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O Judoka

Posted in Cinema with tags , , , , , , , , , , , , on junho 5, 2012 by canibuk

Resolvi resgatar uma matéria antiga sobre o filme “O Judoka” (1973, 90 min.), de Marcelo Ramos Motta, que foi originalmente publicada na revista “O Judoka número 35” de fevereiro de 1972 (EBAL Editora). Como arranjar informações sobre filmes brasileiros sempre é uma tarefa meio ingrata, espero que o resgate desta matéria ajude alguns pesquisadores. Claro que como é uma “matéria” de jornalista “enche lingüiça” que nem assinou o que escreveu, poucas informações relevantes são fornecidas. Nossa imprensa é uma piada desde sempre.

O FILME DA ONDA

Durante a filmagem de várias cenas do filme “O Judoka”, de Marcelo Ramos Motta, muita gente andou apanhando de verdade. É que para fazer um filme deste gênero, com muita luta, é necessário uma boa dose de realismo; fingir que apanha não convence ninguém. Às vezes, as cenas são repetidas duas, três, dez, doze, quinze, ou mais vezes, até que tudo esteja perfeito, como manda o roteiro.

O professor Amauri Guarilha, faixa-preta de jiu-jitsu, pesando sessenta e poucos quilos, teve que enfrentar o lutador de catch Banzo, um gigante negro com cerca de cento e cinqüenta quilos de músculos. Essa tomada foi feita aqui mesmo, no terraço desta Editora (nota do Canibuk: O jornalista está se referindo a editora EBAL), numa noite de muito calor. Ambos suavam de ter que ser empoados a todo instante pela maquiladora, para que o brilho do suor não prejudicasse a cena, ou atrapalhasse as pegadas de mão dos lutadores. De repente, o lutador de catch segurou o lutador de jiu-jitsu, levantou-o sobre a cabeça e atirou-o no ar. Para quem assistiu os trabalhos, o realismo da luta deu até aquele friozinho na barriga. O artista descreveu uma pirueta e mergulhou de costas, de cabeça para baixo. Era de esperar que Guarilha sofresse sérias fraturas, arremessado deste jeito. Mas a “vítima” bateu no chão duro de lajotas de concreto como se fosse um colchão de plumas. Não foi truque, não, apenas uma técnica sensacional. Guarilha levantou-se de um salto, sacudiu a poeira com naturalidade, e já estava pronto para a cena seguinte.

MARCELO EXIGE AUTENTICIDADE

Marcelo Ramos Motta é isso, um produtor “boa praça”, tranqüilo, delicado e gentil. Quase nunca perde a paciência, e se o faz a zanga não dura mais que alguns segundos. Mas nem por isso deixa de ser exigente e rigoroso nas horas de trabalho. Paga jantar para a equipe, brinca com todos, mas quer realismo; nada de simulações infantis. Artista tem que sofrer. Ele acha que um filme deve dar ao espectador emoções autênticas, sem exageros, mas em doses exatas.

Houve uma cena que foi repetida vezes sem conta, porque os “bandidos” não estavam sabendo “apanhar corretamente”. Afinal, “bandido” que se preza tem de saber apanhar do “mocinho”, com classe. Assim, durante a última tomada, em que os “bandidos” atacavam Pedrinho “Judoka” Aguinaga, o “tempo fechou” com realismo. Marcelo sorriu, plenamente realizado. Mas a cena programada para o dia seguinte teve que ser adiada… por falta de condições físicas dos “malfeitores”.

O BARBUDO WALTER SCHILKE

O diretor de produção do filme, Walter Schilke, é também uma revelação artística do cinema brasileiro. Sua figura nos lembra um autêntico viking. Jovem, forte, louro, de olhos azuis penetrantes e espessa barba ruiva. Walter é um amálgama de alemães e russos, nascido em Santa Catarina, quase na fronteira com a Argentina. Ele tem o terceiro papel do filme em importância, incarnando um cientista e professor de Astronomia “mau-caráter”, que consegue roubar a Lua.

Conversando sobre sua atuação, Walter disse-nos que leva muita pancada, até que o Judoka possa recuperar a Lua. E isto, evidentemente, só se dá no fim do filme. Deste modo, o nosso viking catarinense tem que aguentar a pancadaria por muitos metros de celulóide, para demonstrar o seu talento artístico.

Walter Schilke é um veterano. Ele já apareceu ou atuou como assistente de produção, ou fez as duas coisas de uma só vez, nos seguintes filmes: “Pais Quadrados, Filhos Avançados”, de J.B. Tanko; “Jesus Cristo, Estou Aqui”, de Mosael Silveira; “Prá Quem Fica Tchau”, de Reginaldo Faria; “Como Ganhar na Loteria sem Perder a Esportiva”, de J.B. Tanko; “Em Família”, de Paulo Porto; “Rua Descalça”, de J.B. Tanko; “Cassi Jones”, de L. Carlos Pesson; e “Som Livre, Amor e Curtição”, de J.B. Tanko.

ELENCO V.I.P.

Como se vê, “O Judoka” possui um elenco de astros e primeira grandeza, que por si já constitui uma promessa de sucesso para a estréia do filme. Destacamos Maria Pompeu, por seu trabalho artístico bastante conhecido, no Brasil e no exterior, como um dos pontos altos deste elenco V.I.P. Atriz de grande versatilidade, Maria Pompeu já é um nome bastante consagrado pelas platéias de cinema e teatro, ora surgindo em desempenhos cômicos, dramáticos ou maliciosos. Quem não se lembra da aeromoça de “Como Vencer na Vida sem Fazer Força”, ou daquela dramaticidade de “A Casa de Bernarda Alba?” Maria, com seus grandes olhos azuis e toneladas de talento, garante qualquer espetáculo. Ela Aparecerá também em “O Judoka”.

FERNANDO JOSÉ

Como todo bom artista brasileiro, Fernando José “vive” os mais variados papéis que lhe são designados. Ele aparece também em “O Judoka” sendo uma das boas aquisições de Marcelo Ramos Motta. Sua participação no teatro, no cinema e na televisão já o transformou num artista popular e aplaudido em todo o País. Fernando diplomou-se em arte pela Fundação Brasileira do teatro. Estreou aqui na Guanabara, no Teatro de Tablado, e já participou de espetáculos como “O Rapto das Cebolinhas”; Todomundo” e “O Cavalinho Azul”. Na televisão participou de “Um Gosto Amargo de Festa”; “A Rainha Louca”; “Sangue e Areia”; “O Véu da Noiva”; “Irmãos Coragem”, entre outros. No cinema fez “Na Mira do Assassino”; “A Noite do Meu Bem”; “Os Raptores”; “Bonga, O Vagabundo”; “Pais Quadrados, Filhos Avançados”; “Dois Perdidos numa Noite Suja” e “Ali Babá e os Quarenta Ladrões”.

Scanner de HQ de uma página que explica, de maneira direta e simplória, como surgiu o herói Judoka.

* Essa matéria é um resgate cultural.

Entrevista com Walter Schilke

Posted in Entrevista with tags , , , , on agosto 19, 2011 by canibuk

Em 1992, quando resolvi filmar meu primeiro longa-metragem, “Lixo Cerebral vindo de outro Espaço”, eu não fazia a mínima idéia de como fazer um filme, era novo demais, só tinha energia de sobra prá tentar fazer. Walter Schilke era um senhor que residia na minha cidade que tinha trabalhado em vários filmes profissionais do cinema brasileiro e fui, com minha pequena equipe de amadores sem noção, perguntar algumas coisinhas. Schilke virou uma espécie de “consultor técnico” prá gente, o que evitou algumas burradas que íamos fazer.

Tempo depois o ator E.B. Toniolli (que trabalhava num jornal) entrevistou o Walter Schilke para o fanzine “Brazilian Trash Cinema” (que Coffin Souza e eu editávamos).

Schilke faleceu em 2009 (mesmo ano que, alguns meses depois, meu pai faleceu, desfalcando a Canibal Filmes de dois ajudantes importantes).

eu com Walter Schilke e nossa amiga Iara em 2008.

Segue a entrevista que o Toniolli realizou com o Schilke lá por 1995:

E.B. Toniolli: Como foi seu ingresso no cinema?

Walter Schilke: Foi por acaso. Passeava por Copacabana (Rio de Janeiro) quando alguém me abordou, perguntando se gostaria de participar de um filme. Recém chegado do interior, jovem, inexperiente, fiquei desconfiado. Depois vi que era em meu tipo físico que estava interessado, pois o filme era alemão. Comecei fazendo uma ponta em “Os Carrascos Estão Entre Nós” (1968) de Adolpho Chadler.

Toniolli: Como era trabalhar, fazer cinema, naquela época?

Schilke: Bom. Muito bom. O cinema resurgindo para uma nova fase. Havia passado o momento da Atlântida com suas chanchadas, que não restou dúvidas, foi uma época romântica e ingênua do cinema nacional. O cinema modernizava-se, acompanhando a revolução social dos anos de 1960, quando valores eram revistos. Depois dos Beatles nada ficaria igual. Época dos cabeludos, dos hippies, do novo. E o cinema acompanhava tudo isto tornando-se mais intelectualizado, nãosendo apenas um veículo de divertimento como também de informação e cultura. Sirgiam os grandes cineastas brasileiros. Era uma verdadeira febre de realizações que parecia não ter fim, isso até o final da década de 1970.

Toniolli: E você, como se sentia participando de um momento tão decisivo dentro da cultura cinematográfica brasileira?

Schilke: Entusiasmado. Tanto quando a força da juventude nos faz sentir quando começamos a descobrir nosso próprio potencial. E o resultado veio em satisfação pessoal e financeira. Eu, praticamente analfabeto, contribuindo de maneira tão efetiva no desenvolvimento de uma arte maior, de um poder de penetração enorme, projetando nossos valores culturais aqui e no exterior.

Toniolli: De quantos filmes participou?

Schilke: Mais de 50. “A Dama da Lotação”, “Bar Esperança”, “Gaijin” e tantos outros.

Toniolli: Qual o filme que lhe deu maior satisfação?

Schilke: Todos me deram retorno e contribuiram prá crescer profissionalmente, mas a filmagem de “Gaijin” foi um marco pela dificuldade. Não havia verba e entrou somente o idealismo de todos, aquilo de fazer pelo prazer de vencer os desafios.

Toniolli: Qual seu melhor desempenho como ator ou diretor de produção?

Schilke: Como diretor de produção foi uma experiência fantástica, dei vazão a minha criatividade e relacionei-me com todas as camadas sociais, adquirindo um incrível conhecimento de tudo. Intelectualizei-me, sem leituras, na prática, levando bordoadas numa luta árdua, pois trabalhavamos até a exaustão, as vezes, muitas vezes, não se tinha tempo nem de dormir, imagine comer!!!

Toniolli: Como de uma pequena participação como ator chegou a diretor de produção?

Schilke: Numa filmagem o diretor executivo descabelava-se porque precisava de certos objetos antigos para uma determinada cena e não conseguiam. Eu que a tudo assistia disse:

“Eu consigo!”

“Você?”

“Sim!”

“Se me trouxer…” e me deu uma lista enorme, “… tudo isto dentro de 3 dias o lugar de assistente de produção é seu. Ganhará o dobro e terá outras vantagens!”

“É prá já!”. Não descansei um minuto. Na manhã seguinte estava tudo no set de filmagem. O diretor ficou perplexo. No final da filmagem já era o titular diretor de produção.

Toniolli: Como explica abandonar o cinema e vir para o campo?

Schilke: É outro tipo de realização. O contato com a natureza nos purifica e liberta nosso ego e assim viver e criar torna-se mais fácil. E nos livramos da poluição, assaltos e tudo mais que os grandes centros nos dão!

Filmografia básica de Schilke como diretor de produção:

1971- Prá quem Fica, Tchau (Reginaldo Farias);

1972- O Judoca (Marcelo Mota);

1973- Banana Mecânica (Braz Chediak);

1974- Ainda Agarro está Vizinha (Pedro Rovai);

1975- Costinha, o Rei da Selva (Alcindo Diniz);

1977- A Dama da Lotação (Neville D’Almeida);

1978- A Batalha dos Guararapes (Paulo Thiago);

1978- Tudo Bem (Arnaldo Jabor);

1980- Os Sete Gatinhos (Neville D’Almeida);

1982- Rio Babilônia (Neville D’Almeida);

1982- Gaijin (Tizuka Yamasaki);

1983- Paraíba Mulher Macho (Tizuka Yamazaki);

1985- Bar Esperança (Hugo Carvana);

2005- Gaijin 2 (Tizuka Yamazaki).