Nudie-Cuties foram variações dos Nudist Films (que eram produções com a nudez tratada de forma natural, explorada em filmes como “This Naked Age/This Nude World” (1932) de Jan Gay; “Elysia, Valley of the Nude” (1933) de Bryan Foy, ou o clássico “Garden of Eden/Paraíso dos Nudistas” (1954) de Max Nosseck), onde a nudez natural e saudável das personagens ganharam histórias mais complexas (mas não tão complexas, já que eram filmes feitos para divertir de forma escapista os espectadores) nas mãos de diretores gaiatos como a dupla H.G. Lewis/David F. Friedman, em sua fase anterior ao gore sem limites iniciada com o clássico “Blood Feast” (1963), e a rainha dos filmes nudistas, Doris Wishman, que realizou belezuras como “Hideout in the Sun” (1960); “Nude on the Moon” (1961), inacreditável bobagem sobre astronautas americanos que vão pra Lua e descobrem que lá as pessoas vivem como que num grande campo nudista lunar; e “Blaze Starr Goes Nudist” (1962), estrelado pela stripper real Blaze Starr. Este maravilhoso subgênero cinematográfico lelo pelo menos um grande cineasta gênio ao mundo: Russ Meyer, que estreou na direção de longas com “The Immoral Mr. Teas” (1959) e foi o responsável pelos populares Nudie-Cuties que surgiram no rastro de seu pequeno clássico.
Aqui no Brasil, provavelmente de forma inconsciente e bem atrasado em relação ao seus irmãos pervertidos americanos/europeus, Nilo Machado seguiu os passos dos Nudies-Cuties (flertando muito com o cinema nudista) quando produziu a obra-prima “Tarzann, O Bonitão Sexy” (1977, 51 minutos, direção de Nilo Machado), que contava a história de um grupo de exploradores amadores que vai para a floresta atrás de um avião carregado de ouro que caiu na região onde Tarzann vive com sua esposa Jane e um preguiçoso cachorrinho de madame.
Não espere nenhuma história. Assim que o destemido grupo de aventureiros chega à floresta começam a se banhar num lago, cantar pelados em rodas de acampamento e esperar pelo encontro com o misterioso Tarzann (que, ao aparecer no final do filme, revela todo o bom humor cafajeste de Nilo Machado). Em todo o decorrer do filme as mulheres ficam de topless, sem ter o que fazer na trama, só restando a elas exibirem seus corpos naturais nús. Aliás, percebe-se nitidamente que o elenco de desconhecidos do filme se divertiu muito filmando essa pequena peça obscura do nosso glorioso cinema nacional.
Sempre tive curiosidade em saber como eram os detalhes técnicos dos filmes de Nilo Machado e pude constatar que ele não deve em nada ao cinema americano produzido sem orçamento no início dos anos de 1960, confesso que eu até esperava uma produção mais capenga e improvisada. Neste “Tarzann, O Bonitão Sexy”, temos também uma ótima trilha sonora composta por um grupo que incluía Nilo Machado, Perez Gonzaga, Luiz Nunes, Jair Lemos e J. Wilson, também compositores de ótimas canções como “Vamos Para a Selva”, “Hoje Estou Feliz” e “Não Facilita Nega Se Não”, presentes no filme que foi quase que inteiramente filmado nos estúdios Adelana, no Rio de Janeiro.
Outro filme com produção/direção de Nilo Machado que tive o privilégio de assistir foi “Playboy Maldito” (1973, 50 minutos, direção de Nilo Machado) que, aos moldes dos dramas tragicômicos debochados de George Kuchar, prima pelo exagero das situações dramáticas corriqueiras da vida mundana dos estudantes.
A história de “Playboy Maldito” não poderia deixar de ser mais brasileira: Rapaz de família rica vai estudar no Rio de Janeiro e usa sua mesada para viver fazendo festas na noite carioca. O “Playboy Maldito” não perdoa ninguém e de noitada em noitada, orgia em orgia, vai comendo todas as menininhas da cidade, fazendo com que até o comendador Vitorio Palestrina (“Estupro”, 1979, de José Mojica Marins) pareça um santinho. De sacanagem em sacanagem Nilo Machado conduz o espectador à um hilário dramático desfecho carregado de uma moral às avessas. Acho muito bonito quando pervertidos tentam dar lições de moral.
Nilo Machado, à exemplo do já citado José Mojica Marins, mostra os ricos como verdadeiros monstros sem moral, todos eles vestidos com figurinos pobres feitos de roupas de segunda e objetos de cena cafonas, como os copos floreados presentes em várias cenas deste “Playboy Maldito”, o que confere à essas produções um sabor brejeiro único. Nilo liga a (pouca) história do filme com muito striptease de mulheres feias e uma trilha sonora simplesmente maravilhosa de Lafayete e seu Conjunto (segundo os créditos do filme), com algumas canções escritas/compostas pela dupla Nilo Machado e Marcus José, como “Noite Vazia” (interpretada por Carmem Silvania); “Logo Mais Você Vem” (interpretada por Ubirajara) e “Noite Sem Luar” (interpretada por Marcus José). Essas trilhas sonoras dos filmes de Nilo Machado deveriam ser lançadas em vinil para o completo deleite dos colecionadores da boa música nacional. Foi uma pena Nilo Machado não ter seguido uma carreira musical em paralelo à sua vida dedicada ao cinema.
Os filmes de diretores como Nilo Machado são repletos de defeitos técnicos e limitações orçamentárias, mas pulsam cheios de vida e um estilo único de fazer/viver cinema. Estes pequenos grandes clássicos obscuros do cinema nacional precisam ser resgatados e salvos, são uma parte muito importante da arte e história da sociedade brasileira para continuarem perdidos. Espero que o documentário que Nelson Hoineff está fazendo sobre o cinema de Nilo Machado saia o quanto antes.
por Petter Baiestorf.