Humanoids From the Deep (“Criaturas das Profundezas”, 1980, 80 min.) de Barbara Peeters. Com: Vic Morrow, Doug McClure, Ann Turkel e Rob Bottin como uma das criaturas.
Numa pequena comunidade de pescadores o trabalho vai mal, aparentemente os peixes estão todos sumindo. A esperança de emprego para os pescadores parece ser uma fábrica de conservas que está sendo construída na comunidade e que, sem que ninguém saiba, estão realizando experiências com hormônios de crescimento – o que faz com que algumas criaturas das profundezas do oceano evoluam e se tornem humanoides em busca de fêmeas humanas para a procriação. Levantando o problema ecológico temos um índio que luta contra o dono da fábrica, desviando a atenção das criaturas num primeiro instante, até que homens começam a serem mutilados e as mulheres estupradas. E claro que, por ser um filme de baixo orçamento que tenta lucrar com o sucesso de produções como “Jaws/Tubarão” (1975) de Steven Spielberg e “Piranha” (1978) de Joe Dante, “Humanoids” nos reserva um festival (assim como nos dois filmes citados) para as cenas finais onde as criaturas das profundezas realizam seu banquete/orgia em um divertido ataque em massa aos humanos, o que nos leva ao perturbador final do filme com ecos de chupação de “Alien” (1979) de Ridley Scott.
“Humanoids from the Deep” tem tudo que faz a alegria de um fã de filme vagabundo: monstros, cientistas, peitinhos, ataques brutais, cidadezinha isolada, história ágil, putaria, depravação, bestialismo e um monte de cenas memoráveis. Uma cortesia de Roger Corman, que não contente com as cenas de violência filmadas pela diretora Barbara Peeters (originalmente Corman queria que Joe Dante dirigisse), chamou James Sbardellati (que depois realizou a trasheira “Deathstalker” em 1983 e foi assistente de direção em filmes como “The Island of Dr. Moreau/A Ilha do Dr. Moreau” (1996), uma bagunça cinematográfica da dupla Richard Stanley/John Frankenheimer) para filmar os estupros de uma maneira mais brutal/explícita, fato que fez com que muitos dos atores e técnicos do filme passassem a odiar a produção. Aliás, notem como “Humanoids from the Deep” se parece com “The Horror of Party Beach” (1964) de Del Tenney.
Roger Corman foi o produtor executivo de “Humanoids” e para falar da carreira deste mestre do cinema moderno seria preciso um adendo que daria um segundo post. Corman iniciou sua carreira dirigindo filmes para a American International Pictures dos sócios James H. Nicholson e Samuel Z. Arkoff, que são os responsáveis pelos filmes mais divertidos da história do cinema. Do western “Five Guns West/Cinco Revólveres Mercenários” (1955) até “Roger Corman’s Frankenstein Unbound/Frankenstein – O Monstro das Trevas” (1990) foram 56 filmes dirigidos. Corman é um dos produtores mais espertos do cinema mundial, sendo o responsável por mais de 400 produções, de “Highway Dragnet/Consciência Culpada” (1954), de Nathan Juran, até os dias de hoje (sim, Corman continua na ativa, tanto que em 2014 esteve em Curitiba, à convite da produtora Diana Moro, ministrando uma master class), com produções como “CobraGator” (2015) de Jim Wynorski. Corman foi o responsável pela primeira chance de milhares de cineastas americanos, o início de carreira de gente como Francis Ford Coppola, Martin Scorsese, Ron Howard, Peter Bogdanovich, Paul Bartel, Jonathan Demme, Joe Dante, James Cameron, John Sayles, Monte Hellman, entre muitos outros, foram em produções de Roger Corman.
Barbara Peeters, a diretora de “Humanoids”, começou na indústria cinematográfica fazendo de tudo um pouco. Foi atriz em “The Gun Runner” (1969) e supervisora de roteiro no biker movie “Angels Die Hard/Motoqueiros Selvagens” (1970), ambos de Richard Compton; gerente de produção em “Night Call Nurses” (1972) de Jonathan Kaplan, e até coordenadora de dublês em “Moving Violation” (1976) de Charles S. Dubin. Estreou na direção em 1970 com o drama exploitation “The Dark Side of Tomorrow”, co-dirigido por Jack Deerson. Foi contratada por Roger Corman para realizar filmes pela New World Picture, o que fez com que sua carreira ganhasse um novo gás. “Humanoids from the Deep” (1980) foi seu último trabalho para Corman, logo após ele encomendar cenas de estupro mais brutais para o filme, Peeters pediu para que seu nome fosse retirado dos créditos, como Corman ignorou o apelo ela se demitiu e passou a dirigir produções para a televisão. Na década de 1990 fundou sua própria produtora, Silver Foxx Films, e desde então passou a realizar comerciais de televisão. Uma pena, já que seus filmes para o cinema sempre eram bem curiosos.
Rob Bottin, o gênio da maquiagem por trás do clássico “The Thing/O Enigma de Outro Mundo” (1982) de John Carpenter, foi o responsável pela criação dos humanóides tarados deste filme (outras de suas criações inesquecíveis foram os lobisomens de “The Howling/Grito de Horror” (1981) de Joe Dante; o policial robô de “Robocop/O Policial do Futuro” (1987) de Paul Verhoeven, e o design dos lagartos em “Fear and Loathing in Las Vegas/Medo e Delírio” (1998) de Terry Gilliam). Em “Humanoids” Bottin interpretou uma das criaturas e foi ajudado pelos assistentes de maquiagens Steve Johnson (que depois fez as maquiagens em produções como “Big Trouble in Little China/Os Aventureiros do Bairro Proibido” (1986) de John Carpenter e “Night of the Demons/A Noite dos Demônios” (1988) de Kevin Tenney), Shawn McEnrou (que trabalhou em filmes como “Night of the Creeps/A Noite dos Arrepios” (1986) de Fred Dekker e “The Texas Chainsaw Massacre 2/O Massacre da Serra-Elétrica 2” (1986) de Tobe Hooper) e Kenny Myers (que fez as maquiagens no trashão “Metalstorm” (1983) de Charles Band e na comédia “Return of the Living Dead 2/A Volta dos Mortos-Vivos 2” (1988) de Ken Wiederhorn). Os efeitos especiais foram do veterano Roger George (que começou lá em 1959 em “Invisible Invaders/Invasores Invisíveis”, de Edward L. Cahn, e na década de 1980 comandou a função em filmes importantes como “The Terminator/O Exterminador do Futuro” (1984) de James Cameron) com ajuda do jovem Chris Wallas que, depois, se tornou diretor em “The Fly/A Mosca 2” (1989).
Alguns dos técnicos que também trabalharam em “Humanoids” foram Jimmy T. Murakami, que dirigiu algumas cenas e, no mesmo ano, dirigiu o pequeno clássico “Battle Beyond the Stars/Mercenários das Galáxias”; Martin B. Cohen foi produtor/roteirista (ele foi diretor do biker movie “The Rebel Rousers” (1970), estrelado por Jack Nicholson, e produtor executivo do lixo Cult “Blood of Dracula’s Castle” (1969) do sempre ruim Al Adamson) ao lado de Hunt Lowry (que depois se tornou produtor dos filmes de comédia do amalucado trio David Zucker, Jim Abrahams e Jerry Zucker e, também, foi produtor executivo do Cult movie para jovens moderninhos “Donnie Darko” (2001) de Richard Kelly). Mark Goldblatt foi o editor (antes já havia montado o “Piranha” e depois montou “The Terminator”) e Gale Anne Hurd, que depois viria a se tornar uma das mais importantes produtoras das décadas de 1980/1990, foi assistente de produção neste pequeno clássico do Corman.
“Humanoids from the Deep”, que na Europa é conhecido pelo título “Monster” (não confundir com a produção de Kenneth Hartford, também de 1980), é uma exemplar sci-fi de horror típica de uma época em que o cinema tinha como obrigação ser despretensioso e muito eficiente na arte de, simplesmente, entreter o público.
por Petter Baiestorf para o livro “Arrepios Divertidos”.
veja o trailer de “Humanoids from the Deep” aqui: