Hipócrates olhou para o rosto comprido de Bug e lhe disse: “Mantendo os pés quentes, a cabeça fresca e os intestinos livres viverás muito!”. Bug levou as mãos a boca e regurgitou litros de cerveja que havia bebido sem saber o significado da palavra moderação. Seus jorros de vomito acabaram por encharcar Hipócrates que ali parado, surpreso, estava a ver pingar os líquidos de outro ser vivo. Bug não queria ouvir ouvir Hipócrates que, irritado, começou a cantarolar algo que dizia mais ou menos isso que transcrevo aqui: “Em um ferimento o aparecimento de convulsão é perigoso; nos convalescentes, se uma parte permanece dolorosa, é nela que se forma os depósitos; as expectorações escuras, sanguinolentas ou purulentas, nas febres não intermitentes são más; os que nas febres tem urina turvas sofrem de cefaléia; uma convulsão sobrevinda após grande hemorragia é má; uma grávida cujos seios murcham rapidamente vai abortar; as úlceras que aparecem no corpo dos hidrópicosdificilmente curam…”, até ser impedido de continuar sua canção ao levar uma marretada no crânio. Kei Ishii Chow, também bêbado, lhe diz algo como “Minha vida foi prejudicada pela proibição de dissecar cadáveres femininos!”. Bug limpa o vomito grudado em sua boca e fica assistindo Hipócrates recolher seu próprio cérebro com uma pequena colher de chá. Hipócrates, sem deixar de recolher seus neurônios espatifados, olha para Kei Ishii Chow e com o maxilar trincado lhe diz: “A vida é curta, a arte é longa, a ocasião fugidia, a experiência enganadora, o julgamento difícil…”, parando de falar quando avista, perplexo, Uzi Uschi e Voltaire, vestidos de menininhas, vindo em sua direção com um pequenao banquinho de gelatina nas mãos, o qual Voltaire coloca no chão, sobre em cima, e faz um discurso que dizia: “Que arte poderosa poderia produzir uma matéria que, tendo sido preparada pelas glândulas salivares, em seguida pelo suco gástrico, depois pela bílis hepática e pelo suco pancreático, tendo fornecido no seu caminho um quilo que se transformou em sangue, tornou-se finalmente esse composto fétido e pútrido que sai dos intestinos pela surpreendente força dos músculos?”. Uzi Uschi bebe num único gole uma garrafa de cerveja e aplaudindo grita palavras furiosas em latim mal pronunciado onde se fez ouvir as palavras “Homo doctus sede verus atheus!”. Kei Ishii Chow brinda a si mesmo e diz a todos: “A alma espera seis semanas até que o feto se forme e só então ocupa a glândula pineal; mas, se depara com um germe falso, volta atrás, aguardando então uma ocasição mais propícia para dominar o corpo mole do embrião recém formado!”. Voltaire, tão Bêbado quanto todos, grita para Kei Ishii Chow: “Ei, seu viado alcoólatra, essa teoria é minha!!!”. Hipócrates gargalha e diz para Voltaire: “Foda-se, seu filósofo de bosta!!!” e recoloca sua massa cinzenta de volta ao crânio destruido. Borboletas corcundas materializam caixas de cervejas e todos exclamam um “Hóóóóó!!!” conjunto de felicidade, esquecendo então a inútil discussão e se atiram sobre as magníficas garrafas que brilham como raios de sol…
Petter Baiestorf (“Acontecimentos Coruscantes do Ex-Escanifrado Uzi Uschi e seus Amigos Inuptos”, 2001).