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O Beco das Almas Famintas

Posted in Literatura, Livro with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , , on outubro 1, 2016 by canibuk

img022Acabei a leitura do romance “O Beco das Almas Famintas” de uma tacada só, curtinho e envolvente, escrito pelo Erivaldo Mattüs que por anos editou o fanzine “Spermental” e que já foi ator de Gurcius Gewdner no fantástico curta-metragem “Erivaldo – O Astronauta Místico”. Drogas, sexo e fanatismo religioso de um mundo pervertido contado em  linguagem direta e sem rodeios quase como se fosse um roteiro de um grindhouse transformado em romance.

Sinópse: “Quando alguns mendigos são misteriosamente assassinados no centro da Cidade Sereia, três cidadãos bem sucedidos têm suas vidas progressivamente destruídas: Antenor, um executivo playboy egoísta; Cláudio, um luxurioso técnico em eletrônica e Sauro, um pastor evangélico que tem a ganância por sobrenome. O enredo, mostra a escalada do trio rumo ao fracasso, de seu presente estável até suas quedas meteóricas; seguindo em narrativas paralelas até cruzar o destino dos personagens no abandonado e famigerado “Beco dos Invisíveis”, lugar no centro de Sereia onde as desgraças são mais cotidianas e inacreditáveis do que sonha nossa vã filosofia.”

O Beco das Almas Famintas é o primeiro romance de E. Mattüs. A narrativa traz elementos que vão desde a marginalidade de Bukowski ao horror de Edgar Allan Poe, tudo ambientado em um absurdo universo kafkiano. Em tiragem numerada de 150 exemplares, a edição usa e abusa de papéis de qualidade duvidosa e estética “trash”, ao longo de 48 páginas, encadernadas em costura de 3 pontos. O livro foi lançado pela editora independente recifense Livrinho de Papel Finíssimo e é o sexto volume da coleção romanesca LiteraTara.

O que?

O Beco das Almas Famintas. Autor: E. Mattüs. Editora: Livrinho de Papel Finíssimo. Ano: 2016. Preço: R$20,00 (Envio simples: 22,00; Carta Registrada: R$25,00). Contato: katarru_podre@hotmail.com/ (82) 99945-8090. Facebook: MattüsMattüs. Instagram: @mattus.ausente

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Abaixo o primeiro capítulo de “O Beco das Almas Famintas”:

Quando a esmola é uma chuva de balas.

Quem transita pelo centro da cidade Sereia pode encontrar tudo o que precisa para exercer o materialismo a rigor. De cama, mesa e banho a eletroeletrônicos e made in china, o comprador pode desfrutar de todas as visões necessárias para abrir a carteira e deixar parte de sua fortuna em qualquer recinto. Odor suave de esgoto pairando no calçadão das ofertas vazias. Queima de estoque. Ao comprar, o ser humano adquire existência. Todavia, aberta a embalagem, o sentimento de satisfação é transformado numa estranha sensação de engano ou frustração. Com a realização do desejo consumista, o objeto adquirido perde o encanto e cede sua vez a uma nova fantasia material.

Porém, nem todos os transeuntes têm o poder aquisitivo necessário para existir. E para esta estirpe maldita é reservado o chamado “Beco dos Invisíveis”. Um reduto dos ignorados, criaturas das quais não se pode vampirizar qualquer espécie de lucros. Habitat natural dos moradores de rua e criaturas inexistentes aos olhos bem sucedidos dos consumidores. Numa viela, ao final de um labirinto com ruas curtas, fica este ambiente inóspito. Um forte cheiro de esgoto misturado ao de eletrônicos embalados acaba resultando num cheiro de merda tão natural quanto a fumaça da combustão automotiva. Uma pocilga abandonada aos seus 6 residentes. Caixas de papelão formam casas. Carrinho de supermercado vira armário. Uniformes velhos e camisetas de políticos ditam a moda. Eis o bendito lar de Alex, José e Simão. Os três reis magros que, na melhor das hipóteses, podem ofertar ao mundo uma pequena faceta da miséria criada por uma sociedade cruel.

São dez da matina e uma chuva rasa antecede o Sol picante. O vapor se eleva do concreto criando uma sauna natural. Pessoas andam mais rápido, enquanto lojas de ar condicionado faturam mais. Alex devora meia quentinha, Zé tasca a primeira pedra do dia no cachimbo e Simão continua a soltar suas profecias esquizoides:

— Este beco é a chave da penitência humana. Toda dor e culpa desse mundo maldito veio parar aqui e nós pagamos o preço! Só estamos aqui por culpa de todos vocês, seus desgraçados! Vocês são os culpados! Berrava o velho vagabundo.

— Cala a boca, porra! Nem tá doido de cana e já está falando merda! Explodiu Zé, depois do primeiro beijo na lata.

E explodiu mesmo! A fumacinha com gosto de plástico invadia seu corpo de forma devastadora. Paranoia, alucinações e mania de perseguição por fora, mas dizem que o que conta é como somos por dentro. Quanto a isso, Zé se sentia o rei do mundo. Um príncipe em seu reinado a céu aberto. Sensação esta, semelhante à de Alex que não reclamava nem repreendia, apenas soltava pequenos arrotos em sinal de total satisfação.

Refeições, drogas e ideias expostas em mais um fatídico dia que chega à metade. O trio desventurado compartilha a primeira lata de cachaça, Simão era o mais alvoroçado. Cada gole descia com a urgência de um antídoto ao mais maldito de todos os venenos, a sociedade. Zé — Caralho! A fissura tá voltando, mas dá pra segurar com a cana. Simão — Maldito sejas tu que trocasses o néctar divino pela pedra do diabo! Alex — Essa porra tá me deixando enjoado, acho que vou deixar uma bacia aqui de lado porque, se eu vomitar, é só jogar uma farinha por cima que já tenho a janta…

Simão — A autossuficiência é o segredo do sucesso! Os três soltam uma gargalhada uníssona.

No horário de almoço, o trânsito humano aumenta. Os ébrios cabisbaixos nem percebem que alguém passa pela calçada em que descansam e atira em cima dos três uma verdadeira chuva de balas. Framboesa, morango e abacaxi. Acho que o indivíduo veio de mão cheia e simplesmente abriu a palma em cima de nossos heróis. Ao erguerem a vista, só perceberam o anônimo de costas prosseguindo seu destino. Usava uma camiseta estampada com flores, daquelas bem bregas que se compram em brechós. Apesar do mau gosto, abençoadas sejam as almas generosas que habitam a selva de pedra.

— Deus lhe dê em dobro! Alex foi cordial em nome do trio.

É óbvio que os doces viraram tira-gosto. Zé perambulou meia hora e já voltou com duas pedrinhas, sinal de que a sociedade era realmente caridosa… Em eliminá-lo!

— Ainda tem confeitinho?

— Claro! Segura aí!

Alex era um jovem de quase um metro e oitenta, beirando os trinta e portador de um ar amistoso. Graças às drogas e descuidos com a vaidade, ele aparentava quase quarenta. O Sol e o clima seco também corroíam sua aparência, igualzinho aos prédios do centro da cidade. Os cabelos loiros ficaram quase marrons. Algumas mechas se juntavam em dreads; o que para a grande maioria lhe dava uma aparência suja, fato negativo aos negócios de pedinte. Os amigos pouco sabiam de seu passado. Só existiam alguns boatos sobre ele ter vindo do interior do estado trabalhar como servente de pedreiro e ter arranjado uma mulher que destruiu sua vida. Um belo dia, ele chegou com uma trouxa de roupas e uma garrafa de vinho pela metade. Perguntou a Simão se poderia ficar no Beco e foi aceito de bom grado. Por ser o único habitante do recinto, o patriarca da ralé apenas ditou-lhe algumas regras de convívio e até ensinou a arte da mendicância ao recém-chegado.

Já José Silva era vítima dos químicos, a família bem que tentou, mas a paixão pela pedra falou mais alto. Zé estava largado no mundo e pedindo esmolas em prol de seu culto aos deuses da lata. Cara chupada. Metade dos dentes o abandonou. A gordura era pouca e as veias saltavam pelos braços até desparecerem nas falanges proximais. Talvez seus familiares estejam a sua espera, aguardam um desejo de abstinência ou a providência divina, mas quem fuma a unha do capeta assina um contrato com o tinhoso para se entregar de corpo e alma ao prazer.

Simão sempre existiu no Beco dos Invisíveis. Desde que a terra é terra, o mar é mar e a cachaça passou a ser vendida em latas. Ele vivia sozinho e largado pelo centro da cidade Sereia. Aparentava ser um homem de conhecimento, a longa barba amarelada pelo tabaco exibia a experiência de um ser que, caso não estivesse usando uma blusa do candidato perdedor a prefeito, bem que poderia se passar por sábio hindu. O cabelo branco simulava algodão, os dentes eram mais amarelos que o sol no fim de tarde e sua mente cansada somente questionava o sentido amargo da vida. Em alguma parte de sua existência, Deus o abandonou. Por manter as mesmas roupas por muito tempo, Simão tinha cheiro de urina envelhecida. Sempre profético em suas palavras, o álcool exorbitava suas filosofias. Bêbado, ele conseguia ser pior que muito pregador de praça, mas, com certeza, o pedinte dizia bem mais verdades que um pastor charlatão.

Drogas, esmolas para comida e mais entorpecentes. Estabelecimentos em horário comercial encerram seu expediente. Os outros habitantes do beco retornam ao lar. Em sua maioria, fazedores de bicos. Uns quatro ou cinco companheiros chegam com histórias, violão e caninha para adoçar o amargo da vida. O parceiro com violão toca Raul Seixas. Todos cantam os trechinhos que se recordam da música “Ouro de Tolo”. “Essa música explica o sentido da existência de todos que circulam por aqui com grana!” discursou Simão para a plateia desatenta. A mensagem musical era conceitual e poderia até mudar a vida de todos eles, mas a única mudança desejada era sair da caretice e adentrar a algum estado alterado de espírito. Companheirismo, boa música e aguardente descendo na garganta. Aos noiados, a lata de cachaça só servia vazia. E mesmo em pleno estado de paranoia, nunca se viu uma confusão, todo mundo seguia a lei da cordialidade. Caso contrário, o bagunceiro amanhecia com a boca cheia de formigas…

Eram quase 22 horas, quando uma estranha figura entrou no beco. Uma jovem mulher com aparência de tiazona derrubada. Pela cara chupada era óbvio que pertencia ao grupo dos “beija-lata”. Cambaleante e desnorteada, ela suplicava por sua paixão: — Dou a xoxota pra quem me der um pega na lata! Cadê os machos dessa merda? Eu quero só um peguinha… Deixa eu beijar a lata que eu beijo outra coisa bem gostosa depois!

Zé nem precisou de cavalheirismo. Apenas levantou a mão empunhando o recipiente metálico e sua deusa entendeu o recado. Depois de uma chupada na lata, a musa entregou-se ao amor paranoide. Fizeram tudo ali mesmo, numa caixa de papelão improvisada como palácio de Vênus. O pico do Zé. A mansão do amor abrigou aqueles dois corpos psicóticos por um breve delírio chamado felicidade. O amor de dois zumbis embalado por deliciosos tragos de cigarro Oscar no pós-coito. A fêmea sai estonteada com sua microssaia suja de areia e tentando pôr o que parecia um top. Ela caminha cambaleante sob o efeito do amor e da pedra. Os companheiros do beco sorriam para José em nome de sua sorte. Enquanto a jovem adicta dava seus passos, os outros mendigos enfiavam a mão direita dentro dos farrapos para homenagear a deusa do lixo com o sexo dos solitários.

Apesar do vazio das ruas, no centro da Sereia sempre existem olhos maldosos à espreita. O resultado disso foi que, menos de dez minutos após a saída da mulher do Zé, a polícia já chegou descendo o cacete em todo mundo que via no beco. Somente ouviam-se os gritos dos repressores seguidos de pancadas secas do cassetete. “Vaza cambada de vagabundo! Vão fazer gandaia na casa do caralho”. Exceto por Simão, que saiu assim que viu os praças ao longe, todos sentiram o bastão perseguidor tocar suas costelas de forma emocionante. Zé correu alucinado levando sua moradia na mão, enquanto Alex se escondeu dentro de uma pilha de lixo. As ruas não eram violentas, já seus protetores pareciam salivar por carne fresca para o espancamento.

Meia-noite, o relógio recomeça a contagem. Todos se dispersam, exceto os três companheiros. Eles resolvem voltar ao beco pela certeza do descanso ser tranquilo. A barra estava limpa. Nada de coxinhas. Um deserto de concreto e lixo, onde com alguns papelões, nossos reis mendicantes resguardavam suas existências na esperança de um dia com mais grana, drinks, pedras e Raul Seixas.

Por ainda ter a audição em bom estado, Simão deve ter sido o único que teve tempo de abrir os olhos no momento em que alguém passava pela calçada. Três balas na cabeça de cada um! Alex nem se mexeu e parecia prosseguir em seu sono, que duraria a eternidade. Zé abriu os olhos, mas já estava puxando ar num ato mecânico de seu corpo; vivenciando os últimos momentos de resistência biológica após a morte cerebral. Simão conseguiu ver seu algoz e teve tempo de gritar “Deus…” antes de cair em estado de óbito. Seus olhos pareciam perder a sabedoria e expressavam decepção. Sentimento que foi alimentado por reconhecer a mesma camisa florida que viu meio dia. O benfeitor virou malfeitor. E, pela permutação no estado de espírito, ele apenas trocou as balas.

Apoie os independentes comprando seus lançamentos!

Assista aqui ao curta “Erivaldo – O Astronauta Místico” (2013) de Gurcius Gewdner com Erivaldo Mattüs atuando:

Lua de Mel no Nordeste Brasileiro

Posted in Buk & Baiestorf with tags , , , , , , , , , , , , , , , , , , on fevereiro 10, 2012 by canibuk

Nos últimos 20 dias estive com Leyla Buk passando uma nova lua de mel em Recife, Olinda e Maceió, nos divertindo com caipirinhas, vinhos, cervejas, cafés, comidas típicas (quem for ao Nordeste precisa experimentar o maravilhoso pirão de queijo, simplesmente genial), sexo, cigarros, comidinhas preparadas por nós (adoramos cozinhar juntos, em breve iremos postar algumas receitas que fizemos nesta lua de mel), filmes undergrounds, músicas bregas lindas, artes em camisetas e mais sexo melequento delicioso!!!

Cheguei em Recife no dia 23 de janeiro e fomos prá casa dos meus sogros (adoráveis!). Logo Leyla e eu já fomos abrindo um vinho e bebericando dele entre amassos e um filme rodando na TV (não lembro qual filme era) e ficamos assim boa parte da semana, só no vinho (ela) e cerveja (eu), sexo e filmes, cafés com cigarro e na cozinha criando/recriando receitinhas de comidas vegetarianas deliciosas. Cozinhar com a Leyla me trás uma paz interior indescritível!!!

No sábado, dia 28 de janeiro, fomos visitar a cidade histórica de Olinda que é um lugar maravilhoso (apesar do sol intenso), com construções lindas, cores vivas vibrantes e suas ruazinhas estreitas com cheiro de artesanato. Olinda é bela, visitá-la é uma pequena viagem no tempo e percorrer as ruazinhas acompanhado da pessoa que você ama é bom demais, faz bem pro coração e prá mente e te rejuvenesce. E ver a Leyla subindo a ladeira que dá acesso ao Alto da Sé, quase sem ar e fazendo pausa para fumar, é algo único, filosofia de vida completamente bukowskiano!!! A única coisa negativa em Olinda é que a paz e tranqüilidade de suas ruazinhas históricas é quebrada pelas caixas de poluição ambulantes, os barulhentos e incômodos automóveis tão cultuados pelos humanos, que na minha opinião deveriam ser proibidos de circular em qualquer local histórico. Olinda histórica é pequena e percorrê-la a pé é essencial para curtir a cidade, além de ser um programa saudável do mais alto nível. Após conhecer Olinda fomos para um restaurante à beira mar onde experimentei um caldinho de feijão divino e saí de lá cambaleando por ter bebido cerveja demais, abraçado em Leyla, igualmente cambaleante, cortesia das inúmeras caipirinhas que ela bebeu.

Nosso domingo acabou sendo para curar a ressaca e cozinhar com a Biba, amiga da família de Leyla, que fez um delicioso caldinho de abóbora, acompanhado de um queijo coalho à milanesa, combinado com um feijão verde que Leyla e eu preparamos. Fechou o domingo de maneira espetacular!!!

Durante a nova semana Leyla e eu retomamos nossos afazeres de lua de mel: Beber vinho, fumar cigarros, fazer sexo tarado, beber cervejas, ver filmes brasileiros e cozinhar (e mais sexo, sexo, sexo!!!). Como o pai de Leyla entrou de férias por estes dias, fomos jantar fora mais vezes. Foi bem interessante experimentar a culinária de Recife (o pirão de queijo é espetacular e o queijo coalho crocante também, engordei alguns quilos). Só não experimentei tudo porque, infelizmente, as opções para os vegetarianos são reduzidas (se eu fosse vegan não teria opção alguma).

Na quinta-feira, dia 02 de fevereiro, encontramos Osvaldo Neto (do ótimo blog Vá e Veja) e ficamos pela orla do bairro de Candeias bebericando cervejinhas. Osvaldo é um cara gente fina prá caralho e foi ótimo conhecê-lo pessoalmente, inclusive foi ele quem linkou meu “Arrombada – Vou Mijar na Porra de Seu Túmulo!!!” para download quando fiz o protesto anti-sopa e em breve irá disponibilizar, também, o média “O Doce Avanço da Faca”.

Na sexta-feira Leyla e eu acordamos extremamente cedo (após uma noite em que declaramos guerra aos pernilongos) e pegamos um busão prá Maceió/AL onde iria acontecer “A Noite dos Malditos” no Sesi local. Prá minha surpresa, quando chegamos, Erivaldo Mattüs me informou que os ingressos para a exibição dos filmes “Zombio” (1999), “O Doce Avanço da Faca” (2010), ambos com direção minha, e “A Noite do Chupacabras” (2011) de Rodrigo Aragão, onde interpreto o vilão Ivan Carvalho, já estavam esgotados desde o dia anterior (163 lugares no cinema já vendidos). Como meus filmes não são muito conhecidos na região Nordeste fiquei extremamente feliz com isso e a recepção do público foi linda: “Zombio” arrancou várias risadas, mas “O Doce Avanço da Faca” levou o público presente ao delírio, com altas gargalhadas, gritos histéricos, aplausos ensandecidos em algumas cenas (na morte do Minuano pelos seios gigantes de Gisele Ferran, Jorge Timm explodindo e a cena final deixaram o público eufórico!). Foi lindo, obrigado Maceió!!! Depois dos filmes rolou um rápido bate-papo comigo e a exibição do já Cult “A Noite do Chupacabras” do genial Rodrigo Aragão, que fez o público ficar completamente absorvido durante suas quase 2 horas de duração. Com o término da sessão passamos por um mercado 24 horas (eram umas 4 da manhã), compramos vinho e pizza, e fomos prá casa do Erivaldo Mattüs ver o sol nascer. Leyla desmaiou de canseira e eu também, logo depois dela. Na casa do Erivaldo está o quadro “Bloody Catrina” que Leyla pintou para ele e que eu conhecia apenas por fotos. Ver o “Bloody Catrina” ao vivo, de pertinho, é uma experiência fantástica, o quadro é maravilhoso, um grande trabalho de meu amor, garota linda e talentosa, por quem fico a cada dia mais apaixonado.

Algo me chamou atenção na viagem de busão entre Recife-Maceió (eu só conhecia o Nordeste viajando de avião): O interior nordestino é verde e produtivo, cheio de vida e cidadezinhas coloridas, bem diferentes do Nordeste seco e sem vida mostrado pelos filmes e/ou canais de TV. Fica a dica, viaje de busão pelo Nordeste para conhecer mais da região, é uma experiência bem interessante e rica.

De volta em Recife, Leyla e eu resolvemos ficar caseiros. Recusamos os convites que os pais dela fizeram para sair e ficamos os próximos dias no nosso ritmo de bebidinhas, comidinhas e sexo gostoso. Queríamos nos aproveitar ao máximo antes da minha volta para o Sul do Brasil, namorar à distância é horrível e no momento de separar bate uma tristeza profunda muito ruim de controlar! Espero que em breve estejamos morando juntos para não ter mais que sofrer com a distância!

 

Lampião: Herói ou Bandido?

Posted in Cordel with tags , , , , , on março 19, 2011 by canibuk

Na fazenda Ingazeira ele nasceu

Vila Bela, atual Serra Talhada

Virgulino Ferreira na estrada

Das caatingas do Sertão empreendeu

Uma marca que o cangaço conheceu

Como linha divisória do cangaço

Que com ele assumiu ares de traço

Permanente fazendo a divisão

Do período a partir de Lampião

E de antes do seu primeiro passo.

.

Foi parido no mês de fevereiro

Dia 12 de 1900

Virgulino era mais um dos rebentos

Da família de um simples fazendeiro

Admirava a vida de vaqueiro

Inda moço amansava animal bruto

Em seu plano de vida resoluto

Artesão de arreios de cavalo

Mudou tudo assim num só estalo

Para a vida perdeu salvo-conduto.

.

Um artista do couro que fazia

Sela, arreios, bornais, gibão, perneira

Às cidades vizinhas ia prá feira

Pra vender o que ele produzia

Tinha sempre o pai por companhia

Nessas idas também os irmãos iam

Os negócios a eles garantiam

Um retorno que dava pro sustento

Não faltava à mesa o alimento

E assim tranqüilamente eles viviam.

.

Nesse tempo com 17 anos

Mesma idade que entrou para o cangaço

Ocorreu de uma vez no mesmo passo

O fracasso dos seus atuais planos

José Saturnino e outros manos

Decorrente de encrencas por chocalhos

Saiu de Cachimbos por atalhos

Encontrando-os perto de Nazaré

Atirou em quem viu que estava em pé

E o tempo fechou por entre os galhos.

.

Os irmãos do jovem Virgulino

Baleados foram prá Mata Grande

Antes mesmo que ele mesmo mande

Resolveram tomar esse destino

Entretanto antes de tomarem tino

Aparece o tenente Zé Lucena

Delegado volante dessa cena

E atira no pai de Lampião

Que atingido é morto e cai no chão

Friamente o mataram sem ter pena.

.

Quando soube o que tinha acontecido

Com o marido a mão de Lampião

Agachou-se de dor e o coração

Já estava batendo combalido

O socorro chegou mas foi perdido

Não havia mais nada prá fazer

Morto o pai, morta a mãe e ele não vê

A saída, mas seu olhar se lança

Ao desejo instintivo de vingança

E partiu pra matar ou pra morrer.

.

Ingressou no cangaço e foi viver

Com o bando de Antonio Silvino

Ainda moço partia Virgulino

Para o mais contraditório proceder

Com as suas próprias mãos queria ver

O que ele não via na justiça

E se a ira no coração lhe atiça

A vingança foi generalizada

Onde andou sua marca foi deixada

Por projéteis de sua arma roliça.

.

Da fazenda Ingazeira deu no pé

Devido as encrencas com os Nogueira

Seus vizinhos que agora se entrincheira

Depois do que houve em Nazaré

Espantalho dos Sertões Lampião é

Mesmo antes de tornar-se Lampião

E promete botar a própria mão

Sobre Zé Saturnino e Zé Lucena

E outros tantos que estão na mesma cena

Que o fizeram sair do teu torrão.

.

Eram os reis do cangaço nessa era

Casemiro Honório e Antõe Quelé

Né Pereira, os quais mantinham em pé

Os instintos terríveis de uma fera

Os inúmeros membros da quimera

Do cangaço ganhava habilidade

Desafios a toda autoridade

Com certeza se desenvolveria

Com a chegada da sua maior cria

O cangaço ganhou vitalidade.

.

Quando Antonio Matilde se casou

Com uma moça prima de Lampião

Não contava que por provocação

Levaria a surra que levou

José Saturnino, que o surrou

Provocou Lampião e se deu mal

Este veio deixando o pessoal

No estado de Alagoas onde estava

Depois de brigar ele matava

Todo gado que achava no curral.

.

Dois dos reis do cangaço em socorro

À família de José Saturnino

Lançaram-se em grande desatino

Como à caça se lança o cachorro

Virgulino disse: da luta eu não corro

Mas botou prá fugir quem combatia

Baleou os Nogueira mas não via

Nenhum morto daqueles que esperava

Tocou fogo em tudo que encontrava

Na fazenda que as chamas consumia.

.

Pouco tempo sua fama se espalhou

As pessoas daquela região

Que sofria qualquer humilhação

Procurava-o pra ser seu seguidor

Como rei do cangaço ele ficou

Conhecido e temido no Sertão

Não faltava a ele ocasião

De exibir-se com suas diabruras

Humilhava e exaltava criaturas

O terrível e valente capitão.

.

Componentes do bando de Lampião:

Corisco, Jararaca e Nevoeiro

Volta seca, Pancada e Cajueiro

Cravo Rocho, Moita Brava e Azulão

Cajarana, Sabonete e Mergulhão

Gato Bravo, Enedina e Pente Fino

Juriti, Passarinho e Livino

Zabelê, Elétrico e Quinta Feira

Mais Sereno e Antonio Ferreira

E outros tantos que seguiam Virgulino.

.

Maria estava com a vizinha

Quando alguém do lugar anunciou:

Lampião vem aí, e ela falou:

Credo cruz minha gente, eu tô calminha

Quero mesmo é ser sua rainha!

Eu queria era ir com ele embora!

Mas a Rosa sua amiga lhe implora:

Fala baixo alguém pode te ouvir

Eu quero é que ouça que é pr’eu ir

Com ele pro fim do mundo agora.

.

Era ela a mulher de um sapateiro

Vida simples em seu cotidiano

Mas sonhava com o mundo desengano

E jogou-se nas mãos do bandoleiro

Lampião a levou para o vespeiro

O cangaço era a sua moradia

Numa vida de aventura fugidia

Foi Maria Bonita a rainha

Desse mundo que quase nada tinha

A não ser sua própria revelia.

.

Mesmo havendo poesia, ainda assim

Era errante a vida o tempo inteiro

Se roubava prá conseguir dinheiro

Se matava prá ir até o fim

Torturava quem achava ruim

Corrompia pela imposição

A conquista à força da ação

Amizades compradas pelo medo

Tanto foi que acabou-se num enredo

Descoberto por um coiteiro irmão.

.

Era um tempo em que a lei foi esquecida

A do homem e a de Deus também

Tudo era a base de quem tem

O poder da lei atribuída

Conforme a vontade suicida

Sem medida de qual a conseqüência

Era assim pro governo dá ciência

Era assim prá ninguém obedecer

A vontade de cada era fazer

Uma lei pela sua onipotência.

.

A polícia cometia atrocidades

O coiteiro da mesma forma agia

Cangaceiro a nada obedecia

O governo cheio de incapacidades

A justiça com mais de mil verdades

Mesmo em nome de uma religião

Alguém avançava com a mão

Tomando para si algum partido

Até Deus era desobedecido

Imagine o restante da nação.

.

O governo Federal pra combater

A coluna de Prestes no Sertão

Procurou conversar com Lampião

O fazendo agora merecer

A patente que iria receber

O tornava pra sempre capitão

Padre “Ciço” fez a negociação

Virgulino Ferreira é empossado

Novas fardas e o bando bem armado

O errado tornou-se solução.

.

O que fez Lampião e seus bandidos

Nas tantas investidas contra a vida

É a página mais suja empedernida

Que ficou desses tempos esquecidos

Quando ouviu inda moço os estampidos

Dos tiros que mataram o próprio pai

A diabólica ação que lhe atrai

É matar. É matar até morrer

E aí matou gente sem porquê

Só prá vê como é que um morto cai.

.

O poder militar, do mesmo jeito

Que buscava combater o infeliz

Ajudava autoridades civis

Pra tirar disso tudo algum proveito

Fazendeiro vivia satisfeito

A despeito de sua transgressão

Mesmo assim não podemos ver razão

Pra dizer que o errado virou certo

Foi herói ou foi bandido esperto

Virgulino Ferreira, o Lampião?

.

O final da estrada foi traçado

Pela prática do seu caminhador

Que de tanto atirar-se ao horror

O horror a si foi atirado

O caminho do valente é encurtado

E aos 38 anos, Lampião

Deixa a vida perdida sobre o chão

Que não pôde mais nele caminhar

Acabou seu reinado no Sertão.

.

Lampião encontrou-se com a morte

No seu esconderijo preferido

Por um dos seus coiteiros foi traído

Mudando do cangaço toda a sorte

Tenente Bezerra, se fez forte

Para a Grota dos Angicos, comandava

Sua tropa que à noite caminhava

Pra no dia seguinte aparecer

E aos bandidos poder surpreender

De manhã quando o dia inda raiava.

.

Cedinho Lampião se levantou

Com um caneco de água em sua mão

De repente um tiro o leva ao chão

Já cai morto e morto ali ficou

E Maria Bonita se jogou

Sobre o corpo caído posto ao nada

Sobre ela desceu uma rajada

Outros tantos morreram no embate

Não havia mais força pro combate

A coroa do rei foi derrubada.

FIM.

escrito por Abdias Campos.