Aqui você encontra o que rola de melhor no mundo underground e espaço pra o tipo de arte que tenha algo interessante a dizer e mereça ser descoberta, apreciada e/ou resgatada. Se você quer ficar informado sobre festivais, shows, mostras, lançamentos e exposições que acontecem pelo mundo underground, se interessa por cinema independente, sons extremos e curiosos, arte erótica, fetiches variados, putaria da boa, bebidas, culinária vegetariana, HQs, resgate cultural, zines, filme B, anarquia, pensamento libertário, atéismo e senso de humor crítico, siga o Canibuk, o blog que tem a MEGALOMANIA como palavra de ordem!
Ontem eu estava procurando a biografia do Edgar Allan Poe (que tenho guardada numa caixa embaixo da cama) e na minha procura encontrei a revista “Rudolf” (Macho Magazine) que era dos meus tempos de guri. Dei fim da busca pela biografia do Poe e corri aqui digitalizar a “Rudolf” número 1 (editora Ki-Bancas Ltda.) para disponibilizar ela aqui no Canibuk. Achei, também, algumas outras revistas eróticas na mesma caixa e as digitalizarei/postarei mais no futuro.
Boas punhetas com a “Rudolf”, era a pornografia que existia antes da era internet, bateu maior nostalgia!
O fantástico cineasta Kôji Wakamatsu foi atropelado por um táxi dia 12 de outubro, vindo a falecer no dia 17 em decorrência dos ferimentos causados pelo acidente. Sua morte acabou ofuscada pela morte da atriz erótica Sylvia Krystel no dia 18 de outubro, ontem. Não quero parecer neurótico, nem criador de teorias de conspiração, mas me passou pela cabeça que o governo japonês tenha pagado pro taxista atropelar Wakamatsu e depois assassinado, com requintes samurais, a Krystel para que o mundo não comentasse tanto a morte dele. Mas claro, é coisa da minha cabeça. Sempre é!
Kôji Wakamatsu, nascido em Wakuya (Miyagi) em 1936, ainda adolescente foi tentar a sorte em Tokyo onde, sem dinheiro nem perspectivas de uma vida melhor, entrou para o mundo das gangues de rua e, tempo depois, foi preso. Na cadeia foi abusado pelo guardas e tomou ódio pelo estado, uniformes e instituições de todos os tipos. Nos anos de 1960 conseguiu emprego nos estúdios da Nikkatsu onde estreiou como diretor com o filme “Hageshii Onnatachi” (1963). Nos anos que se seguiram realizou inúmeros filmes de baixo orçamento (dirigiu 10 longas em 1964 e outros 8 em 1965, num ritmo de produção de dar inveja até ao Jesus Franco). “Kabe no Naka no Himegoto/Skeleton in the Closet/Secrets Behind the Wall” (1965) foi selecionado no Festival Internacional de Berlim e teve boa acolhida por parte do público e crítica, mas como os pinku eigas não costumavam ganhar o certificado de exportação do governo japonês, isso originou um embaraço político. O estúdio Nikkatsu, que não queria encrencas com o governo, lançou o filme em alguns poucos cinemas e isso limitou o sucesso da produção. Wakamatsu, irritado com este fato, resolveu deixar a Nikkatsu para formar seu próprio estúdio e realizar seus filmes de modo independente. Seu primeiro filme com produção inteiramente sua foi o drama “Taiji ga Mitsuryo Suru Toki/The Embryo Hunts in Secret” (1966), já com roteiro que misturava sexo com críticas ao governo. Com um orçamento médio de apenas 5 mil dólares por filme, Wakamatsu realizou alguns clássicos mundiais do baixo orçamento, como “Okasareta Hakui/Violated Angels” (1967), pinku eiga violento que se baseava nos crimes do serial killer americano Richard Speck, e “Yuke Yuke Nidome no Shojo/Go, Go, Second Time Virgin” (1969), onde se baseou nos assassinatos da família Mason para criar um dos filmes mais belos dos quais já tive o privilégio de assistir.
Na década de 1970 sua produção continuou intensa e cada vez mais política e provocativa. Em “Seizoku/Sex Jack” (1970) ele teorizou sobre os movimentos revolucionários de esquerda. Paralelo aos filmes que escrevia e dirigia, começou a realizar documentários, como “Sekigun – P.F.L.P.: Sekai Sensô Sengen” (1971), em parceria com Masao Adachi, sobre o exército vermelho do Japão apoiando guerrilheiros do Líbano, ou “Porn Jikenbo: Sei no Ankoku” (1975) sobre o underground sexual de Tokyo. Nesta época foi produtor executivo do clássico erótico político “Ai no Korîda/O Império dos Sentidos” (1976) de Nagisa Ôshima, já lançado em DVD no Brasil. “Seibo Kannon Daibosatsu/Sacred Mother Kannon” (1977) é um de seus filmes mais conceituados, mas infelizmente ainda não consegui assistir à este filme que é considerado um clássico de como usar simbolismos e metáforas no cinema.
A partir dos anos de 1980 seu ritmo de produção diminuiu um pouco. Seus métodos de distribuição foram esmagados pelos conglomerados cinematográficos, relegando seu cinema à festivais e ratos cinéfilos sempre em busca de prazeres da sétima arte. Wakamatsu até apareceu como ator em alguns poucos filmes, como “Rampo” (1994) de Rintaro Mayuzumi e Kazuyoshi Okuyama; “Seishun Kinzoku Batto” (2006) de Kazuyoshi Kumakiri, diretor nascido em 1974 que homenageou o cinema político de Wakamatsu em seu primeiro filme, “Kichiku dai Enkai” (1997), pequeno clássico produzido enquanto ainda era estudante de cinema; ou “Yûheisha-Terorisuto” (2007) de seu amigo Masao Adachi, entre alguns outros.
Conheci o cinema de Kôji Wakamatsu lá pelo meio da década de 1990 e foi paixão à primeira vista, se tornando em pouco tempo um dos meus cineastas japoneses preferidos. Em 2000 comprei o livro “L’Empire Erotique”, do fotografo francês Romain Slocombe, que trazia uma entrevista com Kôji Wakamatsu (traduzida do francês para o português por Ulisses T. Granados para que eu pudesse ler e que publiquei no fanzine “Arghhh” número 31, de outubro de 2002, que resgato agora no Canibuk). Na entrevista participam também o editor do Eichi Publishing e uma assistente de Wakamatsu.
por Petter Baiestorf.
Romain Slocombe entrevista Kôji Wakamatsu:
Slocombe: Ontem, em uma livraria de Jimbo-cho, eu encontrei por acaso uma fita de um dos seus filmes antigo, “Yuke Yuke, Nidome no Shojo”. Eu o assisti essa manhã antes de vir. O Título espanta um pouco, mas eu me surpreendi com a beleza das imagens e com os trechos de jazz da trilha sonora. A história é bastante simples, ainda que intelectual, não? Esse filme deve ter agradado aos estudantes da época que amavam os filmes de Ôshima. No início seus filmes eram mais violentos? Houve uma mudança de estilo?
Wakamatsu: Sim, entre os tratados de segurança Japão-USA de 1960 a 1970, o ambiente social era cada vez mais tenso. Os movimentos estudantis se faziam cada vez mais violentos. Paralelo a isso, meus trabalhos se tornavam cada vez mais excêntricos. Esse filme eu fiz no telhado do prédio da nossa repartição. Um filme dirigido totalmente em cima do telhado! As idéias me vinham enquanto eu respirava olhando para o céu! Isso não me custou quase nada, e só tive que pagar a equipe e os atores. No momento das filmagens eu não sabia se seria um filme interessante ou não. Foram os outros que me diziam se estava bom ou não, eu mesmo não tinha a mínima idéia sobre que filme que eu estava fazendo.
Slocombe: Durante a direção você modificava o script?
Wakamatsu: Eu mudo o tempo todo!
Slocombe: Você não tinha problemas quanto a sua relação com os produtores?
Wakamatsu: Sim, os produtores não ficam contentes quando o filme termina sem ter nada a ver com o projeto apresentado inicialmente.
Slocombe: Mesmo uma pequena sociedade de produção como a Art Theater Guild?
Wakamatsu: Sim, mas o mais importante é colocar o maior número de gente nas salas de exibição. Depois que eles se dão conta do sucesso não dizem mais nada.
Slocombe: Quanto mais excêntrico o filme, mais ele atraí audiência?
Wakamatsu: Sobretudo os estudantes, não o grande público. As pessoas em geral acham meus filmes “sujos”. Meus principais espectadores estão entre os intelectuais, a maior parte são estudantes universitários.
Slocombe: Qual a duração média dos seus filmes?
Wakamatsu: No início da minha carreira, sem refletir bem, eu fazia filmes de cerca de uma hora e vinte minutos (80 minutos). E, de tempos em tempos, filmes de duas horas (120 minutos). Depois eu me meti a fazer média-metragens de cerca de uma hora (60 minutos). Esse é o caso de “Okasareta Hakui/Violated Angels”. Eu não fiz esse filme com a intenção de exibi-lo nos cinemas, eu esperava fazer algo mais pessoal. E liguei para Juro Kara dizendo – “Ei, venha se divertir com a gente!”, oferecendo três grandes camarões à guisa de salário. Não custou quase nada e me contentei em exibi-lo em pequenas salas undergrounds. Ainda assim ele chamou a atenção de certos críticos de cinema.
Slocombe: Seus filmes muitas vezes tratam da relação homem-mulher e sempre o faz de uma maneira muito violenta. Numa entrevista a muito tempo atrás, lembro de você dizendo: “Entre um homem e uma mulher não pode existir nada além de guerra” (risos).
Wakamatsu: Mas sim, o relacionamento é sempre uma guerra! Aliás, a relação sempre dura mais tempo quando é mais tensa e quando há uma distância entre os dois, não é verdade?
Editor do Eichi Publishing: A propósito de “Yuke, Yuke, Nidome no Shojo”, você nos disse que o filmou inteiro em cima de um prédio. Em “Gewalt! Gewalt! Shojo Geba-Geba/Violent Virgin” (1969) você mostra uma cruz levantada num deserto e “Okasareta Hakui” se passa numa câmara fechada e desolada.
Wakamatsu: Não sei porque, mas eu adoro criar um drama dentro de um espaço limitado. Eu considerei o deserto como uma câmara fechada, isso me permite concentração. Meus trabalhos considerados mais bem realizados são aqueles que se passam em cenários isolados e limitados.
Slocombe: Gostaria de voltar a “Yuke, Yuke, Nidome no Shojo”, que assisti a pouco. Percebi o herói dele tão puro quanto o de “Okasareta Hakui”, que não tem experiência sexual e parece sentir tanto amor quanto desejo de agressão em relação às mulheres. Ele não consegue se decidir quanto a matar ou não a enfermeira, que reconhece tão pura quanto ele. Quando a garota implora para não estuprá-la, a relação ainda permanece pura. O herói de “Yuke, Yuke…” decide matar os outros garotos, mais adultos, que tinham estuprado a garota. Tenho a impressão de que você mesmo gostaria de ficar puro e encontrar uma mulher pura.
Wakamatsu: No caso de “Okasareta Hakui” fui inspirado pela chacina de enfermeiras que ocorreu em Chicago, USA. O fato de que uma delas foi poupada me interessou. Parece que ela foi a única a entender os sentimentos do assassino e por isso se salvou. No meu caso eu sou o mais jovem entre sete irmãos. Éramos todos homens e só tivemos nossa mãe na infância. Os espectadores dos meus filmes sempre percebem o meu complexo de édipo. Eu sempre me pergunto se essa tendência pessoal vem de minha situação na infância. Mas, à parte disso, eu sinto admiração pelas mulheres em geral.
Assistente de Wakamatsu: Talvez seja um “complexo de virgem imaculada”?
Wakamatsu: Exatamente. Eu procuro conforto nas mulheres, como alguns procuram na Virgem maria ou na deusa Kannon (encarnação feminina de Buda).
Slocombe: No seu filme “Seibo Kannon Daibosatsu” (1977) esse tipo de mulher surge emergindo do mar…
Wakamatsu: Refletindo bem, admito que sou um grande admirador das mulheres. Para mim a mulher é um ser que me entende e aceita totalmente, sem que aja a necessidade de me explicar. Nos meus filmes sempre se vê a aspiração por uma mulher de infinita graça e bondade.
Editor do Eichi Publishing: Há um abismo entre essa mulher idealizada e aquelas do mundo real.
Wakamatsu: É claro, existe muita diferença. Mas eu prefiro continuar buscando esse ideal do que viver na resignação.
Editor do Eichi Publishing: Para Slocombe essa mulher idealizada esta representada em suas fotos de mulheres usando ataduras, estou certo?
Wakamatsu: Eu entendo isso perfeitamente. A mulher machucada, que não pode se mover de sua cama de hospital, de certo modo esta isolada do mundo real – essa imobilidade involuntária lhe deixa mais erótica do que em seu estado natural. Deste modo a mulher se expõe sem artifícios. Uma mulher nua dormindo é uma bela visão. De fato eu sinto uma grande atração quando vejo uma mulher cheia de curativos numa cama de hospital. Se bem que uma mulher doente é algo bem menos erótico.
Slocombe: Certo, é porque a visão de uma mulher doente traz à mente a possibilidade de sua morte, o que não é agradável para mim. Uma mulher em bandagens pode não estar em sua perfeita saúde, mas não vai ter que ficar nessa posição imóvel por muito tempo.
Editor do Eichi Publishing: Visualmente, bandage branca é realmente muito bonita. Slocombe mencionou a pureza do herói de “Yuke, Yuke…”. É essa pureza que o leva a morte não? Porque seu herói morre no final?
Wakamatsu: Eu achei que essa resolução teria mais estilo. Por exemplo, eu acho Che Guevara muito chic – eu gostaria de ter vivido e morrido como ele. Infelizmente eu vou terminar como um mero diretor de filmes. Seguindo os princípios do filme, o herói não deveria morrer, mas eu achei que o final seria melhor com sua morte.
Editor do Eichi Publishing: Eu acredito que o herói teve que morrer para preservar sua pureza.
Wakamatsu: Eu não estava consciente disso porque não uso muito a razão em um filme, prefiro me guiar por minha sensibilidade e sentimentos. Frequentemente os atores não entendem o que eu quero. Eu me acho muito instintivo, como um animal. Nunca estive numa escola de cinema, nunca aprendi técnica cinematográfica. Foi por acaso que entrei nessa profissão. Eu nunca tinha sequer sonhado com isso! Eu simplesmente tive o impulso de criar alguma coisa, fosse um texto ou um filme. Eu queria tornar os meus desejos reais, por exemplo, o meu desejo de matar policiais (risos). Não posso fazer isso na vida real, é claro, mas num filme posso exterminar um monte de policiais de uma vez. Eu comecei a filmar só por esse motivo. Como alguns desses primeiros filmes tiveram sucesso, as pessoas passaram a me chamar de diretor. Desde então eu filmo constantemente, mesmo hoje em dia quando as condições estão cada vez mais difíceis. Eu construo um filme dentro da minha mente. E isso vem repentinamente. Por exemplo, “Taiji ga Mitsuryo Suru Toki” nasceu a partir de uma imagem que eu vi da janela numa manhã chuvosa de maio. A essa imagem inicial eu fui acrescentando outras, uma por uma. Mas tão logo essa imagem inicial me vem a mente, eu chamo os atores e começo a filmar. Se eu esperasse um mês ou mais, o impulso de filmar já teria se perdido.
Slocombe: Você concebeu do mesmo modo “Gendai Kôshoku-Den: Teroru no Kisetsu/Season of Terror” (1969, nota do Canibuk: Com roteiro de Kazuo “Gaira” Komizu), onde o herói, que vive com duas mulheres, explode o Aeroporto de Haneba no final?
Wakamatsu: Sim, eu realmente conhecia um cara que vivia com duas mulheres. Elas tiveram filhos quase ao mesmo tempo e se amavam, era lésbicas! Todos eles viviam muito bem juntos. Eu achei toda a situação muito divertida e quis fazer um filme sobre essas três pessoas. Foi só no fim que acrescentei o detalhe do homem ser um terrorista.
Slocombe: Sexo e terrorismo são temas que não se misturam. Foi por esse motivo que um dos meus livros foi censurado na França.
Wakamatsu: Meu filme “Seizoku/Sex Jack” foi banido da França também. Ele foi exibido primeiramente em Cannes e então proibido – embora muitos cinéfilos gostarem dele. O problema foi que no fim do filme o terrorista bonzinho tenta matar o primeiro ministro. Eles acharam muito anti-social, como também falaram que havia muito sangue em “Okasareta Hakui”.
Slocombe: Algo me intriga: Na França ou Inglaterra, um filme ou comic mostrando SM ou violência contra mulheres enfrenta censura, enquanto que cenas de sexo são bem toleradas. No Japão a situação é inversa, não?
Wakamatsu: Sim, mostrar SM ou violência num filme é perfeitamente normal, mas para sexo alguns limites foram fixados. O que significa que você não pode mostrar tudo, entende? Em alguns festivais da Europa as pessoas frequentemente riem dos filmes japoneses porque a câmera faz movimentos esquisitos para não mostrar certas coisas. Eu fico meio embaraçado quando um europeu me pergunta: – “Qual o significado daquele movimento apressado da câmera?”. Por que alguém teria que esconder órgãos genitais? Eu acho que no Japão sexo sempre foi privilégio dos poderosos, políticos, milionários, etc. No passado se dizia “os pobres que se contentem em comer arroz”. É como hoje dizerem “se contentem sem imagens de sexo”. No período Edo, pelo que li, a abertura era maior, mas após as eras Meiji e Taisho, as autoridades ficaram mais restritas.
Editor do Eichi Publishing: Enquanto SM e violência continuaram tolerados como sempre.
Wakamatsu: Sim, talvez as autoridades achem essas coisas perfeitamente normais.
Editor do Eichi Publishing: Achei a idéia interessante, o poder monopolizando o sexo.
Wakamatsu: É por isso que nos meus filmes eu caçoo do poder associando-o ao sexo.
Slocombe: Você percebeu alguma mudança recente ao assistir filmes dos jovens cineastas? E você pretende tentar outros gêneros?
Wakamatsu: Eu frequentemente noto que os jovens diretores mostram nudez com um propósito puramente comercial. Acho isso muito superficial. É por isso que raramente assisto seus filmes. Eu e alguns outros diretores, se fizemos pinku eiga, foi para expressar alguns sentimentos mais sérios. E quanto a outros gêneros, eu já experimentei a todos.
Editor do Eichi Publishing: Se entendi direito, mesmo nos seus pinku eigas, o assunto principal não era sexo?
Wakamatsu: Certo. Primeiramente eu não era aceito pelas grandes produtoras. Para fazer um filme tive que recorrer ao campo dos pinku eigas. E meus filmes tinham que ser vistos pela maior audiência possível, o que me levou a colocar nomes escandalosos como “Yuke, Yuke, Nidome no Shojo”. Lendo a palavra “virgem” (nota do Canibuk: Shojo significa virgem) as pessoas imaginavam coisas pornográficas e corriam para os cinemas. E o importante é que elas ficaram contentes com o que viam, mesmo que isso não tenha sido exatamente o que esperavam inicialmente, não acha?
Assistente de Wakamatsu: Então, agora que você pode dirigir os filmes que quiser, eles não precisam ser pinku eigas?
Wakamatsu: As coisas mudaram totalmente, atualmente estou até filmando para a TV!
Recentemente descobri, meio que sem querer, os filmes de bondage/BDSM com uma mulata americana/escocesa chamada Skin Diamond que gostei bastante. Skin tem uma interpretação de rosto ótima, faz sexo com vontade, deep throat como deve ser (profundo e completamente babado) e, geralmente, está imobilizada com cordas ou equipamentos de tortura onde é fodida por atores/atrizes pervertidos. Skin, nota-se por sua grande produção de filmes com outras meninas, que é chegada em chupar uma bela bucetinha molhada, tanto que já fez filmes com Belladonna e Katsumi, outras duas taradas por belas mulheres assumidas. Skin é uma incrível mistura de checa, alemã, dinamarquesa, iuguslava com etíope, provando de uma vez por todas que as pessoas mais belas são as que possuem mistura de etnias (este negócio de raça pura é coisa de débil mental, me desculpem).
Skin Diamond nasceu em 18 de fevereiro de 1987 com o nome de Raylin Christensen. Antes de se aventurar no fabuloso mundo maravilhoso da pornografia ela trabalhou numa crechê cuidando de crianças (Ron Jeremy teve emprego semelhante antes de virar lenda pornô). Em 2009 ela estrelou “No Panties Allowed” de James Deen e não parou mais, já tendo estrelado mais de 40 filmes, vários deles dedicados ao bondage, BDSM, humilhação e outros deliciosos fetiches sexuais. Neste ano de 2012 ela foi indicada para o prêmio AVN para a Best Three-Way Sex Scene. No tempo livre ela curte pintar. Atualmente reside em Los Angeles, USA.
“Quando era adolescente eu fiquei obcecada com a “Bizarre Magazine”, eu nunca tinha visto nada como aquilo. Então decidi que era isso que eu queria fazer. Trabalhei, trabalhei e, finalmente, me tornei capa da “Bizarre”. Aí quis ver o que mais eu poderia fazer e me tornei também modelo erótica para grandes designers como Louis Vuitton e da American Apparel!”, nos conta Skin Diamond, explicando um pouco de sua fixação por sexo sadomasoquista. Leia entrevista com Skin no site Rap Industry.
Veja “Carbon Girl” (2010) de Belladonna; “Street Hookers for the White Guy 2” (2011); “Black Anal Beauties 2” (2010) de Mike Adriano; “Kung Fu Pussy” (2011) de Joanna Angel; “This Ain’t Nurse Jackie XXX” (2011) de Stuart Canterbury; “Filthy Cocksucking Auditions” (2012) de Mike Adriano; “Corrupt Schoolgirls” (2012) de Bobby Manila; “In Bed With Katsuni” (2012) de Katsumi e todos os outros filmes onde essa mulata do sexo violento esteja no elenco.
“Meet The Feebles” (1989, 94 min.) de Peter Jackson. Obra-Prima com fantoches.
Este clássico do mal gosto se aprofunda na vida artística ao contar a alucinada história de um grupo teatral que está ensaiando uma nova canção para tornar seu show um sucesso. Com várias sub-tramas entrelaçadas entre si, que exploram os tipos humanos (aqui representados por fantoches/marionetes de insetos e animais), o roteiro apresenta Robert, novato que tenta a sorte no show business e se apaixona por Lucile que vira atriz pornô, que cruza com o mundo de Heidi, a grande estrela do show que ama Bletch, que a traí com Samantha. Harry, outra estrela do show e pervertido sexual, está com uma terrível doença sexual transmissível e é perseguido por uma mosca jornalista que quer publicar a história num tablóide sensacionalista. Sid (um elefante) é acusado por Sandy (uma galinha) de ser o pai de seu filho (uma galinha com tromba), como ele se recusa a assumir a paternidade, Sandy ameaça processá-lo enquanto muita droga, sexo sadomasoquista e negócios ilícitos vão se sucedendo no maravilhoso mundo do teatro, até que uma inevitável explosão de violência e brutalidade sacode o mundo dos sonhos, com Heidi, após uma tentativa fracassada de suicídio, armada de uma metralhadora e muita raiva matando e ferindo todos os azarados que cruzarem seu caminho.
Após as filmagens (e relativo sucesso) de “Bad Taste” (1987), Peter Jackson entrou em contato com a televisão japonesa com a idéia de um filme gore com fantoches viciados em drogas e sexo, mas aos poucos o projeto foi adquirindo vida própria e virando um longa. O engraçado é que Peter Jackson teve seu pedido de orçamento à Film Commission da Nova Zelândia recusado por Jim Booth que depois viria a se tornar seu produtor. Com um orçamento de 750 mil dólares a produção recebeu somente dois terços deste valor e a relação entre produção e financiadores azedou a ponto da Film Commision ser retirada dos créditos. Como previsto, o dinheiro acabou durante a produção de “Meet the Feebles” e várias cenas foram filmadas sem dinheiro, como o flashback paródia para “The Deer Hunter/O Franco-Atirador” (1978) de Michael Cimino. Sem dinheiro para balas de festin, todos os tiros da metralhadora foram feitos com balas reais. Repare nas cenas da platéia que assiste o show que é possível identificar um dos alienígenas de “Bad Taste”, dentro da fantasia está o diretor Peter Jackson.
“Meet the Feebles” é uma fábula adulta sobre a violência humana, sobre pequenas ações mesquinhas onde corações magoados são capazes das mais horríveis atrocidades num momento de fúria incontrolável. O show, que a primeira vista parece algo tão meigo quanto “The Muppet Show”, se torna um pesadelo sangrento com sonhos destruídos via balas de metralhadora (que precede em vários anos o massacre final de “Rambo 4”). Heidi é a Miss Piggy hardcore, Harry é o Pernalonga com problemas com sexo e drogas, a imprensa é uma mosca que se alimenta de merda e, assim por diante, Peter Jackson foi brincando com o imaginário do cinema infantil até destruí-lo por completo e anunciar ao público: “É isso meninos, a vida real é difícil e fará de tudo para te aniquilar!”.
Peter Jackson (1961) nasceu na Nova Zelândia e foi o responsável pelos filmes mais divertidos dos anos de 1980 até a primeira metade dos anos 90. Em 1987 lançou a comédia ultra-gore “Bad Taste”, um filme quase amador sobre alienígenas de uma rede de fast food intergaláctico que descobre uma nova iguaria: Carne humana! Com um orçamento minúsculo Jackson criou uma obra-prima do mau gosto filmada entre 1983 e 1987 e editada durante um mês na cozinha da casa de seus pais. Em seguida conseguiu fazer “Meet the Feebles” e seu grande clássico, “Braindead/Fome Animal” (1992), uma divertida comédia gore non stop que influenciou o cinema sangrento do mundo inteiro. “Braindead” contava a história de um mimado homem que vivia à sombra de sua superprotetora mãe em meio à um apocalipse zumbi (iniciado por sua própria mãe), que envolvia cortadores de grama, liquidificadores e padres que lutavam kung fu como armas contra os mortos-vivos mais cômicos de todos os tempos. Em 1994 vimos o começo do fim de Peter Jackson, “Heavenly Creatures/Almas Gêmeas” é um bom filme, mas Jackson se deixou seduzir pela indústria de Hollywood e seus filmes seguintes não lembram em nada a inventividade de suas três primeiras obras que traziam inteligência ao conservador gênero dos filmes de horror. Em tempo, Peter Jackson dirigiu e atuou no telefilme “Forgotten Silver” (1995), mockumentary de média-metragem onde ele “descobre” o pioneiro cineasta Colin McKenzie que teria inventado tudo que o cinema moderno utiliza, mesmo que muitas coisas por acidente ou involuntariamente. “Forgotten Silver”, talvez, seja o último sopro de humor e cara-de-pau de um genial cineasta diluído pela indústria cinematográfica. Peter Jackson morreu na metade dos anos de 1990.
“Meet the Feebles” nunca teve um lançamento digno no Brasil. Em 1995 consegui uma cópia do filme em VHS com amigos europeus e vi, maravilhado, sem legenda alguma. Eu já era um grande fã de Peter Jackson por causa de “Bad Taste” e “Braindead” e ter conseguido essa cópia de “Meet the Feebles” foi para confirmar o que já sabia, Jackson era um gênio do cinema gore feito com baixo orçamento. Em 2007 o cineasta underground Gurcius Gewdner lançou “Mamilos em Chamas”, claramente inspirado em “Meet the Feebles”, só que ainda mais bizarro e raivoso. Quem curte o trabalho de Jackson em Hollywood ainda terá vários filmes dele estreiando nestes pomposos cinemas de shopping, desisti de acompanhar a carreira dele após perceber que o cineasta gore que eu adorava morreu com “Braindead”.
William Seabrook Buehler, nascido dia 22 de fevereiro de 1884 em Westminster, Maryland, foi um jornalista explorador obcecado por descobrir (e relatar) culturas desconhecidas para o público branco médio dos USA numa época em que a informação dependia de jornalistas corajosos e criativos (diferente dos dias atuais em que essa profissão foi dominada por jovens preguiçosos/acomodados que fazem o que seu dono manda). Dado à aventuras, em 1915 se juntou ao exército francês na Primeira Guerra Mundial e, no ano seguinte durante a batalha de Verdun, foi intoxicado por gás alemão. Quando voltou aos Estados Unidos, cheio de cicatrizes e histórias, conseguiu emprego no jornal The New York Times e começou a viajar pelo mundo em busca de histórias de culturas desconhecidas.
Fascinado por ocultismo e satanismo, Seabrook passou uma semana com o charlatão Aleister Crowley no outono de 1919. Crowley vinha de uma família rica e na falta do que fazer espantava o tédio criando textinhos esotéricos para impressionar ricos como ele próprio. Em 1904 ele “recebeu” de “entidades espirituais” o livro “The Book of the Law” (“O Livro da Lei”, muito plagiado por Paulo Coelho e Raul Seixas nos anos 70). Também era pansexual e experimentador de qualquer tipo de drogas naturais ou sintéticas e a farra com Seabrook deve ter sido ótima, já que nosso explorador também era chegado numa boa festa com putaria e drogas. O fato é que este encontro entre duas personalidades tão originais rendeu o livro “Witchcraft: Its Power in the World Today”, onde Seabrook narra este encontro.
Logo se interessou pelas práticas do vodu haitiano e viajou para lá a fim de realizar suas próprias experiências. Jamie Russell em seu livro “The Book of the Dead” (Editora Barba Negra) nos conta que Seabrook foi apresentado aos zumbis haitianos por um fazendeiro local e logo reparou que estes zumbis são “frutos da crença religiosa que domina a ilha, símbolo poderoso do medo, da desgraça e perdição”. Essa viagem resultou no livro “The Magic Island” (“A Ilha da Magia”, 1929, nada a ver com a ilha de Florianópolis, também conhecida como a Ilha da Magia, lógico!) onde o pesquisador descreve os zumbis como “um cadáver humano sem alma, ainda morto, mas tirado do túmulo e mantido por feitiçaria com um semblante mecânico de vida – é um corpo que se faz andar e agir e mexer como se estivesse vivo”. O público americano foi ao delírio, na época, com os relatos emocionates e tétricos desta aventura de Seabrook. Este livro é o responsável por introduzir o conceito “zumbi” na cultura popular e serviu de inspiração para o roteiro de “White Zombie/Zumbi Branco” (1932) de Victor Halperin, estrelado por Bela Lugosi e com momentos bem divertidos.
Cada vez mais sedento por novas aventuras, se recusou a escrever sobre canibalismo até que conseguisse provar ele mesmo a carne humana. Durante uma viagem pela África Ocidental conviveu com uma tribo conhecida como Guere onde pediu ao chefe que gosto tinha a carne humana e, diante de sua insatisfação ao ouvir a descrição do chefe tribal, saiu de lá com a certeza de que experimentaria ele próprio o gosto da carne humana. Pouco tempo depois subornou um servente de um hospital de Paris para que lhe conseguisse um quilo de carne humana, logo em seguida deu entrada o cadáver de um operário que havia sido atropelado e Seabrook conseguiu sua preciosa iguaria. Correu para o apartamento de um amigo e convenceu a cozinheira da casa a assar, grelhar e cozinhar aquele estranho tipo de carne de “bode selvagem” (nome que usou para a cozinheira) que até então ninguém havia comido. Enquanto experimentava a carne humana fez minuciosas anotações onde a comparava com carne de porco e sentiu a necessidade de mais tempero. Escreveu: “Carne leve, boa, sem gosto bem definido. Não muito duro ou pegajoso, uma carne agradável e de excelente paladar!”. Fica a dica!
Man Ray, fotografo e diretor de vários curtas surrealistas como o clássico “Le Retour à La Raison” (1923), relatou que Seabrook pediu para que ele cuidasse seu apartamento uma tarde. Ao chegar lá o fotografo encontrou uma garota nua acorrentada ao pilar da escadaria com um cadeado e instruções para não ser desamarrada pois estava recebendo muito bem por aquele serviço. Seabrook era um sádico sexual dado a cultivar práticas de sexo bizarro gostoso. Diz a lenda que circula em torno de sua figura, que quando viajava uma de suas malas estava sempre cheia de chicotes e correntes para satisfazer suas fantasias sexuais.
No final de 1933 foi internado na instituição mental de Westchester County para tratamento de alcoolismo, onde permaneceu internado durante quase seis meses e, em 1935, publicou “Asylum”, livro onde relatou suas experiências no hospício e que acabou se tornando um best seller. Ainda em 1935 se casou com Marjorie Muir Worthington, uma escritora com mais de 15 livros publicados, incluíndo “The Strange World of Willie Seabrook” (1966). O casamento durou somente até 1941 por culpa do alcoolismo de William e seu comportamento cada vez mais sádico nas diversões sexuais do casal. Em 1961 foi produzido o telefilme “Witchcraft” de Harold Young, com inspirações nos estudos ocultistas de William, filme este que infelizmente ainda não consegui assistir.
Em 1945, no dia 20 de setembro, cometeu suicídio por overdose de drogas. No final da vida costumava afirmar que “não havia visto nada que não têm uma explicação racional e científica”. Em tempos que o cinema americano se encontra tão sem idéias, seria lindo ver uma produção bem feita sobre a vida de Seabrook e suas descobertas macabras.
Receita de Carne Humana Agridoce
Ingredientes:
600 g de carne humana cortada em cubinhos de 2cm
1/2 xícara (chá) de farinha de trigo
1 ovo
1/2 xícara (chá) de açúcar
1/2 xícara (chá) de vinagre
1/3 xícara (chá) de suco de abacaxi
1/4 xícara (chá) de catchup
1 colher (chá) de molho de soja
2 colheres (sopa) de maizena
2 colheres (sopa) de água
1 xícara (chá) de pedacinhos de abacaxi em calda, escorrido
1 pimentão verde cortado em pedaços de 1cm
Óleo para fritar
Sal e pimenta-do-reino a gosto.
Modo de Preparo:
Misture a farinha e o sal. Passe a carne humana no ovo batido e depois na mistura de farinha, até que os pedaços estejam bem cobertos. Frite a carne numa frigideira em bastante óleo quente por 6 a 8 minutos, ou até que fique bem dourada. Retire, escorra e reserve mantendo quente. Em uma panela funda, misture o açucar, o vinagre, o suco de abacaxi, o catchup e o molho de soja e pimenta-do-reino, se desejar. Leve ao fogo e deixe levantar fervura. Misture a maizena com água e adicione ao molho, mexendo sempre. Continue cozinhando até que o molho engrosse. Reserve. Junte ao molho a carne humana quente, os cubinhos de abacaxi e os pedaços de pimentão. Esquente outra vez, mexendo sem parar, por cinco minutos. Sirva enquanto quente, acompanhado de arroz.
* IMPORTANTE: Como Seabrook nos ensinou, não faça este prato em casa, faça-o na casa de algum amigo sem nada falar. Como sou vegetariano não testei este prato.
“Shivers” (ou “Orgy of the Blood Parasites” ou “They Came From Within” ou “The Parasite Murders”, “Calafrios” no Brasil, 1975, 87 min.) de David Cronenberg. Com: Paul Hampton, Joe Silver, Barbara Steele, Lynn Lowry e Susan Petrie.
Um cientista conduz experiências onde almeja criar um parasita que possa ser usado em transplantes de orgãos que não funcionam mais, onde o paciente com um rim doente, por exemplo, receberia o parasita que faria o trabalho do rim em troca de um pouco de sangue como alimento. Mas algo sai errado e o que o cientista acaba criando é um parasita que assume o controle do paciente e faz sua libido sexual, sem culpas ou moralismos, crescer assustadoramente; uma combinação entre afrodisíaco e doença venérea que foge do controle quando a namorada adolescente do cientista espalha o parasita para outras pessoas do moderno condomínio onde vivem vários tipos humanos que logo se tornam tarados sexuais em busca de formas de saciar seu apetite sexual.
“Shivers”, o primeiro longa-metragem profissional de David Cronenberg (que antes havia dirigido apenas os curtas “Transfer” (1966), “From the Drain” (1967), os experimentais “Stereo” (1969) e “Crimes of the Future” (1970) e inúmeros curtas para a TV canadense), é a cara do cinema dos anos 70, um cinema que não fazia concessões para agradar o espectador, investia em roteiros originais/adultos (onde sexo e assuntos sérios eram discutidos), apostava em atores desconhecidos/amadores e os finais destes filmes geralmente eram bem pessimistas acerca dos rumos que a humanidade estaria tomando. Claro que tamanha ousadia não passaria desapercebida, depois de lançado “Shivers” foi a maior bilheteria do cinema canadense e foi discutido em seu parlamento que havia colocado em dúvida seu valor social e artístico para a sociedade, já que boa parte do dinheiro da produção havia vindo do Canadian Film Corporation, que era mantido pelo contribuinte através dos impostos.
Filmado em apenas 15 dias, “Shivers” foi um desafio para o jovem Cronenberg que lutou para ser o diretor do filme durante 3 anos (seu roteiro chegou até a ser oferecido ao lendário Roger Corman, mas uma cláusula no contrato que dava ao roteirista o direito de dirigi-lo, manteve Corman fora do projeto). O aval para a realização do filme veio depois que Barbara Steele (que Cronenberg havia conhecido no lançamento de “Caged Heat” (1974) de Jonathan Demme) concordou em tomar parte da empreitada. Os testes de elenco de “Shivers” foram abertos, ou seja, qualquer pessoa que não fosse ator poderia conseguir um papel. Susan Petrie, uma atriz de comédias de baixo orçamento, lutou pelo papel da personagem Janine Tudor, onde teria que chorar em várias cenas, como não conseguia chorar, Cronenberg conta, que antes de cada take a atriz pedia para que ele a esbofeteasse violentamente, criando um verdadeiro clima de sadomasoquismo entre ele e a atriz, para o espanto da equipe-técnica chocada pelo método nada ortodoxo de direção.
David Cronenberg nasceu em Toronto, Canadá, em 1943. Ainda criança começou a escrever histórias e seu interesse por ciências o levou a entrar no programa “Honours Science” da Universidade de Toronto. Inspirado pelo cinema underground de New York, conseguiu realizar seus primeiros curtas. Durante toda década de 1970 seus filmes foram produzidos com ajuda do dinheiro do contribuinte canadense (pelo menos não foi parar no bolso dos políticos de lá). Entre outros, realizou o maravilhoso “Rabid/Enraivecida – Na Fúria do Sexo” (1977), estrelado pela atriz pornô Marilyn Chambers (do clássico imperdível “Behind the Green Door/Atrás da Porta Verde”, de 1972) e que contava a história de uma garota que, após uma cirurgia, sofre uma mutação e começa a se alimentar de sangue; “Fast Company” (1979), um drama sobre o universo automobilistico lançado no Brasil pela distribuidora Zircon Films com o título “A Escuderia do Poder” e “The Brood/Os Filhos do Medo” (1979, em VHS no Brasil pela Top Tape), onde um psiquiatra aplica um método experimental de exteriorização de traumas e uma de suas pacientes gera uma “ninhada” de crianças que agirão comandadas por sua sede de vingança, um drama sangrento que Cronenberg escreveu após sua separação.
Os anos de 1980 começam com o sucesso internacional de “Scanners/Sua Mente pode Destruir” (1981, Van Blad Vídeo), um filme revolucionário onde somos apresentados aos Scanners, pessoas com poderes mentais, que são usados pela indústria farmaceútica (e que tem a famosa cena de uma cabeça explodindo sem cortes antes da computação gráfica estragar o cinema), filmaço que abriu as portas dos grandes estúdios americanos para o peculiar estilo de filmar horror adulto/inteligente de Cronenberg; Para a Universal Studios faz “Videodrome” (1983, Universal Home Vídeo), que mostrava como controlar os espectadores através da TV, com ótimos efeitos de maquiagens de Rick Baker; “The Dead Zone/A Hora da Zona Morta” (1983, Europa Multimedia) é a adaptação de um livro de Stephen King (que estava em moda nos anos de 1980) onde um paciente acorda do coma com a capacidade de ver o futuro das pessoas que toca; “The Fly/A Mosca” (1986, Fox Home Vídeo) é uma releitura moderna extremamente gore do clássico “The Fly/A Mosca da Cabeça Branca” (1958, Fox Home Vídeo) que havia sido estrelado pelo cult e genial Vincent Price. “The Fly” teve um grande orçamento (foi produzido pelo comediante Mel Brooks) mas não foi sucesso de público nos cinemas, diz a lenda que os espectadores ficavam ruins do estômago ao tentar assistí-lo. Cronenberg fechou a década de 1980 com “Dead Ringers/Gêmeos – Mórbida Semelhança” (1988, em VHS pela F.J. Lucas Vídeo), um drama sexual sobre ginecologistas gêmeos e sua relação com uma paciente feiosa. Acho muito discreto este filme, o assunto poderia ter rendido bem mais.
A década de 1990 parecia promissora quando Cronenberg lançou “Naked Lunch/Mistérios e Paixões” (1991, Spectra Nova), drama lisérgico inspirado no livro homônimo de William S. Burroughs sobre um escritor viciado em drogas que não sabe mais distinguir realidade e delírio. Em seguida o cineasta realiza o pomposo (perdão) “M. Butterfly” (1993), que na época de seu lançamento achei divertido, mas preciso revê-lo para ter uma nova opinião sobre o filme, e o genial “Crash/Estranhos Prazeres” (1996, em VHS pela Columbia Pictures), onde Cronenberg ajeita o chatíssimo livro de J.G. Ballard e nos apresenta seu último grande filme, uma história sexy sobre pessoas que após sofrerem acidentes de carro começam a procurar por sexo bizarro envolvendo carros. Nos últimos anos não realizou nenhum novo clássico, “ExistenZ” (1999) é fraquinho; “Spider” (2002, Movie Star) mornô e os filmes policiais que realizou (“A History of Violence/Marcas da Violência, 2005; “Eastern Promises/Senhores do Crime”, 2007 e “A Dangerous Method/Um Método Perigoso”, 2011) são burocráticos. Dá pena ver um cineasta tão bom desperdiçando seu talento por conta da mediocridade da indústria cinematográfica e seu público idiotizado atual.
Na produção de “Shivers” Cronenberg recebeu uma grande ajuda de Ivan Reitman que em 1972 já havia dirigido o ótimo “Cannibal Girls”. Se alternando nas funções de direção e produção, Reitman fez “Meatballs” (1979) e conseguiu chamar atenção dos grandes estúdios e na seqüência conseguiu emplacar o blockbuster “Ghost Busters/Os Caça-Fantasmas” (1984, Columbia Pictures), campeão das bilheterias dos anos 80. Depois dirigiu megas-porcarias estreladas por Arnold Schwarzenegger como “Twins/Irmãos Gêmeos” (1988), “Kindergarten Cop/Um Tira no Jardim de Infância” (1990) e “Junior” (1994). Verdadeira decadência para o cara responsável pela produção de filmaços como “Death Weekend/Fim de Semana Mortal” (1976) de William Fruet, “Rabid” (1977) de Cronenberg, “Ilsa – The Tigress of Siberia” (1977) de Jean LaFleur, “Animal House/O Clube dos Cafajestes” (1978) de John Landis e “Heavy Metal/Universo em Fantasia” (1981) de Gerard Potterton.
Um dos grandes destaques de “Shivers” são as maquiagens gore, simples mas de grande eficácia. Joe Blasco trabalhava com maquiagens para a TV quando realizou as trucagens gores para “Garden of the Dead” (1974) de John Hayes, distribuido nos USA pela Troma e do clássico “Ilsa: She Wolf of the SS” (1975) de Don Edmonds. Isso lhe valeu o convite para trabalhar em “Shivers” e “Rabid”. Quem aprecia bons trash-movies sem orçamento não devem perder o trabalho de maquiagem de Blasco nos filmes “Track of the Moon” (1976) de Richard Ashe, onde Blasco também “interpreta” a criatura, “Ilsa – The Harem Keeper of the Oil Sheiks” (1976) de Don Edmonds, “The Clonus Horror” (1979) de Robert S. Fiveson e “Whispers” (1990) de Douglas Jackson.
“Shivers” é um filme corajoso, fala sobre o corpo humano e nossos desejos sexuais que são sempre reprimidos pela moralidade social e religiosa de nossa sociedade. Aqui os infectados pelo parasita viram uma espécie de zumbis tarados e dão vazão aos seus instintos. Cronenberg aproveita para discutir assuntos tabus como pedofilia, incesto, homosexualismo, bestilismo, machismo e até o desejo sexual dos velhos. E tudo isso discutido embalado com uma roupagem de cinema gore sexploitation de alta qualidade e diversão. Cronenberg faz falta!
Aqui no Brasil o filme se chama “Calafrios” e já foi lançado em VHS pela F.J. Lucas Vídeo e em DVD pelos picaretas sem classe da Continental. Este filme ainda aguarda, como tantos outros clássicos do cinema gore, um lançamento decente (de preferência em Blu-Ray) em nosso país, cheio de material extra e o filme com qualidade de imagem impecável. Distribuidoras, façam seu trabalho bem feito, por favor!
Barbara Steele – Tão grande que não cabe em rótulos!
Barbara Steele enfeitiça. Lembro-me bem da primeira vez em que a vi num filme, justamente o “Shivers” e, apesar do papel pequeno e sem tanto destaque como em seus mais conhecidos filmes, ela simplesmente me enfeitiçou pela forte presença, pela beleza estranha, a estrutura óssea facial grande e forte (como desenho mulheres acabo sempre observando isso em todas, e o rosto da Steele parece ter sido esculpido com proporções todas erradas, mas que mesmo assim acabou dando todo certo no final), o sorriso largo e os olhos profundos e malignos. Pensei: “Como ela é gigante! Que rosto monstruoso e perfeito! Essa mulher é uma obra de arte!”. A partir daí eu precisa saber mais e ver mais sobre ela. Virei Fã.
Hoje, com setenta e cinco anos, a mais poderosa atriz dos filmes de horror que de tão grande não cabe em rótulos, se assusta com o assédio dos fãs que até hoje a abordam empolgados por causa dos seus filmes antigos com uma emoção tamanha como se os filmes tivessem sido feitos ontem.
Conhecida como musa do cinema de horror gótico, Steele ganhou destaque na década de sessenta e alcançou seu status por conta da sequência de filmes de horror, italianos principalmente, onde atuou.
Steele nasceu na Inglaterra em 19 de dezembro e não tinha intenção de ser atriz, queria mesmo era ser pintora, “queria ser Picasso” dizia, e estudou para isso, foi para Paris, mas precisava de grana e foi por esse motivo que em 1957 ela entrou numa companhia de teatro onde ganhava cinco libras por semana.
Sua estréia como atriz foi na comédia britânica “Bachelor of Hearts“, em 1958, e não tinha muito mais que um pequeno diálogo. Foi em 1960 que, após ver sua foto numa revista, Mario Bava a recrutou para o que seria seu papel de maior destaque em “La maschera del demonio/Black Sunday/A Máscara de Satã” (que saiu aqui no Brasil em DVD pela London Films) onde faz um papel duplo, passeando brilhantemente entre a bruxa malvada e a princesa inocente. Este filme também marca a estréia oficial de Mario Bava como diretor. A partir daí, Barbara ganha grande notoriedade e em 1961 é levada para a américa onde estrela “The Pit and the Pendulum/A Mansão do Terror” (lançado aqui no brasil em DVD pela CultClassic) de Roger Corman, contracenando com o sempre genial Vincent Price. Ali, mais uma vez, ela nos encanta ao desempenhar muito bem seu papel de mocinha inocente e mulher cruel e assustadora ao mesmo tempo.
Durante a época em que ficou na américa, Steele relata que tentaram transformá-la em mais uma boneca de plástico fabricada por Hollywood “Eles tinham uma idéia preconcebida de que as mulheres eram todas lábios brilhantes. Eles diziam: ‘É melhor fixar suas orelhas para trás. É melhor deixá-la loira. Você não tem qualquer decote’. Depois vieram as recomendações: ‘não seja vista com fulano, porque… Não ande por aí de salto alto’ – eles achavam que eu era muito alta e todos se sentiam terrivelmente baixos lá. Era uma piada. Todos esses clichês fantásticos que você lê em “Day of the Locust” (livro de 1939, do autor americano Nathanael West sobre a decadência e alienação de Holywood nos anos 30). Só que era muito mais clichê do que você poderia imaginar.“, desabafou certa vez numa entrevista. Barbara se manda para a Itália e em 1962 ganha o papel para o filme “Fellini Otto & Mezzo” (de mesmo título aqui no Brasil e que foi lançado em DVD pela Versátil Home Video). Em seguida, ainda em 1962, faz o “L’orribile segreto del Dr. Hichcock“, o horror italiano dirigido por Riccardo Freda. Depois disso, outros papéis para filmes de terror surgem em seu caminho e consolidam cada vez mais seu título de rainha do horror. Entre estes títulos encontramos “Lo Spettro“, de 1963, dirigido por Riccardo Freda; “Danza Macabra” de 1964, dirigido por Sergio Corbucci e Antonio Margheriti; “I lunghi capelli della morte”, 1964, também dirigido por Antonio Margheriti, entre outros. Em 1966 faz um pequeno papel na comédia clássica “L’armata Brancaleone/O Incrível Exército Brancaleone” de Mario Monicelli (lançado no Brasil em DVD pela Spectra Nova) e em 1968 faz o clássico do horror britânico “Curse Of The Crimson Altar” de Vernon Sewell, filme que reúne também os outros dois grandes nomes do horror Boris Karloff e Christopher Lee. Apesar de todos os títulos e de seguidores fiéis do gênero do horror que mantém até hoje, Barbara Steele parecia não gostar tanto do culto ao título que recebeu, talvez pela limitação que isso causava a sua carreira. Declarou certa vez estar aposentada do gênero e que jamais voltaria a sair de um caixão de novo. A promessa não é seguida. Visando novos rumos para a carreira, volta à américa onde conhece o roteirista James Poe com quem se casa e tem um filho. Os dois ficam casados por muito tempo. Em 1969, Poe escreve um papel para Barbara na adaptação para a tela do romance “The Shoot Horses, Don’t They?”, mas quando Sydney Pollack, o diretor do filme, escolheu outra atriz para o papel, Barbara decidiu fazer uma pausa e ficou sem atuar por uns cinco anos. Volta ao cinema só em 1974 com o exploitation “Caged Heat” de Jonathan Demme. Em 1975 aparece lindísisma no clássico cult “Shivers“, papel com pouco destaque, porém notável, e em 1977 no “I Never Promised You a Rosen Garden” de Anthony Page. Já com a carreira capengando ela aparece em mais alguns títulos, uns tornaram-se memóraveis, outros nem tanto. Em 1978 ela e Poe divorciam-se e ela não volta a se casar novamente. Em 1980 tenta ainda o horror “The Silent Scream” de Danny Harris, se aposenta das telonas em seguida e se dedica, com sucesso, ao trabalho de produtora de mini-séries para TV. Chegou, inclusive, a ganhar um Emmy pela produção na série “War and Remembrance“. Barbara Steele retornou às telonas agora em 2012 estrelando o horror “The Butterfly Room” de Jonathan Zarantonello. Não sei se esse filme será lançado aqui no Brasil, não achei informações que indicasse algo sobre isso, então ficarei devendo essa informação.
Mesmo setentona Steele continua linda e com aquele olhar impressionante que nos convida sem que a gente saiba se é pro bem ou pro mal, ela nem sempre foi bem aproveitada, mas é tão gigante em talento e força que impressiona mesmo quando seu papel é minúsculo. Vida longa à grande e fascinante musa!
Steele – “The Butterfly Room”
The Buterfly Room
Algumas imagens de uma exposição com suas pinturas que aconteceu em Roma no dia 9 de novembro de 1962
Trailers de alguns filmes com a musa:
Resenha de petter baiestorf Box sobre barbara Steele de Leyla Buk
Segue a terceira parte da HQ “Birthday Gift” do desenhista Erenisch. Clique nos nomes para ver as partes anteriores: “Birthday Gift 1“, “Birthday Gift 2“.
“Smoker” (1983, 84 min.) de Veronika Rocket. Com: Sharon Mitchell, John Leslie, Joanna Storm e Ron Jeremy.
Este filme é do tempo que os filmes pornôs eram muito mais do que uma sucessão de cenas de fodas burocráticas sem tesão de 25 minutos cada. Neste “Smoker” a feiosa gostosa Sharon Mitchell é uma revolucionária de esquerda que possui uma sex shop de fachada onde bombas são acopladas em vibradores. Tudo ia bem até o dia em que um dos vibradores que continha uma bomba é vendido por engano à uma lésbica que pretende dá-lo a sua namorada. Quando elas fazem sexo são observadas por um vizinho punheteiro que acaba roubando o tal vibrador, e assim, começa uma série de desencontros eróticos envolvendo ótimas cenas de sexo bem elaboradas, dois estupros envolvendo bondage com as meninas imobilizadas sendo molestadas pelos empregados de Sharon Mitchell (entre eles o impagável Ron Jeremy, o prefeito de Tromaville).
De acordo com a pesquisadora Susie Bright, Veronika Rocket é o pseudônimo usado pela dupla Michael Constant e Rubin Masters (que com este mesmo pseudônimoteriam tambémteriam assinado “I Know What Girls Like”, vídeo de 1986 estrelado por Kristara Barrington, Stacey Donovan e Rhonda Jo Petty). Com uma ambientação SM Noir (a iluminação é extremamente bem feita, deixando um climão de sujeira), “Smoker” é uma comédia hilária que satiriza a política dos USA dos anos de 1980 (e o medo que o cidadão comum americano tem das esquerdas), uma época em que essa mistureba de gêneros, carregados no deboche, ainda tinha espaço no mundo das distribuidoras e cabeça dos espectadores.
Sharon Mitchell nasceu em 1956, era atriz e dançarina antes de começar a fazer filmes adultos. Seu primeiro filme foi “The Horny Landlady” (1975), estrelado por Vanessa Del Rio, ambas não creditadas. Depois do pontapé inicial, apareceu em mais de 400 produções como atriz (dirigiu cerca de 18 filmes), incluindo grandes clássicos do pornô como “Water Power” (1977) de Shaun Costello, “Exploring Young Girls” (1977) de David Stitt, “The Violation of Claudia” (1977) de William Lustig (sim, o diretor de “Maniac Cop” começou fazendo pornografia), “Barbara Broadcast” (1977) de Radley Metzger, “The Satisfiers of Alpha Blue” (1980) de Gerard Damiano, “Maniac” (1980) de William Lustig (agora fazendo horror), “The Taming of Rebecca” (1982) de Phil Prince, “The Devil in Miss Jones 2” (1982) de Henri Pachard, “Feast” (1992) de Mike Tristano, entre inúmeros outros. Por meados dos anos 90 Sharon fez a transição do pornô convencional para os vídeos de bondage e SM, na maioria das vezes desempenhando papel de dominatrix. Ela foi viciada em heroína por quase duas décadas, costuma zuar com isso quando se refere ao vício de 16 anos como seu “ano do apagão”. Em 1996 ela foi atacada e estuprada por um tarado que quase a matou, após este incidente ela deixou a indústria de filmes adultos e fez algumas aparições em produções para a TV, se aposentando nos anos 2000.
Como curiosidade: A trilha sonora de “Smoker” é assinada por Sharon Mitchell que canta “I Wanted to Love You” e “I Can Turn You On”.
“Smoker” tem 11 cenas envolvendo sexo criativo e bem filmado:
Sou apaixonado pelo senso de humor de Annie Sprinkle, uma estrela pornô surgida nos anos de 1970, que também foi prostituta por opção e stripper por opção, depois virou diretora de filmes pornôs e documentários, apresentadora de TV a cabo, fotografa, editora de revista adulta, escritora e educadora sexual. Ou, como ela própria se apresenta no Annie Sprinkle Org(asm), seu site: “Sou uma artista, sexóloga ecosexual, escritora, palestrante, educadora e atriz dramática. Também já fui uma trabalhadora do sexo, uma diretora/performer pioneira do filme adulto e fotografa profissional. Sou a primeira estrela pornô a tirar um Ph.D., meu trabalho é estudado nas grandes universidades, mostrei-o nos melhores museus e galerias – E ainda estou firme e forte!”. E você, arauto da moralidade e dos bons costumes, já fez metade disto tudo? Sexo é saudável, sexo como pecado é apenas uma criação das mentes sujas dos religiosos.
Nascida em 23 de julho de 1954, na Philadelphia, Pennsylvania, com o nome verdadeiro de Ellen F. Steinberg, lá pelos 18 anos de idade trabalhava na bilheteria de um cinema que exibia o, hoje, clássico pornô “Deep Throat” quando o filme foi apreendido pela polícia e ela acabou conhecendo o diretor Gerard Damiano, de quem se tornou amante. Em 1975 apareceu no obscuro “Wild Pussycats” (não confundir com “The Wild Pussycats/Kafti Ekdikisis” (1968) de Dimis Dadiras) e na seqüência em “Satan Was a Lady” (1975) da diretora cult Doris Wishman, usando o pseudônimo de Anny Sands (com este pseudônimo Sprinkle ainda fez “My Master My Love” (1975) de Ralph Ell). Em 1981, com ajuda do grande mestre Joseph W. Sarno, co-dirigiu seu melhor filme, “Deep Inside Annie Sprinkle”, onde ela aparece gulosa atrás de homens e litros de porra, tornando “Deep Inside…” a segunda maior bilheteria do pornô americano daquele ano. Na indústria adulta Sprinkle aceitava inúmeras participações especiais, é comum vê-la em cenas de orgia em filmes de produção mais caras, como “Pandora’s Mirror” (1981) de Shaun Costello e estrelado por Veronica Hart. Em 1992, já de olho nos novos rumos de sua carreira, aceitou um papel em “War is Menstrual Envy” do sempre experimental Nick Zedd (parceria repetida em 1999 no curta “Ecstasy in Entropy” e no vídeo “Electra Elf: The Beginning Parts One & Two” de 2005).
Considerada a primeira pornstar com Ph.D., Sprinkle realiza trabalhos irreverentes de educação sexual e sexologia. Uma de suas peças de teatro, “Public Cervix Announcement”, era um convite ao público para celebrar o corpo feminino, onde ela exibia seu colo do útero e as pessoas ganhavam um espéculo e uma lanterna para explorar suas profundezas viscerais.
Seu trabalho sobre sexualidade tem uma inclinação política, espiritual e artística (ela é uma espécie de Otto Mühel, só que mulher e inteligente). Com sua esposa e colaboradora Beth Stephens criou seu “Love Art Laboratory”, que consistia em realizar um casamento experimental por ano, com tema e cores diferentes, assim, Annie e Beth, se casaram 15 vezes, com onze temas ecosexuais que variaram de “terra”, “céu”, “mar”, “lua”, “sol” até “montanhas apalaches”.
Sprinkle é uma defensora da prostituição como carreira profissional (além de atriz pornô, ela foi prostituta entre 1973 e 1993), com carteira de trabalho e direitos trabalhistas às profissionais do sexo. Sua palestra chamada “My Life and Work as a Feminist Porn Activist, Radical Sex Educator, and Ecosexual”, defende seus pontos de vista sobre a sexualidade humana, liberdade sexual e individual e instiga as mulheres à se tornarem independentes. Ela apresenta essa palestra em várias faculdades e universidades dos USA e Europa (fica a dica do Canibuk para que uma de nossas universidades traga Sprinkle ao Brasil). Junto destas palestras ela realiza a “Free Sidewalk Sex Clinics”, onde oferece educação sexual livre aos passantes nas calçadas, usando este espaço público para se falar livremente de sexo.
Segue uma combinação de entrevistas com Annie Sprinkle:
De que forma você considera o seu trabalho feminista?
Sprinkle: Eu acho que é feminista, porque eu falo sobre minha vida de vários jeitos de forma aberta e honesta. É também uma declaração feminista contra a juventude do mundo, orientando para desfrutar do sexo como uma mulher mais velha, mesmo quando ampliadas.
Como você vê as suas experiências no passado agora?
Sprinkle: Eu sinto que o que eu fiz foi uma parte importante de quem eu sou agora. Assumo total responsabilidade por todas as coisas estúpidas que eu fiz. Eu sempre sai vencedora. Nunca me sinto como uma vítima. E eu tenho tido muita sorte, eu me livrei de muitas situações ruins onde não pegar Aids foi um milagre. Mas eu sempre acho que eu aprendo alguma coisa com cada experiência ruim. Então, se você aprende, você ganha. Mas como eu disse, eu tive sorte. Nada realmente ruim aconteceu. Algumas mulheres são vítimas de crimes terríveis.
Quais são os aspectos importantes de seu trabalho?
Sprinkle: Para mim, meu trabalho é apenas sobre a verdade. O que está acontecendo na minha vida e com outras pessoas. O sexo não é sempre essa coisa ideal de fazer amor bonito. É muito complexo e as pessoas são estranhas. As pessoas têm todos os tipos de fantasias estranhas e desejos incomuns. Meu programa exibe toda a variedade e diferentes aspectos. Sexo é tão diverso. Não há esse ideal. A maioria das pessoas tem uma natureza animal, eles têm todo o tipo de fantasias, até mesmo politicamente incorretas e fantasias onde estão fazendo um monte de coisas estranhas. Isso é normal. As pessoas pensam em casar, ter filhos e viver felizes para sempre, mas às vezes há complicações, as vezes não temos sexo ou fazer sexo se torna mais difícil ou desconfortável. As pessoas passam todos os tipos de coisas, mesmo em um bom relacionamento. É a mesma coisa com o sexo, é mais complicado.
Como você trabalha? Há intercâmbio com outras mulheres e feministas?
Sprinkle: Quando eu venho a um teatro, eu converso com as pessoas. Principalmente as mulheres querem falar. Quando eu estou fazendo um show que eu gosto de ter alguma troca cultural.
Que tipo de pessoas vê seu show?
Sprinkle: O público é muito variado e diversificado. Existem tantos tipos diferentes de pessoas. Ele não atrai a equipa de futebol, esses vão para o clube de strip. Agora eu estou na capa de uma revista semanal (nota: uma revista popular nos EUA). E as pessoas diziam: Ooh, nós nunca tivemos na capa da revista semanal “. Eu digo: “Bem, você tem que mostrar suas tetas “. Eu sou completamente ciente disto – como falamos na conferência de imprensa sobre pornografia e arte. Isso é mais interessante para muita gente.
Quando foi o momento em sua vida quando você queria fazer outra coisa? Por que você quer trabalhar no campo da arte?
Sprinkle: Eu já passei por diferentes fases. Eu certamente estou farta da pornografia mainstream. E agora eu estou loucamente apaixonada escrevendo um livro e gostaria de ficar em casa no meu ninho de viagens. Às vezes eu gostaria de ganhar mais dinheiro e acho que talvez eu deveria ser mais comercial. Tentar seguir com a corrente na maior parte das vezes. Mas tudo está mudando, o tempo todo. As pessoas têm noções pré-concebidas ou idéias, há muito preconceito em relação às mulheres que são prostitutas ou na pornografia. É por isso que é interessante trazer isso para o mundo da arte, porque as pessoas no mundo da arte tem uma mente mais aberta. Você pode sugerir coisas e, em seguida, eles têm a inteligência para colocá-las em contexto. O mundo da arte é um lugar muito bom para explorar a sexualidade. Mas tem o risco de arruinar a sua carreira como artista – se tiver relações sexuais na sua arte. Embora tenha havido artistas que foram muito bem sucedidos e que têm relações sexuais em seu trabalho como Jeff Koons.
Você também fez um filme chamado “Linda/Les and Annie: The First Female-to-Male Transsexual Love Story“. Como é sua relação com as pessoas transexuais e do movimento gay?
Sprinkle: Eu amo as pessoas transexuais. Eu acho que elas são realmente especiais e mágicas e uma parte imortante da nossa cultura. Há muito preconceito contra eles, mas eu os adoro. Eu tive amante fêmea-macho, amante macho-fêmea, amantes andróginos… Em São Francisco há tantas pessoas de todos os gêneros. Se você não é gay, você é estranho. Eu encorajo as pessoas a serem quem são e para serem abertos com seus amigos e familiares se puderem. É um bom momento para ser um transexual, melhor do que nunca. Mas eu gostaria mais se pessoas transgêneros não fizessem a cirurgia. Um monte de pessoas intersexo estão nascendo. Se possível, não deveriam fazer a cirurgia e aprender a se amar do jeito que são. Isso seria ótimo. Tanto faz o que são – é perfeito. Alguns deles têm que fazer uma cirurgia, não podem sustentar seus corpos. Um monte de fêmeas-machos não fizeram a cirurgia, porque é tão ruim. Eu acho que você pode ser um homem com uma buceta e uma mulher com um pênis – ou o que você quiser ser.
No seu trabalho você se concentra sobre a sexualidade das mulheres. O que você pensa sobre o seu trabalho ter sido acusado de reduzir as mulheres apenas a sexo?
Sprinkle: Os que se sentam no meu show não diriam isso. Não se trata só de sexo. A mostra ilustra a complexidade e os diferentes aspectos do sexo. Acabei de contar a minha história. Minha vida tem sido toda sobre sexo na maioria das vezes. Se eu estou reduzindo-a a sexo isto é bom. Não tenho nenhum problema com a objetificação da mulher, se é bem intencionado. Se alguém está assistindo a uma stripper e apenas vê-la como um ser sexual, tudo bem. Porque eu vejo ser sexual como uma deusa! Para mim é uma sacerdotisa – uma boa stripper. Mas eu não quero estar andando na rua e algum cara dizer: ‘peitos bonitos ‘. Eu vou querer bater-lhe. Mas se for bem intencionado e apreciado ver uma mulher como um ser sexual, está tudo bem. Mas se ele é feito de uma forma que é detestável ou abusivo, então não está tudo bem. Nina Hartley (nota: Sex Performer) diz que o problema não é objetificação, mas que alguns homens precisam aprender boas maneiras.
Que recomendações você daria para as meninas e mulheres se fortalecerem?
Sprinkle: Eu encorajo as mulheres jovens a aprender o máximo que puderem sobre a sexualidade. Não tenha medo de cometer erros. As pessoas pensam que o sexo deve ser sempre esta grande coisa maravilhosa – e não é. Às vezes você tem experiências ruins – aprenda com elas. A maioria de nós tem que ter um monte de experiências diferentes para aprender. Ame-se acima de tudo. Pense em você como o seu próprio e melhor amante.
O que você gostaria de dizer para as mulheres que lidam com seus corpos?
Sprinkle: Conheça o seu corpo. Aprenda sua anatomia. Olhe para sua buceta, se você já não estiver olhando. Aprenda a amá-la e apreciá-la. Se você tem vergonha – acabe com ela. Tenha orgulho: pussypride. E masturbação é realmente importante!
Como você acha que a internet mudará a nossa vida sexual?
Sprinkle: Você pode realmente ver a diversidade sexual. Há tantos fetiches, informações e sites de arte. Há um bom livro e também um site que é o www.deviantdesires.com, sobre todos os fetiches pesquisados por Katherine Gates. Existem todos os tipos de fetiches engraçados e interessantes, como pie-in-the-face ou pony girl. É incrível.
Na sua opinião, quais são as diferenças de pornografia feitos para/por mulheres comparando as feitas para/por homens?
Sprinkle: Durante muito tempo houve apenas um tipo de pornografia, mas agora existem diferentes ramos. Um monte de estudantes nas universidades agora estão explorando pornô em seu trabalho. É uma grande parte da cultura. Algumas mulheres fazem pornô para mulheres e casais e algumas mulheres fazem muito pornô misógino. Há alguns fazendo alguma coisa realmente boa como Candida Royalle, SIR Vídeo – fazem pornôs realmente bons em San Francisco. Há também Tristan Taormino, Joseph Kramer – uma educadora sexual gay, Carol Queen, Fatale Vídeo e Good Vibrations. Há tantas oportunidades para fazer algo diferente. Faça o seu próprio pornô!
Algumas pessoas culpam os males da cultura sobre a repressão do sexo. Se as pessoas realmente estavessem fazendo sexo e amando um ao outro, seríamos todos mais felizes.
Sprinkle: Se as pessoas tivessem mais orgasmos e soubessem como construir mais intensidade e energia sexual. Um monte de pessoas têm relações sexuais, mas isso realmente não significa muito. Eles não estão utilizando todo o seu potencial.
Como você ficou tão sexo-positiva em nossa cultura o sexo-negativa?
Sprinkle: Bem, a partir da experiência pessoal. Meus momentos eróticos, sensuais, sexuais e amorosos com um amante são os momentos mais felizes, bonitos, espirituais, resturadores que eu experimento na minha vida. Além disso, quando eu comecei a me prostituir não era tudo como se fosse um filme onde protitutas ou são assassinadas violentamente ou são salvas por um multimilionário onde você não vê a prostituta feliz, a mulher com poder fazendo um grande trabalho. O que você quer dizer com “sacred slutism”?
Sprinkle: O segredo do sacred slutism (risos) é estar consciente do nosso lado sacana, o nosso lado animal, alimentando esse nosso lado, a mulher selvagem, a prostituta interna em todos nós.
A “prostituta interna” inclui homens e mulheres, presumo?
Sprinkle: Sim.
Quem são suas associações profissionais nestes dias? Todas as influências atuais?
Sprinkle: Meu guru principal é Linda Montano, que é uma artista performática. Ela tem sido minha professora durante sete anos. Mas minhas duas maiores influências agora são as minhas duas namoradas. Uma delas se chama Dancer Vision, de Mill Valley. Ela é muito tântrica e muito um curandeira. Ela faz massagem erótica e nós ensinamos juntas. Ela é muito maravilhosa. Na costa leste, eu tenho minha namorada Mary Dorman, que é advogada. Ela é uma amazona, uma lutadora, muito lésbica amazona feminista. Ela é ótima! Muito inspiradora. E eu estou aprendendo mais sobre o amor e intimidade. Tenho estado com as duas sexualmente por oito meses, e eu pretendo continuar nessa linha. Eu gosto de ser, no momento, muito mais exclusiva. Embora isso seja apenas fisicamente sexual; eu acho que você pode ter um momento sexual num dia com tudo e todos, e, certamente, em minhas apresentações eu tenho muitas experiências sexuais com meu público.
Você obteve algumas críticas da ala direita. Como você responde?
Sprinkle: Eu acho que eles tem realmente muito medo, eles estão com medo, e eles não entendem um monte de coisas sobre sua própria sexualidade e sobre a sexualidade das outras pessoas. Eu sinto um pouco de compaixão para com eles. Por mais que eu tente, eu não os odeio.
Fontes: fibring.net, trechos de uma entrevista concedida em 2004.
Tradução de Leyla Buk.
Segue uma lista de filmes de filmes com Annie Sprinkle e algumas informações sobre essas produções:
“Satan Was a Lady” (1975) de Doris Wishman. Aqui com Sprinkle usando o nome Anny Sands. Uma dominatrix ganha uma grande soma de dinheiro de um cliente rico e passa boa parte de seu tempo com o namorado num clube de strip praticando sexo. Tudo isso com o padrão de qualidade Doris Wishman, freqüentemente chamada de “Ed Wood de Saias”. Os filmes de Wishman são únicos, seus grandes clássicos são os filmes “Deadly Weapons” (1973) e “Double Agent 73” (1974), ambos estrelados por Chesty Morgan; o semi-documentário “Let Me Die a Woman” (1978), sobre troca de sexo com uma operação explícita em closes bem sangrentos e “Bad Girls Go To Hell” (1965), um sexploitation proto-feminista. Doris Wishman começou a fazer cinema da forma mais inusitada possível: Após a morte de seu marido queria fazer algo para passar o tempo (e se possível ganhar algum dinheiro), pegou 10 mil dólares emprestados de sua irmã e realizou o nudie movie “Hideout in the Sun” (1960), seguido do hilário “Nude on the Moon” (1961, usando o pseudônimo de Anthony Brooks), sobre astronautas que vão prá Lua e descobrem que lá todos se divertem pelados. Neste período dos nudie movies fez ainda mais 6 filmes, incluindo “Blaze Starr Goes Nudist” (1962), estrelado pela lendária stripper e dançarina Blaze Starr. Com “The Amazing Transplant” (1970), ela começou a incorporar elementos do softcore em suas produções, misturando sexo ao cinema de gênero como policial e comédia. Para os fãs de horror recomendo uma assistida em “A Night to Dismember” (1983). Nos anos de 1990 os trashmaníacos (entre os quais me incluo) começaram a cultuá-la. Em 2001 ela refilmou “Satan Was a Lady” sem o sexo hardcore. Com Sprinkle ela ainda filmou “Come With me My Love” (1976), que tecnicamente é pavoroso. Doris faleceu dia 10 de agosto de 2002 deixando um legado de 30 filmes.
“Blow Some My Way” (1975) de Joe Davian. É um daqueles pornôs com edição bagunçada típico dos anos 70, um dos primeiros onde Ellen Steinberg usa o nome Annie Sprinkle, que aparece em algumas cenas fazendo deliciosos boquetes e transando em imagens mal filmadas. Aqui ela é uma modelo tentando vaga num comercial para famosa marca de cigarro que tem executivos tarados por sexo. É o primeiro filme do diretor Joe Davian, é um pornô ruim mas que merece ser visto pela Annie (talvez cópias melhores destes filmes melhorasse as produções também).
“French Shampoo” (1975) de Bill Milling. É uma paródia sexual ao lucrativo “Shampoo” (1975) de Hal Ashby, estrelado por Warren Beatty. Um magnata árabe trás sua esposa para um salão de tratamento em putarias ocidentais. Enquanto a esposa é preparada, o sheik e seu guarda-costas são servidos com sexo gostoso pelas putas taradas do estabelecimento. Annie Sprinkle é a pequena Mary que passa, literalmente, no teste de sofá para fazer parte do cast de putas de tão especial puteiro internacional. O diretor fez inúmeros pornôs usando o pseudônimo Dexter Eagle (além de Philip T. Drexler Jr., Craig Ashwood e outros nomes).
“Teenage Deviate” (1976) de Ralph Ell. Sprinkle faz uma adolescente chamada Ella que é introduzida no gostoso mundo do sexo. Ela participa de quase todas as cenas, de lesbianismo à orgias, passando por sexo com três gordos barbudos sebosos típicos dos pornôs dos anos 70. São pessoas reais transando com animação, físicos comuns bem diferentes dos atores/atrizes com padrão de plástico (chamo-os de “prástico girls”) da indústria pornográfica atual que tanto me broxa. O diretor Ralph Ell fez sete pornôs entre 1975 e 1976 (seis deles com Annie Sprinkle no elenco) e depois sumiu.
“The Night of Submission” (1976) de Joe Davian. Como uma Emmanuelle do sexo explícito, Sprinkle investiga os clubes de sadomasoquismo de New York e participa de ótimas cenas de sexo sujo, suado e melequento. Neste filme há uma ótima cena de sexo onde três homens ejaculam, um após o outro, na vagina de uma escrava sexual e depois tiram a porra com um copo. Visualmente escuro e agressivo, este filme tem um climão de perversão lindo (pena que Joe Davian nunca aprendeu como montar as cenas que filmava). Vanessa Del Rio faz parte do elenco.
“Bang Bang You Got It!” (1976) de Chuck Vincent. Essa comédia hardcore é hilária, criativa e muito bem filmada. São vários sketches envolvendo situações sexuais. O filme todo é uma boa paródia com o universo da TV, seus comerciais, programas de auditório e até re-inventa contos de fadas (aqui o lobo mau transa com uma peituda chapeuzinho vermelho interpretada pela gostosa C.J. Laing, que antes de virar atriz de filmes adultos havia sido groupie da banda The Grateful Dead). Chuck Vincent debocha de tudo e Annie aparece em uma rápida cena cômica fazendo boquete em um cara. Vincent fez mais de 50 pornôs, todos com grande qualidade técnica.
“Unwilling Lovers” (1977) de Zebedy Colt. Gosto muito do clima doentio deste filme. Rapaz perturbado pela mãe gosta de espionar seus vizinhos fazendo sexo, até o dia em que mata acidentalmente um casal e descobre as delícias da necrofília. Annie aparece no papel de uma prostituta que sofre violência física e depois é estuprada pelo degenerado. Zebedy Colt era um músico que virou ator pornô (atuou nos clássicos “The Story of Joanna” (1975) de Gerard Damiano e “Sex Wish” (1976) de Victor Milt) e depois dirigiu 8 filmes adultos, entre eles “Terri’s Revenge!” (1975), “The Farmer’s Daughters” (1976) e “The Devil Inside Her” (1977), também estrelado por Annie Sprinkle e que recomendo. Curiosidade: Em 1938, ainda criança, Zebedy aparece em cena no filme “The Adventures of Robin Hood” de Michael Curtiz e William Keighley e, anos depois, no clássico católico “The Ten Commandments” (1956) de Cecil B. DeMille, no papel de escravo.
“Cherry Hustlers” (1977) de Ron Dorfman. Outro daqueles pornôs classe “Z”, confusos e mal editados, em que Annie se metia. Este filme tenta mostrar como funcionava o tráfico de escravas brancas, há pelo menos duas boas cenas de estupro num clube onde escravos sexuais são vendidos à ricaços. Parece dois filmes montados num único, inclusive Annie aparece numa transa bem sem graça. Ron Dorfman é conhecido pelo pseudônimo de Arthur Bem e dirigiu inúmeros pornôs e fez a fotografia do clássico trash delirante “The Incredible Torture Show“ (1976) de Joel M. Reed, que é mais conhecido por seu título alternativo “Bloodsucking Freaks” (também trabalhou na direção de fotografia de “Night of the Zombies” (1981), outra maluquice de Reed).
“Jack and Jill” (1979) de Chuck Vincent. Outra ótima produção de Vincent com sexo bem feito e filmado. Aqui Jack e sua parceira Jill estão completando um ano de casados e resolvem apimentar seu casamento com uma série de encontros sexuais, com telefonemas obscenos, troca de casais, Jill ganhando um escravo sexual (o sempre bizarro George Payne) e Jack sendo raptado por duas mulheres taradas (uma delas Annie Sprinkle). Jill é interpretada por Samantha Fox e Vanessa Del Rio também aparece no elenco. Não confundir este filme com “Jack and Jill” (2011) com o xarope Adam Sandler.
“The Satisfiers of Alpha Blue” (1980) de Gerard Damiano. Outro clássico elaborado pelo mestre Damiano e repleto de atores que fizeram a fama da indústria adulta americana (no elenco, além de Annie, temos Richard Bolla – que anos mais tarde fez ponta em “Night of the Creeps” (1986) de Fred Dekker -, Herschel Savage, Sharon Mitchell, Tiffany Clark e George Payne). Numa sociedade futurística várias pessoas vão para um resort espacial em busca de satisfação sexual. Damiano dispensa apresentações, é o diretor que tirou os filmes pornôs das salas fuleiras e os levou para os cinemas comuns com seu clássico “Deep Throat” (1972). Realizou vários outros clássicos do cinema adulto, como “The Devil in Miss Jones” (1973), “The Story of Joanna” (1975), “Let my Puppets Come” (1976), estrelado por fantoches e marionetes numa deitação em cima dos Muppets, “Consenting Adults” (1982), escrito e estrelado por Annie Sprinkle em grande forma e “Throat: 12 Years After” (1984), continuação de seu grande clássico, desta vez estrelado por Sharon Mitchell, Joanna Storm e Annie Sprinkle.
“Bizarre Styles” (1981) de Carter Stevens. Vanessa Del Rio e Annie Sprinkle fazem parte de um grupo de mulheres taradas que se divertem humilhando homens com abuso verbal, chicotadas, torturas e golden shower. Carter Stevens, que também assinou alguns filmes com o nome Steven Mitchell (chegando a atuar em alguns com este nome), se interessou por fotografia nos anos 50. Nos anos 70 partiu para a produção de filmes de sexo explícito, alguns deles ótimas comédias hardcore como “Rollerbabies” (1976) com Terri Hall, “Punk Rock” (1977), que apesar do título é um filme adulto estrelado pelo impagável Richard Bolla e “Jail Bait” (1977), com Sharon Mitchell. Nos anos de 1980, além da produção de pornôs sadomasoquistas, Carter iniciou uma bem sucedida carreira como editor da revista “The S&M News”.
“Pandora’s Mirror” (1981) de Shaun Costello. Com um elenco de primeira este clássico da putaria conta a história de uma mulher (Veronica Hart) que entra numa loja de antiguidades e se sente atraída por um espelho amaldiçoado que tem o poder de lhe mostrar escapadas sexuais das pessoas que o possuíram ao longo da história humana. Com uma produção requintada e bem cuidada, “Pandora’s Mirror” já chama atenção por seu elenco que incluí, além de Hart e Sprinkle (que aqui aparece caracterizada como a rainha SM de um clube underground), Jamie Gillis, George Payne, Jerry “pau de manteiga” Butler, Tiffany Clark, Ron Jeremy, o grupo Patrons of Hellfire Club e o próprio diretor Costello, que começou sua carreira fazendo loops em 8mm e 16mm para a dupla Bob Wolf e Ted Snyder. Usando o pseudônimo de Helmut Richler, Costello filmou seu primeiro e explosivo pornô, “Forced Entry” (1973), que contava a história de um perturbado veterano do Vietnã estuprador de mulheres. Diz a lenda que Costello adorava fazer os filmes, mas não gostava de ver seu nome associado aos filmes, o que explica a quantidade absurda de produções onde ele não foi creditado ou que usou um de seus vários pseudônimos (Neil Almebor, Nicholas Berland, Russell Carlson, Jerri Conti, Alan de Fledermaus, Arthur Dietrich, Warren Evans, Jack Hammer, Josepi Masolini, Waldo Popper, Kenneth Schwartz, Stephen Steinberg, John Stover e Oscar Tripe são apenas alguns dos nomes por ele usados). Se você é um pornófilo que se preza, já terá visto pelo menos uma dúzia de ótimos filmes de Shaun Costello sem saber, como “The Summer of Suzanne” (1976), “Water Power” (1977), que ele lançou usando de pseudônimo o nome Gerard Damiano para ter lucro certo (mais picareta impossível), “Slave of Pleasure” (1978), “Fiona on Fire” (1978), “More Than Sisters” (1979), “Dracula Exotica” (1980), “Beauty” (1981), “Prisoner of Pleasure” (1981) ou “Heaven’s Touch” (1984), são todos filmes seus. Como curiosidade aos horrormaníacos, o divertido “Popcorn” (1991) de Mark Herrier, co-dirigido pelo veterano Alan Ormsby, é uma produção de Shaun Costello usando seu pseudônimo Warren Evans.
“Deep Inside Annie Sprinkle” (1981) de Annie Sprinkle e Joseph W. Sarno. Este é o meu filme preferido de Annie, que aqui nos conta sua história tarada fake e aparece com um apetite por sexo alucinado tesudo. Adoro a cena onde ela chupa vários fãs dentro de um cinema pornô, realizando um lindo número metalingüístico. No elenco também temos Ron Jeremy. O co-diretor deste filmaço foi Joseph Sarno, um dos pioneiros do sexploitation. Seu primeiro filme foi “Nude in Charcoal” (1961) e de lá prá cárealizou mais de 120 filmes, com destaque para “Sin in the Suburbs” (1964), “Young Playthings” (1972), estrelado pela belíssima Christina Lindberg e abraçou de vez o sexo explícito com “Sleepy Head” (1973) e não parou mais. Seus outros grandes filmes são “Deep Throat II” (1974), ainda com Linda Lovelace e Harry Reems no elenco e “Misty” (1976). Ele produziu filmes nos USA e em vários países da Europa, geralmente usando o nome Joe Sarno.
por Petter Baiestorf.
Assista também o documentário “NY 77 Coolest Year in Hell”, onde Annie Sprinkle aparece falando sobre a New York dos anos 70.
Derrame à mim teus encantos,
se fores capaz de me erguer com gemidos
como um mercúrio sujo de sêmen boca a baixo.
Do quente vivo das angústias que me queimam entre as pernas,
meus gritos…
música falsa daqueles que me deixaram na miséria da carne…
Tenha humanidade onde me falha o animal…
Cruze suas presas nas minhas.
Urine em mim como oxigênio nocivo mata gafanhotos de fogo,
como ozônio queima nuvem, destrói chuva…
Me tire dos conventos de minhas vergonhas e invejas.
Deixar tua voz moribunda com arranhões,
que com profundidade absurda,
atinjam teu inferno e despertem teu diabo calado
para fazer par com meu gritante demônio insaciável,
é a meta sonâmbula do que masturba o inconsciente…
o impossível.
Minha libido-mulher esfola as coxas buscando o alívio incestuoso
da proibição de tal feito…
O pecado encharcado deixa os soldados rasos corados, mas
tu meu tenente eu promovo a escravo.