com um adorável Sasquatch (Pé Grande) feito de uma ridícula fantasia felpuda. Duncan dirigiu ainda o psicótico The Hackers (1988). Vídeo.

Dead Things (1986) de Todd Sheets. Caipiras matam quem se aventura pelo seu bosque. Vídeo.

Gore-Met, Zombie Chef from Hell (1986) de Don Swan. Dono de restaurante mata pessoas para servir aos clientes. Super 8.

Truth or Dare?: A Critical Madness (1986) de Tim Ritter. Após encontrar a esposa na cama com outro homem, o corno passa a matar pessoas participando de dementes jogos da “verdade ou desafio”. Vídeo.

Cannibal Hookers (1987) de Donald Farmer. Como parte de um trote de iniciação para uma irmandade, duas garotas precisam fingir serem prostitutas. Acabam se tornando zumbis que matam as pessoas da vizinhança. Vídeo.

Demon Queen (1987) de Donald Farmer. Uma vampira e suas agitadas tentativas de conseguir sangue. Vídeo.

Tales from the Quadead Zone (1987) de Chester Novell Turner. Fantasmas atormentam um casal. Vídeo.

Video Violence (1987) de Gary Cohen. Casal abre uma videolocadora e percebe que os clientes só levam filmes de horror extremamente violentos, então começam a produzir seus próprios snuff movies. Vídeo.

555 (1988) de Wally Koz. Adolescentes são mortos – das mais variadas e divertidas maneiras – por um psicopata de visual hippie. Foi produzido na época com a pretensão de ser um SOV melhor do que todos os outros que estavam sendo feitos. Vídeo.

Cannibal Campout (1988) de Jon McBride e Tom Fisher. Grupo de jovens em passeio pelo bosque se envolve com trio de psicopatas. Vídeo.

The Dead Next Door (A Morte, 1989) de J. R. Bookwalter. Uma equipe anti-zumbis é formada pelo governo. Bastante cenas gore e produção bem feita. Super 8.

Oversexed Rugsuckers from Mars (1989) de Michael Paul Girard. Aliens tarados estupram mulheres usando aspirador de pó. Muitas drogas e depravações nesta produção que está no limite entre um SOV e um filme profissional. 35mm.

Robot Ninja (1989) de J. R. Bookwalter. Desenhista de HQs se torna um super herói para combater uma gangue de estupradores. Vídeo.

Things (1989) de Andrew Jordan. Marido impotente deseja tanto o nascimento de um filho que precisa lidar com uma ninhada de criaturas que se materializam em sua casa. Vídeo.

Zombie Rampage (1989) de Todd Sheets. Um jovem que está indo encontrar seus amigos acaba cruzando com zumbis, serial killers e gangues homicidas neste clássico do SOV sangrento. Vídeo.

Fertilize the Blaspheming Bombshell! (1990) de Jeff Hathcock. Durante uma viagem, mulher é atormentada por adoradores do diabo. Vídeo.

Gorgasm (1990) de Hugh Gallagher. Garota mata os homens com quem transa. Hugh também foi editor da revista Draculina, dedicada ao cinema SOV americano. Vídeo.

Alien Beasts (1991) de Carl J. Sukenick. Alien caça humanos em assassinatos ultra gores feitos sem dinheiro, nem técnicas. É muito ruim, mas é impossível não vê-lo inteiro. Vídeo.

Nudist Colony of the Dead (1991) de Mark Pirro. Musical envolvendo zumbis numa colônia nudista. Super 8.

A Rede Maldita (1991) de Simião Martiniano. As peripécias de um grupo tentando enterrar uma pessoa. Vídeo.

Science Crazed (1991) de Ron Switzer. Cientista injeta droga experimental em uma mulher que morre ao dar a luz a um monstro já adulto. Vídeo.

O Vagabundo Faixa-Preta (1992) de Simião Martiniano. Kung Fu no sertão de Alagoas. Vídeo.

Criaturas Hediondas (1993) de Petter Baiestorf. Cientista marciano vem à Terra fazer os preparativos para a invasão re-animando alguns cadáveres terráqueos. Vídeo.

Goblin (1993) de Todd Sheets. As diabruras gores de um Goblin que chega até a perfurar os globos oculares das pobres vítimas. Vídeo.

Gorotica (1993) de Hugh Gallagher. Um ladrão morre após engolir uma jóia que havia roubado, então seu parceiro conhece uma necrófila. Vídeo.

Zombie Bloodbath (1993) de Todd Sheets. Um colapso numa usina nuclear transforma as pessoas em zumbis. Vídeo.

Acerto Final (1994) de Antonio Marcos Ferreira. Estrelado por Talício Sirino interpretando um herói em sua cruzada contra as drogas. Vídeo.

Gore Whore (1994) de Hugh Gallagher. Assistente de laboratório rouba uma fórmula que cai em mãos erradas. Vídeo.

Shatter Dead (1994) de Scooter McCrea. Drama muito bem encenado e filmado envolvendo uma mulher que quer chegar à casa de seu namorado num mundo pós-holocausto zumbi. Causou sensação quando foi lançado, mas a carreira de McCrea não decolou. Fez ainda Sixteen Tongues (1999) e foi ator em vários filmes de Kevin j. Lindenmuth. Vídeo.

Vampires and other Stereotypes (1994) de Kevin J. Lindenmuth. Dois “homens de preto” (que não estão usando preto) são encarregados de livrar o planeta dos seres sobrenaturais. Vídeo.

Addicted to Murder (1995) de Kevin J. Lindenmuth. Garoto que mantém amizade com uma vampira está disposto a alimentá-la. Vídeo.

Chuva de Lingüiça (1995) de Acir Kochmanski e Andoza Ferreira. Comédia rural ao estilo de Mazzaropi. Essa produção nacional é hilária e as piadas realmente funcionam. Um dos grandes clássicos do SOV brasileiro. Vídeo.

Creep (1995) de Tim Ritter. Psicopata escapa da prisão e vai pedir ajuda para sua irmã stripper. Vídeo.

Fronteiras sem Destino (1995) de Antonio Marcos Ferreira. Filme de ação eletrizante com Talício Sirino. Vídeo.

O Monstro Legume do Espaço (1995) de Petter Baiestorf. Alienígena constituído de tecido vegetal escapa de sua prisão e aniquila os humanos que cruzam seu caminho. Teve uma continuação em 2006, bastante inferior ao original. Vídeo.

Red Lips (1995) de Donal Farmer. Garota que doa sangue para conseguir dinheiro vira cobaia de um médico. Michelle Bauer e Ghetty Chasun estão no elenco. Vídeo.

Space Freaks from Planet Mutoid (1995) de Dionysius Zervos. Alienígenas convivem com terráqueos. Vídeo.

Blerghhh!!! (1996) de Petter Baiestorf. Grupo de terroristas não consegue se livrar de um zumbi. SOV com efeitos mecânicos e muito gore. Vídeo.

Feeders (1996) de Jon McBride, John Polonia e Mark Polonia. Aliens vem ao planeta Terra para um banquete de vísceras, atacando jovens do interior dos USA. Ótimos efeitos especiais, atores canastrões e aliens – feitos ao estilo de fantoches – que funcionam. Teve uma continuação em 1998. Vídeo.

Colony Mutation (1996) de Tom Berna. Casal vai para uma colônia de mutantes. Vídeo.

Eles Comem Sua Carne (They Eat Your Flesh, 1996) de Petter Baiestorf. Comunidade de canibais se alimenta de fiscais da prefeitura que teimam em ir cobrar o IPTU. Por anos foi o filme mais sangrento já produzido no Brasil. Vídeo.

The Bloody Ape (1997) de Keith J. Crocker. Baseado no conto “Assassinatos da Rua Morgue”, de Edgar Allan Poe. Super 8.

Fatman & Robada (1997) de Rogério Baldino. Pastiche sátira com Batman & Robin. No ano de seu lançamento foi o SOV brasileiro de melhor produção. Cult-movie. Vídeo.

The Necro Files (1997) de Matt Jaissle. Estuprador canibal volta do túmulo como um zumbi alucinado. Vídeo.

Shuín – O Grande Dragão Rosa (1997) de Cristiano Zambiasi. Gordinho lutador de kung fu entra num campeonato de artes marciais para descobrir quem está contrabandeando sorvete seco. Vídeo.

Gore Gore Gays (1998) de Petter Baiestorf. Casal de gays tenta deixar de ser gays e realiza brutais atos de violência e depravações sexuais. Vídeo.

Night of the Clown (1998) de Todd Jason Cook (sob pseudônimo de Vladimir Theobold). Milionário que quer vender sua empresa se torna alvo de um assassino. Vídeo.

Road SM (1998) de José Salles. Estranha relação sadomasoquista entre um grupo de pessoas. Vídeo.

They All Must Die! (1998) de Sean Weathers. Três bandidos torturam uma mulher. A capinha de seu lançamento vem com todos aqueles avisos do estilo “Proibido por 13 anos!”, “Cuidado!”, “Agora sem cortes!”, ou seja, pode assistir que é vagabundagem certa. Vídeo.

Dominium (1999) de Cleiner Micceno. Zumbis mongolóides atacam Sorocaba. Vídeo.

Zombio (1999) de Petter Baiestorf. Sacerdotiza Vudú reanima cadáveres. O primeiro filme de zumbis autenticamente nacional. Filmado em 1998, lançado em 1999. Vídeo.

Blood Red Planet (2000) de Jon McBride, Mark Polonia e John Polonia. Impagável sci-fi com maquetes muito bem elaboradas. A história é sobre um planetóide em direção ao planeta Terra. Vídeo.

Boni Coveiro: O Mensageiro das Trevas (2000) de Boni Coveiro. Ser satânico ataca escoteiros numa floresta. Vídeo.

Edmund Kemper – La Mort de Ma Vie (2001) de Laurent Tissier e Fred Quantin. O psicopata Kemper em sua jornada macabra. Petter Baiestorf faz participação especial em Edmund Kemper Part 4 – La Mort Vengeresse (2018, Laurent Tissier). Vídeo.

Entrei em Pânico ao Saber o que Vocês Fizeram na Sexta-Feira 13 do Verão Passado (2001) de Felipe M. Guerra. Jovens que só estão a fim de festa se deparam com um atrapalhado psicopata. Vídeo.

Raiva (Rage-O-Rama, 2001) de Petter Baiestorf. Trio de ladrões rouba uma coleção das revistas Spektro e acaba numa vila de pessoas raivosas. Com cenas de carro explodindo. Vídeo.

Attack of the Cockface Killer (2002) de Jason Matherne. Serial killer com uma máscara de pinto mata de todas as maneiras possíveis as pessoas que encontra pelo caminho, incluindo com consolos improvisados de armas. Vídeo.

Rubão – O Canibal (2002) de Fernando Rick. As aventuras gore de uma família canibal. Vídeo.

Feto Morto (2003) de Fernando Rick. Por conta de uma relação incestuosa um rapaz tem um feto em sua cabeça. É o primeiro SOV nacional a ser lançado em DVD. Vídeo.

The Low Budget Time Machine (2003) de Kathe Duba-Barnett. Viajantes do tempo vão para o futuro e encontram mutantes. Vídeo.

Quadrantes (2004) de Cesar Souza. Um viajante dimensional experimenta os prazeres de vários quadrantes. Vídeo.

Eyes of the Chameleon (2005) de Ron Atkins. Serial killer ataca em Las Vegas. Vídeo.

The Stink of Flesh (2005) de Scott Phillips. Zumbis fedorentos tentando comer algumas pessoas. Boa produção. Vídeo.

Canibais & Solidão (2006) de Felipe M. Guerra. Jovens tentando perder a virgindade se metem em confusões envolvendo canibalismo. Ou não. A modelo Edna Costa está no elenco. Vídeo.

O Homem sem Lei (2006) de Seu Manoelzinho. Western capixaba remake da produção homônima de 2003. Vídeo.

Minha Esposa é um Zumbi (2006) de Joel Caetano. Ótima comédia sobre um funcionário dos laboratórios Z que transforma sua esposa em zumbi. Vídeo.

Sandman (2006) de A. Normale Jef. Uma aventura com o Mal. Vídeo.

Telecinesia (2006) de Danilo Morales. Garota que tem poder mental ajuda a policia na investigação de um desaparecimento. Vídeo.

Arrombada – Vou Mijar na Porra do seu Túmulo!!! (2007) de Petter Baiestorf. Ricaços se aproveitam de suas posições de poder para comprar pessoas e barbarizar em orgias sexuais. Ljana Carrion no elenco. Vídeo.

Mamilos em Chamas (2007) de Gurcius Gewdner. Uma história de amor encenada com fantoches feitas de coelhos mortos. Vídeo.

Rambú III – O Rapto do Jaraqui Dourado (2007) de Manoel Freitas, Júnior Castro e Adilamar Halley. Aldenir Coti, o Rambo brasileiro, é a estrela nessa produção de ação ambientada na Amazônia. Vídeo.

Satan’s Cannibal Holocaust (2007) de Jim Wayer. Jovem jornalista se envolve num culto canibal para satã. Vídeo.

Mangue Negro (2008) de Rodrigo Aragão. Zumbis atacam no mangue. Produção que se encontra no tênue limite entre SOV e filme profissional, tendo representado um ganho em qualidade ao cinema independente brasileiro. Os filmes seguintes de Aragão não são SOVs. Vídeo.

Synchronicity (2008) de Brian Hirschbine. Homem acorda coberto de sangue e não se lembra do que fez. Vídeo.

Vadias do Sexo Sangrento (2008) de Petter Baiestorf. Casal de lésbicas cruza os domínios de Esquisito, um psicopata que foi estuprado por 48 Padres quando criança. Ljana Carrion e Lane ABC no elenco. Vídeo.

Black Ice (2009) de Brian Hirschbine. Um conto de fantasia, sexo e assassinatos. Vídeo.

No Rastro da Gangue (2009) de José Sawlo. Mestre do Kung Fu baiano luta contra um bando de traficantes. Pancadarias ao estilo Jackie Chan. Vídeo.

Atomic Brain Invasion (2010) de Richard Griffin. Estranhas criaturas alienígenas atacam pequena cidadezinha do interior americano. Um exemplo perfeito de como os SOVs de hoje evoluíram e estão com uma qualidade fantástica. Griffin está construindo uma carreira de respeito, com ótimos filmes. Também é dele Splatter Disco (2007). Vídeo.

Birdemic: Shock and Terror (2010) de James Nguyen. Pássaros se rebelam contra a humanidade. A produção virou cult por ser tão ruim. Vídeo.

El Monstro del Mar! (2010) de Stuart Simpson. Três assassinas enfrentam um monstro marinho. Outro exemplo de SOV muito bem produzido. Vídeo.

Nasty Nancy (2010) de Sandi Mance. Numa escola onde os professores resolvem tudo com sexo, uma estudiosa aluna se vinga, violentamente, de uma nota baixa. Produção fantástica. Recomendo! Vídeo.

O Tormento de Mathias (2011) de Sandro Debiazzi. As confusões num hospício muito louco. Joel Caetano e Felipe M. Guerra estão no elenco. Vídeo.

Confinópolis (2012) de Raphael Araújo. Sci-fi com ótimo aproveitamento de cenários. Um ditador oprime o povo. Vídeo.

Rat Scratch Fever (2012) de Jeff Leroy. Ratos gigantes do espaço atacam Los Angeles. Com efeitos especiais fuleiros é diversão garantida. Vídeo.

Breeding Farm (2013) de Cody Knotts. Após uma noitada de festa quatro amigos acordam presos num porão, onde estranho homem tem uma fazenda humana. Vídeo.

Hi-8 (Horror Independent 8) (2013) de Ron Bonk, Donald Farmer, Marcus Koch, Tony Masiello, Tim Ritter, Chris Seaver, Todd Sheets e Brad Sykes. Longa em episódios que reúne alguns dos nomes de maior destaque na história das produções americanas de Shot on Video.

Sinister Visions (2013) de Henric Brandt, Doug Gehl, Andreas Rylander e Kim Sonderholm. Longa em episódios com trabalhos dos USA, Inglaterra, Suécia e Dinamarca. Vídeo.

Gore Short Films Anthology Part 2 (2015) de Jeff Grienier, Rob Ceus, Sam Bickle, Jim Roberts, Colin Case, Alexander Sharglaznov, Fuchi Fuchsberger, Petter Baiestorf e Esa Jussila. Coletânea de curtas com representantes do SOV mundial atual organizada por Yan Kaos para lançamento em DVD no Canadá. São curtas do Canadá, Bélgica, USA, Russia, Alemanha, Brasil e Finlândia. 2000 Anos Para Isso? (1996) é o curta representante do Brasil.

Zombio 2: Chimarrão Zombies (2013) de Petter Baiestorf. Em um holocausto zumbi os humanos são o maior problema de todos. Miyuki Tachibana e Raíssa Vitral no elenco. Vídeo.

13 Histórias Estranhas (2015) de Fernando Mantelli, Ricardo Ghiorzi, Claudia Borba, Petter Baiestorf, Marcio Toson, Cesar Souza, Taísa Ennes Marques, Rafael Duarte, Gustavo Fogaça, Renato Souza, Léo Dias, Paulo Biscaia Filho, Felipe M. Guerra, Filipe Ferreira e Cristian Verardi. Longa em episódios que reúne alguns dos principais nomes do SOV brasileiro. Vídeo.

Pazúcus – A Ilha do Desarrego (2017) de Gurcius Gewdner. Casal de lunáticos enfrenta a mãe natureza com seus cocôs mafiosos. Vídeo.

Termitator (2017) de Roxane De Koninck, Camille Monette e Keenan Poloncsak. Um mutante extermina jovens que vão passar alguns dias em cabana na floresta. Vídeo.

Astaroth (2017) de Larissa Anzoategui. A demônia Astaroth se envolve com tatuadores e rockistas para cooptar almas humanas. Vídeo.

O Mito do Silva (2018) de Fabiano Soares. Ótima produção política lançada às vésperas da eleição presidencial de 2018. Aqui Soares alerta para o crescimento do fascismo no Brasil. Vídeo.

Contos da Morte 2 (2018) de Vinicius Santos, Ana Rosenrot, Cíntia Dutra, Danilo Morales, Diego Camelo, Janderson Rodrigues, Larissa Anzoategui e Lula Magalhães. Antologia com vários episódios de horror, reunindo alguns dos principais diretores do novo SOV brasileiro. Vídeo.

Escrito por Petter Baiestorf.

Fascismo Verde Amarelo: O Mito do Silva

Posted in Cinema, Entrevista, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 26, 2018 by canibuk

Conheci o Fabiano Soares quando ministrei uma oficina de vídeo no Rio de Janeiro em 2012, parte da programação da Mostra do Filme Livre. Juntos bolamos o curta Perdigotos da Discórdia, que envolvia necrofilia e outras peripécias cremosas, como sexo pervertido com membros de plástico realistas que acabaram dando problemas com o Banco do Brasil, patrocinador da Mostra naquele ano. Tivemos que explicar um boquete que Gurcius fazia explicitamente no tal pinto de plástico que fazia as vezes do membro pulsante de Pablo Pablo. Logo em seguida ele dirigiu o ótimo curta O Terno do Zé, com integrantes da banda Gangrena Gasosa e o Carlo Mossy no elenco, e, também, foi diretor de segunda unidade do longa Desagradável, do diretor Fernando Rick. Depois dirigiu A Revolta do Boêmio, vídeo clip para a banda Uzômi, com Angelo Arede e Gurcius Gewdner nas personagens principais. Agora em 2018, ano literalmente tenebroso na vida política do Brasil, Fabiano retorna com O Mito do Silva, curta que sintetiza de maneira quase didática – e brutal – o que está rolando no país do Pau Brasil.

Segue uma entrevista com ele sobre O Mito do Silva e suas observações sobre este conturbado momento em que o povo brasileiro se entocou. E, também, link para assistir o primeiro corte de O Mito do Silva e sua filmografia completa:

Petter Baiestorf: O Mito do Silva é um retrato do Brasil atual, como foram as filmagens do curta, da concepção do roteiro até as filmagens? Alguma história curiosa das gravações?

Fabiano Soares: Eu tinha escrito em 2016 um texto sobre o assunto, o “Mito”, utilizando como base um político que tava se destacando pelas merdas que falava, mas que, naquele ano, parecia bastante exagerada a ideia de o cara se candidatar a presidente. Então, partindo desse prenúncio de distopia, eu convidei o cineasta Marcos Lamoreux, daqui do Rio, para me ajudar a transformar em roteiro, acrescentando ou retirando trechos que ele achasse necessários. O Marcos é um amigo, ativista, negro, artista em diversas áreas, e topou. Nessa transformação do texto em roteiro, além das transformações estruturais, recebi algumas aulas dele, desde pequenas mudanças lingüísticas para não ofender sem querer, a origens de palavras como “linchar”, que acabaram dando um conceito mais forte ao filme. Então um cara, o Marcelo Paes, que me deu aula, decidiu entrar como produtor cedendo a câmera e alguns acessórios, além de dar uma ajuda na parte de produção.

Nossa bandeira jamais será vermelha.

Como eu faço um cinema com amigos, alguns velhos amigos se juntaram em suas áreas, e foi assim que o Thor Weglinski veio ajudar na produção e na assistência de direção; o Caio Cesar Loures topou fazer o som direto; o Gabriel P. Almeida fez a arte; e o Ricardo Schmidt, a fotografia. Tudo gente que quem já viu algum filme meu, já conhece de créditos. Chamei a Fany Coelho, uma maquiadora de gore fodona daqui, que abraçou a ideia; e o Marcos Lamoreux foi essencial também para conseguir os figurantes. E teve o Juan, que deu uma ajuda no set quando pôde. Sem essa galera aí, eu estaria fodido, porque fiz mais um filme sem dinheiro, só convidando as pessoas e tentando mostrar o roteiro, pra ver se topavam; e porque a Luciana estava trabalhando na época, o Edgar com 5 meses quando eu comecei esse processo de roteirização, e achei que conseguiria facilmente cuidar dele, decupar o roteiro, ensaiar com atores, ter reuniões de equipe, e finalizar um livro que estou escrevendo, só porque eu estava de férias. Eu mal conseguia cagar sem ficar pensando nas minhas responsabilidades de pai, e tinha só a partir das dez da noite para resolver tudo em relação ao curta. A Luciana, a namorada com quem casei e tive um filho (porque acho brega escrever “esposa” ou “minha mulher”), aliás, não pôde participar tanto desse curta diretamente, mas o fez cuidando do Edgar quando chegava em casa, permitindo que me dedicasse ao curta nesses momentos, e fazendo a comida pra batalhão na diária que teria, segundo minhas contas, 40 pessoas. Ah, e sempre, mesmo torcendo o nariz para algumas ideias minhas, meus pais dão uma força: figuração, transporte, comida. Uma observação: sempre rola uma opção vegana de comida, geralmente uma caponata de berinjela feita pela minha mãe, já que tem uma galera vegana / vegetariana entre esse pessoal que topa participar dessas coisas que eu invento.

O Mito em sala de aula

Para escolher o ator, procurei um ator amador, amigo meu, o Moisés, cuja primeira pergunta que fiz foi: “O que você acha do “político X” (o Brandão do filme)?” Quando ele respondeu, dizendo que não estava entendendo morador de favela apoiando esse cara, decidi que seria ele. O Marcelo foi arrumar o cara pra fazer o político, e a primeira opção dele, um ator com visual meio milico, declinou por um motivo óbvio: ele era eleitor do cara. Segundo o Marcelo, foi a primeira vez que ele achava alguém do círculo de contatos dele demonstrando apoio ao cara, foi quando ele viu que aquela piada ruim poderia ser mais assustadora do que era. Estávamos em junho de 2018. E contei mais uma vez com a participação do ex-galã da Globo, agora doutor em filosofia e ator de produções menos ostentatórias, Marc Franken, um cara gente boníssima!

Cara, filme independente sempre tem perrengue, e esse não foi diferente. O drone, que tinha uma utilização estética para simular celular gravando de um prédio, zicou e ficamos sem. Os 30 figurantes que confirmaram para a cena de agressão ao Silva, só apareceram uns 10, 12; pessoal no Rio é daqueles “Vamos marcar, borá!”, e furam. Aí entraram meus pais, o namorado da Fany, quem estava de bobeira no set virou figurante. E muita gente parava para perguntar o que estava acontecendo, achando ser real o Moisés ensanguentado. Além dos contratempos de chuva, intervenção federal, que atrapalharam bastante o cronograma, teve também as desistências de equipe e figurantes no último segundo, que rolou bastante, mas nada que abalasse o andar da carruagem, só desesperava um pouquinho, até conseguir dar um jeito.

Figurantes

Ah, e de última hora, o Leo Miguel, que fez assistência de direção no dia mais complicado, a externa da agressão, ficou enrolado pra fazer a edição do filme, e aí outro Leo, o Miranda, que editou já muita coisa minha, assumiu o posto. E nisso, uma coincidência que achei doida demais: no primeiro corte, o Leo botou uma música clássica. Eu estava lendo O Selvagem da Ópera, do Rubem Fonseca, que fala sobre a vida do Carlos Gomes, e é uma base de roteiro para um filme sobre o maestro e compositor brasileiro, que enfrentou uns casos de racismo na Itália por ser negro e brasileiro. Quando ouvi a música – eu não conheço muito de música clássica, embora ouça muito no trabalho, não é algo que eu grave ou escute em casa –, perguntei “É Carlos Gomes?”, e o Leo me disse que não. Fiquei pensando “Que idiotice, só porque eu tô lendo um livro sobre o cara, tudo o que é música clássica vou achar que é ele…”; aí quando terminamos de ver o corte, a música, que ele tinha pego aleatoriamente no catálogo do Domínio Público, ele viu “Ah, é sim, Antônio Carlos Gomes!”. Achei bizarra a coincidência, e disse ao meu ceticismo: “É um sinal!” Melhor ouvir o universo e ficar com a trilha de Carlos Gomes! Lógico que o fato de não ter ninguém para compor uma trilha sonora em dois dias, de graça, ajuda bastante…

Baiestorf: Achei ele bem ilustrativo para aqueles que se negam em enxergar o que está acontecendo no país. Foi opcional essa narrativa tão didática? Porque?

Fabiano Soares: Pô, eu acho que eu faço sempre um cinema por diversão, é bem quadrado na estética, eu gasto minha piração com o texto. Eu não sou cineasta, né? Eu faço uns filmes, é diferente; é como se eu fosse um cara que faz paródias subversivas de uma novela mexicana, mas não falando de paixões desencontradas, mas de filhadaputice humana. Acho que meus filmes são tudo sobre o pior lado do ser humano, mostrar que deu tudo errado. Mas a didática não tem nada a ver com isso, é só de talvez eu ser um roteirista que quer ver aquela merda numa tela, e como ninguém em sã consciência vai querer fazer isso, acabo fazendo. Aí não tenho aquela intimidade com a linguagem cinematográfica a ponto de saber subverter e dar certo. Aí eu faço o meu feijãozinho com arroz, batata frita e bife, e taco um pouquinho de sangue pra dar um gosto. O foda é que eu gosto muito de uns filmes mais doidos, que brincam mais com a linguagem, mas não consigo fazer. Deve ser medo de entropia, do público comum não pescar sobre o que eu estou falando. Acho que me preocupo muito em explicar didaticamente pro público.  Vou tentar pensar mais nesse assunto.

Fabiano e Moisés em O Mito do Silva

Baiestorf: Alguma observação sobre os eleitores do “mito” Brandão? Sobre essa “cegueira” coletiva (ou mau caratismo mesmo)?

Fabiano Soares: Cara, andando na Uruguaiana, um mercado popular no centro do Rio, vi muito camelô vendendo camisas do cara que inspirou o personagem, vendido como o salvador da pátria, e só fiquei pensando: esse cara não entendeu que ele vai se foder com o discurso de ódio. Que ele é visto pela elite como um vagabundo, trambiqueiro, e no que puderem usar de força bruta contra eles, usarão. Será que vale esse lucro? É como se, na atual conjuntura, eu topasse fazer um vídeo para um político evangélico, que eu sei que vai foder com qualquer possibilidade de uso correto da máquina pública, que já é uma merda. Poderia ganhar um dinheiro, adiantar o meu lado, da maneira mais egoísta possível.

E cara, eu tô realmente ficando mal com esse assunto. Você precisa explicar o óbvio, e após toda uma didática infantil, bem explicadinha, na falta de argumentos, os cegos só mandam memes e “fora PT”. Mas eu nem tô falando do PT, ô caralha! E tem muita gente cega mesmo, que não foi criada para pensar, mas para reproduzir discursos, que acaba indo na onda. Mas óbvio que sempre existe aquele mau-caráter, que esperou na moita o momento em que poderia falar abertamente sobre seus preconceitos e incentivá-los, porque agora naturalizou-se isso, passou a ser apenas um ponto de vista, que deve ser respeitado. Porra, intolerância não é aceitável, e  não podemos ser tolerantes com intolerantes, sem medo de parecer incoerentes. Essa naturalização do machismo, da homofobia, do racismo, vindo de gente que deveria representar o povo, é assustadora. Fazendo uma analogia idiota, é como a música de um churrasco com gente dos mais diferentes gostos musicais: o cidadão pode chegar e colocar, sem medo ou vergonha, Maiara e Maraísa (e realmente pode, um espaço democrático em geral), outro coloca Molejo, outro entra no Melhor do Axé, e depois de você ouvir isso tudo, você decide colocar um som que você gosta, um Black Sabbath (para citar um exemplo até mainstream): será repreendido, porque naturalizou-se a ideia de que só pode tocar música “que todos vão gostar” – só esquecem que nem todos gostam das outras músicas. A mesma lógica vale para os assuntos cotidianos. A pessoa acha que pode puxar um papo com você falando sobre não gostar de “ver viado andando junto”, sem nem saber seu pensamento sobre isso, porque naturalizou-se o “ninguém gosta de homossexual, até tolera, mas não gosta”. Esquecem que os gays que gostam de andar juntos fazem parte da sociedade. E assim vão tentando excluir cada vez mais o que os incomoda, chamando de minorias, através da supressão da fala, impondo a opinião preconceituosa como se fosse o pensamento comum. E esse discurso vai sendo naturalizado pelo cidadão comum, que nem é mau-caráter, mas reproduz isso. É a favor de morte para bandido, mas esquece do filho que vende droga, do irmão que instala gato de luz, da vez em que subornou um guarda, etc.

Cidadão de Bens

Baiestorf: Você produziu o curta no RJ, que já é uma cidade que vive sob uma ditadura evangélica radical. Você pode falar sobre as transformações da vida cultural carioca nos últimos anos.

Fabiano Soares: Cara, a vida cultural sobrevive em pontos de resistência, centros culturais independentes de verbas do município. Aqui tem muita gente, muito grupo agitando suas correrias, então não tem do que reclamar. Mas do ponto de vista político… Bom, eu estou realmente preocupado com essas eleições presidenciais. Você vem lembrar do pastor que é prefeito do Rio. Bom, eu sou a favor de acabar com essa merda de misturar política e religião. Não dá certo. Você acredita em Deus, foda-se, vai pra porra da igreja e converse com seus amiguinhos, todo mundo com o mesmo amigo imaginário, e sejam felizes! Eu não me importo com a religião das pessoas, desde que não queiram fazer leis que têm como base crenças religiosas. Vou voltar a falar da merda da naturalização: pessoal acha normal falar “vai com Deus”, mas fica abismado se receber de volta um “Satã te ilumine”, “fica com Exu”. Então vai pra puta que o pariu com a sua crença se você não aceita a do outro. E essa contaminação evangélica que tem acontecido não só no Rio, como no Brasil, busca cada vez mais reger a vida de todos tomando como natural os ensinamentos cristãos, “porque a maioria pensa assim”. Eu já estou me preparando para comprar muita briga com professor acéfalo que for passar doutrina religiosa pro meu filho em escola. Uma coisa é ensino religioso, onde você vai falar da diversidade religiosa no mundo; outra é falar que uma religião é a certa, que deve-se seguir isso ou aquilo. E falei porra nenhuma da vida cultural no Rio. Cara, tem vida cultural, deve estar escoando muito dinheiro da prefeitura para igrejas, pecinha de igreja deve estar recebendo milhões, patrocinada pelo pastor do Rio, o prefeito da Universal, Crivella. Mantendo-se longe disso, tem uma galera boa movimentando arte de verdade. Tá, julgamento de valor meu, mas foda-se. Arte que questiona algo.

Fany maquiando em O Mito do Silva

Baiestorf: A personagem principal é um negro seduzido pelo discurso de “bandido bom é bandido morto”, quais suas observações sobre isso?

Fabiano Soares: Algumas pessoas não estão entendendo o que está acontecendo, esqueceram chacinas, apagaram da memória casos recentes de racismo. E é apenas para exemplificar: poderia ser misoginia, homofobia. Pessoas que são naturalmente privilegiadas apoiarem um cara como esse, eu não acho certo, mas é compreensível: não quer largar de ser mimado; o garotinho branco, rico, quer que continuem governando para ele, protegendo-o de qualquer risco que possa correr. Mas uma pessoa que encontra-se em um dos grupos atacados, concordar com ele, é masoquismo. Mas o ódio é apaixonante, né? Eu lembro que eu com 13, 14 anos, achava lindo tudo o que eu estava estudando e pregava violência: Hitler, Mussolini, Robespierre, Mao Tsé-Tung… Eu era um idiota e achava que ser revoltado era fazer apologia à violência, tinha que matar todo mundo. Felizmente me dei conta rápido que não era bem assim, mas possivelmente, em 99, 2000, eu seria um passador de vergonha na internet, compartilhando meme de “mimimi”, cheio das confusões identitárias de raça.

O Mito do Silva

Se você pega um lugar movimentado, pega dois atores, um loiro e um negro, e bota os dois para correr ao mesmo tempo, separados por alguns metros lateralmente, e um terceiro gritando “pega ladrão!”, eu não tenho dúvidas que a maior parte ia olhar e escolher o negro como o ladrão. E isso é uma construção social perversa, que fez, ao longo dos anos, vítimas da escravidão serem vistas como marginais da sociedade após libertadas. Construção social, mais uma vez, desculpa, sou chato mesmo, naturalizada. Então a pessoa vê um menino negro em um sinal (semáforo, farol, faroleiro, chame como quiser aquela merda de três luzes), e fecha a janela do carro, porque tem medo. Tem medo de um menino magro que tenta conseguir um trocado para comer, provavelmente. A mesma irracionalidade leva uma pessoa negra a concordar em dar mais poder à polícia militar, por exemplo, que no Rio de Janeiro metralhou com mais de cem tiros um carro com cinco meninos que tinham saído para dar uma volta. Meninos que não estavam armados, nem atropelaram alguém. Mas eram negros. O filho do Eike Batista atropelou e matou uma pessoa. A polícia não deu tiros no carro dele. Por que? Enfim, ter uma opinião isenta sobre racismo é estar do lado do opressor. O dia em que você perceber que você não é branco, ou que sua sobrinha, seu filho, ou quem quer que seja na sua família ou círculo de amizade, dançou exclusivamente por conta de um julgamento pela cor dele(a), acho que será tarde demais para entender.

Baiestorf: Acho a personagem do professor um tanto apática aos comentários de seus alunos em sala de aula, sem tomar uma posição mais firme, talvez um retrato fiel de como se comportaram os professores nos últimos anos. Como competir com as fakes news? Como os professores podem fazer a diferença numa época em que os alunos “fabricam” suas verdades?

Fabiano Soares: Eu sou um cara do “copo vazio”, sou derrotista mesmo. Desisto fácil, e não culpo a apatia de professores: como lutar quando o mundo está contra você? Como explicar o óbvio e não ficar puto quando for chamado de doutrinador? Se eu fosse professor já teria desistido. Mas façam o que eu digo, não façam o que eu faço. Professores fazem diferença ao sugerir leituras, ao mostrar ao aluno que as ideias dele podem e devem evoluir. Eu lembro de um professor de artes que eu tive, e em um passeio a um museu, tinha um quadro com dois homens se beijando, e ele foi falar do quadro, e eu falei Que viadagem! (nessa época aí, de 13 anos, eu quase um nazipardo desses… Por isso digo que adolescentes podem mudar muito, independente das merdas que falem. Mas burro velho eu não tenho paciência). Ele mandou na mesma hora “Viadagem por quê?”, e eu falei provavelmente um “Porque sim!”, esse argumento valiosíssimo nos dias de hoje. E ele mandou eu ver o quadro, meio que me desafiou, e eu me neguei, e ele falando pra eu olhar, e a turma vendo isso… Resolvi olhar. Era um quadro no qual o artista tinha duplicado a fotografia dele e simulava um beijo entre ele e ele mesmo. Aquilo me deu um baque, foi o primeiro, quando eu vi que eu era burro. E que eu não podia falar das coisas sem saber, sem ver do que eu tô falando. Esse professor nem sabe, mas ele provavelmente me ajudou a mudar o pensamento de certeza sobre tudo sem nem precisar ver o outro lado; e é nisso que os professores são essenciais, não em explicar a verdade absoluta, mas a ensinar os alunos a questionarem-se, a botar dúvidas no lugar de certezas. Isso muda vidas. É desanimador, por conta das fake news multiplicadas sem filtro, só com um botãozinho; mas é uma luta essencial pela humanidade. Que botem a pulga atrás da orelha sobre essas notícias de whatsapp nos alunos. Muitos poderão rir, mas vai ter um que vai duvidar de fake news, que vai duvidar de isenção jornalística nos grandes meios de comunicação. E só por esse, já vai ter valido a pena.

Reunião de equipe

Baiestorf: O papel da arte é ser resistência? O que tu acha dos artistas “isentões”, que não estão tomando posição neste momento tão crítico de nossa história?

Fabiano Soares: Porra, pergunta pra textão. Não, o papel da arte não é ser resistência. Mas o papel da arte que eu gosto, sim. Eu acho que a arte eleva seu potencial de ser relevante ao ser resistência, porque junta ao estético o conceito e a ideia de mudança social. Mas não sei se seria o papel da arte, se eu estaria usando muito o meu juízo de valores. No entanto, se não bota o dedo na ferida, se não cutuca, eu deixo para ser fruída por outros, tenho mais o que fazer. Artistas isentões não existem. Não se posiciona, está do lado do mais forte. Ouve falar que tem que bater em homossexual e não diz nada? Está apoiando. Tá vendo, se é artista, faz arte, mas se é isentão, provavelmente eu não me interesso pela arte que ele faz. Ou se me interesso, diminuo o apreço agora…

Baiestorf: Com o Supremo, com tudo?

Fabiano Soares: As pessoas estão cegas, surdas e loucas. Tá aí, né? Depois desse “acordão”, muito facilitado pelo posicionamento dos deputados e senadores, para passar o impeachment, fico realmente espantado com o número de deputados que o partideco do “Brandão” conseguiu eleger. Vários militares. O golpe virá, e o pior é que será pelas vias legais… Espero que seja apenas uma distopia, culpa do meu pessimismo constante. Assim como em 2016 o “Mito” era…

Fabiano Soares dirige O Mito do Silva

Baiestorf: Brasil, país de racistas enrustidos de antes a país de racistas assumidos (violentos) de agora? Para onde vamos?

Fabiano Soares: Ladeira abaixo. Todo o tipo de preconceito e discurso de ódio vindo à tona, e o pessoal achando que é zoação, é só mais um HUEHUEBR. Acho que tem uma galera descrente de eleição que tá votando pensando que é voto de protesto. Mas esse Macaco Tião é perigoso…

Baiestorf: O espaço é seu Fabiano.

Fabiano Soares: O espaço é nosso, e não deve ser cerceado. Independente de sofrer ou não racismo, homofobia, misoginia, tenhamos um pouco de empatia. Ninguém deve ter medo de andar nas ruas por achar que sua cor, seu credo, sua orientação sexual ou seu gênero o coloquem em um estado de risco. O mundo já está uma merda, o ser humano já é escroto por natureza, não precisa ser incitado a isso. Pensem, não tenham certezas, leiam, leiam, leiam. E ouçam. Não dá pra você viver tranqüilo em uma sociedade que elege religioso pra representar o povo. Principalmente esse câncer que é a bancada evangélica, um sintoma de uma sociedade doente que quer ser ovelha a todo momento. Por isso, defendo ser radical contra a mistura de política e religião (principalmente se for uma religião hegemônica, no nosso caso, cristã) assim como contra esse novo fascismo, que não por acaso vem ganhando forças sendo carregado em uma cama de “Deus acima de todos”. Eu tenho um filho para experimentar muita coisa na vida, e não pode ser calado por um governo que flerta abertamente com a ditadura, apoia torturador. Pensem nas crianças que vocês dizem gostar tanto. Tá ficando meio Zé do Caixão, né?

E se tudo der certo, “O Mito do Silva” será um episódio de um longa-metragem. Isso se eu não desanimar e desistir, porque vou te falar, tá foda… E sem isenção, dia 28 agora é 13 contra o fascismo! E ser humano deveria vir antes de ser anti-PT, portanto, não há desculpa.

Fany trabalhando

Filmografia Completa de Fabiano Soares:

2008 – O Dia do Folclore; 2009 – Acertos Errados; 2009 – Boneco de Pano; 2011 – SolidariedAIDS (co-direção); 2012 – O Terno do Zé; 2012 – Thrash Star; 2012 – Perdigotos da Discórdia (Co-direção); 2013 – Desagradável (diretor de 2ª Unidade); 2014 – Churrasco Misto (animação, co-direção); 2014 – Eu Aceito; 2015 – Primeiro Ato (co-direção); 2015 – Eleven Years (Videoclipe); 2015 – Olho Maldito (animação); 2015 – Par ou Ímpar (co-direção); 2015 – Vegetal (co-direção); 2016 – A Revolta do Boêmio (Videoclipe); 2016 – Paterno; 2016 – Sacrifício; 2018 – O Mito do Silva.

Assista aqui, também, estes outros trabalhos do diretor:

2009- Boneco de Pano

2012- Perdigotos da Discórdia

2012 – O Terno do Zé

2013 – Desagradável (diretor de segunda unidade)

2014- Eu Aceito

2015- Par ou Ímpar

https://vimeo.com/130901429

2016- A Revolta do Boêmio

2016- Paterno

 

A Noiva do Turvo

Posted in Cinema, Entrevista, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 9, 2018 by canibuk

A Noiva do Turvo é um curta-metragem produzido no início de 2018 utilizando-se de um celular enquanto festejávamos a passagem de ano. Orçamento zero para contar uma lenda do rio Turvo que, meses antes, Loures Jahnke e sua filha Isabela haviam resgatado para um trabalho escolar que virou um fanzine de contos. Você pode ler o conto A Noiva do Turvo clicando no coletivo literário Maldohorror.

Segue relato dos envolvidos nas gravações:

Petter Baiestorf: O curta A Noiva do Turvo, escrito e dirigido por Loures Jahnke e filmado com seus filhos: Lorenzo de cinco, Isabela de dez, Vinicius de doze e Morgana de vinte anos. Loures, Elisiane Rodrigues, Carli Bortolanza e eu nos divertimos muito durante essa experiência fantasmagórica sessão livre onde respeitamos o ritmo de trabalho das crianças. Não quer dizer que eu vá produzir filmes em celulares, mas abrem-se algumas possibilidades com este formato, principalmente com suas câmeras de alta definição.

Lorenzo, 5 anos, assistente de direção

Loures Jahnke: Exatamente um ano depois da filmagem de Ándale!, na virada de 2017 para 2018, Baiestorf e Bortolanza voltaram para o Baixo Azul, trazendo na bagagem mais de 300 latas de cerveja – sim, eles sempre são exagerados. Não tinham o Toniolli, nem o Élio e nem a filmadora, mas Baiestorf estava com um celular com câmera bacana. Alguns meses antes dessa visita, ajudei minha filha Isabela em um trabalho escolar sobre mitos e lendas locais, o que resultou em um pequeno conto que publiquei no Maldohorror. Eu tinha o argumento e 4 filhos; Peter tinha um celular e o Bortolanza. O produto? A Noiva do Turvo.

Morgana, A Noiva do Turvo

Carli Bortolanza: Loures nos apresentou um texto que ele havia ajudado uma das filhas a escrever para um trabalho escolar que virou um livro coletivo dos alunos que estudavam na mesma sala de aula da filha dele. Sugerindo “Nós podíamos filmar este texto da Isabela, não?”. E “de balde”, por que não? E o primeiro impacto após termos lido o texto foi, “Como não tem câmera, vamos filmar pelo celular!”, única opção e sem nenhuma objeção. A iluminação foi outro empecilho, mas Loures comentou que um vizinho tinha uma bateria com uma lâmpada que fora improvisado para ser usado como uma mochila nas costas, com direito a alças e tudo. A escolha de quem faria o pescador também foi engraçada: Pedi para ser escolhido, pois estava com um pouco de frio e ai ficaria com a roupa manga longa e não precisaria ficar carregando o peso da bateria.

Teste de iluminação durante as gravações com Carli sendo abduzido

E. B. Toniolli: A história é linda, pulsante e real. O Loures mostrou-se um bom diretor, mas que não chega aos pés do Loures escritor, que é formidável.

Loures Jahnke: Filmar A Noiva foi uma das coisas mais divertidas que já fiz. Meus filhos foram batizados na Canibal Filmes – não com groselha, mas com o “espírito da coisa” -, todos riram muito, sofreram – principalmente Morgana e Isabela – e se encantaram. Até a Elisiane, minha companheira, diz que se divertiu muito sendo a produtora do filme – ela pagou um pote de minâncora e um lápis de olho, total de custos.

Carli Bortolanza: Uma coisa que ficou bem marcante foi a empolgação das crianças em participar!

Petter Baiestorf: Para A Noiva não tínhamos uma câmera, somente meu celular. Como eu havia acabado de filmar Beck 137 em Goiânia, GO, com ele, sabia que dava pra fazer algo minimamente bacana. Também deu pra testar o uso de iluminação mínima em espaços abertos – boa parte do curta foi filmado numa plantação de soja que invadimos. De certo modo o uso da iluminação foi uma continuidade do que havia pensado para A Cor que Caiu do Espaço.

Loures Jahnke: Já tinha visto alguns trabalhos feitos com celular, mas A Noiva do Turvo foi para muito além das expectativas, considerando que a maioria das cenas foram noturnas, que a iluminação foi feita com um troço adaptado para caçar lebres tomado emprestado de um vizinho, que os áudios da narração e da trilha sonora  – brilhantemente composta pelo Vinicius, de 12 anos – foram todos gravados em celular e que o Bortolanza passou uma tarde toda catando lenha pra assar carne.

A Noiva se preparando para entrar em cena

Elio Copini: Quanto A Noiva, não participei das filmagens, assisti e gostei muito dele. Despertou uma inveja por não estar lá também.

Loures Jahnke: Toniolli acho que também se divertiu muito, um tempo depois, comigo e com o Baiestorf na casa dele num final de semana inteiro durante a edição do Noiva.

E. B. Toniolli: A Noiva do Turvo já chegou em minhas mãos filmado e só faltando a edição. Dessa vez tínhamos o Loures Jahnke como diretor e ele é uma pessoa muito inteligente, que sabe o que quer e sabe valorizar o trabalho em equipe, deixando todos participarem do processo de maneira ativa. Assim considero esse curta mais coletivo do que as obras naturais da Canibal Filmes, que são a visão do Baiestorf, basicamente.

Morgana e Carli em A Noiva do Turvo

Loures Jahnke: A Noiva do Turvo é quase um filme infantil, inocente, mas que explora um universo cultural muito vasto que são os causos, os mitos e lendas que preenchem o imaginário – e a vida! – das populações camponesas sertões afora.

E. B. Toniolli: Fiquei muito contente em editar o material filmado com celular. Considero que o cinema feito de celular é a evolução natural do processo: Não estamos reféns dos grandes estúdios, das câmeras caras e dos “profissionais” da arte. Cinema é para todos, não para uma elite intelectual que trata a todos como gado intelectual, onde quem não comunga de sua maneira bitolada de ver o mundo, é excluído.

fotos e entrevistas para o post por Petter Baiestorf.

Assista ao curta-metragem aqui:

A Independência de Contos da Morte 2

Posted in Cinema, Entrevista, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on agosto 16, 2018 by canibuk

Em 2016 Vinícius Santos organizou e lançou o longa-metragem episódico “Contos da Morte”, que reunia os diretores Ulisses da Motta, Thiago Moyses, Rodrigo Brandão, Kayo Zimmermam, Julio Wong, Jeziel Bueno, Ivo Costa, Helvecio Parente, Calebe Lopes, Bruno Benetti e Ana Rosenrot, e que já está disponível no youtube para ser visto grátis:

Agora, Vinícius reuniu novos diretores, Ana Rosenrot, Cíntia Dutra, Danilo Morales, Diego Camelo, Janderson Rodrigues, Larissa Anzoategui e Lula Magalhães, para a segunda parte de “Contos da Morte”. O lançamento deste SOV que já nasce obrigatório está programado para outubro deste ano e o trailer já está disponível:

Fiz uma entrevista com os diretores da continuação:

Petter Baiestorf: Conte um pouco da sua trajetória nas produções brasileiras:

Vinícius Santos: Minha história com o cinema independente começou por acaso, em 2008 fiz meu primeiro curta caseiro e trash, com toques de humor negro. Foi o “Cereal Killer”, que ganhou alguns prêmios na época aqui em Jacareí, depois peguei uma paixão pelo cinema, ainda mais eu que adoro filme trash, então não vi dificuldade alguma pra realizar meus filmes trash. Fiz vários curtas desde então, alguns longas como “Steve Cicco”, “Iandara”, “Exorcistas Carinhosos”. Realizei meu sonho de conhecer  José Mojica Marins, o eterno Zé do Caixão, até entregamos um prêmio a ele. Dirigi um documentário com Liz Marins e realizei um sonho  de dirigir um filme meu com a Monica Mattos, ex atriz pornô. Comecei a mandar e exibir meus filmes em alguns festivais nacionais e internacionais, conheci também cineastas que já admirava, como Petter Baiestorf e Rodrigo Aragão, fiz novas amizades e parcerias também, acabei sendo convidado para participar na produção de um longa-metragem co-produção Brasil e Londres em 2017, um filme indígena que mistura drama e fantasia chamado “Goitacá”, tive prazer de conhecer alguns atores como Luciano Szafir, Lady Francisco e Leandro Firmino (o Zé Pequeno de “Cidade de Deus”), isso tudo graças aos filmes trash que desenvolvo, então percebi que estou no caminho certo.

Ana Rosenrot: O cinema sempre fez parte da minha vida, sou cinéfila por natureza e minha curiosidade me levou a pesquisar o cinema como um todo, buscando entender a importância da sétima arte para a cultura mundial e sua influência sobre as pessoas. Mas percebi que eu precisava participar da criação cinematográfica e em 2011 passei a fazer pequenos curtas experimentais, tudo muito simples, com a cara e a coragem, assumidamente trash e não parei mais. O primeiro curta que enviei para um festival se chama “Mistérios Obscuros”, ele foi premiado com o Troféu Corvo de Gesso em 2013, selecionado na 15ª Mostra do Filme Livre em 2015 e escolhido para compor a vinheta de abertura da sessão “Trash ou Cinema de Gênero?” da mostra. Em 2013, fui convidada para escrever sobre cinema para uma publicação Suíça, a Revista Varal do Brasil e criei a Coluna CULTíssimo, especializada em cinema e universo Cult. Também em 2013 juntei forças com a Vproduções Cinematográficas e participei como diretora, produtora e atriz em curtas e longas. Destaque para o longa-metragem “Steve Cicco – Missão Popoviski”, o curta-metragem “Samantha” (que dirigi com o Vinícius e protagonizei), as duas edições da Mostra Monstro e o projeto “Contos da Morte”. Em paralelo, me dedico a criação e a divulgação literária e continuo com minhas produções pessoais, rodando os festivais com curtas experimentais e vídeo poemas voltados para o ativismo cultural e as causas femininas. Já ganhei sete prêmios, participei de muitos festivais e mostras e pretendo seguir acreditando no cinema nacional e feminino apesar de todos os obstáculos.

Cíntia Dutra: Certamente assim como todos os envolvidos no “Contos da Morte”, sempre fui apreciadora do cinema de horror, independente da nacionalidade. Na verdade, me considero muito mais fã e pesquisadora do gênero horror, que realizadora. Mas isso, juntamente com a minha formação (em Fotografia) trouxe a possibilidade de realizar alguns projetos. Onde em 2007 dirigi o curta “Obsessão”, posteriormente em 2008, “Extrato”, em 2015 o “Retratos” e agora o “Entre Nós” que fará parte do projeto.

Danilo Morales: Em 2012 meu primeiro filme em HD foi “Adega de Sangue”. Em 2015 veio o projeto “Trilogia do Terror” com os filmes media metragem “Telecinesia – Entre a Cruz e o Balaço” e “A Corrente de Menon”. A produção de curtas foi intensa. Uma media de três por ano. Em 2016 “Astarte- O Assassino do enforc a Gato” e “Até que a Morte nos Separe”. Em 2017 “Quiromania Ninfomaníaca” e “O Lago”. Em 2018 “Vilarejo Libertino”, “Casa de Xangô” – o filme longa metragem “Cemiterio das Moscas”, antologia de três diretores. E “Contos da Morte 2”. Antologia com vários diretores envolvidos. Os filmes estão correndo festivais nacionais e internacionais.

Larissa Anzoategui: Eu comecei a experimentar o audiovisual em, acho que, 2008, quando fiz um curta maluco chamado “Zumbis do Espaço de lá” para o meu TCC do curso de artes visuais. Depois de um tempo fui morar em São Paulo para estudar fotografia e lá entrei em contato com outras pessoas que tinham vontade de produzir e tinham grana zero como eu. Nos juntamos gravamos um curta, o “Limerence’, com roteiro de Paula Febbe, que só foi ficar pronto mesmo no final do ano passado, mas estava gravado esperando finalização desde 2012. Gravo sempre quase com a mesma equipe desde o “Limerence”: Pedro Rosa na direção de fotografia, Renato Ramos Batarce ajudando na produção e o meu marido, Ramiro Giroldo, que hoje escreve todos os roteiros da Astaroth Produções. Até agora temos lançados quatro curtas (“Red Hookers”, “Natal Vade Retro”, “Limerence” e “A Janela da Outra”) e um longa (“Astaroth”). Tem agora o “Fatal” também, que faz parte do “Contos da Morte 2”. Meus filmes são de terror, minhas inspirações são aquelas produções dos anos 80, principalmente as que eram feitas para o mercado de VHS. Busco um terror meio aventura, algo divertido. Monstros que não existem. Nas minhas produções a força e o foco estão sempre nas personagens femininas. Afinal de contas, elas sempre estiveram presentes nos filmes de terror, mas ao invés de ser apenas mais uma vitima, a mocinha bonita gritando, aqui elas levantam e enfrentam o monstro que as vezes é a monstra também.

Diego Camelo: Sou Estudante de Cinema do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade de Fortaleza, meu primeiro curta metragem foi o “Tirarei as Medidas do seu Caixão” que é um filme-homenagem ao personagem mais icônico do Terror brasileiro, que é o Zé do Caixão. O filme foi muito bem recebido por onde passou, consegui inclusive espaço para exibição do curta no Canal Brasil no programa “Pausa para o Café” e é também dos filmes que realizei até aqui, o que mais circulou por festivais afora. Ainda dirigi e produzi os curtas metragem “A Incrível História do Gorila” e “O Vampiro”. Todos os curtas estão disponíveis na internet.

Lula Magalhães: Comecei em 2013 com o filme “Mandala Night Club”. De lá pra cá não parei mais, sempre venho mantendo uma média de uma a duas produções por ano. Sempre produzi na esfera do terror e sempre produções 100% independentes, ou seja, sem dinheiro público.

Janderson Rodrigues: Comecei trabalhando em produtoras independentes até abrira minha há quatro anos. E estou tentando sobreviver até então.

Dor (Lula Magalhães)

Baiestorf: Como surgiu o projeto de Contos da Morte 2?

Vinícius Santos: Eu já havia feito projetos em parceria com cineastas de outras localidades e regiões, inclusive fora do país, sempre tive vontade de fazer algo parecido com o ‘’ABC da Morte’’ e resolvi convidar alguns cineastas para uma antologia chamada ‘’Contos da Morte’’, lançado em 2016. A idéia para o “Contos da Morte 2” surgiu dentro do Festival Boca do Inferno no lançamento do primeiro filme, durante um bate-papo, após a exibição me perguntaram se haveria uma continuação, deixei a possibilidade em aberto, mas muita gente pediu essa continuação e então resolvi juntar uma galera, a idéia era não repetir os cineastas do primeiro, e, ao invés de 12, nesse segundo seria apenas 10. Mas no fim muita gente não deu conta e desistiu, eu acabei tendo que entrar nos momentos finais do projeto devido ao prazo de entrega, não teríamos mais tempo de convidar novos cineasta pra se juntar ao grupo. Então esse segundo “Contos da Morte” conta com sete histórias e oito cineastas do cinema independente.

Ana Rosenrot: O projeto surgiu no Festival Boca do Inferno, durante o lançamento da primeira edição, quando o criador do projeto “Contos da Morte”, Vinícius J. Santos, foi questionado sobre a possibilidade de uma continuação e após o festival ele entrou em contato com outros realizadores e decidiram fazer uma sequência. Primeiramente a ideia era não repetir nenhum dos diretores do primeiro filme, mas, devido a algumas desistências, o Vinícius decidiu participar com um segmento e me convidou para dividirmos a direção. São ao todo sete filmes e oito cineastas participantes.

Cíntia Dutra: Em 2016, ao enviar o curta “Retratos” para algumas mostras, o Vinicius Santos o viu e fez o convite para realizar um novo curta para integrar o projeto.

Danilo Morales: O Vinicius me fez o convite. Ele fez o “Contos da Morte 1” e queria fazer uma sequência com novos diretores.

Diego Camelo: Fui convidado pelo idealizador do projeto Vinícius Santos, eu não conhecia o projeto e não tinha visto o filme anterior, mas curti bastante a proposta e quando rolou o convite aceitei de pronto, gosto dessa iniciativa da Antologia, juntar diretores de locais diferentes, fazendo filmes completamente diferentes sobre o mesmo assunto.

Lula Magalhães: Conheci o Vinicius quando meu filme “Invasor” participou da Mostra Monstro em Jacareí, SP. Surgiu o convite de participar da segunda edição e eu adorei a ideia.

Janderson Rodrigues: Estava fazendo a fotografia do filme “Cinco Cálices” quando o Vinicius me chamou para participar do projeto. Já tinha visto o primeiro em festivais e fiquei super feliz de participar do 2. Ai meu editor, na época, me pediu para escrever o roteiro, então falei que eu queria uma história que se passa na favela.

Diagnose Danação (Diego Camelo).

Baiestorf: Como chama seu episódio e qual a história?

Vinícius Santos: O segmento eu dirigi, junto da diretora Ana Rosenrot, também aqui de Jacareí, se chama “A Marca do Diabo’’ e é sobre uma moça que adquire um quadro de uma criança chorando, e coisas bizarras começam a acontecer até que ela descobre que aquele quadro tem uma história maligna por trás envolvendo pacto demoníaco e sacrifícios. História inspirada na lenda urbana dos Quadros das Crianças Chorando, muito famosa no Brasil na década de 80.

Ana Rosenrot: O episódio que dirijo com o Vinícius J. Santos se chama “A Marca do Diabo”, e é inspirada na maior lenda urbana dos anos 80: “Os Crying Boys” (quadros das Crianças Chorando). Ele conta a história de uma garota que depois de sofrer um terrível acidente, está internada num hospital e ao ser interrogada por policiais alega ter sido marcada pelo diabo após comprar um quadro de uma criança chorando.

Cíntia Dutra: O episódio chama-se “Entre Nós”, e conta a história de um casal, com uma relação um pouquinho turbulenta, regada a sangue e insanidade.

Entre Nós (Cíntia Dutra).

Danilo Morales: “Heterocromia”. Simmel sofre preconceito por ter heterocromia. Seu alter ego maligno, representado pelo olho azul, é desperto quando o demitem do serviço. Filme experimental em primeira pessoa, de humor negro, uma crítica social da crise em nosso país.

Larissa Anzoategui: Meu episódio é o “Fatal”. Conta a história de um rapaz que lança cantadas online e acha que vai se dar bem, mas acaba se metendo em uma enrascada.

Diego Camelo: O nome é “Diagnose Danação” e é livremente inspirado no livro Frankenstein da Mary Shelley, pode até ser temerário dizer que é livremente inspirado, por que imagino que alguém possa tentar fazer comparações ao livro, eu tinha acabado de reler a história quando o Vinicius chegou com o convite, alguns elementos da história da Shelley estavam muito vivo na minha memória por isso tentei pegar o mote central da história e adaptar. Fui atrás do filme Frankenstein da Hammer Filmes, com o Peter Cushing, e fiz algumas modificações. A história é basicamente a relação de um médico e um paciente que não queria ser salvo, depois de vários anos sofrendo de uma doença autoimune, o paciente tenta tirar a própria vida, mas o médico o salva, o paciente acredita que estar vivo é uma espécie de punição e culpa o médico, passando então a persegui-lo.

Diagnose Danação (Diego Camelo).

Janderson Rodrigues: O filme se chama “Morro dos Mortos”. A historia de Bento que fica preso durante 10 anos e ao sair tenta uma vida nova, mas os fantasmas das pessoas que ele matou voltam para cobrar algo .

Lula Magalhães: Se chama “Dor”. O filme narra a trajetória de três psicopatas insanos que alimentam uma estranha criatura com carne humana.

Dor (Lula Magalhães).

Baiestorf: Como foram as filmagens dele?

Vinícius Santos: Tivemos seis meses de gravações, até que foi bem rápido, não tivemos tanta dificuldade por ter muitas cenas com poucos diálogos, algumas locações bacanas como um antiquário e um hospital, que nem imaginávamos se conseguiríamos ou não, mas no fim deu tudo certo com o apoio da Prefeitura Municipal de Jacareí. Até achávamos que teríamos dificuldade, pois filme de terror não é visto com bons olhos em Jacareí, mas arte é arte e conseguimos até fazer as cenas com um Diabo por lá.

Ana Rosenrot: Até que foram bem tranquilas; claro que tivemos algumas dificuldades, o que é muito comum quando falamos em cinema independente, pois, trabalhar com baixo ou nenhum orçamento, equipe pequena e locações sem controle externo, sempre acarreta alguns atrasos ou imprevistos (a greve dos caminhoneiros nos afetou um pouco). O importante é ser capaz de improvisar quando é necessário e poder contar com pessoas engajadas no projeto e nisso tivemos muita sorte, os atores e a equipe estavam maravilhosos.

Bastidores de uma das cenas do filme:

Cíntia Dutra: As filmagens aconteceram na metade do ano passado (2017), em um final de semana bem corrido, onde tudo teve que ser filmado por conta dos recursos disponíveis. A equipe formada por amigos da faculdade e parentes, que tenho que agradecer por ter trabalhado por três xis burguers, é a mesma equipe que trabalhou no curta anterior, “Retratos”, o que tornou o processo muito agradável.

Danilo Morales: Foi um desafio. Nunca tinha gravado nada em primeira pessoa. O episodio foi gravado em um dia e teve um verdadeiro banho de sangue. Um boneco foi confeccionado para ter a cabeça esmagada. Ficou fantástico a cena da cabeça partida. Infelizmente a câmera travou nesse momento. A solução foi refazer a cena de forma desfocada, pois o boneco já estava estourado. Mas foi bem divertido. O episódio não foi feito para ser levado a sério. Tem muito humor negro e critica social.

Larissa Anzoategui: Foi muito rápido, em um dia gravamos tudo. Mas foi rápido assim porque reaproveitei uma cena do “Astaroth” que não ficou no corte final. Mas mesmo assim, tem o começo que está no corte final do longa e está também lá no curta, bem plena e cara de pau. Para fechar uma história com este reaproveitamento, tiramos um dia do final de semana para gravar. Equipe bem reduzida, eu dirigi, filmei, montei a luz e o cenário, o Ramiro ajudou bastante, sendo o assistente em todas essas funções. A terceira pessoa da equipe era a maquiadora, Palmira Nogueira, que sempre trabalha com a gente. Para compensar o elenco era maior que a equipe: Sete atrizes e um ator.

Diego Camelo: Foi bem caótico (risos). Muito por que tivemos muitos atrasos em relação a locações, principalmente. Tivemos problemas pra conseguir a locação do hospital, por exemplo. Lembro que num dos dias de gravação Fortaleza passou por uma onda de ataques a ônibus e isso dificultou todo tipo de transporte na cidade, atrasando bastante o dia de filmagem. O importante pra que tudo desse certo foi ter uma equipe e elenco que mesmo nas dificuldades se dispôs a fazer as filmagens darem certo.

Lula Magalhães: Foi bem louco. Muito cansativo. Quatro dias de gravações intensos. Gravar de forma independente exige muito mais da equipe porque os recursos são mínimos. Mas tudo muito satisfatório no final.

Janderson Rodrigues: Vou deixar o trailer do filme.

Baiestorf: Algo curioso que rolou nas gravações que pode contar para nós?

Vinícius Santos: Tem um fato curioso que aconteceu durante a escolha das locações, em uma das cenas do filme foi filmada em um antiquário. Tínhamos um bem chique, estava tudo certo para filmar, toda equipe aguardando no local, mas por algum motivo o dono da loja não apareceu e tivemos que adiar. O jeito foi utilizar nosso plano B, outro antiquário, era mais simples, mas acabou que combinou muito mais, pois o filme era inspirado em uma lenda dos anos 70 e 80 e o antiquário tinha peças da época, no fim. Deu super certo essa mudança de planos.

Ana Rosenrot: Estávamos numa locação e o nosso ator estava maquiado e pronto para entrar em cena. Enquanto aguardava ele ficou ensaiando e se movendo pelo local. Foi quando percebemos que um senhor que passava na rua estava olhando pela vidraça, ele ficou parado, com os olhos arregalados, horrorizado. E ficou ali por um tempo, indeciso, depois baixou a cabeça e saiu. Ele percebeu que era somente uma pessoa maquiada, pensou que era algum tipo de pegadinha, ou acreditou que estava vendo uma entidade demoníaca? Nunca saberemos, mas o episódio rendeu boas risadas e mostrou que, pelo menos, a maquiagem estava assustadora.

Carolina Venturelli em A Marca do Diabo (Vinícius Santos e Ana Rosenrot).

Cíntia Dutra: Há uma cena no curta que foi filmada em um hospital real, e foi necessário realizá-la na correria, pois segundo o médico que cedeu o leito hospitalar, em final de semana com feriado o risco de precisarem do quarto as pressas era grande. Por sorte não fomos interrompidos. Pagamos 50 reais pelo aluguel de um vestido de brechó. Isso é todo o orçamento do filme!

Elenco de Entre Nós com a diretora Cíntia Dutra.

Danilo Morales: O mecanismo utilizado para esguichar sangue do pescoço da vitima foi feito de forma bem arcaica e barato. Uma mangueira de nível acoplada a uma bomba de encher bicicletas foi a responsável, para de forma mecânica, esguichar o sangue. A faca utilizada era retrátil.

Diego Camelo: Não sei se responde bem a pergunta, mas houve algo engraçado durante as filmagens, fomos gravar uma das cenas mais importantes pro filme e do lado da nossa locação tava rolando uma missa a céu aberto e isso atrapalhou bastante principalmente na questão do som, aí a nossa atriz Gabriela Willis, maquiada com sangue no rosto, foi lá pedir gentilmente pra que os fiéis baixassem o volume (risos).

Lula Magalhães: Sempre digo que fazer filme de terror é muito mais divertido do que fazer filmes de comédia. Foram vários momentos hilários durante as filmagens. Fica até difícil de falar de um específico.

Janderson Rodrigues: No primeiro dia de filmagem estava marcado para começar as 17:30 e terminar as 20:30 e o ator principal não apareceu e ninguém conseguiu falar com ele, então quando estava para cancelar, ele apareceu com o joelho todo inchado e mão enfaixada porque tinha sofrido um acidente de moto e estava no hospital.

Larissa Anzoategui: Olha, as meninas tiveram que passar o dia semi nuas e com maquiagem de efeito na cara. Aí virou uma grande piada tudo o que elas faziam, elas mesmas ficavam tirando sarro umas das outras. Em certo momento, num intervalo, uma das meninas estava agachada olhando o celular, passou a Simone Galassi, que é super piadista e soltou: “Olha! O demônio cagando!”. Só coisas assim mesmo, acho que foi engraçado para quem estava lá. Meio que piada interna. Não aconteceu nada de sobrenatural, nada de luzes caindo ou pessoas levitando (risos).

Diagnose Danação (Diego Camelo).

Baiestorf: Como estão os preparativos (e expectativas) para o lançamento em Outubro?

Vinícius Santos: Estamos já mandando pra festivais nacionais e internacionais, aproveitando que logo o Halloween está aí, e o que mais rola é festivais de horror. Mas a expectativa é grande pra fazer a primeira exibição pública, pra ter um feedback da galera.

Ana Rosenrot: Estamos nos concentrando na divulgação, que deve ser muito bem coordenada com todos os outros diretores e esperamos que o público goste de todos os segmentos, aprecie a diversidade de estilo dos diretores, se assuste e se divirta muito com nossos contos mortais.

Cíntia Dutra: A expectativa é grande, por fazer parte de um projeto tão bacana e com gente super qualificada (falo dos outros curtas – risos). E claro, sempre há a vontade de conferir pessoalmente a estréia, se a rotina e a distância permitirem.

Danilo Morales: A expectativa é alta. Sabemos que o cenário de guerrilha independente não é fácil. A solução é a união dos diretores. Não somos adversários, somos parceiros em prol do fortalecimento do cinema de gênero na região.

Diego Camelo: Estamos ansiosos pro lançamento do “Contos da Morte 2” e vamos fazer um novo corte com mais cenas pro curta, já que havia um tempo limite pra cada curta metragem, muito provavelmente vamos disponibilizar direto pra internet.

Larissa Anzoategui: Eu não vejo a hora de ver todas as histórias! No grupo do facebook a gente ficava trocando informações, postando fotos de bastidores, testes, trailers. Tô muito curiosa para assistir os outros curtas que estão no projeto.

Lula Magalhães: As melhores possíveis. Parte dos outros integrantes são meus amigos e estou muito feliz com a participação e trabalhos deles.

Janderson Rodrigues: Bom, os preparativos estão por conta do Vinicius, e a expectativa é grande porque as pessoas envolvidas são muito boas e também estou muito feliz porque o filme “Cemitério das Moscas” vai ser lançado esse mês e depois vem o lançamento dos “Contos da Morte”.

Dor (Lula Magalhães).

Baiestorf: O público terá o filme disponível para venda em mídia física (ou link online) quanto tempo após o lançamento?

Vinícius Santos: O filme será exibido apenas em festivais em um primeiro momento, após o prazo de um ano. A V Produções Cinematográficas está planejando um terceiro “Contos da Morte”, pra fechar a trilogia e quem sabe a gente possa lançar um box dos três em DVD.

Cíntia Dutra: Espero que haja mídia física sim, afinal é sempre bom ter mais um filme na prateleira.

Diego Camelo: Aí vai depender do tempo que o longa metragem “Contos da Morte 2” ficar em circulação e exibição por festivais e mostras, mas assim que passar essa fase com a Antologia, vamos lançar uma nova versão do curta na internet.

Janderson Rodrigues: O filme vai correr festivais e depois não sei se vai ser lançado em mídia, mas por mim eu lançamos em mídia física sim, ainda sou das antigas.

A Marca do Diabo (Vinícius Santos e Ana Rosenrot).

Baiestorf: No momento você está trabalhando em algum novo projeto? Pode falar sobre ele?

Vinícius Santos: Estou desenvolvendo mais dois novos longas, um é o ‘’Steve Cicco – A Última Porrada’’, um filme paródia de espionagem, a terceira parte de uma trilogia. E também estou finalizando o roteiro do ‘’Sexo, Pizzas e Filmes de Terror’’ que será uma antologia da V Produções com três histórias malucas ambientadas nos anos 80. É um filme que presta uma homenagem a filmes trash da época.

Ana Rosenrot: Atualmente estou me dedicando mais a literatura e ao ativismo cultural. Em 2017 criei a Revista LiteraLivre, uma publicação voltada para a divulgação de autores que escrevem em Língua Portuguesa, de todas as partes do mundo e a experiência tem sido incrível. Também estou planejando o lançamento de um e-book com as edições da Coluna CULTíssimo, no período de 2013 até 2016; continuo escrevendo novas edições da coluna, agora para a LiteraLivre e me dedicado ao meu gênero de escrita predileto: contos e poemas de terror, que pretendo divulgar um pouco mais. Claro que ainda tenho vários projetos cinematográficos, uns curtas inacabados que pretendo finalizar, convites pendentes, enfim, com certeza ainda vem muito mais por aí.

Cíntia Dutra: Projetos sempre existem, nem que seja no âmbito da imaginação. Mas estamos elaborando um novo roteiro, que ainda está em uma fase bem inicial.

Larissa Anzoategui: No final do ano passado e começo deste reuni uma galera aqui em casa para fazer uma maratona de gravações. Em duas semanas gravamos material para quatro curtas e um longa. Dessa produção tem um só pronto: “Janela da Outra”. Mas como eu e o Ramiro somos malucos, acabamos gravando outro longa agora no meio do ano. Era para ser só um curta e para ele pedimos para um artista, o Joni Lima, transformar nossa sala em uma cripta, usando papel e tinta mesmo. Quando ficou pronto ficamos tão empolgados, o Ramiro mais ainda porque estava numas piras com as obras de Byron, que resolvemos gravar mais uns curtas. E no final das contas virou um longa de antologia. Para amarrar todas as histórias gravamos uma quinta e dessa vez eu me meti a atuar também. Oremos! (risos). Este longa de antologia vai se chamar “Domina Nocturna”.

Domina Nocturna (Larissa Anzoategui).

Danilo Morales: Sim. Com previsão de lançamento para 2019. “Cemitério das Moscas II – Os 7 Pecados Capitais”. Sete diretores, cada um dirige o segmento de um pecado. (“Cemiterio das Moscas” está sendo lançado no dia 17 Agosto 2018). Filme longa metragem ainda tem meu filme “Poço Profano”, faz parte de uma dobradinha de diretores. Será gravado em preto e branco.

Diego Camelo: Estou me preparando pra rodar meu primeiro longa metragem, um documentário, mas não posso falar mais sobre por que ainda estamos na fase de pesquisa.

Lula Magalhães: No momento estou fazendo a pós-produção do filme que rodei no ano passado. Acabei de lançar um filme de bruxas chamado “O Pequeno Baú” que rolou no POE – Festival de Cinema Fantástico de São José dos Campos – SP e vai rolar no Cine Horror em Salvador – BA em outubro. Final do ano sai uma ficção científica com horror chamada “O Cavalo Marinho” e início de janeiro um filme que rodei em 2013, chamado “Incógnito”, também estará sendo lançado.

Janderson Rodrigues: No momento estou editando o curta “Povo das Sombras”, com a Lane ABC no papel mais normal dela; e fazendo a fotografia do curta “Não Vacile”, do diretor Ricardo Corsetie. Comecei a pré-produção do longa “Contos”, título provisório.

Baiestorf: Se quiser divulgar seu último filme já lançado, o espaço é seu:

Vinícius Santos: Meu último filme ‘’Steve Cicco: Missão Popoviski’’:

E esse ano ainda lançaremos ‘’Exorcistas Carinhosos’’, trailer já disponível:

Ana Rosenrot: Meus últimos filmes lançados foram “O Atalho”, que dirigi em 2017 (este filme recebeu o Troféu Corvo de Gesso e foi selecionado e exibido no 13º Cinefest Gato Preto); e também participei como produtora, diretora de arte e atriz no curta “Dia de Exorcismo” (2018), dirigido pelo Vinícius J. Santos. Deixo aqui os links do trailer do filme e também do meu site para quem quiser conhecer um pouco mais sobre o meu trabalho:

http://cultissimo.wixsite.com/anarosenrot

Larissa Anzoategui: “A Janela da Outra”. Quase um filme mudo, gravado em uma tarde, equipe muito pequena: Eu, Ramiro, Juciele Fonseca no som e a atriz, a maravilhosa Larissa Maxine. Sinopse: Quem está do outro lado da janela? O delírio, a paranoia e a fusão.

Cíntia Dutra: “Retratos” foi lançado em 2015 e felizmente foi exibido em algumas mostras.

Danilo Morales: Vou deixar o trailer do “Cemitérios das Moscas”.

Janderson Rodrigues: No momento não tenho eles disponíveis, entretanto, até o final do ano será lançado um DVD com os cinco filmes que dirigi.

Lula Magalhães: Acabo de lançar “O Pequeno Baú”, um filme de bruxas que narra uma versão da história de Lilith e de sua influência na vida de duas irmãs. O filme foi todo gravado dentro de uma garagem com fundos escuros, num esquema quase teatral.

Diego Camelo: Meu último filme foi “O Vampiro”, foi o filme que mais curti fazer e o que menos circulou, o filme já está a algum tempo disponível na internet, vejam por favor, foi feito com muito esmero. Segue o link:

Baiestorf: Obrigado pela entrevista e deixe aqui dicas para pessoal que esteja querendo fazer seu primeiro filme:

Ana Rosenrot: Eu é que agradeço pelo espaço e o apoio ao nosso trabalho e ao cinema independente. Sempre digo que o primeiro passo para fazer um filme é fazer um filme! Veja filmes (todo tipo de filmes, seja eclético), pesquise (temos muito material disponível na internet), estude (existem cursos ótimos, com bons preços e até gratuitos) e depois pegue sua câmera (de qualquer tipo) e filme o que der vontade, experimente, vá criando seus roteiros, chame os amigos, faça sozinho, mas faça, não fique a vida toda “pensando” em fazer. Não tenha medo de criar, seja paciente, não fique preso a falta de recursos, não se importe com o amadorismo, aprenda com seus erros, esteja preparado para suportar a crítica (que vai bater sem dó), insista até descobrir seu estilo, aceite que nunca agradará a todos e depois, é só deixar sua marca no mundo.

Vinícius Santos: A dica que dou pra quem está começando, ou pretende fazer seu primeiro filme, é pegar uma idéia, ou um roteiro, mesmo que simples e não pensar demais e nem inventar desculpas demais. É pegar e fazer. Não tem equipamento ou câmera? Faça com o seu celular, ou câmera emprestada, mas faça. Use o que tem na mão e sua criatividade, o importante é não desistir e fazer o que gosta!

Cíntia Dutra: Primeiramente eu que agradeço a oportunidade de divulgar o nosso trabalho, com certeza feito com muito carinho. E para o pessoal que deseja realizar seu filme, basicamente é: Vai e faz.

Janderson Rodrigues: Curtam a pagina no facebook Estrada Films. E para quem estiver fazendo seu primeiro filme, nunca desista, você só vai aprender na prática e sempre esteja preparado para escutar críticas positivas e negativas porque não existe filme ruim e sim gostos diferentes.

Diego Camelo: Eu que agradeço pelo espaço! As dicas que posso dar é estudar bastante, ver muito filme, juntar uma equipe que queira muito fazer os filmes e as suas ideias acontecerem e não desistir nunca! É isso, abraços!

Lula Magalhães: Paciência, organização, objetivismo, garra, criatividade, respeito pela equipe e um pouco de sorte são os ingredientes principais pra tocar uma produção de guerrilha.

Danilo Morales: Não desanimar. Não dar desculpas. Faça o filme com o que tiver em mãos. Um celular, uma câmera usada.  Instale um programa de edição e sempre vá se aprimorando, buscando evoluir.

Larissa Anzoategui: Não espere a equipe perfeita ou fazer tudo certinho. Acumule funções mesmo! Faça como der, mas faça da melhor forma. Procure pessoas que realmente vão se compromissar com a produção, principalmente com parcerias que ninguém vai ganhar nada de dinheiro. Pesquise e teste gambiarras para fazer uma iluminação massa!

Canal Vproduções no youtube:

https://www.youtube.com/user/EquipeVProd/featured

Site da Revista LiteraLivre:

http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre

Posters & Capas de VHS da Canibal Filmes

Posted in Cinema, Manifesto Canibal, Posters, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on maio 16, 2017 by canibuk

Infelizmente estou sem tempo algum para atualizar o blog. Mas nessa última semana estava selecionando material que irá fazer parte do livro “Canibal Filmes – Os Bastidores da Gorechanchada” e encontrei um material referente aos nossos lançamentos em VHS (que já estão disponíveis em DVD e que você pode comprar aqui na MONDO CULT):

Posters

1995- O Monstro Legume do Espaço

1996- Blerghhh1

1996- Blerghhh2

1996- Caquinha Superstar a Go-Go1

1996- Caquinha Superstar a Go-Go2

1996- Eles Comem Sua Carne1

1996- Eles Comem Sua Carne2

1996- Eles Comem Sua Carne3

1996- Eles Comem Sua Carne4_Folder

1996- Eles Comem Sua Carne4_Folder2

1997- Bondage 2 Amarre-me Gordo Escroto

1997- Chapado

1998- Sacanagens Bestiais dos Arcanjos Fálicos2

1998-Gore Gore Gays

Lombada das VHS

Lombada VHS- O Monstro Legume do Espaço (1995)

Lombada VHS- Eles Comem Sua Carne (1996)

Lombada VHS- Blerghhh (1996)

Lombada VHS- Bondage 2 Amarre-me Gordo Escroto (1997)

Lombada VHS- Raiva (2001)

Capas de VHS da Canibal Filmes:

VHS- Blerghhh (1996)

VHS- Chapado-Bondage 2 (1997)

VHS- Bondage 2 Capa 2 (1997)

VHS Bondage parte 1 - Capa 2 (1996)

VHS- Bondage parte 1 (1996)

VHS- Caquinha Superstar a Go-Go (1996)

VHS- Eles Comem Sua Carne (1996)

VHS- Festival Psicotrônico Vol 1 (1999)

VHS- Minimalismo Surreal Vol 1 (2002)

VHS- O Monstro Legume do Espaço (1995)

VHS- Raiva (2001)

VHS- Sacanagens Bestiais dos Arcanjos Fálicos

VHS- Zombio (1999)

Petter e poster GGG

Diário Etílico das Filmagens do longa Blerghhh!!!

Posted in Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 15, 2011 by canibuk

Coffin Souza enviou um e-mail nesta semana me alertando que nosso filme “Blerghhh!!!” (1996) estava com suas filmagens completando os 15 aninhos. Lembrou disso porque viu notícia dos 15 anos da morte de Renato Russo e lembrou que ele havia falecido enquanto a gente estava filmando o “Blerghhh!!!”, onde quase todos os atores e equipe-técnica ficaram ofendidos conosco porque ficamos fazendo piadinhas de humor negro envolvendo a morte do Russo. Depois deste e-mail dele procurei um diário da produção que eu sabia ter escrito durante as filmagens e que vou publicar aqui algumas partes dele (prá ver na íntegra, só quando sair o livro com a história da Canibal Filmes). Este filme foi feito na época com 2 mil reais que o Coffin Souza tinha na mão, ficamos uns 11 dias filmando sem interferências, com uma equipe que envolvia umas 25 pessoas (não lembro o número total) e o resultado do filme foi prejudicado pela edição ruim que eu (Petter Baiestorf) e Coffin Souza fizemos (coisa que consertei em 2008 com ajuda do Gurcius Gewdner, quando re-editamos o “Blerghhh!!!” com nova trilha sonora e que ficou bem como eu queria – menos o som direto que é aquela merda do padrão Canibal Filmes de sempre). Segue algumas partes do diário etílico das filmagens do “Blerghhh!!!” que aconteceram entre os dias 03 à 15 de outubro de 1996:

Dia 04 (de outubro de 1996), Sexta-feira:

O dia estava ótimo. Coffin Souza (o produtor/maquiador/ator) e eu (diretor de fotografia/roteirista/co-produtor/diretor), acompanhados de Claudio Baiestorf (assistente de produção/armeiro), chegamos ao set de filmagens de nosso novo longa-metragem (reduzido a média-metragem na re-edição de 2008), desta vez sutilmente intitulado “Blerghhh!!!”, onde Marcos Braun (ator e assistente de direção) e Zé (ator e produtor associado) , ambos bem a vontade, já com praticamente tudo organizado e com o restante do pessoal já acomodado. Aproveitamos o dia para preparar detalhes do cenário (coisa pouca que faltava arrumar) e deixar o equipamento já a mão, pronto para começar a rodar as cenas noturnas. Todos estavam alegres e otimistas. Nada parecia que ia dar errado.

As 2o horas iniciamos as filmagens. Logo em seguida Denise V. sentiu-se mal (provavelmente devido a longa viagem até Canibal City e o nervosismo, já que era sua primeira produção e estava no meio de um monte de caras estranhos e debochados). Resolvo filmar o ataque policial com os atores Loures Jahnke (que interpretou em 1995 o Monstro Legume) e Airton Bratz (mais conhecido por ter interpretado, anos depois, o Chibamar Bronx no, também meu, longa “Raiva”, uma produção de 2000, lançada em 2001) à casa de um traficante fodão (minha ponta neste filme). Na cena inicial rolava um tiroteio entre o traficante e os policiais e todos os tiros das armas – que já estavam prontos – falharam. Perdemos muito tempo resolvendo o imprevisto e quando os tiros funcionaram, eu acertei um tiro (com pólvora seca) no estômago de Coffin Souza que fazia a câmera em meu lugar. O tiro furou a camiseta de Souza e queimou sua barriga, passado o susto, equipe-técnica estourou numa sessão de risos intermináveis, com um mal humorado Coffin Souza reclamando do acidente. Lá pelas 03 da madrugada tínhamos as 3 primeiras seqüências finalizadas, com toda a introdução do filme resolvida.

Neste instante sou informado que o ator E.B. Toniolli (que possuia um dos papéis principais) não havia chegado, pois estava  num hospital sofrendo uma lavagem estomacal devido a um porre de uisque que havia tomado naquele dia. Reunimos a produção para uma reunião rápida para decidir o que fazer. Optou-se por colocar Loures Jahnke, com visual diferente do policial que ele acabara de interpretar, no lugar de Toniolli. Só que a esposa (hoje ex-esposa) de Loures, que estava junto acompanhando as filmagens, não gostou muito da idéia de ter ele preso ao filme durante quase duas semanas e armou uma confusão. Ao mesmo tempo sou informado que o ator teatral David Camargo, completamente bêbado no set de filmagens principal (que servia de set e dormitório à boa parte da equipe), gritava enfurecdo algo como: “Onde está aquele atorzinho anti-profissional!!!”, referindo-se ao Toniolli que ele ainda nem conhecia. David Camargo era nossa grande estrela importada do Rio Grande do Sul, já tinha trabalhado nos anos 70 com Teixeirinha e era uma lenda do super-oito e teatro porto alegrense.

A produção resolve encerrar as filmagens de noite inaugural tão conturbada e ir encher a cara com um sucolento churrasco (eu ainda não era vegetariano nesta época) oferecido por Marcos Braun que naquele dia estava completando 23 anos. Acalmamos o David com comida e mais bebida, até fazê-lo desmaiar de bêbado e encerrar seus resmungos contra o amadorismo de nossa produção!

capa do roteiro.

Dia 05 (de outubro de 1996), Sábado:

Cansados, sujos, fedidos e sem uisque, nos deslocamos ao restaurante do Jorjão (que naquela época pertencia ao ator/produtor Jorge Timm) onde estava todo o restante da equipe hospedada (o restaurante era em anexo à um hotel), na esperança de um café, banho e um dia calmo de gravações. Porém, como desgraça pouca é bobagem, repentinamente o céu escureceu, acompanhado de ventos fortes, trovões e raios e uma tempestade violenta começava a se formar no horizonte, vindo em nossa direção. Numa velocidade alucinante, retornamos os 2 quilometros que separavam o set do restaurante na ânsia de salvar o equipamento técnico (várias iluminações, figurinos que estavam numa barraca de lona, objetos de cena ainda empilhados do lado de fora do set, entre outras coisas) da fúria da natureza. Resultado: tomamos banho sim… de chuva e comemos… poeira com vento! Realmente um belo dia se iniciava!

As 10 da manhã, conversando com meu assistente de direção, resolvi o problema do papel que seria interpretado pelo Toniolli. Trocamos Toniolli pelo ótimo e sempre disponível Marcos Braun (que topou assumir o papel desde que ele tivesse o mínimo de diálogos possível, queria interpretar a personagem quase sem dizer diálogo nenhum, o que se revelou uma escolha acertada no decorrer das filmagens). E começamos a rodar várias cenas internas enfocando os terroristas, finalmente estávamos trabalhando a todo vapor. Lá fora uma chuva forte castigava tudo sem dó nem piedade.

Anoitece e, sob uma fina chuva de verão (com câmera e iluminação portátil protegidas por pedaços de lonas), filmamos algumas cenas externas onde os terroristas seqüestram Sid (interpretado pelo Zé) e sua parceira Naja (interpretada pela Denise). Resolvo filmar, também, várias seqüências noturnas com David Camargo, um excelente ator mas que incomodava demais, para dispensá-lo em viagem de retorno à Porto Alegre/RS no dia seguinte. Meu plano foi meio maligno, filmei todos os closes dele, todos os diálogos da personagem dele (o velho nojento que no filme fica teorizando sobre caganeira e hemorróidas, aliás, fui o primeiro diretor a colocar diálogos escatológicos na boca de David Camargo) e deixei prá trás cenas gerais onde aparecia partes do corpo dele, ele de costas, etc (porque Marcos Braun tinha a mesma altura e físico dele e filmei todas esses takes nos dias seguintes com o Braun de dublê de corpo, sem David enchendo o saco no set).

As 3 da madrugada dispensei os atores e a equipe-técnica (para que dormissem e estivessem bem logo cedo) e fiquei com Coffin Souza, Madame X e Onésia Liotto para filmar algumas seqüências do média-metragem experimental sobre drogas, intitulado “Chapado”, que estávamos filmando em paralelo ao “Blerghhh!!!”.

diretores do média "Chapado".

Dia 06 (de outubro de 1996), Domingo:

Depois de ter dormido uma hora, me levanto e acordo o pessoal que participaria da primeira seqüência do dia. Eram 7 horas da manhã, pessoal parecia abatido. Caféééé, cadê a porra do caféééé???… Logo cedo Toniolli, melhor de saúde, já tinha aparecido no set e informei ele que tivemos que fazer algumas mudanças no elenco para não perder tempo nas filmagens. Como as duas seqüências que íamos filmar no dia eram fáceis, com Toniolli e Onésia namorando na beira do rio Uruguai, passei a direção das cenas para Coffin Souza e fui prá minha barraca onde peguei uma garrafa de uisque (muito uisque) e bebi generosos goles e fui ficando muito doido, tendo alucinações etílicas toda manhã, portanto não tenho como dar detalhes mais precisos sobre as cenas filmadas. Só posso afirmar que desde aquele dia, nunca mais fiz isso novamente (sair do ar durante as filmagens) porque não gostei do resultado final das cenas dirigidas pelo Coffin Souza (aliás, hoje em dia não gosto mais nem de gente bebendo nas minhas produções).

Depois de um almoço no restaurante do Jorjão, já ao anoitecer, filmamos a engraçada morte da personagem feita pelo Toniolli (na troca de papéis, Toniolli acabou com uma personagem que aparece só prá morrer), que na idéia toda do roteiro, era prá ser uma morte bem violenta e gratuita. Ficou ótima, com pedaços de orelha e cérebro cinematográfico jorrando contra a câmera. Na filmagem desta seqüência levei um tombo com a câmera na mão, porque um dos técnicos não retirou um fio de cerca que havia no local, entre meio a grama alta, escondido, verdadeira armadilha aos desavisados. O visor da câmera ficou torto, mas conseguimos consertar.

As 20 horas começamos a filmar as cenas de torturas com a personagem da Denise. Na equipe-técnica ficou apenas eu, Marcos Braun fazendo a iluminação, Carli Bortolanza (maquiador assistente nesta produção, que foi sua primeira trabalhando nesta função), Claudio Baiestorf, Jorge Timm e a Andréia na continuidade. Coffin Souza, já caracterizado como a personagem Rumba, é quem tortura a menina. Como a Canibal Filmes é uma empresa produtora de sexploitations, muitos closes nos peitos da atriz neste momento para a alegria dos fãs de nossos filmes. Paralelo às filmagens de “Blerghhh!!!”, faço também algumas cenas de um projeto intitulado “Bondage” (um filme de arte erótico dedicado inteiramente às pessoas que gostam de ver as outras amarradas/amordaçadas, cuja segunda parte filmamos em 1997, sendo lançada em 1998).

Terminada as filmagens, dispenso o pessoal e, junto de Coffin Souza, sentamos prá um uisque sem gelo e refazer o plano de filmagens do dia seguinte. Domingão foi um dia cansativo. Minha chapadeira do começo do dia, não ter dormido quase nada e filmagens noturnas demoradas, estavam quase me derrubando.

bondage no Blerghhh!!!

Dia 07 (de outubro de 1996), Segunda-feira:

Neste dia acordamos um pouco mais tarde e filmamos várias seqüências sem muita importância. Vários closes, takes que ficaram prá trás, gerais do cenário, algumas cenas de segunda unidade, etc…

Ao anoitecer resolvemos fazer um churrasco regado a muita bebida, como cerveja e o já tradicional uisque e prá acompanhar umas caipirinhas. Todo mundo fica meio bêbado e apaga (a canseira física estava pegando todo mundo, eu mesmo ainda não tinha tomado um banho decente desde que as filmagens tinham começado).

eu re-escrevendo o roteiro numa das pausas nas filmagens.

Dia 08 (de outubro de 1996), Terça-feira):

Depois de dormirmos a manhã toda, Zé, Coffin Souza e eu começamos a preparar tudo para a seqüência mais importante do filme, que é quando Sid perde sua cabeça (a cabeça animatrônica que usamos nesta produção foi construida pelo técnico em efeitos especiais Júlio Freitas). Serramos árvores, cavamos buracos (para esconder o corpo de Zé para as cenas da cabeça decepada conversando com seu corpo), colocamos a iluminação, ensaiamos, acertamos diálogos, bebeu-se mais uisque, cachaça e trabalhou-se muito (era triste ver os 3 gordos fazendo aqueles serviços braçais). Marcos Braun, Claudio Baiestorf e Airton Bratz (assistentes) fizeram muita falta, mas naquela terça eles não estavam disponíveis para a produção porque o orçamento não permitia.

O tempo ameaçava chover. Iniciamos as filmagens da cena às 19 horas, que era complicada de ser feita, com a equipe inteira (agora já com os assistentes integrados à equipe) nervosa. Vários takes são repetidos a exaustão, para o pânico dos atores, todos já cansados (quando você está realizando um filme amador, esse negócio de repetir demais uma cena irrita os atores). Mas, em apenas umas 5 horas de trabalho, conseguimos concluir a cena inteira, que depois de editada ficou razoávelmente gore e violenta-engraçada, o que era o intuíto.

Rapidamente iniciamos outra cena complicada com o personagem do Zé, porém fomos impedidos de termina-la por causa da chuva que desabou sobre nós. Recolhemos o equipamento e esperamos um pouco prá ver se a chuva parava. Nada feito. Suspendi o resto das filmagens por aquela noite e Coffin Souza e eu vamos ao monitor assistir as cenas capturadas. Aplausos, tudo, de iluminação à interpretações, havia ficado muito bom. Parte do pessoal foi dormir e outra parte ficou bebendo e jogando conversa fora. Finalizamos essa cena uns dias depois.

Júlio Freitas tirando molde da cabeça de Zé.

Dia 09 (de outubro de 1996), Quarta-feira:

Acordo e percebo que a chuva vai continuar caindo sem parar. Dispenso o pessoal de seus afazeres (não tínhamos atores o suficiente para rodar as cenas internas), folga merecida à todos, e passo o dia dormindo porque ninguém é de ferro.

Perto do anoitecer o tédio por não estarmos fazendo nada começa a bater, então chamo Coffin Souza e bolamos o curta-metragem “Ácido”, que filmamos em umas 2 horinhas dentro de um dos quartos do set principal. Acreditem, aquelas cenas lisérgicas do “Ácido” são imagens distorcidas e com suas cores vazadas, que filmamos de bobeira neste dia.

Desconheço o que o resto da equipe fez neste dia.

Dia 10 (de outubro de 1996), Quinta-feira:

Logo cedo, Onésia e Madame X voltam ao set (elas tinham sido dispensadas no domingo), ambas empolgadíssimas, o que levanta o astral de todos. Na primeira hora da tarde iniciamos as filmagens onde Onésia espancava violentamente a personagem Bruce, vivido pelo Braun. Vários takes são repetidos, pois Onésia estava batendo fraco demais em seu algoz com medo de machuca-lo. Ao editar conseguimos impôr mais violência à cena.

Ao anoitecer a chuva recomeça. A equipe técnica fica de prontidão e assim que a chuva acalmasse iríamos fazer algumas cenas externas com Onésia. Prá ganhar tempo resolvo filmar uma cena onde Madame X transava com Rumba moribundo. Tudo sai muito bem feito, principalmente o take onde vários litros de sangue respingam em close sobre os seios de Madame X, criando uma cena ótima para o teaser do filme.

Para não perder nada da empolgação do pessoal, resolvemos rodar algumas seqüências  com o Jorge Timm, big-ator que já chamou atenção de renomados diretores brasileiros como Ivan Cardoso e Carlos Reichenbach (uma pena nenhum dos dois ter filmado algo com o Timm). Terminada as filmagens com o Timm, encerramos as atividades por aquela noite. Foi tudo lindo e tranqüilo, como todos os dias num set devem ser (em teoria).

Jorge Timm e Ivan Cardoso.

Dia 11 (de outubro de 1996), Sexta-feira:

Neste dia não filmaríamos nada relacionado ao “Blerghhh!!!”, pois estávamos aguardando o pessoal da banda Necrotério (banda de death metal de Curitiba/PR) para gravar um vídeo-clip com eles (seguindo o exemplo do polêmico clip “Speech” que fiz para a banda Zero Vision e que foi censurado pela gravadora Roadrunner e pela MTV).

As 11 da manhã acordo e já dou de cara com o vocalista e o baixista da banda (os outros dois integrantes da banda haviam ido conhecer os “banheiros” naturais da mata verdejante que nos cercava). Batemos um breve papo sobre a produção do vídeo-clip e vamos almoçar um lanche com café e pequenas doses de pinga.

As 14 horas começamos a filmar os primeiros takes do clip. Problemas com a iluminação fazem com que Coffin Souza e Loures Jahnke (aquela altura já agregado à produção do filme, para desespero de sua ex-esposa) tenham que ir até Palmitos (distante 20 quilometros da Canibal City) comprar novas lâmpadas. Ao mesmo tempo, racho minha cabeça num pedaço de pau pontudo, transformando minha face num grande rio de sangue. Pessoas desmaiam ao ver o sangue verdadeiro, histeria, gritos de pavor, almoços voltam em jorros de bílis em câmera lenta. Por um segundo o universo todo para em uma eternidade de miléssimos de segundo. No ar ecoam batidas lentas de corações, um grilo se cala, sapos arregalam seus olhos, pavor, pavor, medo e desespero. Mas grito: “Estou bem!” e tudo volta a normalidade de sua insignificância cósmica. Tão logo retornam com a iluminação arrumada, voltamos às filmagens do clip. Devido a empolgação de alguns membros da banda (não devíamos ter dado uisque aos meninos), atrassa-se alguns takes internos.

Durante as filmagens do clip, chegam ao set o diretor/desenhista Rogério Baldino (“Fatman & Robada”, 1997) e o ator/historiador de cinema Marcelo Severo (que está no elenco de “O Monstro Legume do Espaço”, 1995, e “Eles Comem Sua Carne”, 1996, ambos dirigidos por mim). Os dois muito bem a vontade e integrados com a equipe, já bebericando sua parte alcoólica.

Anoitece, sem pausa pro café, começo a fazer os takes, em cenário interno, do clip. São vários takes cansativos à todos os envolvidos. às 21 horas, enquanto Coffin Souza maquiava Rogério Baldino para uma ponta no clip como um cadáver do IML, eu e todo restante da Canibal Filmes ficamos tentando convencer os meninos da banda de que iria ficar muito bom sangue respingando contra o corpo deles, afinal, uma banda de death metal com toques de splatter precisa ter este clichê no currículo. Conseguimos convence-los. Coffin Souza e Carli Bortolanza, com suas seringas cheias de sangue falso, faziam jorrar o líquido vermelho em doses generosas contra a banda, promovendo uma sangueira muito divertida.

Concluída as filmagens do vídeo-clip, maioria do pessoal se retira pro Hotel para um merecido banho. E eu vou cuidar do meu corte na cabeça, lavo bem, passo algo contra infecção e esqueço da porra do corte!

gravando clip da banda Necrotério.

Dia 12 (de outubro de 1996), Sábado:

Um dia agitado estava por vir, segundo nosso plano de filmagens. Levanto-me cedo e já as 8 da manhã, junto de Coffin Souza, Braun, Bortolanza e Claudio Baiestorf, rodamos várias seqüências de segunda unidade. Ceninhas sem grande importância mas que precisavam ser feitas em algum momento.

Depois do almoço (somente eu, Zé, Claudio, Souza e o Timm) no restaurante do Jorjão para uma reunião da produção, percebemos uma nova tempestade se aproximando. Uma respirada funda e vamos lá!

Voltamos ao set principal e filmamos várias cenas internas entre Madame X, Andréia e Jorge Timm (eram cenas noturnas, mas tapamos as janelas da casa com cobertores negros e o dia virou noite). Fazer filme vagabundo é brincar de deus.

Às 17 horas, depois de colocarmos uma lona sobre a câmera e a iluminação, fomos filmar uma cena externa onde era a vez de Denise espancar o infeliz personagem de Marcos Braun (que passa o filme todo apanhando de todas as personagens femininas da história). Os tapas ficam tão realistas que num deles, em especial mais forte do que os anteriores, Braun realmente caí no chão e fica resmugando mal humorado e não querendo continuar suas cenas com ela (dou razão prá ele, mas no dia a gente tinha que filmar o máximo possível, então converso com ele e finalizamos rapidamente a seqüência).

Logo que escureceu, aproveitando que a chuva finalmente fez uma pausa, filmamos cenas noturnas externas entre meio ao lôdo e umidade angustiantes. Numa cena onde Onésia mata uma personagem, sangue respinga forte e denso contra a câmera principal. Delícia. Em seguida rodamos outra cena ultra-gore onde a personagem do Zé mutila a personagem do Jorge Timm e novo jato de sangue respinga contra a câmera principal. Duas vezes em menos de uma hora? Isso quer dizer alguma coisa. E queria dizer sim: Logo em seguida, ainda fazendo takes para essa cena do Timm sendo mutilado, quase perdemos Marcos Braun que, ao segurar uma iluminação, recebeu uma violenta descarga elétrica, jogando-o ao chão e fazendo a iluminação explodir. Passado o susto, finalizamos rapidamente as filmagens da mutilação do Jorge Timm.

Pausa para tentar consertar a iluminação que explodiu e para beber um cafézinho.

Começamos a rodar as cenas ultra-gores finais (possivelmente, até 1996, as mais violentas e sangrentas já rodadas numa produção nacional). Eram cenas díficeis de serem ordenadas devido ao pouco espaço da sala escolhida para filmar essa cena. Take após take, Zé era metamorfoseado numa maquiagem gore pesada, demorada de ser feita, com Coffin Souza e Bortolanza trabalhando duro para garantir o exagero sanguinolento que eu queria. As meninas em cena e o Zé demonstravam cansaço, mas tiravam forças de sua fé no cinema de baixo orçamento para continuar até eu dizer que estava bom. Eu mesmo não enchergava quase nada no monitor da filmadora devido ao grande cansaço nos olhos, afinal, eu já estavam com meus olhos enfiados naquele monitor a mais de uma semana. Muito café esquentava o ânimo de todos.

Lá pelas 3 da madrugada uma parte da equipe vai dormir, pois já não estavam mais aguentando. Mas apesar do cansaço e eventuais crises de mau-humor, tudo corria maravilhosamente bem. As meninas tomavam seus banhos de sangue com dedicação e as cenas capturadas eram lindas. Nesta altura, Jorge Timm roncava alto, mas muito alto mesmo. Como usamos o som direto, a cada novo take alguém tinha que acordá-lo para fazer com que parasse de roncar. Era hilário na verdade.

Depois de uma pequena pausa para novas doses de café, jogamos vísceras reais de porco sobre o Zé que só reclamava do cheiro insuportável de podridão que impregnou o set. Já que ele tava irritado mesmo, neste momento resolvemos clicar várias fotos dos efeitos, para somente depois filmar os takes restantes da cena. Lá fora os pássaros acordavam animados cantando doces melôdias, já era manhã de domingo, olho num relógio e constato que são 8 horas. Havíamos terminado as filmagens de um novo longa-metragem, ninguém comemora, todos queríamos desmaiar em qualquer lugar.

Jorge Timm dando uma dormidinha.

Dia 13 (de outubro de 1996), Domingo:

Acordo ao meio dia para almoçar (restaurante do Jorjão já tinha providenciado um almoço de primeira) e encher a cara de cachaça com muita dedicação e sem nenhum outro compromisso. E com a boa sensação de dever comprido!

Pessoal da equipe e atores começavam a recolher seus pertences pessoais, motoristas da produção começavam a levar as pessoas embora, uma tristeza começava a se esboçar no ar. Cara sofre filmando, mas quando tudo acaba fica um vazio e a sensação de quero mais, sempre mais!

Jorge Timm travestido de Thor Johnson zuando em Gramado, 1997.

Pós-lançamento do Blerghhh!!!

(final de 1996 até final do primeiro semestre de 1997):

Coffin Souza e eu não conseguimos, na época, o dinheiro necessário para editar o filme em equipamento profissional (em 1996 ainda não existiam programas de edição nos computadores pessoais) e fizemos a burrada de edita-lo no nosso equipamento inferior. Nossa ilha de edição era de vídeo prá vídeo com umas placas de créditos e efeitos de transição acopladas. O resultado foi uma montagem que eu passei mais de 10 anos de minha vida odiando, porque eu sabia que este filme com uma edição bem feita teria sido bem recebido. Lançamos o filme ainda no final de 1996 em VHS e conseguimos a exibição dele em alguns festivais independentes sem grandes alardes. Por incrível que pareça, a edição vagabunda, aliada as cenas de nudez e gore intenso, foram uma espécie de empecilho nas exibições. “Blerghhh!!!” ficou restrito à exibições em shows de bandas gore grind.

Em 2008, pós Gurcius Gewdner editar vários filmes meus (“Palhaço Triste”, “Arrombada”, “Que Buceta do Caralho, Pobre só se Fode!!”, “Manifesto Canibal – O Filme” e “Vadias do Sexo Sangrento”), surgiu a idéia da gente re-editar o “Blerghhh!!!” e o resultado ficou lindo. Re-lançamos a versão média-metragem dele em double feature com o “Vadias do Sexo Sangrento” (2008) e finalmente as pessoas puderam curtir ele com um corte decente. Prá dar uma idéia: “Blerghhh!!!” (original, editado de vídeo prá vídeo) tinha 69 minutos e a versão re-editada ficou com meros 42 minutos e ainda contava com uma cena inédita a mais. Edição é tudo!!!

“Blerghhh!!!” (1996, 69 min./2008, 42 min.), Escrito e dirigido por Petter Baiestorf. Produzido por Coffin Souza e Petter Baiestorf. Produtor Associado: Zé. Assistente de produção: Marcos Braun, Jorge Timm e Claudio Baiestorf. Direção de Fotografia de Petter Baiestorf. Edição em 1996 de Petter Baiestorf e Coffin Souza. Edição em 2008 de Gurcius Gewdner. Maquiagens gores de Coffin Souza e Carli Bortoanza. Efeitos mecânicos de Júlio Freitas. Com: Zé, Madame X, Onésia Liotto, Denise V., Andréia, Marcos Braun, Coffin Souza, David Camargo, Jorge Timm, Loures Jahnke, Airton Bratz, E.B. Toniolli e Petter Baiestorf.

Sessão “A Vingança dos Filmes B”

Posted in Vídeo Independente with tags , , , , , , , , on junho 26, 2011 by canibuk

Dia 02 de julho, paralelo ao FantasPoa de Porto Alegre/RS, rola um evento imperdível na sala de cinema P.F. Gastal às 17 horas com a exibição de 5 filmes independentes de diretores Gaúchos, Paulistas e até esse Catarina que vos escreve.

Segue texto da curadoria da Sessão:

“Sobrevivendo às margens do cinema mainstream, as produções independentes de baixo orçamento, além das óbvias dificuldades financeiras de realização, sempre lutaram contra um sistema de distribuição dominado por monopólios, e por vezes com a incompreensão de um público acostumado a uma estética cinematográfica culturalmente imposta pelos grandes estúdios. Durante anos a falta de um mercado exibidor adequado ocasionou o isolamento destas produções em guetos cinéfilos, o que invés de enfraquecer, auxiliou a reforçar o seu caráter de independência, fomentando uma espécie de cinema orgânico, criativo e livre de amarras impostas pelos padrões mercadológicos, possibilitando tanto a experimentação anárquica como a reprodução antropofágica de conceitos tradicionais do cinema de gênero. Na última década a ascensão das mídias digitais possibilitou o acesso facilitado aos meios de produção e exibição, dando maior visibilidade a obras que até poucos anos atrás estariam restritas a um pequeno grupo de cinéfilos.

Esta breve mostra intenciona levar para a tela da Sala P.F. Gastal um grupo de realizadores que ainda luta bravamente por seu espaço no mercado exibidor, ou simplesmente busca encontrar o seu público. Apesar dos diferentes formatos de linguagem, proposta e produção, as obras selecionadas têm em comum, além do baixo (ou zero) orçamento, o diálogo franco e apaixonado com o cinema de gênero, seja investindo no thriller policial ou no horror, ou anarquizando com a tradição dos westerns e dos musicais, ou até mesmo captando uma simples conversa entre dois cinéfilos embriagados. A exibição na tela de um cinema é uma pequena vingança dos filmes B contra um sistema atrelado aos vícios mercadológicos e estéticos da indústria cultural, ou como diria Petter Baiestorf “um grito de guerra dos que nada tem e tudo fazem, contra os que tudo tem e nada fazem”.

Sala P.F. Gastal (3° andar da Usina do Gasômetro), sábado, 02 de julho, 17h. Após a sessão debate com os realizadores, Petter Baiestorf, Felipe Guerra, Joel Caetano, Filipe Ferreira e Gustavo Insekto. O debate será moderado pela Profa. Dra. Laura Cánepa (UAM).  ENTRADA FRANCA.

(Cristian Verardi- Curadoria)

"Estranha" (Joel Caetano).

Programação:

Exorcistas (RS, Brasil, 2011, 7 minutos) de Luis Gustavo “Insekto” Vargas. Com Doutor Insekto e Paulo “Blob” Teixeira.

Dois amigos em uma noite de tédio, bebem, fumam, e elaboram teorias sobre o filme “O Exorcista”, de William Friedkin.

"Exorcistas" (Insekto).

Extrema Unção (RS, Brasil, 2010, 19 minutos) de Felipe Guerra. Com Rodrigo M. Guerra, Oldina Cerutti do Monte, Leandro Facchini.

Um incauto rapaz se muda para uma casa supostamente assombrada pelo fantasma de uma velha fanática religiosa. (Menção Honrosa “Melhor Susto de Velhinha Fantasma”, no Cinefantasy 2010).

"Extrema Unção" (Felipe Guerra).

Estranha (SP, Brasil, 2011, 12 minutos) de Joel Caetano. Com Mariana Zani, Kika Oliveira, Roberta Rodrigues, Tiago F. Galvão, Walderrama dos Santos.

 Duas mulheres em uma estranha e sensual trama de amor, vingança, violência e psicodelia! (Novo trabalho do paulista Joel Caetano, do premiadíssimo curta-metragem “Gato”).

"Estranha" (Joel Caetano).

Ninguém Deve Morrer (SC, Brasil, 2009, 30 minutos) de Petter Baiestorf. Com Gurcius Gewdner, Lane ABC, Daniel Villa Verde, Jorge Timm, Ljana Carrion, Coffin Souza, Insekto.

Um western musical. Eles cantam, dançam e as vezes matam também! O pistoleiro Ninguém decide largar tudo o que sempre considerou importante: a mulher amada, o grupo de amigos cineastas-assassinos-de- aluguel, e o boi de estimação. No entanto, antes de se redimir precisará enfrentar a fúria de seus antigos comparsas. Mais uma insanidade cinemática de Petter Baiestorf, um dos maiores mitos do underground brasileiro. (Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Montagem no I Guaru Fantástico).

"Ninguém Deve Morrer" (Petter Baiestorf).

Os Batedores (RS, Brasil, 2008, 20 minutos) de Filipe Ferreira. Com Marco Soriano Jr., João França, Jack Gerchmann, Artur José Pinto, Jefferson Rachewsky.

Raul, um habilidoso batedor de carteiras é surpreendido pelo retorno à ativa de Amadeu Deodato, um figurão que domina o submundo da cidade e com o qual o tem uma grande dívida. Em sua trajetória na busca de dinheiro para saldar a dívida, Raul se depara com outros marginais, como Odilon, seu antigo mentor, Marcião, um perigoso travesti agiota, e Tosco, um brutamonte psicótico. (Melhor direção no I Festival de Cinema de Ribeirão Pires).

"Os Batedores" (Filipe Ferreira).

Estranha: Um Curta-Metragem de Baixo-Orçamento e Alta Criatividade

Posted in Vídeo Independente with tags , , , , , , , on junho 17, 2011 by canibuk

“Estranha” (2011, 12 minutos) de Joel Caetano. Com: Mariana Zani, Kika de Oliveira e Walderrama dos Santos.

“Estranha” começa com duas mulheres se conhecendo na cozinha de uma casa enquanto esperam por um homem. A Primeira mulher (Mariana Zani) é a namorada do homem esperado (Walderrama dos Santos) e fala com uma alegria contagiante sobre seus planos de ter um filho e o quanto se sente feliz com aquele homem ao seu lado. A segunda mulher (Kika de Oliveira), a irmã do homem esperado que parece sempre nervosa e estranha, desaprova todos os planos do jovem casal com seu olhar de indignação a cada nova frase que escuta.

É assim que Joel Caetano inicia seu curta “Estranha”, estrelado por Mariana, sua esposa (na vida real) e parceira de longa data nas produções, e pelos atores Kika de Oliveira e Walderrama dos Santos, que formavam o casal de apaixonados em luta contra zumbis no cult “Mangue Negro” (2008) de Rodrigo Aragão (Aliás, Joel Caetano, Kika e Walderrama foram meus colegas de elenco na super-produção independente “A Noite do Chupacabras” (2011), novo filme de Rodrigo Aragão que estréia dia 01 de julho em Porto Alegre/RS na abertura do FantasPoa). Neste curta “Estranha”, Joel conseguiu construir um filmaço de suspense-gore que tem sua força na simplicidade do roteiro e nas boas interpretações do elenco, principalmente de Mariana e Kika que dão veracidade às suas personagens. O clima conseguido por Joel neste curta me lembrou o fantástico filme francês “L’Intérieur” (“A Invasora”, 2007) de Alexandre Bustillo e Julien Maury. O cinema independente brasileiro estava precisando de um filmaço neste estilo e agora temos!

Falar mais da trama (além da breve descrição no primeiro parágrafo) é desnecessário. Esposa e irmã, ambas estranhas (cada uma ao seu modo), esperam pelo homem (que é um cafajeste total, Joel revela em uma ceninha rápida, mas importante prá história, que ele está num motel comendo outra menina enquanto as duas esperam por ele). E durante a espera nós, espectadores, vamos tendo importantes revelações que acabam em violência explícita delirante muito bem executada e captada pelas lentes de Joel. As maquiagens do filme estão sangrentas (a face arrancada de uma das atrizes é soberba), a iluminação correta e a edição extremamente dinãmica e bem realizada. Tudo isso torna este curta do Joel, produzido praticamente sem grana alguma, um filme referência para jovens cineastas que acham que um filme barato não pode ser sério. Aliás, os cineastas independentes estão com tudo neste ano de 2011, já pude conferir três grandes obras geradas neste primeiro semestre do ano: O longa “A Noite do Chupacabras” (de Rodrigo aragão), “Ivan” (de Fernando Rick) e “Estranha” (de Joel Caetano). E confesso aqui que estou ansioso pelo longa “Viatti Arrabbiati” que Gurcius Gewdner deverá lançar no segundo semestre deste ano.

Joel Caetano começou fazendo filmes na faculdade em 2001. O primeiro filme dele que me chamou atenção foi o divertido “Minha Esposa é um Zumbi” (2006) e desde então tento acompanhar a carreira dele (e como o Brasil do cinema independente é maravilhoso, acabei conhecendo o Joel Caetano nos sets do longa “A Noite do Chupacabras” onde pude constatar o profissionalismo com que ele encara o mundo do cinema, gosto de trabalhar com gente assim, que respira cinema e torna o cinema a coisa mais importante de suas vidas). Em 2009 Joel lançou o premiadíssimo curta-metragem “O Gato” que também recomendo à todos uma conferida!

“Estranha”, por enquanto, segue inédito em DVD  (mas já está rolando em alguns festivais, já foi exibido em São Paulo na terceira edição da Mostra de Cinema de Bordas). Gaúchos da Capital poderão apreciá-lo dia 02 de julho, às 17 horas, na sala P.F. Gastal (Usina do Gasômetro). Joel Caetano está preparando um box com todos seus filmes que será um lançamento imperdível!!!

Aguardo ansioso pela próxima produção de Joel Caetano, não percam este diretor de vista!!!

Fernando Rick: Jesus Mendigo, Michael Jackson e o Cinema Biriteiro

Posted in Cinema, Entrevista, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , on maio 18, 2011 by canibuk

Faz 10 anos que o Fernando Rick está em franca evolução com sua obra cinematográfica e resolvi entrevista-lo. Fernando diz que foi influênciado (para começar a fazer filmes) principalmente pela Troma e pelos meus filmes, não é o melhor modo de começar a fazer filmes mas ele provou com seu trabalho que até mesmo os bêbados malditos evoluem na sua arte. E como evoluí, seu “Guidable – A Verdadeira História do Ratos de Porão” e, principalmente, seu novo curta-metragem “Ivan”, estão profissionais e continuam peças divertidíssimas do cinema underground brasileiro. Fernando fala na entrevista que gostaria de conhecer outra pessoa que tenha gostado do seu novo curta, bem, já encontrou, fiquei de quatro diante do filmaço, mostra um artista amadurecido em sua arte. Conheço o cinema de Fernando Rick desde quando ele lançou o tosco “Rubão – O Canibal” e virei fã na hora, na época fiquei extremamente feliz porque finalmente surgia alguém no Brasil fazendo filmes na linha dos meus (tanto ele quanto eu fomos/somos influênciados pela Troma) e, na minha cabeça de produtor independente alucinado, já começava a ver um mercado alternativo de cultura gore se esboçando na minha frente. Delírios de uma mente que alucina!!!

eu e Fernando Rick em 2007

Sem mais delongas, segue uma ultra entrevista com o Fernando Rick:

Baiestorf: Como você acabou dirigindo filmes? O que tu fazia antes? Conte como foi isso!

Fernando Rick: Como a maioria dos que se envolvem nisso, eu colecionava filmes, era aficcionado por filmes de terror e filmes violentos. Tinha uma coleção enorme, na época era VHS, vivia comprando e trocando fitas, filme alemão de necrofilia sem legenda em português, filme japonês simulando Snuff sem legenda nem em inglês e por ai vai… Era fanático por Lucio Fulci, Dario Argento, Takashi Miike, Jorg Buttgereit, mas os meus favoritos sempre foram a trilogia Evil Dead (devo ter umas 3 ou 4 tatuagens desse filme espalhadas pelo corpo) e os primeiros filmes do Petter Jackson. Minha vontade de fazer algo começou ai mas foi vendo os filmes da Troma (trilogia Toxic Avenger, Terror Firmer, Tromeu e Julieta, Sgt Kabukiman NYPD, Surfistas Nazistas Devem Morrer, e por ai vai) que comecei a me dar conta do tipo de filme que eu poderia e gostaria de fazer, e quando conheci os filmes da Canibal Produções e seu mentor Petter Baiestorf, comecei a ver que ja existia alguém fazendo este tipo de coisa no Brasil, ai foi o estopim de tudo. Quando era moleque eu fazia uns videos em VHS, com aquelas cameras grandonas de ombro, coisa que todo moleque que se interessa pelo assunto também ja fez algum dia. O primeiro um pouco mais significativo veio mais tarde, certa época eu tinha um site sobre filmes de terror que era bem famosinho, chamava Schizophrenia Horror Website, era antes de existir Boca do Inferno e esses portais de horror que existem hoje em dia. Eu passava meu tempo basicamente enchendo a cara com meus amigos e curtindo som pesado, resolvi juntar o pessoal e gravar algo, depois de algumas tentativas frustradas, conseguimos fazer nosso primeiro video, totalmente influenciado pelas tralhas da Troma, se chama Rubão – O Canibal, e claro, eu não tinha noção nenhuma do que eu estava tentando fazer.

Baiestorf: “Rubão – O Canibal” vai ser lançado em DVD pelo Gurcius Gewdner, como foram as filmagens dele?

Fernando Rick: Isso foi em 2001, eu tive essa idéia de fazer um filme sobre dois irmãos caipiras canibais necrófilos nazistas, queria misturar o máximo de absurdos possíveis e por umas bandas de metal nacional que eu gostava na trilha. Na época estava barateando o custo dessas hand cams MINI-DV e equipamento de edição, placa de captura, etc. Mas eu não tinha nada disso, e nem sabia como funcionava, pedi uma câmera emprestada pra um amigo, falei com um outro se ele poderia editar pra mim, juntei o bando de amigos bêbados que viviam chapados comigo pra cima e pra baixo e começamos a gravar a bagaça. Ficou um vídeo bem tosco, é demorado pra caralho, lento, sei lá como isso funcionou, mas rolou que por causa da trilha sonora, acabou tendo uma divulgação e saiu uns reviews falando bem na revista Rock Brigade, que pouco tempo antes havia feito uma puta matéria de 2 páginas sobre o Baiestorf, ou seja, começou abrir as portas pra esse tipo de filme para um público que ainda não conhecia e não sabia da existência de alguém fazendo esse tipo de coisa no Brasil. Nós fazíamos uns flyers toscos em xerox  e distribuíamos em shows de metal, lembro bem da gente entregando isso num show do Kreator e Destruction, todo mundo ficava curioso pra saber que porra era aquela. Isso já era 2002, quando saiu o filme, e caiu no gosto dos roqueiros bebuns de plantão, começaram a exibir isso em botecos, festinhas de amigos e der repente, todo mundo tinha uma cópia do VHS.

Baiestorf: “Feto Morto” é numa linha completamente Troma e foi o primeiro lançamento independente brasileiro em DVD, como foi realiza-lo?

Fernando Rick: Nessa época eu era extremamente bitolado em Troma, e queria muito fazer algo do tipo, queria mulher pelada, putaria, escatologia. Como eu não tinha noção de filmagem nem porra nenhuma, já sabendo que seria tosco, o negócio era assumir a tosquice, não tentar fazer algo sério, ou seja, era tudo ultra escrachado propositalmente. Essa época eu lembro q tava assistindo muito Toxic Avenger 4, Terror Firmer e seus making offs (que são melhores que os filmes), e claro, queria fazer igual! Inventei essa história sobre um cara que tem um feto morto grudado na cabeça pois seu pai trepou com a irmã. O resto é basicamente um monte de desculpa pra mostrar mulher pelada, escatologia e violência, tudo cheio de humor negro. O cara que faz o papel do Feto Morto é o Rui Villani, ele é o segredo do sucesso desse filme, o cara é meu herói até hoje. Ele tem um irmão gêmeo, que é quem faz o EXU do Feto Morto no filme, o Exu ensina o cara a lutar karatê pra se vingar de um grupinho que vivia azucrinando o protagonista (ta vendo só, nós tratávamos de bullying muito antes disso virar moda no Brasil [risos]). Esse filme conta com a ilustríssima presença da Denise V., que era famosa por seu trabalho nos filmes do Baiestorf, a idéia era ela ficar pelada andando de tetas de fora pra cima e pra baixo durante o filme. Contratamos mais uma putas horrendas pra aparecerem peladas fazendo nojeiras, todas pelo justíssimo preço de 50 reais cada, juntei novamente a cambada de bêbados que andavam comigo na época e começamos a gravar. Por causa do Rubão, muita banda queria ter trilha sonora no meu próximo vídeo, o então Feto Morto. Além da trilha original feita pelo Fabio Ribeiro,  é cheio de bandas de metal de cabo a rabo, o que novamente ajudou muito na divulgação. As gravações foram uma bagunça sem fim, em todas nós estávamos ultra bêbados, nada era sério, era tudo pura diversão, principalmente as gravações com as meninas peladas. O negócio do VHS era foda, era caro pra cacete enviar VHS por correio, dava um trabalho maldito gravar um por um, nessa época os gravadores de DVD para computador estavam barateando  e resolvi investir. Acabei sendo o primeiro cara a lançar essas tralhas em DVD no Brasil. Era mais rápido para gravar e mais barato pra enviar, só que tinha um problemão, muitos dos aparelhos de DVD naquela época ainda não liam DVD-R e sempre tinha problemas com caras reclamando que o DVD não funcionava. De qualquer forma, o Feto Morto também foi lançado em VHS, fizemos uma parceria com a Mutilation Records, eles pagaram as impressões das capas e vendiam os filmes na loja, mas tiveram que parar de vender os DVDs, pois muita gente reclamava que os DVDs não funcionavam. Fizemos uma festa de lançamento do Feto Morto, com bandas tocando, exibição de filmes extremos, cerveja barata (era Lecker, ruim e quente, mas era barata) e foi um sucesso! A Denise V. estava na festa pra alegria dos cuecas de plantão, e logo que saiu Feto Morto já se tornou um Cult absoluto! É incrível pensar a repercussão que este vídeo teve, até hoje é difícil achar alguém que não viu ou não conhece alguém que tenha uma cópia entre fãs de filmes extremos ou fãs de musica pesada. Começou a sair uma caralhada de matérias em revistas, fanzines, TV, internet e, como no Rubão, o boca a boca foi essencial, exibições públicas em botecos e festinhas, gente que sabia várias frases do filme de cor e salteado, lembro que me pagaram muita cerveja por causa desse filme, foi demais! E é um filme ultra tosco, feito sem recurso nenhum por um monte de moleques bêbados e sem noção alguma do que estávamos fazendo. Nessa época de Rubão/Feto Morto, eu era bem novo, devia ter entre 17, 18 anos. Um fato legal é que nós curtíamos muito os programas do Alborghetti e colocamos um trecho de um dos programas dele no filme, tínhamos uma fita com umas 6 horas de Alborghetti gravadas e vivíamos assistindo aquela porra, era tipo uma coletânea dos casos mais escabrosos que rolou nos programas dele. Depois, com o advento do You Tube, ele voltou a ser moda (risos).

Baiestorf: Como foi trabalhar com a Denise V.? Posso estar enganado, mas acho que “Feto Morto” foi o último filme de destaque que ela fez antes de abandonar as produções independentes e seu trabalho de atriz!

Fernando Rick: Foi muito divertido, pois eu era fã dela por causa dos filmes do Petter, já tinha assistido vários e me correspondia com ele por carta (isso ai, carta mesmo, não e-mail). Eu tinha mandado o Rubão pro Petter e ele escreveu uma resenha muito legal no fanzine que ele editava na época chamado ARGHHH. A Denise V. estava vindo pra São Paulo, acho que quem nos colocou em contato foi um amigo em comum o José Salles, que era outro realizador da época, fazia zines, vídeos, etc. As gravações foram uma zona total, bebedeiras e muito barulho, a Denise era doidona e nos demos muito bem, como não era um lance sério e profissional, passávamos a maior parte do tempo falando merda e rindo do que trabalhando de fato. Era uma época divertida. Ela costumava andar com os Abutres (os motoqueiros) e vivia contando histórias de putaria e esbórnia com esses caras, e por ai vai. Se me lembro bem, as lindas garotas que aparecem nuas no filme nos foram apresentadas pela Denise.

Baiestorf: “Coleção de Humanos Mortos” tem um puta clima e de certo modo representa seu amadurecimento como realizador, foi um passo natural?

Fernando Rick: Nessa época eu já havia começado a trabalhar de verdade com TV e cinema, eu era ajudante do Kapel, um dos maiores efeitistas do Brasil e já estava trabalhando na TV Cultura. Então resolvi fazer um curta de verdade, mesmo por que, nunca tive interesse em ficar fazendo a mesma coisa, até hoje cada um dos meus trabalhos é bem diferente do anterior, não gosto de me repetir muito. Queria fazer um filme de terror, com atores de verdade, efeitos legais, fotografia ajeitada, então fiz o roteiro do Coleção, baseado nas coisas que eu andava vendo na época. Em 2004 o Killjoy, vocalista da banda Necrophagia, veio pro Brasil para gravar um clipe com o Mojica e ficamos a semana toda indo pra esbórnia, ele tinha trazido com ele o DVD que eles tinham gravado com o Jim VanBebber e lá eu vi o curta The Last Days of John Martin. Eu pirei naquilo. Eu já conhecia o trabalho do cara nos filmes Deadbeat By Dawn e My Sweet Satan, mas esse ai foi foda, e todo o DVD do Necrophagia era do caralho, então resolvi fazer algo naquela pegada, misturado com alguns fatos de Serial Killers reais, nesta época também eu era meio viciado em coisas relacionadas a isso, lia um monte de livros do Harold Schechter, Helter Skelter do Manson, documentários, ouvia muito a banda Macabre, tudo que tinha a ver com Charles Manson, Ed Gein, Jeffrey Dahmer, Albert Fish e afins, me interessava.

Baiestorf: As filmagens do “Coleção de Humanos Mortos” duraram quanto tempo e qual foi o orçamento dele?

Fernando Rick: As gravações duraram 2 fins de semana e foram ultra conturbadas. Eu não tinha experiência de SET, não tinha equipe, não tinha porra nenhuma. Minha equipe era o André ZP (diretor do curta “Sozinho”) fazendo câmera, o Kapel nos efeitos, Rodrigo Terra e Renato Tado, dois caras que na época eram estagiários comigo na TV Cultura, fazendo luz e alguns outros amigos ajudando com todo o resto, áudio, produção, etc, entre eles o Rui Villani, que fez o Feto Morto. Eu tinha que fazer de tudo, sem ter tempo e experiência e a situação ia ficando tensa, tudo atrasava, dava problema, a luz não ficava como eu queria, tínhamos que remontar tudo, não tinha comida pros atores e equipe, só tinha bebida (herança das épocas de Feto Morto) e o povo todo ia ficando bêbado e ia rolando discórdia. E pra ajudar, o único cara que não era ator de verdade ali, era justamente quem eu tinha escolhido como ator principal, o Ulisses Granados do Putrescine. E ele gostava de encher a cara até cair, ai você já pode imaginar o desastre que foi o primeiro fim de semana de gravação. Foi difícil fazer tudo funcionar e as pessoas colaborarem, primeiro porque estava todo mundo trabalhando de graça, inclusive as atrizes que ficam peladas, segundo que estava todo mundo ultra cansado e com fome, terceiro que estava todo mundo meio chapado e foi bem neste primeiro fim de semana que gravamos aquela cena do estupro. Primeiro fim de semana foi um desastre, então tive que me preparar mais para o segundo fim de semana, ensaiei bastante com o Ulisses, comprei um mínimo de comida pro povo, menos bebidas dessas vez, e lá fomos nós. Gravamos a cena da Luciana tomando banho, tudo calmo e tranqüilo, sem efeitos, sem nada, só ela sem roupa e o banheiro, tudo rolou bem e a Luciana estava achando o máximo ter que ficar só ali, tomando banho quente enquanto ficávamos movimentando a câmera num travelling pelo trilho improvisado com madeira e um carrinho com rodinhas de skate. De lá fomos para uma casa em construção, onde gravamos as cenas que no filme são a casa do Serial Killer, onde tem aquela zona toda de corpos, cabeças, etc. Cena esta onde pela primeira vez tive o prazer de ter em um filme meu a participação do Gurcius Gewdner, fazendo figuração como um dos cadáveres da sala ao lado da Didi Babinski, outra amiga que me ajuda nos meus trabalhos dês da época do Rubão. De lá pra cá, tanto o Gurcius quanto a Didi me ajudaram ou participam de alguma forma de todos os meus trabalhos. Bom, lá estávamos nós no terceiro andar de uma casa em construção, sem janelas, num frio do caralho, altas horas da madrugada, a maior parte do tempo tudo ocorreu bem nesse dia, no máximo demorava para arrumar a luz do jeito que eu queria, mas cedo ou tarde o pessoal fazia, só que as meninas, tanto a Luciana quanto a Tiara, que faz a primeira vítima, estavam apenas de calcinha, num frio do cão, cobertas com aquele sangue fake do Kapel que é uma mistura de Glicose de milho com corante, um negócio grudento que incomoda e a Luciana que passa por vários tipos de tortura nas mãos do Ulisses no filme, coberta com aquele sangue, gritando a madrugada toda, tendo que chorar, atuar e o caralho a quatro, começa a surtar de verdade e de repente resolve abandonar as gravações, gritando que não agüenta mais essa tortura, que quer ir embora, que aquilo é um absurdo, etc. Então após conversar um pouco e acalmar a garota, tivemos que fazer o resto todo do filme as pressas o que prejudicou muito as cenas, alguns efeitos que ficaram bem toscos no filme são por causa disso, como quando o cara bate com a espingarda na cara dela, etc. Tudo que é feito na correria fica uma merda, não tem jeito. O resultado final não é uma obra prima mas também não é de se jogar fora. Foi lançado em DVD pela Mutilation Records, junto com os curtas de horror (“Sozinho” de André ZP e “6 Tiros, 60 Ml” do André Kapel), e foi a primeira vez que curtas de horror brasileiros foram lançados em DVD numa coletânea apenas de curtas. Com o passar dos anos parece que o pessoal começou a dar mais atenção pra esse filme, várias vezes foi convidado a ser exibido em Mostras de cinema no Brasil e exterior e basta você dar uma procurada no Google que vai ver o tanto de lugares que tem pra baixar o filme, sendo a maioria em sites gringos. La fora parece que dão mais valor aos filmes do DVD 3 Cortes, tem um monte de reviews legais espalhados pela Internet de tudo quanto é país, menos do Brasil. Aqui ninguém da muito valor e a maioria do pessoal deve achar uma merda.

Baiestorf: Como surgiu o convite para fazer o vídeo clip do Ratos de Porão?

Fernando Rick: Quando o Ratos estava gravando o disco Homem Inimigo do Homem, quem mixou a bagaça foi o Bernardo (Elma, ex Are You God?), ai entreguei um 3 Cortes para ele mostrar pro Gordo e ver se ele não queria fazer um clipe. O Gordo gostou dos filmes e disse que já tinha visto o Feto Morto e também gostava, ai fez o convite pra fazer um clipe pra música Covardia de Plantão que fala sobre a violência de grupos tipo Skinheads, Punks, etc. A idéia já era fazer algo pesado e que seria censurado, mas o que rolou foi fazer um clipe baratíssimo, porque a Deck Disc tinha dado só 1.500 reais pra fazer o vídeo e apesar de ser um pouco violento, usar uma violência caricata e meio engraçada. Ai foi aquela historia de sempre, junta um monte de gente pra trabalhar de graça, correria do caralho pra fazer tudo sem dinheiro, equipamento emprestado.Gravamos duas diárias, uma que foi a banda tocando no Cerveja Azul, um bar La na Mooca, e outra que é a parte das brigas. Sem grandes acontecimentos nestas gravações, só o usual. No fim das contas corremos pra tentar fechar o clipe a tempo de entrar no VMB, ai que vem o recado da gravadora – A Deck Disc não irá compactuar com a violência. Censuraram o clipe, ele não foi exibido em lugar nenhum, só na internet. Hoje tem ele no disco de Extras do Guidable também. E é isso ai.

Baiestorf: Este clip pro Ratos de Porão serviu prá ti tomar contato com o Gordo, certo? Como surgiu a idéia pro documentário “Guidable – A Verdadeira História do Ratos de Porão”?

Fernando Rick: No processo de realização do clipe do Ratos, acabei me tornando amigo do Gordo e me veio essa idéia de fazer um documentário sobre a trajetória do Ratos. O Gordo disse que vários caras tentaram fazer, mas nenhum conseguia, pois era MUITO material, era trabalho que não acabava mais. Resolvi assumir a bronca e de forma totalmente independente, produzindo tudo eu e o Gordo, comecei a fazer o filme.

Baiestorf: Como foi o processo de seleção de imagens e edição que tu e o Marcelo Appezzato realizaram pro “Guidable”? Deve ter sido uma loucura, porque olhando o filme dá prá perceber que foi um trabalho monstro!

Fernando Rick: A maioria do material usado no filme é do arquivo pessoal do Gordo, ele tem caixas e caixas de arquivos da banda, vídeos de todo formato que você pode imaginar, VHS em NTSC, VHS em PAL, VHS em PAL-M, DVD, Beta, Mini DV, DVD, fotos que não acabavam mais e, mesmo assim, ainda fomos caçar mais material por fora e conseguimos reunir muita coisa inédita e importante, não foi fácil, mas isso enriqueceu muito o filme e o resultado final é muito bom. Comecei recrutando algumas pessoas pra me ajudar a gravar as entrevistas, um cara pro áudio, dois caras pra fazer câmera e luz, e logo no início das gravações convidei o Marcelo Appezzato, vocalista do HUTT, para tirar fotos das gravações e acabou que ele sempre ajudava nas pautas e dava boas idéias, ai começou ajudar na produção, ligava pras pessoas, agendava entrevistas, dava idéias, etc. As gravações foram o máximo pois tivemos a chance de conhecer muitos caras que somos fãs e muita gente importante pra música, mas a melhor de todas foi a da Vila Piauí, bairro de onde surgiu o Ratos de Porão, lá gravamos as entrevistas com o Jabá e o Betinho, dois membros da primeira formação do Ratos. A gravação foi dentro de um boteco na beira da favela e tinha um monte de gente da vila assistindo, sem contar o pessoal do tráfico, os bebuns de plantão, etc. Foi legal ver a reação do pessoal que mora ali, que são vizinhos dos caras e nem sabiam quem eles eram, como quando o Jabá estava contando que uma das maiores conquistas dele foi quando eles tocaram com o Ramones, e você ouve um monte de moleques atrás de você comentando – “Caralho, o cara é meu vizinho e tocou com o Ramones!”. Quando terminamos as gravações, chamei ele pra editar o filme comigo e passamos 1 ano inteiro pra decupar e editar o filme, no fim das contas o cara virou Co-Diretor e ele foi essencial pra obtermos esse resultado final. Decupar essas fitas foi um inferno, foi um trabalho de pesquisa gigantesco, a idéia era ter uma edição dinâmica, e tudo muito ilustrado, quando um cara comentava sobre algum assunto, queríamos ter a imagem exata na hora certa e ficar achando 3,4 segundos de uma imagem X no meio de 500 vhs´s bolorentos, cansa!

Baiestorf: E como foi a carreira do “Guidable” nos festivais e mostras de filmes?

Fernando Rick: Fizemos umas sessões de lançamento do filme no Cine Olido graças ao nosso amigo Alex Andrade que armou tudo, e todas sessões de lançamento foram esgotadas, tinha gente sentado no chão, etc. Foi lindo. Depois o filme começou a rodar alguns festivais legais tipo a primeira edição brasileira do IN-EDIT, o Indie Festival em BH e em um monte de mostras ao redor do Brasil, conseguimos vender um monte de sessões de exibição do filme em diversos estados também, com diversas sessões esgotadas no Brasil todo e o filme entrou em cartaz no Cine Olido. Tivemos uma mídia espontânea fantástica, saímos em uma sexta feira, no mesmo dia, em todos grandes jornais– Folha, Estadão, Jornal da Tarde, Correio Brasiliense. Uma página inteira no mínimo, em cada jornal. Também rolou matéria em vários programas de TV, rádio, zines, internet, foi foda! Alias, várias dessas matérias estão disponíveis no nosso site http://www.blackvomit.com.br.

Baiestorf:  A distribuição do “Guidable” foi feita pela independente Läjä Rekords do incansável Mozine em edição dupla luxuosa, tu pode contar como foram as negociações? Lembro que a Monstro Discos e a Universal Music também estavam interessadas em lançá-lo!

Fernando Rick: No começo, antes do BOOM da mídia, ninguém queria saber do documentário. Oferecemos pra Deck Disc e um monte de gente, ninguém quis. Ai depois das matérias um monte de gente começou a se interessar.  Fizemos umas reuniões mas nenhuma era muito interessante, pois nossa idéia era o DVD ser DUPLO, com encarte e BARATO, custando no máximo 25 reais. Tínhamos até fechado com a Monstro mas acabei desistindo, pois os caras queriam lançar o DVD a 40 reais, encheram o saco pra eu mudar a capa (que foi feita pelo Gabriel Renner especialmente para o documentário), queriam por um desenho do Marcatti e o caralho, não adiantava eu falar que não, eles continuavam insistindo, puta falta de respeito e puta idéia burra. Aí na mesma semana apareceu o Mozine que, junto com o Felipe da Ideal Records, resolveram aceitar todas nossas condições, fizemos uma reunião com o João Gordo e voltei atrás e fiz com eles ao invés da Monstro, ai o tal do Márcio veio todo cheio de pompa me falar um monte de merda, que isso não se faz,  várias insinuações idiotas tipo – achava que você mandava em alguma coisa ai, etc. Depois falou um monte de merda sobre o Mozine, e começou cantar de galo como eles são foda, como eles fazem isso e aquilo, totalmente idiota, como se alguém dependesse dele pra alguma coisa. Tentei até falar na boa com o cara, mas parecia que eu estava lidando com o dono da Sony ou da EMI, ridículo. Depois, mais pra frente, eles lançaram o DVD ao vivo do Ratos e, cara, acho que é o lançamento mais ridículo que já vi na vida, lançaram o show com TIMECODE na tela, um menu cheio de pau, uma capa ridícula, dá até dó. Difícil lidar com os donos do mundo. Bom, lançamos pela Ideal Records + Laja Records, tudo saiu bem, o DVD ficou ótimo e vendeu pra caralho, vendeu uns 3.000 em pouco mais de 2 meses. Na época em que saiu, mesmo o preço de atacado sendo ultra baixo pra poder ser vendido a 25 reais, haviam várias lojas vendendo por 40, 50 e até 60 reais! E mesmo assim vendia muito e rápido. Depois começaram a piratear, colocar na internet, ai nos camelôs tinha o DVD Duplo por 10conto, ai começa a cair, não tem jeito. Teve umas pisadas na bola do Felipe da Ideal Records também com alguns lojistas e com divulgação, não imprimiram 1 poster pra colar em lugar algum, nem flyer, mas estou satisfeito com o resultado.

Baiestorf: Algum plano para o “Guidable” ser exibido em alguma rede de TV brasileira?

Fernando Rick: Ainda não, mas também nem tentamos negociar ainda. Com certeza faremos isso mais pra frente.

Baiestorf: “Guidable” foi lançado em outros países?

Fernando Rick: Mesma coisa que a resposta anterior.

Baiestorf: Confesso que não sou um grande admirador da banda Ratos de Porão (tinha parado de acompanhar eles depois do “Brasil”), mas teu documentário me fez voltar à ouvi-los. Como foi a recepção do público?

Fernando Rick: Foi demais! A repercussão que este documentário teve e continua tendo é inimaginável, muitas vezes estou na rua, em algum bar ou na fila de alguma coisa e ouço alguém comentando sobre o filme. E quando alguém fica sabendo que fui eu quem fez e as pessoas dizem o quanto gostam do filme, que viram no cinema sei lá de onde e depois compraram o DVD, que já emprestou pra 30 amigos e blá bla blá, isso não tem preço!

Baiestorf: E o piloto para programa de TV “Gurcius Gewdner Show”? Como surgiu essa idéia de usar o Gurcius como apresentador? No que consiste este projeto?

Fernando Rick: Eu tive essa idéia de tentar fazer um programa de TV pra web, a idéia original era fazer um programa apresentado pelo João Gordo. Cheguei a falar com ele sobre isso, tivemos algumas idéias, mas no fim acabou não rolando. Conheço o Gurcius a algum tempo, e sou UM, entre seus diversos fãs espalhados mundo a fora. Todo mundo que conhece o cara sabe que ele é uma figura única, e não sei de onde tive essa idéia de ao invés do João Gordo, colocar o Gurcius para apresentar o programa, aliás, era mais que isso, era um programa DO Gurcius, ele faria TUDO no programa. Então eu e o Marcelo Appezzato começamos a bolar as idéias de quadros e toda identidade visual do negócio, queríamos fazer algo simples, barato e divertido. Um dos primeiros quadros que criamos era um chamado Na Banheira do GUGUrcius, onde o Gurcius entrevistaria celebridades lado B em uma banheira e o primeiro que tentamos foi o Kid Bengala. Só que começamos a ter vários empecilhos, o cara queria cobrar cachê para dar a entrevista, não estávamos achando uma banheira legal, etc. Ai desencanamos desse quadro e começamos a pensar em algumas coisas pra fazer em Chroma, pensamos nesse quadro onde o Gurcius explicaria do seu ponto de vista, obras literárias, música e grandes mistérios do universo. O assunto escolhido para o piloto foi a Cultura Racional, aquela do disco do Tim Maia. Então eu vim com essa idéia de fazer uma mesa redonda de bebuns na praça da Sé, colocaríamos uma mesinha lá no meio e daríamos pinga pros caras ficar discutindo assuntos corriqueiros com o Gurcius. Fizemos uma pauta falando desde Michael Jackson até muro de Berlin e entregamos pro nosso herói de bigode. Foi tudo muito divertido com exceção da parte que, enquanto gravávamos naquele antro de pinguços e nóias, sem que percebêssemos, roubaram um case de câmera com uma lente e um microfone dentro. Foi isso o que acabou deixando o programa meio caro, porque todo o resto não gastamos praticamente nada. Gravamos o programa inteiro em um fim de semana e ficamos sabendo que o Sérgio Mallandro estaria fazendo um show de Stand Up bem no fim de semana em que marcamos a gravação. Claro que não poderíamos perder isso, então nossa produtora conseguiu por a gente pra assistir ao show e entrevistar o cara. Quando avisamos o Gurcius que ele iria entrevistar o Sérgio Mallandro, quase que ele teve um treco, ele é ultra fã do cara. Lembro que estávamos assistindo ao Stand Up e o Marcelo estava achando uma merda e começou a ficar azucrinando os caras do palco, ai eu fiquei irritado e discutimos lá no meio, ele saiu andando e largou a gente, antes de gravar, só que ele tinha levado um vinil do Mallandro pro cara autografar e deixou lá, ai o Gurcius pegou e depois da entrevista – “tem como o senhor assinar meu disco? Põe ai – pra Gurcius , um abraço!”, no disco do Marcelo.

Baiestorf: E como é dirigir o Gurcius? Tu já dirigiu ele em vários filmes, se não me falha a memória ele faz pontas no “Coleção de Humanos Mortos”, clip do Ratos de Porão e agora no ainda não lançado “Ivan”!

Fernando Rick: Ah, dirigir o Gurcius é fácil, nada que uns xingos e uns tapas não resolvam. Brincadeira, é bem fácil trabalhar com o cara, ele é ultra dedicado e esforçado, eu uso ele nos meus trampos a bastante tempo, desde o Coleção pra cá, o único que não tem ele acho que é o Guidable. Mas ele tava na sessão reservada que teve do filme antes da estréia, que foi só para imprensa e convidados. Gosto de ter ele fazendo pontas nos meus filmes, é tipo um amuleto da sorte, mas não posso dar muito destaque pra ele se não o cara rouba a cena do protagonista ou qualquer que seja o foco. Mas agora eu inventei um programa só pra ele, então tá tudo certo.

Baiestorf: Alguma TV se interessou em comprar o “Gurcius Gewdner Show”? Pode falar sobre isso?

Fernando Rick: Oferecemos e fizemos umas reuniões em canais de TV tipo a FOX, onde os caras até se interessavam, mas o departamento de marketing sempre barrava, dizia que era difícil vender, etc. Todo mundo pergunta se mostramos pra MTV, nós tentamos mas ninguém lá nem se deu ao trabalho de ver.  Sei lá, talvez só eu tenha gostado dessa merda… (risos).

Baiestorf: Faz alguns dias que vi teu novo curta “Ivan” e ele não sai da minha cabeça, achei o roteiro maravilhoso e me identifiquei com os artistas fodidos que tu retratou. Como surgiu a idéia para fazê-lo?

Fernando Rick: A idéia era tentar fazer um curta barato, que envolvesse um ator de teatro e se passasse dentro de um cortiço, só que o roteiro foi crescendo e tomando proporções muito maiores do que a idéia original. Ai coloquei o curta na Lei Rouanet, fomos aprovados pra captar 90 mil reais, mas eu não quis esperar, ai resolvi fazer com meu próprio dinheiro enquanto tentávamos captar pela lei. Pedi pra um monte de gente trabalhar de graça, apenas os atores foram pagos e mesmo assim foi cachê simbólico.  Tínhamos por dia cerca de 60 pessoas trabalhando no SET, isso só de parte técnica, pois teve dias em que tínhamos um monte de figurantes, atores, etc. Conseguimos diversos apoios para realizar o filme, a TV Cultura apoiou emprestando toda parte de figurino e cenografia, tivemos diversos apoios pra aluguel de equipamento, etc. Toda equipe foi formada por profissionais da área e todo mundo trabalhou de graça com a maior vontade do mundo, nunca na minha vida tinha trabalhado com uma equipe tão esforçada e olha que eu já havia trabalhado com todo esse pessoal antes. Tudo isso foi essencial para o resultado final do filme. Bom, voltando ao roteiro, resolvemos fugir novamente do que estávamos acostumados a fazer. Não queríamos fazer outro filme de terror, nem outro documentário, fizemos um drama misturado com humor negro, onde colocamos a situação do artista no Brasil num curta totalmente situado no centro velho de São Paulo, com personagens marginais. Todo o filme faz uma analogia com a bíblia e seus personagens, colocamos Jesus como um ator de teatro velho e decadente que vive em um cortiço imundo, Maria Madalena é um travesti de meia idade, os apóstolos são os amigos de Ivan, o ator decadente, entre eles um Michael Jackson cover fuleiro e um negro caolho de cadeira de rodas, e ai mostramos a trajetória deste ator que tem que entregar panfletos vestido de Mickey embaixo da luz do sol pra pagar seu sustento, até o momento em que tem uma iluminação e resolve mudar sua vida e de seus amigos.

Baiestorf: Essa versão que vi na tua casa (em companhia do Rodrigo Aragão) ainda não esta finalizada, certo? Quando o curta ficará pronto? Alguma previsão de lançamento?

Fernando Rick: Sim, a versão que você viu era a final, o curta já esta pronto, em 35mm e Dolby SR-D, neste exato momento esta a caminho de sua estréia num festival no Sul! Agora deve percorrer o circuito de festivais e é ai que vou descobrir se alguém além de mim gostou dessa bagaça, por que tem muita gente que mostrei o curta e não fizeram cara de quem gostou muito não (risos).

Baiestorf: A parte técnica do “Ivan” está fantástica, o trabalho dos atores (em especial do cara que faz o Ivan – não lembro nome dele – e do Rubens Mello) está genial!!! Qual foi o orçamento do curta? Como tu levantou essa grana?

Fernando Rick: Sim, a parte técnica foi exaustivamente estudada para conseguirmos esse resultado. Figurino, cenografia, fotografia. O trabalho dos atores também foi incrível, o primeiro cara que eu ofereci o papel do Ivan foi o Ivan Cabral, ator e dono do grupo de teatro Satyros, o cara fechou comigo, me deu certeza… e adivinha? Faltando um mês para começarmos as filmagens, o cara simplesmente sumiu, parou de atender minhas ligações, etc. Beleza, bola pra frente, tentei então o Carlos Mossy, que se interessou, mas como ele mora no Rio, ia ficar muito caro e então me deparei com o André Ceccato! Esse cara caiu do céu, ele ficou perfeito no papel e quero trabalhar muitas outras vezes com ele. Puta ator, com A maiúsculo. Quem ver o filme, verá. O Rubens Mello foi o primeiro que escolhi para o papel do travesti Darlene Starr e nem precisei procurar mais ninguém, ele ficou com o papel de cara. O cara que faz o Ronaldo, o Judas da história, é o Beto Bellini, que também foi o cara que criamos o papel pensando nele e rolou dele fazer e ficou ótimo também.  O curta esta orçado em 90 mil, mas gastamos cerca de 18, 19 mil reais contando com o Transfer para 35mm, etc. Só conseguimos fazer por este preço com esse esquema de todo mundo trabalhando de graça, se não, não ia ter jeito, é 90 mil pra cima. De qualquer forma, estamos conseguindo captar a grana graças a WHEATON do Brasil, que esta patrocinando o projeto através da Lei Rouanet. No site da Black Vomit tem um making of bem legal feito pelo nosso amigo Armando, que mostra um pouco de como foram as filmagens, vale a pena conferir.

Baiestorf: É bom ver cineastas independentes, como Rodrigo Aragão com seu longa “A Noite do Chupa Cabras” e você com o curta “Ivan”, fazendo filmaços. Tu acha que se rolasse mais grana nas produções independentes a gente teria mais grandes diretores realizando bons filmes?

Fernando Rick: Não sei não cara, com alguns até funcionaria, com outros não. O dinheiro funciona quando o cara sabe fazer e tem o que mostrar, tem muito moleque hoje que se prendeu a isso de “eu faço cinema de Bordas…” e o cara acha que porque faz uns videozinhos de 50 reais, não precisa se importar com parte técnica, etc. E os filmes desses caras geralmente não tem nada pra acrescentar, são historinhas de terror bobinhas, sem protesto, sem crítica, sem mensagem, sem finalidade, sem porra nenhuma. Hoje em dia tá cheio de caras assim.  Não sou contra filme tosco, sem recursos, sem equipamentos, sou contra filme bobo, pau mole. Eles deviam aprender mais com você e com o Gurcius. (risos).

Baiestorf: Aliás, tu acredita em cinema de gênero? Há público prá esse tipo de cinema no Brasil?

Fernando Rick: Sim, cada dia cresce mais o número de adeptos do cinema de gênero. A prova disso é o crescente número de festivais de gênero que nascem no Brasil a cada ano, Fantaspoa, Cinefantasy, RioFan, SP Terror, Mostra de Cinema de Bordas, etc. Até pouco tempo atrás não tinha nada disso. Graças à internet, o público tem mais acesso a esse material e vai rolando esse tipo de evento.  E todos eles são muito legais, é uma via de mão dupla, é bom pra quem produz, que divulga o trabalho e sempre tem mais lugares onde exibir os filmes e para os fãs é ótimo poder conferir uma produção crescente não só no Brasil, como no mundo, de um tipo de cinema específico que o cara gosta. Este ano, por exemplo, o FantasPoa esta trazendo o Lamberto Bava! Quando na vida a gente ia imaginar ver esse cara exibindo e comentando seus filmes e os clássicos do pai dele no Brasil? E claro, como não posso deixar de vender meu peixe, estou trazendo pela minha produtora o Lloyd Kaufman da TROMA, numa retrospectiva com os maiores clássicos dos caras e uma MASTER CLASS de 5 horas GRATUITA! Sem contar que ouvi fortes boatos de que até o fim do ano também tem uma mostra do Takashi Miike em SP. Tudo isso no mesmo ano! Ou seja, só temos a ganhar com o fácil acesso a esse material.

Baiestorf: “Ivan” vai ser exibido em festivais e mostras, certo? Há planos de lançar ele em DVD (talvez na linha do DVD “3 Cortes” que reunia 3 curtas de 3 diretores diferentes)?

Fernando Rick: O foco principal são os festivais ao redor do mundo, que é onde a gente consegue divulgar o trabalho, etc. Depois que rodar todo lugar que eu conseguir enfiar o filme, ai com certeza eu coloco ele na íntegra na internet. O que acho mais fácil acontecer é algum doido querer lançar uma coletânea de trabalhos da Black Vomit, reunindo trampos novos, antigos, etc, e o Ivan entrar no meio, com making of e tal.

Baiestorf: Vocês da Black Vomit estão trazendo o Llloyd Kaufman pro Brasil, tu pode falar sobre isso? Passar detalhes?

Fernando Rick: Bom, como já disse, a Troma sempre foi grande influência pra mim, foi em partes por causa deles que comecei a fazer filmes. O Lloyd Kaufman é uma das poucas pessoas que considero um herói de verdade. O que rolou foi que íamos tentar trazer o cara pra Virada Cultural em SP, mas abortamos o projeto e resolvemos fazer em parceria com a prefeitura esta mostra retrospectiva da TROMA, exibindo durante uma semana inteira os maiores clássicos da produtora e de quebra, uma MASTER CLASS de 5 horas com nosso mestre, e o negócio vai ter tradução simultânea, coffe brake e tudo mais. O melhor é que é totalmente de graça! É um sonho pra mim poder trazer um cara que sou fã desde criança e ainda por cima dar essa chance única de ter uma aula de cinema com ele, para um monte de fãs do cara pelo Brasil que virão pro evento. Isso tudo só foi possível graças a ajuda do nosso ultra brother Alex Andrade e o Cine Olido. E preparem-se que isso é só o começo, pretendemos trazer mais gente legal!

Baiestorf: Próximos projetos? O que tu planeja fazer depois do filmaço “Ivan”???

Fernando Rick: Temos um curta, chamado Estopim, que Foi aprovado antes do IVAN na Lei Rouanet e trata desse assunto de massacre em colégio, na época fizemos baseado no Massacre de Columbine, e eis que agora surge esse moleque xarope no Rio e fez o mesmo aqui. É um curta de humor negro, mais adolescente e pra variar, totalmente diferente do Ivan. É um monte de cabeças explodindo, corpos pegando fogo, etc. Vamos tentar captar grana pra fazer esse filme, essa é a única coisa certa até agora. Projetos temos de kilo, mas não adianta ficar contando com o ovo no cu da galinha, quando algo tiver certo, eu solto as novidades!

Lloyd Kaufman da Troma

Cinema de Garagem

Posted in Cinema, Literatura, Vídeo Independente with tags , , , , , , , on maio 15, 2011 by canibuk

“Cinema de Garagem” (170 páginas) de Dellani Lima e Marcelo Ikeda, lançado em 2011, faz um inventário afetivo sobre o jovem cinema brasileiro do século XXI. Mais do que necessário, a iniciativa da dupla traça um perfil das produções independentes nacionais que ganharam força com a popularização das filmadoras digitais que baratearam os custos e tornaram o cinema independente uma realidade. Nos dias de hoje só não faz filme quem não quer. Como os próprios autores escrevem sobre a publicação:

“Cinema de Garagem é um mapeamento da produção independente audiovisual brasileira da última década (2001-2010).

(…)

Esta publicação busca as conexões para compreender esta geração, que apresenta conceitos e uma série de pesquisas, geralmente bastante distintas, que na maioria das vezes se opõem às práticas comerciais do mainstream. O mapeamento não pretende abranger todos os artistas, coletivos, obras ou ações do período, mesmo que aborde diversas manifestações do audiovisual. A intenção é abrir novos caminhos, novas indagações.”

“Cinema de Garagem”, assim como os dois volumes do livro “Cinema de Bordas” (Bernadette Lyra e Gelson Santana, 2006) e o “Manifesto Canibal” (Petter Baiestorf e Coffin Souza, 2004), é um daqueles livros necessários para chamar atenção para produções marginalizadas que não encontram espaço nos meios de exibição oficiais. Como o cinema que produzo (que eu chamo de “Kanibaru Sinema” mas que na prática é a mesma coisa que “cinema de bordas” ou “cinema de garagem”) transita entre essas duas novíssimas “escolas estéticas”, eu queria muito ver os cine-bordeiros dialogando com os cine-garageiros e formando parcerias de exibição/divulgação. Parece uma idéia louca misturar cinema de gênero com cinema autoral mas, na minha opinião, é uma ótima forma de apresentar essas produções independentes para um leque maior de espectadores. A riqueza de todos esses filmes está na diferença que existe entre eles.

No “Cinema de Garagem”, Dellani & Ikeda, perguntam (ainda em 2001): “O que significaria ser independente?” e procuram mostrar essa independência tanto econômica, quanto culturalmente:

“No caso econômico seria um cinema que conseguiria prover os meios para se sustentar mesmo sem a megaestrutura dos estúdios. Isto é, com orçamentos reduzidos, equipes mínimas, produção ágil, e atendendo a um público específico, com um interesse especial em projetos que fujam do protótipo do cinemão.

(…)

O lado mais complexo da questão no entanto é o conceito cultural. Um filme independente , nessecaso, seria um filme que abordasse valores, costumes, hábitos que não são abordados pelo cinemão. Enquanto o cinemão pensa exclusivamente nas leis de mercado, como um puro negócio cujo objetivo principal é a geração de lucros, o cinema independente pode exercitar linguagem, questionar a sociedade, as estruturas do poder propor uma espécie de ensaio audiovisual, ser um cinema político, enfim, não ser primordialmente um produto a ser consumido.”

“Cinema de Garagem” é um livro imperdível para um primeiro contato com o cinema independente autoral brasileiro (assim como os livros do “Cinema de Bordas” o são para um primeiro contato com o cinema independente de gênero brasileiro), escrito por dois autores que fazem do cinema sua vida: Marcelo Ikeda é professor de cinema na Universidade Federal do Ceará e já realizou vários curtas, entre eles, “O Posto” (2005), “É Hoje” (2007), “Eu Te Amo” (2007) e “Carta de um Jovem Suicida” (2008). Já Dellani Lima realiza diversos projetos independentes (inclusive musicais), já tive o privilégio de ser ator no seu longa-metragem “O Sonho Segue Sua Boca” (2008) e posso afirmar que foi uma ótima experiência ser dirigido pelo Dellani.

Diz o Dellani que o livro não está disponível para vendas pelo correio (somente na mão, comprado diretamente com eles, em festivais/mostras de cinema), mas se você ficou interessado escreva para ele e tente comprar um exemplar (depositando valor do livro + valores postais) pelo e-mail: dellanilima@gmail.com

O cinema brasileiro independente precisa de mais livros na linha deste “Cinema de Garagem”!!!!!

Marcelo Ikeda & Dellani Lima