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Infelizmente estou sem tempo algum para atualizar o blog. Mas nessa última semana estava selecionando material que irá fazer parte do livro “Canibal Filmes – Os Bastidores da Gorechanchada” e encontrei um material referente aos nossos lançamentos em VHS (que já estão disponíveis em DVD e que você pode comprar aqui na MONDO CULT):
“Cani Arrabbiati” (1974, 96 min.) de Mario Bava. Com: George Eastman, Riccardo Cucciolla, Lea Lander e Don Backy. Também conhecido como “Semaforo Rosso” ou “Kidnapped”.
Se tem um filme em que você deve confiar na indicação sem maiores perguntas e sem se informar muito, é este clássico “Cani Arrabbiati”, mais conhecido como “Rabid Dogs”, do fantástico diretor italiano Mario Bava. Na minha opinião o melhor trabalho de Bava em uma carreira repleta de grandes momentos. O mais incrível é que este filmaço, na época em que foi finalizado, não teve distribuição nos cinemas porque a produtora responsável por ele entrou em falência e foi impedida, legalmente, de lança-lo. Somente no ano de 1995 (alguns dizem 1998, não lembro direito e pesquisando achei informações desencontradas, mas vi ele em 1999 em cópia pirata conseguida pelo colecionador Thómaz Albornoz) que o filme ganhou distribuição por insistência de Lea Lander, atriz do filme (que em algumas produções assinava com o nome de Lea Kruger para lucrar com a fama de seu primo Hardy Krüger, ator em clássicos como “Barry Lyndon” (1975, Warner) de Stanley Kubrick, “A Bridge too Far/Uma Ponte Longe Demais” (1977) de Richard Attenborough ou “The Wild Geese/Selvagens Cães de Guerra” (1978) de Andrew V. McLaglen).
O que você deve saber da trama é o seguinte: Quatro ladrões tentam assaltar um carro blindado. Um deles é morto durante o assalto e os três restantes precisam fugir pegando duas mulheres de reféns (uma logo é morta) e roubando um carro que estava parado num semáforo (o motorista, Richard, diz desesperado que está levando seu filho doente ao hospital, mas não consegue sensibilizar os bandidos). Logo o trio de maníacos começa a torturar psicologicamente seus reféns (a ação do filme se desenvolve, com maestria, dentro de um carro), com um dos ladrões querendo estuprar a mulher, Maria (Lea Lander), a todo custo. Saber mais do que isso estraga as ótimas surpresas que o roteiro nos proporciona. Posso assegurar que você vai se deparar com um dos melhores finais da história do cinema (dependendo de qual versão do filme você estiver vendo, pois existem pelo menos seis cortes de “Cani Arrabbiati” circulando no mercado mundial).
Com base numa história de Ellery Queen (pseudônimo usado pelos primos de origem judaica, Frederic Dannay e Manfred Bennigton Lee) publicada pela Arnoldo Mondadori Editore através da série policial “Il Giallo Mondadori”, os roteiristas Alessandro Parenzo e Cesare Frugoni, com algumas intervenções de Mario Bava, criaram uma tensa peça sobre o sadismo humano e sua capacidade de maldades em nome de lucro fácil, com um final extremamente niilista. Mario Bava nunca esteve tão a vontade e sarcástico em um filme, dá prá sentir ele se divertindo enquanto fazia o filme. “Cani Arrabbiati” era seu filme preferido dos que fez.
Mario Bava (1914-1980) foi técnico de efeitos, diretor de fotografia, roteirista e diretor, filho do escultor Eugenio Bava, um dos pioneiros do cinema italiano, responsável por trucagens e direção de fotografia de inúmeros filmes mudos. Mario, em 1956, foi contratado pelo diretor Riccardo Freda para fazer a fotografia de “I Vampiri”, filme que Freda abandonou no meio da produção deixando a oportunidade para Bava finalizá-lo. Seu primeiro filme solo é o clássico “La Maschera del Demonio/Black Sunday/A Maldição do Demônio” (1960, London Films) com Barbara Steele no elenco. Em seguida dirigiu uma série de filmes bastante influentes como “Sei Donne per L’Assassino/Blood and Black Lace” (1964) sobre modelos assassinadas; “Terrore Nello Spazio/Planet of the Vampires” (1965) que mostra astronautas lutando contra criaturas em planeta hostil, que serviu de inspiração para “Alien” (1979) de Ridley Scott e foi plagiado por “Pitch Black/Eclipse Mortal” (2000) de David Twohy; “Operazione Paura/Kill, Baby, Kill” (1966), horror gótico bastante imitado; “Diabolik” (1968), uma adaptação adulta inspirada em histórias em quadrinhos, dando uma nova perspectiva ao gênero e “Reazione a Catena/A Bay of Blood/A Mansão da Morte” (1971, também conhecido como “Twitch of the Death Nerve” ou “Ecologia del Delitto”), slasher exemplar que, alguns anos depois, foi descaradamente copiado em “Sexta-Feira 13 – Parte 2”. Decepcionado com a distribuição de seus últimos filmes como “Lisa e il Diavolo” (1974) e “Cani Arrabbiati”, Bava realizou ainda “Schock” (1977) e se aposentou. Lamberto Bava é seu filho e seguiu a tradição familiar, sem grande destaque, na produção de filmes.
Um dos atores do filme é Luigi Montefiori (George Eastman) que se tornou conhecido por sua longa parceria com Joe D’Amato. Trabalhou com vários grandes diretores italianos como Enzo G. Castellari, Enzo Barboni, Umberto Lenzi e até Federico fellini (ele está no elenco de “Satyricon” (1969), clássico felliniano imperdível). Foi ator e produtor do clássico “Antropophagus” (1980) dirigido por seu amigo D’Amato. Outro ator de destaque no elenco é Riccardo Cucciolla, um dublador (também diretor de dublagens) que eventualmente trabalhava como ator. Cucciolla também está no elenco de “Sacco e Vanzetti” (1970) de Giuliano Montaldo, um dos mais belos filmes políticos dos anos 70.
“Cani Arrabbiati” nunca teve um lançamento no Brasil. Espero que saia uma versão nacional com material extra como um clássico destes pede (e que não seja lançado pela Continental, lógico!). A título de curiosidade: escrevi o roteiro de “Raiva” (2000) inspirado em “Cani Arrabbiati”.
Nesta semana Gurcius Gewdner está disponibilizando em sites como Vimeo e Youtube alguns curtas que fiz tempos atrás e que nunca foram lançados em DVD. Segue link para mais quatro curtinhas bagaceiros. Para Assistir “Deus – O Matador de Sementinhas” (1997) e “Poesia Visceral” (2004), clique aqui.
“Fragmentos de uma Vida” (2002, 7 min.) de Petter Baiestorf. Com: Juliana, PC e Loures Jahnke.
Em 2001, logo após o lançamento do longa-metragem “Raiva”, comecei as filmagens de outro longa chamado “Mantenha-se Demente”, uma homenagem ao cinema gore exagerado japonês que naquela época eu assistia aos montes em fitas VHS piratas sem legendas em nenhuma língua ocidental. Como o “Raiva” não deu lucro financeiro nenhum, tive que abortar as filmagens do “Mantenha-se Demente” (bem mais caras e complicadas), mesmo já tendo filmado algumas seqüências. Depois de um ano resolvi rever as cenas que havíamos filmado e percebi que tinha um curta nas mãos. Não gosto de filmar e não aproveitar o material. Mudando o título para “Fragmentos de uma Vida”, montei as cenas para ser uma reflexão sobre a brutalidade do machismo na sociedade brasileira (sem deixar de lado minhas críticas religiosas, desta vez centradas na figura de um satanista, que para mim é tão ignorante quanto um católico, um evangélico, um espírita, um cabalista, macumbeiro, budista, muçulmano e o que mais os medos humanos criarem para servir de muletas). Não filmo o sobrenatural porque o que não existe não me interessa (salvo zumbis e alienígenas que aí é pura diversão), meu interesse está voltado aos assuntos possíveis, como a imbecilidade do homem, seu fanatismo religioso, sua brutalidade que ganha força com sua ignorância; uma horda de torcedores fanáticos vindo em minha direção me assusta, fanáticos religiosos segurando um facão me assustam (o mundo está cheio de exemplos de massacres religiosos), a mente humana me assusta muito mais que vampirinhos ou fantasminhas de filme de horror americano que o cinema brasileiro está começando a pegar gosto em copiar. A trilha sonora do curta trás músicas das bandas Ornitorrincos e Intestinal Disgorge.
“Frade Fraude Vs. O Olho da Razão” (2003, 13 min.) de Petter Baiestorf. Com: Coffin Souza e Petter Baiestorf.
Este é outro curta que só filmamos por culpa do tédio (se você não gosta de filmes sem um mínimo de produção nem assista). Estávamos, Coffin Souza e eu, sem nada para fazer num domingo e, depois de algumas cervejas, resolvemos filmar uma reflexão sobre os rumos da humanidade. Nos apropriamos de textos do Nietzsche (e de outros filósofos que fomos lembrando frases) e elaboramos um curta cíclico como a vida; ação/reação – tudo que tu faz na vida resulta em críticas positivas e destrutivas (e no final arrisco dar minha fórmula para a implantação de uma sociedade anarquista na sociedade de hoje). Revendo este curta hoje me arrependo de não tê-lo filmado direito, com outro ator no meu papel (para mim manejar a filmadora e dirigir direito), figurinos apropriados e outras coisinhas mínimas de produção. Mas a idéia está aí, rodando por todos os lados, essa tranqueira foi até exibida em alguns festivais de cinema experimental. Neste curta temos uma participação especial de Claudio Baiestorf (meu pai, que infelizmente faleceu em 2009), no final do filme, com um diálogo enigmático que remete à uma piada interna da Canibal Filmes envolvendo o clássico “Invasion of the Body Snatchers/Vampiros de Almas” (1956) de Don Siegel.
“Vai Tomar no Orifício Pomposo” (2004, 14 min.) de Petter Baiestorf. Com: Coffin Souza, Elio Copini e DG.
Não é segredo prá ninguém que sou um grande fã do escritor Charles Bukowski e este curta é minha tentativa de filmar algo no universo do velho safado. Não lembro muita coisa destas filmagens, não lembro nem de ter escrito o roteiro (to achando que filmei este curta todo de cabeça), nesta época eu estava mais preocupado em me matar bebendo do que na possibilidade de realizar meus projetos. A casa usada nestas filmagens era a casa real do Souza e como a casa vizinha à dele estava vazia, arrancamos a parede para criar o clima surreal que a briga de vizinhos pedia. Elio Copini interpretou o evangélico cretino e Coffin Souza o escritor maldito com problemas com as bebidas (essa personagem sou eu, mas pode ser o Souza mesmo, pode ser o Bukowski, pode ser você). Não gosto muito da edição que fiz (montei tudo na câmera, inclusive os efeitos sonoros e as músicas). Desde a época que filmei “Vai Tomar no Orifício Pomposo” que tenho planejado um longa-metragem dramático com este clima de desespero fantástico, mas como tenho preferência por projetos sexploitations de humor negro, sempre vou deixando prá depois essa minha vontade de produzir um drama etílico surrealista.
“O Nobre Deputado Sanguessuga” (2007, 13 min.) de Petter Baiestorf. Com: Elio Copini, Coffin Souza, Gurcius Gewdner, Carli Bortolanza, Iara e Claudio Baiestorf.
Essa fábula infantil que ensina as crianças sobre as maldades dos políticos brasileiros eu escrevi e dirigi em 2007 para testar minha nova filmadora (escolhi a temática infantil por dois motivos, primeiro: nesta época eu estava planejando um livro infantil com ilustrações de Gurcius Gewdner – idéia que não abandonei ainda; segundo: porque é uma temática que me interessa muito). Inspirado no cinema expressionista alemão, “O Nobre Deputado Sanguessuga” foi a desculpa perfeita para reunir amigos para algumas cervejas no meu sítio e me exercitar na narrativa do cinema mudo. Gostei bastante da experiência de rodar um curta infantil, mas acabei não repetindo a dose porque depois dele rodei somente sexploitations gores com títulos como “Arrombada – Vou Mijar na Porra do seu Túmulo!!!” (2007), “Vadias do Sexo Sangrento” (2008) e “O Doce Avanço da Faca” (2010) e uma comédia musical western cafajeste chamada “Ninguém Deve Morrer” (2009).
“Quel Maledetto Treno Blindato” (“The Inglorious Bastards/O Expresso Blindado da SS Nazista”, 1978, 99 min.) de Enzo G. Castellari. Com: Bo Svenson, Fred Williamson e Peter Hooten.
Este filme é uma das obras-primas do diretor italiano Enzo Castellari. Com um senso de humor característico do cinema italiano (onde os heróis nunca são perfeitos, nem bons, em tempo integral) ele nos conta a história de cinco problemáticos soldados que são avessos à disciplina do exército e que estão presos. Quando o comboio que os levava à prisão militar é atacado por aviões alemães surge a oportunidade deles fugirem em direção a Suiça (país neutro). Em fuga o grupo logo se une a um desertor alemão e vai se metendo numa sucessão de situações absurdas (como quando encontram várias mulheres peladas tomando banho num rio e elas se revelam soldadas do Terceiro Reich), até que encontram um suspeito grupo de sete soldados alemães e, na dúvida, passam chumbo em todos. Quando nossos anti-heróis são capturados pela Resistência Francesa ficam sabendo que os setes soldados alemães que eles mataram eram, na verdade, soldados americanos disfarçados para a realização de uma importante missão de sabotagem. Sem opções de escolha o grupo de bastardos precisa tomar o lugar dos soldados americanos mortos e realizar, por conta e risco, a missão (quase) suicida e são enviados para sabotar o foguete V2 que está sendo transportado naquele maldito trem blindado da SS nazista.
Escrito pelos roteiristas Sandro Continenza, Sergio Grieco, Franco Marotta, Romano Migliorini e Laura Toscano, “Quel Maledetto Treno Blindato” (que originalmente se chamava “Bastardi Senza Gloria”) é um dos poucos filmes onde várias cabeças criaram situações complementares que nunca deixam o ritmo cair (vários roteiristas num mesmo filme geralmente resulta em filmes medíocres). É uma sucessão incrível de cenas memoráveis magistralmente dirigidas por Enzo Castellari em grande forma, que na época já era famoso por ter dirigido algunas clássicos do spaghetti western como “Vado… L’Ammazzo e Torno” (“Vou, Mato e Volto”, 1967), “Quella Sporca Storia nel West” (“Johnny Hamlet/Deus Criou o Homem e o Homem Criou o Colt”, 1968) e “Keoma” (1976).
Castellari nasceu em Roma e seu verdadeiro nome é Enzo Girolami (sobrenome este que desperta paixões em fãs do horror italiano, seu pai é o diretor Marino Girolami, diretor do clássico “Zombie Holocaust” (1980), mais popularmente conhecido por seu título americano: “Dr. Butcher M.D.”). Enzo foi o responsável por ótimos filmes de gênero, geralmente imitações inventivas de grandes sucessos americanos, como os bem sucedidos (de bilheteria) “1990: I Guerrieri del Bronx” (“Os Guerreiros do Bronx”, 1982), “I Nuovi Barbari” (“The New Barbarians”, 1983) e o ótimo “Fuga del Bronx” (1983), ficção de ação do qual sou muito fã, tanto que a personagem “Chibamar Bronx” (que aparece no meu longa “Raiva”, 2001) é uma homenagem à Sonny Chiba e ao bairro do Bronx deste filme. Mas nem tudo foi alegria, em 1981 a Universal Studios o processou por plágio e seu filme “L’Ultimo Squalo” (“O Último Tubarão”) teve que ser retirado dos cinemas devido as similaridades com “Jaws” de Spielberg. Nos anos da década de 1990 a indústria cinematográfica italiana faliu e Castellari foi trabalhar dirigindo filmes para canais de TV de seu país.
Curiosidades: A primeira tentativa de se produzir “Quel Maledetto Treno Blindato” aconteceu nos USA e era para ter sido dirigido pelo hoje cult diretor Ted V. Mikels (“The Astro-Zombies“, 1968) que não se animou com o roteiro (que até então era uma imitação do clássico “The Dirty Dozen”). Sou um grande fã de Mikels e gostaria de ver como ele teria estragado este roteiro. Também existe uma versão re-editada deste filme onde os produtores cortaram várias cenas para fazer parecer que Fred Williamson (ator figurinha em spaghetti westerns, como “Take a Hard Ride/Cavalgada Infernal” (1975) de Antonio Margheriti ou “Adiós Amigo” (1976) com direção dele mesmo) era o ator principal e lucrar com o fenômeno Blaxploitation.
Nos USA saiu uma versão em DVD, pela Severin Films, com 3 discos lotados de extras e uma versão remasterizada. Aqui no Brasil, infelizmente, foi lançado pela Cultclassic sem extra nenhum e qualidade de imagem de VHS ripado.