Arquivo para poesia de bêbados

A Voz

Posted in Literatura with tags , , , , , , , , , on maio 24, 2012 by canibuk

Meu berço ao pé da biblioteca se entendia,

Babel onde ficção e ciência, tudo, o espólio

Da cinza grega ao pó do Lácio se fundia.

Eu tinha a mesma altura de um in-fólio.

Duas vozes ouvi. Uma, insidiosa, a mim

Dizia: “A Terra é um bolo apetitoso à goela;

Eu posso (e teu prazer seria então sem fim!)

Dar-te uma gula tão imensa quanto a dela.”

A outra: “Vem! vem viajar nos sonhos que semeias,

Além da realidade e do que além é infindo!”

E essa cantava como o vento nas areias,

Fantasma não se sabe ao certo de onde vindo,

Que o ouvido ao mesmo tempo atemoriza e afaga.

Eu te respondi: “Sim, doce voz!” É de então

Que data o que afinal se diz ser minha chaga,

Minha fatalidade. E por trás do telão

Dessa existência imensa, e no mais negro abismo,

Distintamente eu vejo os mundos singulares,

E, vítima do lúcido êxtase em que cismo,

Arrasto répteis a morder-me os calcanhares.

E assim como um profeta é que, desde esse dia,

Amo o deserto e a solidão do mar ao largo;

Que sorrio no luto e choro na alegria,

E apraz-me como suave o vinho mais amargo;

Que os fatos mais sombrios tomo por risonhos,

E que, de olhos no céu, tropeço e avanço aos poucos.

Mas a Voz me consola e diz: “Guarda teus sonhos:

Os sábios não têm tão belos quanto os loucos!”

poesia de Charles Baudelaire (“As Flores do Mal – Marginália”).

Leia mais: “As Metamorfoses do Vampiro“.

1/2 Café

Posted in Anarquismo, Fanzines, Nossa Arte with tags , , , , on novembro 7, 2010 by canibuk

Tava terminando de digitar uns quadrinhos agora na madrugada e descobri por acaso este folheto poético que editei em parceria com o desenhista Michel Garcia (não sei em que ano foi isso, mas é possível que tenha sido em 2004). Pelo que me lembro este folheto poético foi a última coisa que editei em papel e acabou nem tendo distribuição porque tava todo mundo desanimadão nesta época (tudo que é zineiro de papel tinha sumido e os zines de papel começavam a entrar em extinção). Tem um endereço e fone meu ali no folheto, não adianta enviar cartas (nem ligar) prá esses contatos porque eles não estão mais valendo.

E, neste folheto poético, descobri um poema que escrevi por essa época que não lembrava mais, segue ele:

ENCHEU A CARA

e saiu por aí pintando frases de protesto pelos muros da cidade. Estava indignado com a situação do Brasil e muito mais indignado com as pessoas que não se indignavam e saiam por aí detonando políticos, padres, burgueses e outros seres desprezíveis.

Encheu a cara

e saiu por aí batendo boca com os milicos, guardiões dos ricos e famosos.

Encheu a cara,

ainda bem,

assim não sentiu tanta dor quando apanhou de cecete da guarda municipal…

de baiestorf.