Arquivo para luciano irrthum

Baratão 66 e outros Lançamentos da Pitomba

Posted in Fotografia, Fotonovela, Literatura, Livro, Quadrinhos, revistas independentes brasileiras with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on janeiro 10, 2014 by canibuk

O final de 2013 trouxe para o público de quadrinhos brasileiros várias ótimas obras. E a editora Pitomba, em parceria com a revista Beleléu, se encarregaram de pelo menos um lançamento obrigatório, “Baratão 66”, fruto de uma bem-vinda parceria entre Bruno Azevêdo e Luciano Irthum. Pitomba surgiu em 2009 e se tornou a editora marginal mais ativa de São Luís/MA. E a Beleléu é um selo do Rio de Janeiro/RJ.

Baratão1“Baratão 66” (180 páginas), de Bruno Azevêdo e Luciano Irrthum. Este trabalho da dupla Bruno/Luciano (dois apaixonados por personagens marginalizadas) é um mergulho pela difícil vida fácil das putas de cidadezinhas brasileiras onde, invariavelmente, políticos, policiais, padres, pastores, empresários, fazendeiros e outros coronéis de todos os calibres orquestram arranjos em prol da saúde de seus próprios bolsos, mostrando o quanto as putas podem interferir na política local (o que nunca é uma má interferência, já que puta são muito mais humanas do que essa corja de bandidos engravatados-fardados-fantasiados). Aliás, puteiros fazem parte da cultura nacional tanto quanto samba e bunda (o que não é ruim, antes um povo com a cultura da bunda do que das armas, por exemplo), é muito comum os poderosos locais terem uma amante por pura questão de status, uma espécie de troféu para mostrar aos amiguinhos. E putas são compreensivas, são mulheres sofridas que entendem (e perdoam) qualquer falha de caráter que prefeitos, delegados, padres, seu vizinho (eu e você) possam ter. Como fã de cinema, ao ler o saboroso “Baratão 66” me deleitei com os paralelos do roteiro de Bruno com o filme “Amor Estranho Amor” (1982) de Walter Hugo Khouri (sim, “Amor Estranho Amor” é o famoso pornô da Xuxa , que de pornô não tem nada, já que sua história gira em torno de um bordel de luxo que atende os desejos mais molhados da elite política brasileira para falar de política brasileira). Claro que, para nossa sorte e tendo em mente que Bruno e Luciano são crias do underground, aqui é tudo mais debochado e divertido do que o intelectualizado Khouri. Me foi impossível saborear do “Baratão” sem imaginá-lo como um storyboard já pronto para ser filmado. “Baratão” ainda fala sobre os produtores picaretas de cultura que acham que suas “obras-primas” devem ser bancadas pelo governo (porque mamar todo mundo quer e um grande viva a quem consegue). E a exemplo da política nacional, “Baratão 66” tem uma linda história de amor cafajeste onde tudo acaba bem, com suas transviadas personagens encontrando a tão sonhada liberdade (nem que para isso seja necessário derramar algumas lágrimas, sangue e gasolina). “Baratão” é cu e buceta, ou seja, diversão total. Tive o privilégio de escrever o posfácio deste álbum, que custa R$ 30.00 e pode ser adquirido pelo site http://www.pitomba.iluria.com ou comigo pelo e-mail baiestorf@yahoo.com.br.

Baratão2

Intrusa“A Intrusa” (165 páginas) de Bruno Azevêdo. Segundo Xico Sá, “Um folhetim em chamas capaz de tostar raparigas em flor. Um erotismo de banca capaz de reverter a mais enjoada das menopausas de todos os caritós. A Intrusa é fogo en las entranhas da frígida e solene literatura contemporaneazinha. O Monstro Bruno Azevêdo , este papaléguas, alcança, com este volume que ora lateja nas mãos da mulher moderna, a condição do nosso melhor escritor pícaro-mexicano. Que outro seria capaz de erotizar o tilintar dos duralex? A pia de louça por testemunha de um tórrido amor engordurado. “Temperamento latino é fuego”, já dizia, na subida do morro, o velho Morengueira”. “A Intrusa” traz ainda ilustrações de Eduardo Arruda, um dos criadores da revista Beleléu, e a capa do livro é de autoria de Frédéric Boilét, autor de “Garotas de Tokyo”. Apesar de estar com o livro aqui em casa, em virtude das milhares de coisas que faço tudo ao mesmo tempo, ainda não consegui tirar um tempo para lê-lo com calma.

Isabel“Isabel Comics!” (Ano 2, 56 páginas) de Bruno Azevêdo e Karla Freire. Este trabalho do casal Bruno e Karla é de extrema importância para sua pequena filha Isabel, que quando crescer vai ter um registro incondicional do amor de seus pais ao poder se “ver” com dois anos de idade, se divertindo em família. Achei o registro uma ideia fantástica, daquele tipo que outros pais apaixonados por seus filhos irão adorar e se identificar. Em fotos e textos dos criativos papais ficamos sabendo da movimentada vida de criança da filhinha Isabel em uma agitada fotonovela. Confesso que não sou o público certo para este pequeno livrinho, mas quem é pai/mãe, ou quer ser pai/mãe, creio que vai amar esta linda declaração de amor. Este livrinho, assim como “A Intrusa”, podem ser adquiridos no site http://www.pitomba.iluria.com.

dicas de Petter Baiestorf.

Bicho Papão

Posted in Animações, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on agosto 3, 2012 by canibuk

“Bicho Papão” (2012, 5 min.) de Luciano Irrthum. Animação em stop motion.

O desenhista Luciano Irrthum parece estar se especializando em produções em stop motion, sua possibilidade real de trabalhar sozinho sem ter dores de cabeça com outras pessoas, como nos disse via e-mail: “Mexer com gente dá muita mão de obra. Falham nas filmagens, tem ressaca, não fazem algumas cenas, etc. Com bonecos eu acho melhor!”. Luciano Irrthum se tornou um dos mais cultuados desenhistas surgidos nos fanzines dos anos de 1990, lançou vários álbuns de quadrinhos geniais como a quadrinização do poema “O Corvo” de Edgar Allan Poe que saiu pela editora Peirópolis (não confundir com as duas outras versões quadrinizadas por ele nos anos 90 e editadas por mim em edições independentes que você pode conferir clicando em “O Corvo – Primeira versão” e “O Corvo – Segunda Versão“), começou a pintar quadros visualmente criativos/encantadores e, ainda, iniciou a produção de suas divertidas animações em stop motion como o hilário, e já clássico, “O Mingaú da Vovó“.

Paralelo aos seus trabalhos como desenhista (no momento Irrthum está ilustrando o livro “Baratão 66”, novo trabalho do ótimo escritor Bruno Azevedo, autor de “O Monstro Souza“), continua produzindo animações em stop motion, como seu novo curta “Bicho Papão” (não confundir com “Papão” de Edgar S. Franco) e finalmente finalizou um antigo projeto intitulado “Reciclados” (uma tentativa de filmar com pessoas reais), que estava parado a anos, e que você pode conferir agora no youtube:

Em “Bicho Papão” Luciano Irrthum brinca com os medos infantis ao nos contar a história que começa com um casal na sala de casa. O homem está pelado lendo jornal e sua esposa, também pelada, peida para chamar sua atenção. Quando ela ganha atenção dele, demonstra estar tarada, querendo sexo animalesco, e se agacha perto do pênis do marido para dar início a um delicioso boquete. Enquanto ela chupa o homem a flor, que fica num vaso em cima da mesa, dança feliz e excitada com a cena. Logo é a vez do homem se divertir chupando a mulher com sua língua procurando lubrificar o clitóris rosinha dela que se contorce de prazer inebriante. O ato sexual do casal tarado faz a casa tremer e, no quarto ao lado, o filho que dormia profundamente acorda apavorado com a porta de seu armário batendo fantasmagoricamente. O menino começa a gritar que há um monstro no armário e seu desespero broxante atrapalha a foda. Seu pai fica emputecido e vai até o quarto do moleque medroso para mostrar o que um monstro pode fazer e sua ação detona momentos hilariantes de extremo gore explícito e bestialismo sexual envolvendo sexo proibido como nunca antes mostrado em um curta brasileiro.

Com roteiro, fotografia, animação, bonecos, cenários, edição, sonorização e direção de Luciano Irrthum, ele prova de uma vez por todas que é possível fazer um excelente filme sozinho. “Bicho Papão” é um passo adiante nas experimentações de Irrthum com a técnica de stop motion e acredito que ele já está preparado para alçar vôos mais altos e complicados, talvez com um projeto de maior duração e roteiro mais complexo. Mas, por outro lado, dado a diversão de seu “Bicho Papão” que não tem receio de ser explícito, tanto no sexo quanto no gore, talvez Irrthum nem deva tentar vôos mais altos e sim continuar realizando bons curtinhas insanos e politicamente incorretos quanto este. Espero ver este fabuloso curta-metragem em inúmeros festivais de cinema brasileiro (cinema nacional é tão comportado que iniciativas insanas como essa de Irrthum são sempre bem-vindas).

por Petter Baiestorf.

O Mingau da Vovó

Posted in Animações, Vídeo Independente with tags , , , , , , , , , , , , on abril 20, 2012 by canibuk

“O Mingau da Vovó” (1999, menos de 2 min.) de Luciano Irrthum.

Não posso falar muito da sinópse deste curta para não estragar o prazer que é assistí-lo, mas posso dizer que o curta mostra um neto presenteando sua amada vovó com todo o amor caliente que as vovós merecem. Ou, também, o curtinha pode ser o “passo à passo” de como fazer o delicioso mingau que as vovós tanto adoram.

Para ler o resto da postagem, assista antes o curta:

“O Mingau da Vovó” foi realizado pelo desenhista mineiro Luciano Irrthum (que nos anos de 1990 foi um dos principais colaboradores no fanzine “Arghhh” que eu editava). Luciano estava numa vernissage bebendo vinho gratís adoidado com seu amigo Zé Armando, que lhe disse estar com uma idéia para um vídeo (que era somente um cara batendo punheta, nos moldes de “Deus – O Matador de Sementinhas“). Como por essa época Irrthum estava fazendo vários bonecos de stop motion para ilustrar um livro infantil, resolveu fazer um vídeo com essa técnica, partindo da idéia de Zé Armando.

Se armando de uma câmera de vídeo VHS, um tripé e sem roteiro, a história foi surgindo enquanto filmavam, como nos confidência Irrthum: “A vovó nem ia entrar no curta, mas eu tinha a boneca sobrando e resolvi usar também!”. Para fazer o gozo, Luciano usou shampoo e, com uma seringa ligada ao membro do querido netinho por uma mangueira de aquário, conseguiu um efeito jorrante de primeira. Para as filmagens Irrthum contou com a preciosa ajuda de Sílvia Amélia ajudando-o à construir os cenários, para a música/som, Luciano diz: “Um amigo meu toca cavaquinho, tomamos algumas cervejas e ele foi tocando Jimi Hendrix no cavaquinho e eu filmando este som, depois na edição o Leo Rocha arrumou tudo!”. Mais experimental, impossível.

Filmado em apenas uma tarde, “O Mingau da Vovó” chegou até a ser exibido na MTV por João Gordo. Também foi exibido no MUndo Mix, no Miami Gay Festival e em vários outros festivais nacionais. Em VHS foi colocado como bônus de luxo em alguns lançamentos da Canibal Filmes e em DVD está disponível como extra no “Mamilos em Chamas” de Gurcius Gewdner. Sobre a exibição na MTV, Irrthum nos conta: “Mandei pro João Gordo que exibiu na íntegra naquele programa dele que sempre passava algumas animações. No dia quem estava com ele no programa era o Edson Cordeiro, que fez uma cara de espanto muito engraçada ao final do curta, com João Gordo rolando de rir ao lado; gostei!”.

Atualmente Luciano Irrthum está preparando algumas animações gore em stop motion e assim que estiverem pronta falarei delas aqui no Canibuk.

Por Petter Baiestorf.

Arghhh e seus Quadrinhos

Posted in Fanzines, Quadrinhos with tags , , , , , , , , , , , on janeiro 3, 2012 by canibuk

Como primeiro post do ano resolvi resgatar aqui no Canibuk mais algumas histórias em quadrinhos que editei nos anos 90 no meu extinto zine “Arghhh”.

Insônia, escrita e desenhada por Luciano Irrthum, foi originalmente publicada no “Arghhh # 5”.

Pupilas, escrita e desenhada por Michel Garcia, foi originalmente publicada no “Arghhh # 8”.

Sábado de Aleluia – Malhação de Judas, escrito e desenhada por Márcio Kurt, foi originalmente publicada no “Arghhh # 14”.

A Frágil Arte da Existência, escrito e desenhada por Eduardo Manzano, foi originalmente publicada no “Arghhh # 23”.

Quadrinhos Tragicômicos do Arghhh

Posted in Fanzines, Quadrinhos with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on setembro 17, 2011 by canibuk

No fanzine “Arghhh # 3” (Março de 1994), publiquei uma HQ do desenhista Renato Pereira Coelho, o RPC, chamada “Elo Perdido”, a qual resgato aqui neste post.

Já no “Arghhh # 9” (Junho de 1995), publiquei “Sifu” do desenhista Rodrigo Gagliardi e “Sedução” do Luciano Irrthum. Resgato aqui elas, continuam hilárias!

E dando continuidade às parcerias com artista plástico e quadrinista Luciano Irrthum, no “Arghhh # 11” (Outubro de 1995), publiquei a HQ “Invasores”, lindona como sempre!

O mesmo aconteceu com o Rodrigo Gagliardi que voltei a publicar no “Arghhh # 27” (Novembro de 1999), com a engraçada HQ “Gore Dog 2”.

Oito Leões e um Garoto

Posted in Fanzines, Quadrinhos with tags , , , , , on maio 23, 2011 by canibuk

No “Arghhh” número 7 publiquei uma ótima HQ do Luciano Irrthum chamada “Oito Leões e um Garoto”, resgato ela aqui no blog para que os jovens que não tomaram contato com os fanzines de papéis possam conhecê-la!!!

Os Bons Tempos da Imprensa Livre

Posted in Fanzines, Quadrinhos with tags , , , , , , , , , , , on abril 16, 2011 by canibuk

Postando hoje uma série de quadrinhos de uma página que publiquei originalmente no meu fanzine “Arghhh” nos anos 90.

Inferno (de RPC & Rosemário Souza)

Luz (Adriano Gomes & LOK)

Santa Lucia (RPC & Brujeria)

Ódio (RPC)

Ossos, Só Ossos! (RPC)

Pai Nosso (Luciano Irrthum)

Tua Meleca Gosmenta (Maria Jaepelt)

Dia de Poesia

Posted in Fanzines, Literatura, Nossa Arte with tags , , , , , , , , , on abril 9, 2011 by canibuk

 

O Pássaro

O Pássaro vôou em busca de alimento.

No infinito avistou um cadáver

não tão fresco

e sobre ele pousou!

O olho-morto transformou-se

em apetitoso manjar

e a fome do emplumado saciou!

O Escritor

Escrevendo, bebendo,

Criando, chapando…

Minhas úlceras se perdem pela vida!

Maria Bernenta Vs. O Anjo de Muletas

Garanhões unidimensionais

com unhas cravadas nas costas

fazem amor na pocilga,

seus pênis se entrelaçam

e seus rostos se tornam um,

apenas um,

um no eterno momento do gozo,

gozo anatomicamente perfeito,

fundido ao momento sublime,

às gotas de suor,

pai suor,

suor responsável pela atração carnal

de dois garanhões unidimensionais.

Tocando Sinos Derretidos

Não há mais nada para escrever.

Não há mais nada para cantar.

Não há mais nada para amar.

Não há mais nada para criar.

Não há mais nada do que reclamar.

Não há mais nada para odiar.

Não há mais nada para se fazer.

Não há mais nada para se orgulhar.

Poesias de Petter Baiestorf (escritas em algum momento dos anos 90 do século XX, ilustradas com desenho de Luciano Irrthum e capas de RPC baseadas em descrições de Baiestorf).

E Do Caos Criei A Exuberante Anomalia Cloacal

Posted in Literatura, Nossa Arte with tags , , , , , , on março 29, 2011 by canibuk

A criação perdeu-se em sua complexidade. Nadou para os anais do ralo castrador e boiou, boiou e boiou cano abaixo, rumo ao Olímpio fecal tão venerado nas missas de domingo que teimam em nunca abandonar a ignorância do homem. Lá, protegida em seu casulo de seda negra, organizou suas células rebeldes e floresceu para o mundo cão. O homem com várias cloacas – sim leitores, cloacas são aqueles orifícios que expurgam merda e mijo ao mesmo tempo – saltou para fora do casulo. Estava completa sua metamorfose. Continuaria seu sopro de vida. Os palhaços lotaram as arquibancadas do show da vida para apreciar o novo ser, o incrível homem repleto de cloacas nas costas, axilas, rosto e até no umbigo. O criador incrédulo também compareceu, precisou ver para crer. Suas cloacas exalavam um cheiro doce capaz de fazer com que todos se sentissem de bem com suas vidas medíocres. O homem-cloaca observou todos ao seu redor. Suas cloacas pulsavam possivelmente excitadas pela estranha veneração do respeitável público. Algo de podre, então, aconteceu no reino de Baiestorf. O homem-cloaca produziu uma curiosa substância de fino trato que transbordava de suas cloacas super excitadas. Enrolou a substância de cor rosa num palito de madeira e ofereceu a uma cria de sorriso automático. A cria olhou a substância produzida pelas cloacas do homem e num único gesto, também automático, levou a massa doce a sua boca. Mastigou confiante e gostou daquilo. O Homem-cloaca defecou algodão doce. O homem-cloaca produziu algodão doce. E seu algodão doce cloacal causou impacto. Era realmente delicioso. Logo todos os palhacinhos estavam comendo mais e mais algodão doce cloacal, como que viciados em mais uma maravilha. A maravilha que fazia suas vidas parecerem menos medíocres!

escrito por Petter Baiestorf.

Homem-Cloaca desenhado por Luciano Irrthum.

Shimamoto

Posted in Entrevista, Quadrinhos with tags , , , , , , , , , , , on março 15, 2011 by canibuk

Júlio Y. Shimamoto nasceu em 13 de maio de 1939 em Borborema, interior Paulista. Começou a desenhar na adolescência e logo se tornou um dos melhores quadrinistas de horror (e qualquer outro gênero) do Brasil. Shimamoto tinha suas histórias publicadas em inúmeras revistas profissionais e, mesmo assim, nunca deixou de colaborar em fanzines (ele sempre colaborava com ilustrações pro meu zine). No número 21 do “Arghhh”, editei uma entrevista com o grande mestre Shimamoto (abri espaço para que outros artistas também fizessem suas perguntas, ficando a entrevista mais bacana). Resgato essa entrevista aqui no Canibuk:

Petter Baiestorf: Como foi sua infância no interior paulista?

Shimamoto: Sou caipira e nesse contexto, tive infância feliz: cacei passarinhos com atiradeiras (acertei raramente), comi frutos silvestres como pitanga, marmelos e gabirobas. Pratiquei arco e flecha e errei em lagartos e cutias. Meu pai não era xavante prá me orientar. Nadei pelado em arroio. Escapei de cobras e caranguejeiras, mas não das taturanas venenosas. Amarelei quando um lagarto preto e branco (80 cms) me peitou perto de uma furna com ninhadas.

Airton Bratz: Como começou o seu envolvimento com quadrinhos? E, na sua opinião, qual foi o seu melhor trabalho?

Shimamoto: Ganhei três gibizões de 100 páginas cada (contando capa) em 1944. Foi presente do papai que voltava de viagem. Um deles tinha o Príncipe Submarino nocauteando um grupo de soldados japoneses. Sem enfeite e nem falta modéstia, o melhor trabalho ainda tenho que fazer.

Petter Baiestorf: Você fazia o que na ADESP, já que seu estúdio servia de sede para a associação?

Shimamoto: Eu cuidava do apoio e tesouraria. Explico o apoio: quando o sindicato dos bancários, que ficava no nosso prédio, nos ajudava com “know how” de sindicalismo ou cooperativismo, a gente retribuía com cartazes e reivindicações ou palavras de ordem que usavam em passeatas. Tinha as tiras de HQ e logomarcas de secções de jornais que a gente fornecia em troca de espaço no jornal para entrevistas e notícias sobre nosso movimento de nacionalização. Chegamos até a confeccionar cenários para palco de TV que nos recebiam prá entrevistas.

Petter Baiestorf: Porque não deu certo suas colaborações em revista humorísticas, como “Mazzaropi”, “Oscarito & Grande Otelo” e outras? Seu trabalho era muito pesado?

Shimamoto: Por ser leitor de gibis e não de Pato Donalds da vida. Alguém me opinou que não era o convívio com determinado gênero, mas a guerra e o violento conflito de terras na região que teriam influenciado meu estilo de HQ. Pode ser, essas coisas influem muito.

Petter Baiestorf: Nas suas HQs das décadas de 60/70 havia muita crítica ao sistema, militares e polícia. Era um reflexo da época?

Shimamoto: Sim, sim. E tinha meu pai, que apesar de lavrador, era contador formado no Japão e era extremamente politizado. Embora eu tenha só o curso primário, ele me botava prá ler jornal desde os 10 anos. Meu velho não tinha recursos prá que eu continuasse estudando. Fui trabalhador precoce como ainda ocorre com os filhos dos sem-terras. Mudam-se os governantes mas o país é o mesmo sempre.

Lúcio Reis: Como foi produzir HQs no Brasil nos anos 60/70, trabalhando para editoras como a Taika, Edrel e seu contato com feras como Colin, Nico Rosso e outros grandes artistas da HQ nacional?

Shimamoto: Comecei e fiz HQ de 1957 à 1963 (e parcialmente em 1965 e 1966). As editoras eram: Novo Mundo, La Selva, Outubro, CTPA (Cooperativa Editorial de Trabalhadores de Porto Alegre) no tempo do governador Brizola, e Folha de São Paulo. Edrel e Taika ainda não existiam. Foi um período fantástico quando uma tropa de desenhistas surgiram ao lado de outros já consagrados: Colin, Getúlio, Igayara, Saidemberg, Aragão, Odilon, Igomar, Daglemos, Hamasaki, Maurício, Queiróz, Sérgio Lima, Zezo, Scudellari, Bortolassi, Pizzi, Nico Rosso e por que não Gedeone.

Coffin Souza: Quando você desenhava para a “Spektro” foram desenhadas histórias de fantasmas que se passavam no Japão Medieval, com samurais, etc… Eram baseadas em lendas e pesquisas ou vocês as inventava? Você nunca pensou em fazer uma série baseada no folclore japonês de horror?

Shimamoto: O Japão, como o Brasil, é rico em lendas e histórias sobrenaturais. As crianças crescem no clima de “terror”, tanto que eu vivia com medo do escuro. Quando queriam me punir eles me botavam prá dormir no relento. Já viu, né! Assim, criar HQ terrorífico era só remanejar o que se achava armazenado na memória.

Petter Baiestorf: Como foi seu ingresso para a publicidade? Foi por causa de sua militância contra os “enlatados”, certo?

Shimamoto: Antes de HQ trabalhei no departamento de propaganda das lojas Sears & Reeback, quando tinha 17 anos em 1956, como desenhista. Em 1967, como participante do movimento de nacionalização de HQ, fui boicotado pelas editoras. E fui desenhar livros didáticos para a Editora do Brasil. Daí veio o golpe militar e relutante, entrei prá faculdade pelo saudoso Lírio Aragão.

Petter Baiestorf: Porque a imprensa o acusou de ter plagiado o cartaz nacional do filme “King Kong”?

Shimamoto: Foi por mancaratismo (não confundir com macartismo) do jornalista Giba Um, que era lobista da Metro, do famigerado Harry Stone, testa de ferro da distribuidora no Brasil. Gilberto (Giba) falsamente denunciou nosso cartaz de “King Kong” como plágio da capa da Hustler do Larry Flynt. Como? Se meu desenho foi feito em Maio e a revista saiu em junho nos USA? E era proibida sua circulação no Brasil! E eu nunca tinha saído daqui de Jacarepaguá! Foi uma merda, com todos os jornais, como que orquestrados, repetiam a notícia que saiu na “Última Hora”, onde o colunista tinha espaço cativo. A Metro queria desmoralizar o concurso pela nacionalização de cartazes que o clube de criação do Rio de Janeiro patrocinava! Lamento não tê-los processado, teria um caminhão de dólares em indenização!

Petter Baiestorf: Tanto se fala em horror, mas, o que é horror para Shimamoto?

Shimamoto: Horror prá mim é a desventura do ser humano. Tenho por hábito filmar mentalmente a tragédia que acorrenta a humanidade e lamentar por nada poder fazer prá evitá-la. E o pior horror é saber que, quase sempre, o sofrimento do homem é provocado por outro homem.

Petter Baiestorf: E o seu envolvimento com o Maurício de Souza? Você realizou algum trabalho importante prá ele?

Shimamoto: Na ADESP elegemos Maurício de Souza prá presidente por ser jornalista articulado e quadrinista de talento. Ele soube pelo menos capitalizar essa liderança para plantar a semente de seus mega-projetos. Hoje ele está onde sempre quis chegar. Pena que mais gente não tenha chegado com ele. Ajudei-lhe na confecção da “Boneca” do suplemento dominical prá concorrer na Folha de São Paulo. Ganhou e me retribuiu dando-me a terceira contra-capa. Ali encaixei durante dois anos e meio “Fidêncio, O Gaúcho”, que quase virou série de TV na antiga Tupi, dos diários associados.

Luciano Irrthum: A mais ou menos uns 4 meses atrás (nota do Canibuk: essa entrevista coletiva foi realizada em maio de 1997) eu tava bebendo no Maleta, aqui em Belo Horizonte, e conheci um velho piradão, todo destruído pelo álcool, que fazia quadrinhos de horror na década de 60 e 70. O velho diz que pirou o cabeção e vive bebendo cachaça por causa dos quadrinhos de horror. Nome dele parece que era Luís. É possível enlouquecer fazendo HQs de horror?

Shimamoto: Loucos todos somos um pouco. Quem não é louco é vegetal. Determinação, obsessão, inquietação ou aspiração em busca de um objetivo, são um tipo de anomalia, de piração. Nossos irmãos animais são instintivos, mas nós somos racionais e emotivos, isto é, loucos. Esse Luís não seria Luís Merí? Era Uruguaio, ou argentino, e vivia enturmado com o simpático Zalla e Colonese, também nascidos no Cone Sul. Sem diminuir os colegas, para mim, os melhores “terroristas” do HQ no Brasil são: Colin, Manoel Ferreira e, dos novos, Mozart Couto e Mano. Estes quatro estão no bico da pirâmide. Eu estou em algum lugar, acima do meio dessa pirâmide.

Petter Baiestorf: Fale-me das técnicas de desenho que você cria, como por exemplo, o desenho em bexiga…

Shimamoto: Seguinte, tenho um inimigo dentro de casa. E faz mais de dois anos que não me atraco com ele: é o micro-computador! Tenho bronca dessa onda colonizante e babante que tenta robotizar nosso cérebro, impondo terrorismo através da mídia. É um puta marketing da infobusiness globalizada. Ouçam essa: um físico famoso tinha acabado de construir um potente cérebro eletrônico (nome anterior de computador) e para exibir-se chamou seu antigo colega de faculdade: “Einstein, meu amigo, eis a maravilha das maravilhas deste século! Você pergunta o que quiser que ele responde tudo naquele terminal ali!” E Einstein: “Hum… Ele faz perguntas?”… Não, não fazia perguntas, só sabia responder. Isso diz tudo, né? Daí, só uso bexiga prá distorcer meus desenhos. É rápido e sem artificialismo. Dicas: Abro a bexiga, desenho sobre a superfície, repuxo-as à vontade e copio a distorção na copiadora.

Renato P. Coelho: Qual a sua opinião sobre a atual situação dos quadrinhos brasileiros, principalmente com artistas nossos trampando lá fora no estrangeiro?

Shimamoto: Sou a favor, mesmo que desenhem super-heróis. Tem que se viver, né? Cadê Abril e Globo que não abrem espaço à ninguém? O brasileiro é criativo e talentoso em qualquer coisa. Basta dar-lhe condições e ele faz bem, com competência e maestria.

Petter Baiestorf: O que você tem achado do movimento zineiro aqui do Brasil da década de 90?

Shimamoto: Apesar das limitações, das dificuldades, os zineiros são verdadeiros guerrilheiros que lutam por uma grande causa. Dou apoio total e colaboro com todos na medida do possível. Adoro zines e os trabalhos que neles são publicados. São eles que mantém a chama das HQs nacionais sempre acessa.

Petter Baiestorf: Destacaria algo?

Shimamoto: Toda e qualquer iniciativa em publicar trabalho nacional merece nossos aplausos, independente de ser bom ou ruim. Publicar é prioridade!

Petter Baiestorf: E a visão política dos zineiros de hoje? Chega à frustrar as gerações passadas?

Shimamoto: Nada a obstar. Como disse antes, num amplo leque de opções, o que o zineiro preferir fazer, que o faça. Tudo é válido!

Petter Baiestorf: E o Shimamoto ano 2000? Quais são seus planos?

Shimamoto: Em setembro de 1996, um tumor maligno no rim quase me “levou”. Isso me deixou chapado e vulnerável. Meus amigos me deram força e isso foi fundamental prá minha recuperação. Já tô superando o problema e comecei uma faxina mental. Expulsei grande parte do Shima que eu não gostava e estou numa fase de mudança. É um processo violento e irreversível. Muitos amigos começaram a me estranhar, estão me observando com um certo distanciamento. Meu HQ reflete essa luta. Tô destruindo meu desenho. Tô buscando o ponto onde comecei no passado. Tô “desaprendendo”. Tô partindo agora pro HQ – teatro, HQ minimalista, sem cenários, sem balões, sem o que for dispensável. Quem sabe o meu ano 2000 começou agora?

Segue uma HQ com desenhos do Shimamoto e roteiro do Paulo Hamasaki que publiquei no “Arghhh” número 10.